O SOFRIMENTO PSÍQUICO NO CLERO: UMA PROSA SOBRE PADRES, ALTARES E ADOECIMENTO PSÍQUICO

PSYCHIC SUFFERING IN THE CLERGY: A PROSE ON PRIESTS, ALTARS AND PSYCHIC DISEASE                              

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11047513


Diogo Rogério Carlos1
Jaiana Saraiva Do Nascimento2
Ana Carla Pereira Chaves Da Silva3
Karoline Raquel Pontes De Souza Do Amaral4
José Leandro Aleixo5
Maria Denise De Assis6


Resumo: Diante de acontecimentos expostos na grande mídia, de casos de padres católicos com relatos de adoecimento psíquico, como estresse e esgotamento emocional, síndrome de burnout, síndrome do pânico e depressão; em alguns casos chegando a ideação suicida ou mesmo de suicídio consumado, esta pesquisa tem por objetivo discutir o adoecimento psíquico no clero e sua relação com o trabalho que esses exercem. O ativismo, a sobrecarga de atividades diárias, prejudica a qualidade de vida, gera um esgotamento psicológico e emocional, pondo a vida dos presbíteros em risco. No primeiro momento abordar-se-á a relação sofrimento-trabalho. O método utilizado para elencar as informações necessárias à pesquisa foi o levantamento bibliográfico com revisão sistematizada. Na conclusão pode-se perceber que a estafa de trabalho é um dos principais fatores de adoecimento e o importante papel da psicoterapia e dos grupos eclesiais no auxílio dos padres.

Palavras-chave: Padre. Trabalho. Adoecimento Psíquico.

Abstract: In the face of events exposed in the mainstream media, of cases of Catholic priests with reports of psychological illness, such as stress and emotional exhaustion, burnout syndrome, panic syndrome and depression; in some cases arriving at suicidal ideation or even consummated suicide, this research aims to discuss the psychic illness in the clergy and its relationship with the work they do. Activism, the overload of daily activities, impairs quality of life, generates psychological and emotional exhaustion, putting the lives of elders at risk. In the first moment, the suffering-work relationship will be addressed. The method used to list the information necessary for the research was the bibliographic survey with systematic review. In conclusion, it can be seen that work stress is one of the main factors of illness and the important role of psychotherapy and ecclesial groups in helping priests.                                               

Keywords: Father. Job. Psychic Illness.

INTRODUÇÃO

A decisão em pesquisar sobre padres e sofrimento psíquico como depressão, burnout, síndrome do pânico, estresse e esgotamento emocional foi por observar como é comum, apesar da maioria das pessoas pensarem que não, relatos e notícias de padres adoecidos psicologicamente. Números de suicídios de presbíteros também aparecem de forma significativa.

Casos como o do padre Rosalino Santos, que aos 34 anos cometeu suicídio em Corumbá, no Mato Grosso do Sul. Neste caso, antes do ato, o padre publicou no Facebook uma foto de quando era garoto, e escreveu um texto onde continha frases soltas como: “Dei o meu melhor” e “Me ilumine Senhor.” O que parecia ser um simples desabafo em rede social, tratava-se de uma despedida, deixado dois dias antes do padre ser encontrado enforcado em sua casa. (DOCUMENTÁRIO BBC BRASIL, 2017)

Em novembro de 2016, a Paróquia Senhor da Paz de Salvador (BA), viu o padre Ligivaldo dos Santos, com 37 anos, atirar-se de um viaduto. Doze dias depois, outro caso, pela terceira vez em menos de 15 dias, um sacerdote encerrava a própria vida, o padre Renildo Andrade Maia, de 31 anos, era pároco da igreja de Jesus Operário, em Contagem – MG. (COSTA, 2018).

No dia 16 de fevereiro de 2018, a cidade de Quixadá foi pega de surpresa com a notícia de que o Padre Luiz Orlando de Lima, 56 anos, encontrado morto na sua residência paroquial, na Igreja de São Francisco. Devido ao acontecimento, as prefeituras de Quixadá, Boa Viagem e Ibaretama decretaram luto oficial de três dias. A provável causa da morte do sacerdote já é amplamente comentada. Neste caso, chamou-se a atenção o fato de um crucifixo ser encontrado junto ao corpo do Padre Orlando e isto, por motivos que não pretendo desenrolar aqui, pode ser suficiente para indicar, conforme o entendimento da Igreja acerca de arrependimento e do perdão divino. (DIÁRIO DE QUIXADÁ, 2018).

No ano de 2017, os padres de maior relevância midiática falaram abertamente sobre o sofrimento que estavam vivendo e sobre o pensamento suicida, foram eles o padre Marcelo Rossi e o Padre Fábio de Melo, o primeiro diagnosticado com depressão e o segundo com síndrome do pânico. Outro nome conhecido no meio católico que relatou sofrer de depressão nos últimos tempos, e inclusive afastou-se da mídia por alguns anos foi o Padre Jonas Abib, de Cachoeira Paulista – SP, fundador da Comunidade Canção Nova. Ainda no portal Catolicus, uma pesquisa mostra que entre os anos de 2017 e 2018, tivemos morte suicida de 17 padres no Brasil. (CASTILHO 2018; COSTA 2018). A sequência de suicídios de padres católicos chama a atenção da sociedade, da mídia e da academia científica também, muitos voltam a atenção aos vários motivos que podem tê-los levado a tirar a vida, o objetivo desta pesquisa não é este, a exploração e estudo dos motivos poderão ser abordados em trabalhos posteriores.

Diante do exposto, este trabalho tem por objetivo, discutir o sofrimento psíquico em presbíteros da Igreja Católica Apostólica Romana, onde no primeiro momento abordar-se-á a relação entre sofrimento e trabalho. Na conclusão pode-se perceber que a estafa de trabalho é um dos principais fatores de adoecimento e o importante papel da psicoterapia, dos grupos eclesiais e da família, no auxílio dos padres.

METODOLOGIA

Por tratar-se de uma pesquisa de revisão bibliográfica com bases de dados nacionais e internacionais, no levantamento realizado da literatura, foram selecionados 18 artigos pertinentes ao tema. Esses artigos foram rastreados em banco de dados on line (indexadores Scielo, Lilacs e Google Acadêmico). Todos os 18 artigos apontaram evidências a respeito da ligação entre trabalho e adoecimento/sofrimento psíquico. Os pesquisadores também apontaram os efeitos positivos da psicoterapia no tratamento dos presbíteros adoecidos. Por sua vez, a literatura abordando o tratamento clínico dos padres é bastante escassa.  A pesquisa ocorreu entre maio e julho de 2018. Para enriquecer o levantamento bibliográfico foram incluídos nas fontes principais três livros sobre o tema e duas dissertações que também foram rastreadas na pesquisa. As principais palavras descritoras selecionadas para a realização das buscas foram: Presbíteros em depressão, clero e suicídio, sofrimento psíquico em padres, psicoterapia para padres, religião e adoecimento. As palavras foram combinadas de diferentes modos para que fosse rastreado o máximo possível de artigos não repetidos. A escolha dos artigos mais relevantes foi determinada pelo seu conteúdo no sentido de contemplar os aspectos do presente estudo. Os critérios de exclusão para a estruturação da pesquisa foi o acesso privado e incompleto do material. Durante a pesquisa foram rastreadas duas teses e uma dissertação sobre o tema.  Foram identificados 28 matérias e estudos sobre o tema, sendo que 18 foram selecionados. Em todos estes, problematizou-se o porquê do tema suicídio ainda ser tratado como um assunto-tabu para as religiões cristãs, como também apresentam a psicoterapia e o atendimento psicológico sistemático como principais modos de cuidado do sofrimento psíquico em padres católicos.

A maioria dos artigos pesquisados também pontuava o adoecimento psíquico no clero tem sim relação com o trabalho que esses exercem, com o ativismo, a sobrecarga de atividades diárias; a falta de uma pausa no trabalho prejudica a qualidade de vida, gerando um esgotamento psicológico e emocional, pondo a vida dos presbíteros em risco.  

TRABALHO E ADOECIMENTO PSÍQUICO

O fenômeno trabalho tem diferentes significados, de acordo com Albornoz (1986), alguns deles carregados de emoção e dor. A palavra trabalho se origina do latim, tripalium, que era um instrumento feito de três paus acentuados, algumas vezes munidos com ponta de ferro. A maioria dos dicionários registra o tripaliumcomo um instrumento de tortura. A tripalium se ligou o verbo do latim vulgar tripaliare, que significa torturar. Trabalho, no sentido geral, significa realizar uma obra que expresse resultados, que traga reconhecimento social e permaneça além da vida, como também é sinônimo de esforço rotineiro e repetitivo, sem liberdade, de resultado consumível e incômodo inevitável.

Para Martins e Pinheiro (2006), o trabalho supõe atividade para um fim, pressupondo esforço mas, para alguns, esse esforço será apenas físico e, para outros, intelectual. No entanto, ainda detectamos pessoas que dividem e classificam o trabalho físico e o trabalho intelectual separadamente.

A organização e trabalhadores elaboram um código de ética inviolável, em que, invariavelmente, o trabalhador passa a ser orientado, rotineiramente, pela cultura desenvolvida pela organização, no entanto ignora-se que o trabalhador carrega com ele sua própria bagagem de valores ou seja sua própria cultura, que deveria se integrar ao ambiente de trabalho; percebe-se que os valores da cultura da organização sobrepõe-se a seus valores, levando este a uma visão da organização a partir destes novos referenciais que lhes são, em primeiro momento, totalmente externos, resultando em conformismos. O tempo vai passando, os trabalhadores de ontem e os que vem chegando vão sempre procurando acomodar-se ao modelo de cultura encontrado na organização. Entendemos que, dificilmente, a organização conseguirá separar e/ou erradicar a cultura do trabalhador, pois tais pressupostos encontram-se em sua estrutura, na própria condição de vida e em suas experiências subjetivas. (MARTINS e PINHEIRO, 2006)

Chega-se assim, ao Capitalismo e ao seu sistema, ou melhor, dizer, modo de funcionamento. Karl Marx (1985) afirma que o trabalho, ao constituir a substância dos valores, é trabalho humano, igual dispêndio da mesma força do homem. A força conjunta de trabalho, na sociedade, que se apresenta inserida no valor das mercadorias, vale aqui como uma única e mesma força de trabalho do homem, não obstante ela ser composta de inúmeras forças de trabalho, individuais. Para Martins e Pinheiro (2006), é nos moldes capitalistas, que assim acontece a explicação histórica:

Um determinado modo de produção de mercado, criado desde o principio da idade moderna e desenvolvido com a revolução industrial. O sistema capitalista nada mais é do que a força de trabalho que se transforma em mercadoria e fica no mercado, como objeto de troca. A propriedade é centralizada em uma única classe social, que compra a força de trabalho de outra classe e a vende, para sua sobrevivência. 

O modo de funcionamento da sociedade afeta diretamente a existência dos indivíduos. A sociedade atual está inserida em uma forma freneticamente instantânea e corrida de pensar e lidar com o mundo, e isso inclui a forma como os sujeitos se relacionam com seus trabalhos, fazendo com que a cada dia cresça os números de pessoas adoecidas.

Para Mendes e Tamayo (2001), compreender o sofrimento psíquico do trabalhador implica em antes investigá-lo, considerando a cultura e seus valores, significa, ainda, relacionar este sofrimento aos processos subjetivos envolvidos no campo do trabalho. Os valores organizacionais servem à própria sobrevivência da organização e, por essa razão, buscam mediar conflitos para resolver problemas.

O adoecimento psíquico pode estar ligado ao excesso de padronização e hegemonização social sobre o indivíduo, que acaba incorporando a lógica social reprodutiva e adoece em nome desta mesma sociedade que visa o ajustamento dos sujeitos, sendo que esse ajustamento imposto e autoritário, em muito favorece o adoecimento psíquico.

A ligação entre sofrimento psíquico e trabalho é matéria de estudo e de pesquisa há um bom tempo, e podemos citar Dejours como um dos principais pesquisadores.  Para Dejours (1994), o sofrimento do trabalhador nasce das elaborações edificadas nas relações de trabalho, a partir da organização (cultura) e de seus próprios colegas trabalhadores (relações). A organização exige que suas atividades sejam realizadas, a partir do instante em que ela passa a oferecer ao trabalhador condições de trabalho suficientes para que o exercício do trabalho redunde em êxito. Quando isso não ocorre, a organização passa a cobrar, muitas vezes de forma hostil, o resultado não atingido pelo trabalhador, e este por sua vez, acredita nesta “verdade” e passa a desenvolver uma relação de sofrimento consigo mesmo e com a organização.

Para Dejours (1994), o objeto de estudo é, preferencialmente o sofrimento, mas isto não significa que tudo fique reduzido à sua constatação. No entanto, doenças podem acometer o trabalhador, a partir das exigências impostas pelas organizações. Dejours (1994) amplia seu campo de investigação, e passa, da psicopatologia do trabalho à psicodinâmica deste, permitindo que se olhe diferentemente para o sofrimento, afirmando que, no trabalho, também existe prazer. O objetivo de Dejours passa a ser o de compreender como os trabalhadores alcançam determinado equilíbrio psíquico, mesmo estando submetidos a condições de trabalho desestruturantes (Dejours, 1997).

Dejours na sua Picodinâmica do Trabalho aborda a questão da saúde e sua relação com o trabalho, segundo ele, como se constroem as competências profissionais, aqui entendidas como o potencial para agir, a saúde seria, inspirado na proposta de construção, busca, ideal, objetivo a ser atingido, mas nunca totalmente alcançado. Distante da proposição que considera a saúde mais um estado de bem-estar do que uma contraposição à doença, a sua definição estaria relacionada, de um lado, com uma dinâmica de vida pautada pelo que as pessoas fazem e podem fazer dentro de determinadas condições organizacionais e, de outro, com seus aspectos genéticos e fenotípicos. Desenvolver a saúde é desenvolver um patrimônio fundado num corpo-sujeito dentro das incertezas e buscas de continuidade, moderada por desafios constantes (DEJOURS, 2005).

Dejours introduz a questão da relação sofrimento e prazer associada ao trabalho, elemento central para a Psicodiâmica do Trabalho. Muitos criticam a teoria de Dejours sobre a Psicodinâmica do Trabalho, por considerá-la reducionista, pois ao focar a questão do sofrimento estaria evidenciando os aspectos negativos do trabalho numa espécie de epopeia ao sofrimento, que, como consequência, seria uma espécie de indutor de seu crescimento e serviria para torná-lo o ponto central do trabalhar. Isto não corresponde ao que de fato propõe este campo do conhecimento, cuja intenção é evidenciar a racionalidade pathica com relação ao trabalhar, isto é, a partir de como os sujeitos constroem e vivenciam o seu trabalho, Dejours propõe uma tentativa de enriquecer as diferentes representações sociais existentes sobre o trabalho humano. No caso da racionalidade pathica, a questão reside em como o sujeito transforma o mundo e como seu trabalho o transforma, trabalho este que está inscrito no real do mundo. Assim, trata-se das vivências dos sujeitos, da sua relação com o mundo através de seu corpo e da sua psiquê. O sofrimento no trabalho torna-se evidente quando não é mais possível transformá-lo em prazer através das realizações do sujeito, reconhecidas pelos outros como úteis e belas. Ou, como afirma Molinier, “o sofrimento no trabalho começa no momento em que ele se torna patogênico, isto é, exatamente lá onde a parte criativa do trabalho cessa” (Molinier, 2006, p. 60). Segundo Dejours:

O sofrimento começa quando a relação homem-organização do trabalho é bloqueada, quando o trabalhador utilizou ao máximo suas faculdades intelectuais, psicossensório-motoras, psicoafetivas de aprendizagem e de adaptação. Quando um trabalhador utilizou tudo o que dispunha de saber e poder sobre a organização do trabalho e quando ele não pode mais mudar a tarefa; isto é, quando esgotou os meios de defesa contra o constrangimento físico. Não é tanto a importância dos constrangimentos mentais ou psíquicos do trabalho que faz aparecer o sofrimento (se bem que este fator seja uma evidência importante) quanto a impossibilidade de toda a evolução em direção ao alívio. A certeza de que o nível atingido de insatisfação não pode mais diminuir marca a entrada no sofrimento (Dejours, 2000, p. 78-79).

Molinier e Dejours falam de situações em que é necessária a criatividade para resolver os desafios que o contexto de trabalho apresenta ao trabalhador. A elaboração criativa dos imprevistos e problemas envolve um sofrimento criativo, ou seja, sofre-se criativamente para enfrentar a situação. Quando o trabalhador utilizou todos os seus recursos e não tem mais como mudar a tarefa, surge o sofrimento patogênico. Falar em sofrimentos criativo e patogênico não significa que existam dois tipos de sofrimento, mas que na realidade esses termos designam dois destinos diferentes do sofrimento: “O destino do sofrimento criativo é o de se transformar em prazer e em experiência estruturante. O destino do sofrimento patogênico é a doença que surge quando as defesas não cumprem mais sua função defensiva” (Molinier, 2006, p. 60).

Num mundo em que predomina a lógica do capital financeiro, que exige um crescimento sem fim, impondo metas cada vez mais absurdas e defendendo a ideologia de que os homens são seres com capacidade de superação infinita, observa-se várias formas de adoecimento psíquico no trabalho. Na ânsia de corresponder às exigências de que só se é bem-sucedido quando se atinge cada vez mais metas agressivas e rigorosas, observamos que estes sujeitos se tornam visíveis não pelo sucesso, mas pelo preço que passam a pagar, ou seja, pela expressão dos seus sofrimentos patogênicos.

PROSA, PADRES, ALTARES E ADOECIMENTO PSÍQUICO: RESULTADO E DISCUSSÃO

Quando pensasse que um padre ordenado irá trabalhar numa Paróquia, e de certa forma responder por milhares de paroquianos, percebe-se o tamanho do seu trabalho. De acordo com o Código Canônico da Igreja Católica Romana:

Cân. 515 – § 1. Paróquia é uma determinada comunidade de fiéis, constituída estavelmente na Igreja particular, e seu cuidado pastoral é confiado ao pároco como a seu pastor próprio, sob a autoridade do Bispo diocesano. (IGREJA CATÓLICA, 2002, p.155).

Para Barbosa (2016), “o padre deve ser o pastor das ovelhas, que são os fiéis, membros da paróquia.” E o trabalho pastoral exigirá diversas habilidades dos futuros padres, como noções de administração, contabilidade, psicologia e cultura geral, além do conhecimento bíblico e teológico. (BARBOSA, 2016).

A pesquisadora Luciana de Almeida Campos, em seu livro “A dor invisível: A síndrome de Burnout e depressão entre os religiosos” acentua a solidão dos religiosos como ponto delicado no “incremento do adoecimento”. Para a pesquisadora, o fato do padre diocesano, na maioria das vezes, residir sozinho, faz com que o fator solidão torne-se um agravante, potencializando a angústia ou outro sintoma dessa ordem.

Para Costa (2018), “a vida religiosa não dá superpoderes aos padres, pelo contrário, eles são tão falíveis quanto qualquer leigo”. Em muitos casos, a fé pode não ser forte o suficiente para superar um momento difícil da vida. O psicólogo William Castilho, autor do livro “Sofrimento Psíquico dos Presbíteros”, destaca que “O grau de exigência da Igreja é muito grande. Espera-se que o padre seja, no mínimo, modelo de virtude e santidade. Qualquer deslize, por menor que seja, vira alvo de crítica e julgamento. Por medo, culpa ou vergonha, muitos preferem se matar a pedir ajuda”. (CASTILHO, 2016).

Em cerca de nove dos artigos pesquisados, os autores apontam que uma das falhas no processo de formação dos seminários, é a de não os preparar na dimensão prática, para vivência dessa solidão. (COSTA, 2018, CASTILHO 2016, ALMEIDA, 2016). Afinal, seminário são comunidades cheias de pessoas, lugar de fraternidade e convivência; a transição para uma casa paroquial grande e vazia de pessoas é para alguns seminaristas, fator preocupante. Porém para outros não. Há aqueles que preferem a solidão, que até certo ponto é algo até mesmo necessário, mas sem provocar fuga dos relacionamentos ou mesmo o isolamento social. (COSTA, 2018).

Costa (2018) escreve dizendo que entre os anos de 2017 e 2018, aconteceram a morte suicida de 17 padres no Brasil.

A sequência de suicídios de padres católicos chama nossa atenção pelos vários motivos que podem tê-los levado a tirar a vida. Fiquei angustiado e preocupado com a morte do Monsenhor Orlando, da diocese de Quixadá, ocorrido recentemente, com quem tive um convívio pastoral em 2009. Meus sentimentos a toda diocese de Quixadá, a todo clero. (COSTA, 2018).

Falar de adoecimento psíquico, ideação suicida e suicídio ainda é um tabu nas religiões cristãs. Para o Catecismo da Igreja Católica, o suicídio ainda é visto como um dos maiores pecados:

O suicídio é gravemente contrário à justiça, à esperança e à caridade. É proibido pelo quinto mandamento. C.I.C. nº 2325. O suicídio contradiz a inclinação natural do ser humano a conservar a própria vida. C.I.C. 2281.

Importante observar que a definição do Catecismo Católico se aplica aos casos onde a pessoa comete o suicídio com toda a consciência do seu ato. O mesmo Catecismo oficial da Igreja diz que “Distúrbios psíquicos graves, a angústia ou o medo grave da provação, do sofrimento ou das torturas podem diminuir a responsabilidade do suicida”. (C.I.C. 2282).

“Não se deve desesperar da salvação das pessoas que se mataram. Deus pode, por caminhos que só Ele conhece, dar-lhes ocasião de um arrependimento salutar. A  Igreja ora pelas pessoas que atentaram contra a própria vida”. (C.I.C. nº 2283).

Para Saraiva (2017), ao passo que a Igreja, de fato, encara o suicídio como um ato pecaminoso, e um pecado de extrema seriedade, ela também compreende que a misericórdia de Deus pode alcançar detalhes que escapam à nossa vista e avaliações limitadas:

Na Bíblia, o Rei Davi, segundo a Bíblia, mostrou-se grato aos habitantes de Jabes-Gileade porque eles demonstraram respeito e providenciaram um enterro decente para Saul, que havia se jogado em cima de sua espada e, portanto, cometido suicídio. A atitude de Davi pendeu mais para a humanidade e para a misericórdia, bem como para a gratidão a quem demonstrou consideração pelo suicida Saul. (SARAIVA, 2017)

Saraiva aponta que existem casos na Bíblia de homens e mulheres religiosos que, à beira de situações desesperadoras, pediram para si a morte:

Elias quis morrer quando perseguido por Jezabel (1 Reis 19,4); Moisés também chegou a pedir para Deus a morte (Números 11,15). Isso aconteceu também com Jonas, mas por um motivo mais fútil (Jonas 4,3). É claro que eles não pensaram em se suicidar, mas pediram a Deus que os levasse, ou seja, quiseram morrer. Isto ilustra que, mesmo pessoas devotas e com boas inclinações religiosas, são vulneráveis aos diversificados sofrimentos que podem abalar e desequilibrar o espírito humano. (SARAIVA, 2017)

O fato de o suicídio ser encarado pelas religiões cristãs como pecado sem perdão dificulta e muito o trabalho de prevenção e intervenção nos casos, visto que gera sentimentos e ações de discriminação e preconceito entre as comunidades de leigos e entre a própria comunidade do clero. Não muito raro, no momento que um padre diocesano ou religioso expõe seu sofrimento, vira alvo de crítica e julgamento. De certa forma, a própria doutrina da Igreja, deixa esse peso sobre as costas dos seus trabalhadores, e isso faz com que a sociedade em geral sempre espere que um padre seja uma pessoa infalível, sem dores, sem sofrimentos e sem fragilidades. Há certa dificuldade de considerar a humanidade dessa classe, por parte de quase uma sociedade toda. E então, por medo, por culpa ou mesmo por vergonha, muitos preferem se matar a pedir ajuda. (CASTILHO, 2016).

Castilho firma que “no caso da vida sacerdotal, os padres costumam ter um trabalho acolhedor do sofrimento dos outros. Dessa maneira, eles podem sentir dor intensa diante dos problemas trazidos pela população que atendem.” (CASTILHO, 2016).

Um trabalho de pesquisa de 2008, realizado pela ISMA Brasil, organização de pesquisa e tratamento do estresse, apontou que a vida sacerdotal é uma das profissões mais estressantes. No ano em que a pesquisa foi realizada, 448 entre 1,6 mil padres e freiras entrevistados (28%) se sentiam “emocionalmente exaustos”. O percentual de clérigos nessa situação era superior ao de policiais (26%), executivos (20%) e motoristas de ônibus (15%). A psicóloga Ana Maria Rossi, que coordenou o estudo, afirma que padres diocesanos, que trabalham em paróquias, estão mais propensos a sofrer de estresse do que monges e frades que vivem reclusos.

Para Rossi (2008), um dos fatores mais estressantes da vida religiosa é a falta de privacidade. Não interessa se estão tristes, cansados ou doentes, padres têm que estar à disposição dos fieis 24 horas por dia, sete dias por semana. A vida sacerdotal é mais atribulada do que se costuma imaginar. Inclui celebração de batizados e casamentos, visitas a doentes, sessões de confissão, aulas em universidades, presença em pastorais. (ROSSI, 2008).

Castilho (2016), também pontua em suas pesquisas o excesso de exigências e expectativas por parte da instituição Igreja:

“o grau de exigência da Igreja é muito grande. Espera-se que o padre seja, no mínimo, modelo de virtude e santidade. Qualquer deslize, por menor que seja, vira alvo de crítica e julgamento. Por medo, culpa ou vergonha, muitos preferem se matar a pedir ajuda”. (CASTILHO, 2016).

Ele ainda destaca que “o excesso de trabalho, a falta de lazer, a perda de motivação pastoral e a falta de fraternidade presbiteral, são possíveis fatores que podem levar os padres ao suicídio”. (CASTILHO, 2016).

Costa (2018) consegue fazer uma leitura muito semelhante à de Castilho (2016), destacando a importância do cuidado a saúde psíquica:

Cuidemos mais de nossa vida, de nosso bem-estar, como também de nossos trabalhos pastorais. Aconselho-vos que devem pedir ajuda ao bispo sempre que sentirem tensão psicológica ou esgotamento físico: Os padres não estão sozinhos. Fazemos parte de uma família. E, nesta família, cabe ao bispo desempenhar o papel de pai e zelar pelas necessidades dos filhos. (COSTA, 2018).

Costa (2018) fala da importância do presbítero não se afastar do convívio clerical; tirar suas férias anuais; procurar sempre fazer check-up médico; dar prioridades às suas horas de descanso; intensificar suas orações pessoais; pedir sempre orações aos seus fiéis, cuidar de si e do outro também. (COSTA 2018).

Somos esses homens comuns, no corpo e na alma, tão semelhantes a milhares de outros homens, mas que possuímos uma marca, um sinal, uma destinação honrosa e necessária para levar a salvação a todos que nos procuram! Homens acolhidos e ungidos por Deus! (COSTA, 2018).

Para Lima (2016), o fato dos padres assumirem uma grande carga de trabalho, se caracteriza como uma autodestruição. Para ele, muitos padres estão se “autodestruindo”, e por essas condições, eles são mais vulneráveis a desenvolver doenças psíquicas, sobretudo a síndrome de burnout ou síndrome do esgotamento profissional.

O termo burnout, do inglês “combustão completa”, passou a ser utilizado para definir um tipo de estresse relacionado ao trabalho. Esta palavra foi cunhada, na década de 1970, pelo psicólogo Herbert Freudenberg, para definir o esgotamento que acometia um grupo específico de profissionais especialmente dedicados ao cuidado de outras pessoas, como, por exemplo, médicos, enfermeiros, sacerdotes etc. Esses homens e mulheres, que se sacrificam pelos outros, são colocados sob extrema pressão e passam a se sentir esgotados, exaustos, apáticos e incapazes de lidar com a situação, ou seja, veem-se “completamente queimados”, tal qual um palito de fósforo que se consumiu completamente (“burnout”)” (LIMA, 2016)

Os efeitos negativos da Síndrome de burnout na vida dos padres, sobretudo em seus trabalhos pastorais e no relacionamento com os outros, são desastrosos e se não for cuidado, pode levar a ideação suicida e ao próprio suicídio. De acordo com Lima, “caso o padre acometido com essa síndrome não procure ajuda profissional ou se não ocorrer mudanças no seu ambiente de trabalho, pode causar transtorno de estresse pós-traumático, abuso de álcool e/ou medicações e concepções suicidas.” (LIMA, 2016).

A síndrome de Burnout nos padres católicos já é estudada por diversos pesquisadores da área da psicologia e da psiquiatria. De acordo com Mézerville (2012), a síndrome de burnout é uma ameaça para os sacerdotes que lidam frequentemente com as múltiplas exigências do povo, as condições peculiares do estilo de vida que possuem e até a experiência de solidão nas paróquias. A pesquisadora Helena López de Mézerville desenvolveu sua tese de doutorado, pela Universidade de Salamanca (Espanha), sobre o problema no âmbito religioso. Para o trabalho, ela contou com a colaboração de 881 sacerdotes de dioceses do México, da Costa Rica e de Porto Rico. Essa amostra, segundo ela, reflete a mais ampla realidade sacerdotal investigada até então. (MÉZERVILLE, 2012).

Nos resultados da sua pesquisa, apenas 9% dos religiosos entrevistados não se encontravam esgotados. “Em síntese, três em cada cinco sacerdotes experimentavam graus médios ou avançados da síndrome do esgotamento ou burnout”. (MÉZERVILLE, 2012).

A pesquisa também constatou que a boa adaptação ao estresse, a inteligência emocional, o autocuidado e o equilíbrio de vida, bem como a maturidade humana e espiritual, são variáveis que incidem diretamente em sua qualidade de vida pessoal e ministerial.

A pesquisadora transformou sua pesquisa em livro, que dividido em sete capítulos, todos eles iniciados com um “caso sacerdotal” para ilustrar a temática discutida e finalizados com uma conclusão, analisa um assunto que segundo  autora, a Igreja tem necessidade de entender, prevenir e superar na atualidade, abordando as causas do estresse, as consequências, os efeitos físicos e psicológicos, a questão do perfeccionismo, entre outros aspectos.

Para a pesquisadora, passos para melhoria da qualidade de vida dos presbíteros estão sendo dados:

A forma de vida como os padres vivem, sobretudo o equilíbrio emocional, práticas esportivas, o autocuidado, a maturidade humana e espiritual, tem ajudado a elevar a qualidade de vida pessoal e ministerial dos presbíteros (MÉZERVILLE, 2012).

Tanto Mézerville (2012) quanto Lima (2016) pontuam que devido o número alarmante, a Igreja Católica tem motivado diversos encontros de formação voltados para a temática sobre a síndrome de burnout, possibilitando uma chance maior da prevenção.

Em relação ao excesso de atividades para os padres diocesanos, dados de 2010 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) ajudam a entender essa questão. Havia no Brasil naquele ano, cerca de 22 mil padres para 123 milhões de católicos, uma média de um padre para cada 5,6 mil fiéis. Uma messe gigantesca com poucos operários. O número de padres é considerado muito pequeno, diante do tamanho da Instituição Católica, mas porque será que faltam padres? Para a maioria dos pesquisadores a razão da escassez está nas duras e rígidas regras da Igreja Católica, o que faz com que o grau de aprovação ao seminário e ao sacerdócio seja bastante dificultoso. Para estes pesquisadores, apesar da evolução notável em alguns aspectos, a pedagogia da Igreja com os seus candidatos ao sacerdócio parece estagnada no mesmo conservadorismo.

 O psicólogo Ênio Pinto, atuante há 17 anos no Instituto Terapêutico ACOLHER, em São Paulo. Desde que foi fundado, no ano 2000, o instituto voltado ao atendimento psicoterápico de padres, freiras e leigos a serviço da Igreja atendeu por volta de 3.700pacientes.Autor do livro Os Padres em Psicoterapia, Ênio escreve que:

A vida religiosa não dá superpoderes aos padres. Pelo contrário. Eles são tão falíveis quanto qualquer um de nós. Em muitos casos, a fé pode não ser forte o suficiente para superar momentos difíceis”. (PINTO, 2017).

Pinto (2017) ressalta que a vida dos presbíteros está muito distante de ser uma vida cômoda:

Eles estão longe da “vida mansa” que os desinformados imaginam o dia-a-dia da maioria dos sacerdotes é pontuado por celebrações de batizados, casamentos, unções dos enfermos, escuta de confissões e muitas atividades pastorais que incluem a caridade e as atenções a pessoas necessitadas, além da celebração diária da Santa Missa, das orações pessoais ou comunitárias e dos tempos de estudo – sem mencionar os muitos casos em que o padre ainda dá aulas e atende os fiéis em direção espiritual. (PINTO, 2017).

É preciso desmistificar a ideia de que o padre diocesano ou religioso é um ser infalível, ou que o fato do trabalho ser voltado a finalidades religiosas, oferece uma garantia de segurança, que não há. (BBC BRASIL, 2017).

No levantamento bibliográfico dois dos artigos rastreados destacaram-se na pesquisa, um artigo com o título “Autoconsciência, religiosidade e depressão na formação presbiteral em seminaristas católicos”, trabalho realizado por pesquisadores da UFPE. Este primeiro trabalho provoca uma reflexão e discussão sobre o adoecimento psíquico já no período de formação, entre seminaristas, e  a pesquisa foi realizada no Seminário Maior São José, Arquidiocese de Olinda e Recife. Outro, foi um estudo que teve como objetivo analisar o prazer e o sofrimento de sacerdotes da Igreja Católica no Rio Grande do Sul, à luz da Teoria da Psicodinâmica do Trabalho. Trata-se de uma pesquisa de métodos mistos, com projeto convergente, realizada pelos pesquisadores Edemilson Pichek dos Santos, Edna Thais Jeremias Martins, Gímerson Erick Ferreira. pelo Programa de Pós-Graduação das Fa­culdades Integradas de Taquara – Faccat (RS), tendo como título: “Entre o prazer e o sofrimento: um estudo de métodos mistos com sacerdotes do Rio Grande do Sul”. Nesta pesquisa constatou-se que o reconhecimento, significado e importân­cia atribuída ao trabalho favorecem os sentimentos de prazer, no entanto a organização do trabalho, o custo humano no trabalho, esgotamento profissional, falta de cooperação e de espaços para discussão desvela o risco de adoecimento, assim, o prazer é percebido na Realização Profissional, Liberdade de Expressão e Reconhecimento, enquanto o sofrimento foi aferido no Esgotamento Profissional que Ritmo excessivo do Trabalho, por isso os sacerdotes vivenciam formas de prazer e de sofrimento no trabalho sacerdotal na realização e no reco­nhecimento do trabalho que realizam.

Para Santos, Martins e Ferreira (2018), “o sacerdote envolve-se com diversos tipos de emoções em seu cotidiano la­boral, desde alegria e realizações a sofrimentos e tristezas. Entretanto, comumente, realizam atendimentos aos paroquianos que apresentam vários problemas, envol­vendo-se em situações de falecimento, doença terminal, álcool, dificuldades conju­gais e familiares e abuso físico e sexual, condições evidenciadas a partir das entrevis­tas. Em estudos sobre o clero, há evidências de que o clero é mais frequentemente abordado por ajuda e consolo em tempos de sofrimento ou trauma psicológico do que conselheiros ou profissionais de saúde mental (KINMAN; MCFALL; RODRIGUEZ, 2011). Dessa forma, esses sujeitos recebem grande demanda emocional, que, por vezes, afeta diretamente o seu bem-estar emocional e físico, ao se sentirem exaus­tos, com peso advindo da realização do trabalho.

De acordo com Kinman, Mc Fall e Rodriguez (2011) essas demandas emocionais, em geral, estão relacionadas a percepções de regras de exibição emo­cional derivadas do próprio papel do trabalho, uma vez que o clero tem a obrigação de demonstrar simpatia e preocupação, sendo submetido a mascarar a frustração ou o tédio. As exigências emocionais também abrangem o grau de atenção às regras de exibição emocional, bem como a variedade, frequência e intensidade das emoções exigidas pelo papel do trabalho.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Mais que recomendações ou orientações para os presbíteros, apresentam-se aqui, modos de cuidado. Sabendo dos riscos que o ritmo exacerbado de trabalho pode gerar, riscos que podem adoecer seriamente o sujeito em sua totalidade, começando pelo psíquico, precisamos pensar me prevenção, intervenção e promoção de saúde psíquica nesses espaços religiosos.

Para Lima (2016), o padre adoecido com a síndrome de burnout está muito mais vulnerável ao suicídio, e para que isso não venha acontecer, são importantes algumas precauções por parte dos padres e da comunidade eclesial. O ato de cuidar de si é a melhor prevenção, assim, o padre precisa ter o seu espaço e o tempo para si. Todo trabalhado é regido por uma carga horária que ofereça as condições legais para o trabalhador, e por isso, faz-se necessário pensar na carga horária do padre diocesano, com um olhar profissional, não apenas com olhar da religião, que muitas vezes só o ver como um missionário, que trabalha para o reino e por isso não deve reclamar das condições e suportar todo tipo de sofrimento, fazendo sacrifícios.

Cuidar de si aqui significa olhar para si, mas um olhar humanizado, envolto de compreensão e certa misericórdia, como se esforçam para cuidar dos outros, que os padres cuidem primeiramente de si; tirem um tempo para si, aproveitem o tempo livre para o lazer e o período de férias assegurado pelo Código de Direito Canônico. Cuidar de si inclui estar com os outros, e a fraternidade presbiteral, pode ser um auxílio nesse processo de prevenção ou intervenção. O clero, enquanto grupo, precisa tomar a consciência da corresponsabilidade na vida dos seus irmãos padres, buscando ter atenção as necessidades uns dos outros, possibilitando a abertura para o diálogo. Porém, não é só o Bispo e o Clero que deve está implicado na situação, mas os leigos que compõem a paróquia onde o padre trabalha. A comunidade eclesial deve ter um olhar humanizado para o seu padre, evitando preconceitos e julgamentos, nem esperar do padre uma inefabilidade que no aspecto saúde ninguém o possui. “Isto (Julgar) é um reducionismo, e pura falta de conhecimento. Mesmo as pessoas que vivem intensamente a fé e uma sólida espiritualidade estão sujeitas, sim, ao esgotamento físico, ao adoecimento e, portanto, à necessidade de ajuda” (LIMA, 2016).

O padre, estando bem consigo mesmo, poderá ajudar melhor as pessoas; amando a si, é capaz de amar o outro. Os padres precisam cuidar de si mesmos, e a as Dioceses precisam promover um olhar mais especializado para essa dimensão, envolvendo sacerdotes e leigos, profissionais da área da saúde, como psicólogos, psiquiatras, fisioterapeutas, biomédicos, enfermeiros, dentistas e nutricionistas. É fundamental que se promovam formações humanas, grupos de encontro, acompanhamento psicoterapêutico sistemático, acompanhamento nutricional e exames de rotina.

Por fim, precisa-se pensar em caminhos de promoção de saúde para o clero, e isso desde o início de sua formação, nos seminários, caminhos esses que promovam uma segurança a vida dos presbíteros, caminhos que dependem primeiramente do posicionamento dos senhores bispos, em cada diocese do Brasil. Que sejam vias e possibilidades de cuidado com seus fiéis trabalhadores, com um olhar de mais afeto, acolhimento e compreensão para as fragilidades propriamente humanas dos seus presbíteros.

REFERÊNCIAS

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1– Professor do Centro Universitário Maurício de Nassau – Caruaru PE, Mestrando em Psicologia Social – UFLO, Buenos Aires – ARG (2024), Especialista em Análise Existencial e Logoterapia pela FACEAT-UNILIFE (2021). Graduação em Psicologia pela Unifavip (2012).

2– Discente em Psicologia, Centro Universitário Maurício de Nassau – Caruaru, PE (2024). Discente em Psicologia puerperal, Faculdade Faveni, Espírito Santo, Brasil (2024). Discente em Psicologia Hospitalar, Faculdade Faculeste, Minas Gerais, Brasil (2024).

3– Discente de Psicologia no Centro Universitário Maurício de Nassau, Caruaru – PE, formação em Recursos Humanos, Faculdade Metropolitana de São Paulo, FAMESP, São Paulo, Brasil (2022). Discente em Especialização em Intervenção ABA Aplicada ao Transtorno do Espectro Autista, Faculdades Metropolitanas de São Paulo, FAMESP, São Paulo, Brasil (2024).

4– Psicóloga pela FACULDADE ESUDA, especialista em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de Pernambuco – UNICAP e Professora do Centro Universitário Maurício de Nassau, UNINASSAU Caruaru.

5– Psicólogo pela Universidade Estadual de Pernambuco – UPE 2010, Especialista em Atenção Básica e Saúde da Família, Práticas Integrativas e Complementares em Saúde e Professor do Centro Universitário Maurício de Nassau, UNINASSAU Caruaru

6– Psicóloga Clínica pela UFPB (2016), Especialista em Logoterapia e Análise Existencial – FACEAT (2021), Especialista em Psicologia Hospitalar – UNIFAVIP (2019), Especialista em Associativismo/Cooperativismo Gestão de Org. – UFRPE (2006), Professora do Centro Universitário Maurício de Nassau – Caruaru – PE.