A POLÍCIA MILITAR E A SOCIEDADE MIDIÁTICA: DESAFIOS E IMPLICAÇÕES

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10692346


José Mauricio Cavalcanti da Silva Junior


RESUMO

Este estudo aborda a influência da mídia na investigação criminal e na atuação da Polícia Militar. Inicialmente, o resumo apresenta uma introdução ao tema, destacando a importância de compreender os efeitos da cobertura midiática sobre esses dois aspectos da segurança pública. Os objetivos do estudo incluem analisar criticamente essa relação, identificar desafios éticos e propor recomendações para uma abordagem mais equilibrada pela mídia. A metodologia adotada é uma revisão bibliográfica abrangente, que examinará estudos acadêmicos, análises de casos e debates teóricos sobre o assunto. Por meio dessa abordagem, busca-se contextualizar historicamente a relação entre mídia e investigação criminal, identificar padrões na cobertura midiática de eventos criminais e refletir sobre os dilemas éticos envolvidos. O resumo conclui ressaltando a relevância deste estudo para o debate sobre ética jornalística e responsabilidade social da mídia, visando promover uma cobertura mais informativa e equilibrada dos eventos criminais.

Palavras-chave: Mídia, investigação criminal, Polícia Militar.

This study examines the influence of the media on criminal investigation and the performance of the Military Police. Initially, the abstract provides an introduction to the topic, emphasizing the importance of understanding the effects of media coverage on these two aspects of public security. The objectives of the study include critically analyzing this relationship, identifying ethical challenges, and proposing recommendations for a more balanced approach by the media. The methodology adopted is a comprehensive literature review, which will examine academic studies, case analyses, and theoretical debates on the subject. Through this approach, the aim is to contextualize historically the relationship between media and criminal investigation, identify patterns in media coverage of criminal events, and reflect on the ethical dilemmas involved. The abstract concludes by highlighting the relevance of this study to the debate on journalistic ethics and the social responsibility of the media, aiming to promote more informative and balanced coverage of criminal events.

Keywords: Media, criminal investigation, Military Police.

1. INTRODUÇÃO  

A influência da mídia na investigação criminal e na atuação da Polícia Militar é um tema complexo e relevante atualmente. A democratização dos meios de comunicação, aliada ao avanço tecnológico, trouxe consigo uma ampliação do escopo do espaço público, onde a mídia exerce um papel fundamental na formação da opinião pública e na fiscalização das ações do Estado. No entanto, essa relação entre mídia e investigação criminal não é isenta de desafios e dilemas éticos, uma vez que a busca por audiência e lucro pode influenciar a maneira como os eventos são narrados e percebidos pelo público.

A dramatização judicial e a espetacularização do crime são fenômenos cada vez mais presentes na mídia contemporânea, onde o sensacionalismo muitas vezes prevalece sobre a busca pela verdade e imparcialidade. A cobertura midiática de crimes de alto perfil pode distorcer a percepção da opinião pública, gerando preconceitos e julgamentos precipitados, ao mesmo tempo em que pressiona as autoridades policiais por respostas imediatas e espetaculares.

Nesse contexto, surge a problemática central deste estudo: como a relação entre mídia e investigação criminal afeta a imparcialidade e eficácia do processo investigativo? Essa questão norteia a investigação sobre os reflexos midiáticos na atuação da Polícia Militar, explorando a complexa interação entre esses dois atores sociais.

O objetivo geral deste trabalho é analisar criticamente a influência da mídia na investigação criminal e na atuação da Polícia Militar, buscando compreender como a cobertura midiática afeta a percepção pública da segurança pública e a eficácia das políticas de segurança.

Para alcançar esse objetivo, serão estabelecidos os seguintes objetivos específicos: examinar a relação entre mídia e investigação criminal, analisar o impacto da cobertura midiática na atuação da Polícia Militar, identificar os desafios éticos e dilemas associados à relação entre mídia e investigação criminal, e propor recomendações para uma abordagem mais ética e imparcial na cobertura de eventos criminais pela mídia.

A justificativa para este estudo reside na importância de compreender os efeitos da mídia na investigação criminal e na atuação da Polícia Militar, considerando o papel crucial desses atores na manutenção da ordem pública e na proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos. Além disso, a análise crítica dessa relação contribuirá para o debate sobre ética jornalística e responsabilidade social da mídia, visando promover uma cobertura mais equilibrada e informativa dos eventos criminais.

Metodologicamente, este trabalho se baseará em uma revisão bibliográfica abrangente, que abordará estudos acadêmicos, análises de casos e debates teóricos sobre o tema. Através dessa abordagem, será possível contextualizar historicamente a relação entre mídia e investigação criminal, identificar padrões e tendências na cobertura midiática de eventos criminais e propor reflexões críticas sobre os desafios e dilemas éticos associados a essa interação.

2. DESENVOLVIMENTO

2.1. A midiatização 

Antônio Fausto Neto (2008) observa que em um período que poderia ser chamado de “sociedade midiática”, a mídia terá relativa autonomia dada a existência de outras esferas. Numa sociedade midiatizada, a cultura midiática torna-se referência para a construção de estruturas sócio-técnico-discursivas, produzindo zonas de influência em diversos níveis organizacionais e dinâmicas da própria sociedade.

Nossa visão da mediação observa precisamente esse deslocamento. Por uma variedade de razões, “a mídia” não pode mais ser considerada um objeto estranho na sociedade. O que está acontecendo agora é uma aceleração e diversificação das formas pelas quais as sociedades interagem umas com as outras, pois os processos sociais em geral são cada vez mais mediados.

O que está acontecendo agora é uma aceleração e diversificação das formas pelas quais a sociedade interage com a sociedade, pois os processos sociais em geral são cada vez mais mediados. Embora os processos interativos mais antigos – comunicação oral face a face e múltiplas formas de escrita – continuem a definir os modos de comunicação e a lógica de raciocínio que organizam as sociedades e suas tentativas, em geral esses processos mudam para padrões mais complexos e a midiatização cada vez mais diversa – que é mais ampla e diferenciada do que simplesmente se referir ao uso da mídia. Hoje, portanto, são esses processos que fortemente atraem nossa atenção – cujas ações não se restringem a objetos “meios” ou objetos “receptores e seus mediadores”, mas incluem um conjunto altamente diversificado de estruturas e ainda estão associadas a outras estruturas.

Em um artigo de 2007, “Mediatificação como processo de referência cruzada”, fiz algumas observações sobre essa abordagem. Portanto, uma distinção básica precisa ser feita. Quando falamos em “midiatização”, não nos limitamos às indústrias culturais. Nem as inovações tecnológicas estão disponíveis. Claro, a existência da indústria cultural é um fato que não pode ser ignorado.

Mesmo levando em conta essa presença, porém, não entendemos que a “midiatização” corresponda à expansão ou dominação da sociedade pelas indústrias culturais. Ao contrário, inúmeras possibilidades estão sendo desenvolvidas para criticar, refletir sobre os produtos e processos da indústria, para engajar setores sociais para atuar na e pela mídia, para esforços de policiamento político e social – tudo isso, por sua vez, torna a existência de as indústrias culturais são elementos sociais não homogêneos.

Eliseo Verón (1998) propõe que uma sociedade em processo de midiatização (ao contrário da sociedade midiática do período anterior […]) não é, portanto, uma sociedade dominada por uma única forma estrutural, que explicaria a totalidade de suas funções. A culturalização da mídia opera por meio de diferentes mecanismos dependendo do setor da prática social de interesse e produz resultados diferentes em cada setor.

Além disso, o surgimento de novas tecnologias oferece cada vez mais possibilidades de midiatização para setores “não midiáticos”: desde as mais diversas instituições até grupos e indivíduos ad hoc. No entanto, não limitamos o prazo a essa penetração técnica. Claramente, este é um aporte relevante que merece estudo e reflexão – mas entendemos que processos de comunicação relevantes não são simplesmente resultado de invenções técnicas.

É preciso haver um componente social imediato nesse processo. Diante da tecnologia disponível, ainda é preciso desenvolver invenções sociais no sentido da interação. Essas invenções são talvez a parte mais importante. Isso ocorre porque as sociedades decidem usar as tecnologias em um sentido interativo, que elas desenvolvem na engenharia e nas construções sociais.

Abordando a performance mediada por computador, Sá e Holzbach (2010) observam que o YouTube foi desenvolvido como um canal para transmissão de vídeos caseiros – mas os usuários começaram a postar vídeos de instituições, gerando uma série de discussões sobre direitos autorais. Indo um passo adiante, chega-se ao Twitter. Para ele, o Twitter, desenvolvido para os usuários responderem “O que você está fazendo?”, também divergiu de seu propósito original, tornando-se uma das plataformas mais populares do Brasil ao longo de 2009.

Esta parece ser uma constante que toda tecnologia produz. Imagine que a tecnologia de rádio foi desenvolvida para permitir a comunicação ponto a ponto. Por tudo isso, não se trata de voltar da mediação aos meios: ambos são partes necessárias e importantes de nosso campo de interesse. Mas, ao mesmo tempo, eles não são suficientes. Conforme observado na chamada de trabalhos da Compós 2012, o conceito de midiatização “ainda está em construção” e requer um escopo mais amplo. Todas as áreas e setores da sociedade começam a praticar e refletir sobre as interações com outras áreas e setores, testando possibilidades e inventando processos interativos para se engajar de acordo com suas próprias perspectivas e interesses.

Essas práticas, esses processos, em suas diversas formas, são possíveis objetos de nossa investigação – desde que gerem de alguma forma um comportamento interativo. Isso equivale a dizer que tais objetos oferecem a possibilidade de investigar uma variedade de problemas, alguns dos quais talvez nem saibamos como gerar ou organizar explicitamente. Assim como a publicação se tornou um componente estrutural da sociedade (especialmente da sociedade europeia) desde o século XVII, ao tentar organizar, diversificar, o potencial da escrita para servir a seus interesses múltiplos e muitas vezes conflitantes; ver o processo de interação mediada estimula maneiras em que a sociedade se comunica e assim se organiza provisoriamente.

Hjarvard (2014) apontou que a midiatização está relacionada à transformação institucional da alta modernidade. Na visão do autor, a midiatização não é um processo universal, mas uma tendência que se acelerou nas sociedades modernas avançadas nos últimos anos do século XX. O estudioso vincula essa tendência à transformação da globalização, por isso é um processo que ocorre de forma diferente em cada região do mundo. Essa visão está muito distante de alguns aspectos da midiatização.

O pesquisador Eliseo Verón (2014) é um dos autores que discordam dessa noção. Para este teórico, a mediação é o resultado das capacidades semióticas humanas que se manifestam como fenômenos mediados que constituem uma característica universal de todas as sociedades humanas.

O autor traz uma perspectiva de longo prazo e tem o benefício de nos lembrar que o que aconteceu na sociedade moderna tardia começou há muito tempo. O estudioso define a midiatização como a nomeação de uma série de fenômenos midiáticos institucionalizados na sociedade. Apesar de suas diferenças, ambos os pesquisadores concordam no fato de que o processo de intermediação não é linear e na mudança induzida pela noção de tempo. Verón (2014) fala da aceleração do tempo histórico e do processo de descontextualização do significado, enquanto Hjarvard (2014) fala da diferenciação e desencaixe do tempo e do espaço.

Com efeito, o caráter da mudança está presente tanto nas perspectivas mais amplas de Verón (2014), que considera grandes transformações ao longo da história, quanto de Hjarvard (2014), que define a midiatização como um processo de mudança na modernidade tardia. Além de Hjarvard (2012; 2014) e Verón (2014), outros mediacionistas citados neste artigo concordam em certo sentido com o caráter mutável do termo.

Braga (2006), ao vê-lo como um processo incompleto, demonstra as características mutáveis do fenômeno, que está relacionado com as demandas e mudanças tecnológicas nos meios de comunicação e novas formas de interação social. De fato, o caráter de mudança trazido pelo termo “intermediação” é um dos fatores que o distinguem do conceito de intermediação.

2.2. A influência da mídia na investigação criminal 

Este item abordará a influência dos meios de comunicação, especialmente os meios de comunicação de massa, no processo penal, especialmente nas investigações criminais. Para tanto, faz-se necessário comentar o recente fenômeno da dramatização judicial e do “espetáculo” criminal em seus mais diversos aspectos, desde sua ocorrência, passando pela investigação de autoria, importância e circunstâncias (inquérito criminal), até chegar ao programa judicial. A relação entre a mídia, o sistema de justiça e os cidadãos mudou profundamente nas últimas décadas. De fato, a democratização dos meios de comunicação é bem conhecida, e a maioria das pessoas tem acesso a todas as formas de mídia, seja escrita, televisão ou rádio. O advento das redes globais de computadores e a disseminação de sites de notícias e conteúdo de notícias na Internet possibilitaram a disseminação de todos os tipos de informações de uma só vez e sem fronteiras em uma velocidade sem precedentes.

Essa democratização tem levado a uma ampliação do escopo do espaço público, criando um ambiente que promove uma “cultura de fusão”, que exacerba as especificidades da esfera pública, ou seja, uma cultura que promove a integração não apenas entre formatos de informação, debates e literatura, mas combinar informação com entretenimento para tornar o rigor mais flexível para absorver as funções de propaganda e propaganda política e econômica (HABERMAS, 1989).

Na nova realidade da privatização, a convergência de informação e entretenimento é resultado do viés mercadológico dos sistemas de comunicação. O fato de essas instituições estarem se aproximando de conceitos típicos de negócios, como a busca constante pelo lucro, as torna mais vulneráveis ​​aos interesses privados. Portanto, fica claro que as funções educativas e informativas dos meios de comunicação possuem características relevantes. Essas funções estão ligadas às de entretenimento e diversão, e nessa fusão, muitas vezes, as atividades de cada uma não são claramente diferenciadas.

É geralmente aceito que a imprensa desempenha um papel fundamental no desenvolvimento da atividade democrática de um país porque é capaz de monitorar as ações do Estado por meio de seus agentes e permite que os cidadãos participem mais efetivamente dos assuntos públicos. As palavras de Rui Barbosa (1954 p. 56) sobre o assunto são agradáveis:

A mídia é a cara do país. É por meio dele que a nação rastreia o que acontece perto e longe, vê o que está errado, investiga o que está escondido e tramado, colhe o que está oculto ou roubado, sente seu propósito ou mancha, mede o que está ao seu redor ou destrói, monitore seus interesses e fique atento àqueles que o ameaçam.  (…) Portanto, um país de notícias depravadas ou depravadas é um país de cegueira e um miasma, um país de ideias errôneas e sentimentos pervertidos, um país que explora a consciência, não poderá lutar com vícios, que as instituições o exploram.

Os ideais nascidos da Revolução Francesa encapsularam em termos modernos a ideia de liberdade de pensamento e crença como um direito inerente à condição humana.  A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, publicada em 1789, tornou obrigatória a garantia da liberdade de comunicação. dar uma olhada:

Art. 10. Ninguém pode ser perseguido por suas opiniões, inclusive religiosas, desde que sua expressão não perturbe a ordem pública estabelecida por lei.
 Art. 11. A livre comunicação das ideias e das opiniões dos mais preciosos direitos do homem.  Todo cidadão pode, portanto, falar, escrever, ir e vir livremente, respondendo, todavia, pelos abusos desta liberdade nos termos não previstos na lei..

Com efeito, a ampla abrangência e as amplas possibilidades de divulgação de informações por meio da atividade jornalística tornam esta agência essencial para fiscalizar a implementação de políticas públicas e a realização do interesse público. A cidadania para uma intervenção e participação efetiva nos assuntos públicos passa necessariamente pelo acesso à boa informação. Nesse sentido, no que se refere à interação entre o sistema judiciário (qualquer que seja seu estágio) e a mídia, os dois devem ser considerados necessariamente relacionados, dadas as características inerentes às suas funções públicas.

A transparência e publicidade inerentes à ação do Estado, bem como a necessidade de as pessoas monitorarem constantemente as ações do poder público, fazem da mídia um veículo para que as pessoas entendam o que está acontecendo em situações de intervenção do Estado. Enquanto as investigações criminais estão sujeitas aos princípios de garantia do sigilo e da discrição exercidos pelos órgãos de polícia investigativa, as ações criminais com repercussão midiática sempre terão cobertura significativa e exigirão a rápida disponibilidade dos agentes públicos para convencer a sociedade de que a investigação avança apesar da investigação em essência, é proibido divulgar que a due diligence ainda está em andamento.

O próprio sistema político e a necessidade de manter a imagem do órgão público responsável pela investigação servirão de base para estabelecer a transparência e o pronto atendimento às demandas de informação da sociedade, geralmente por meio da mídia. Observou-se, assim, que a mídia tem papel fundamental na fiscalização da atuação do poder público em todas as suas formas, inclusive no âmbito do processo penal, tanto na fase de inquéritos policiais quanto no próprio processo judicial. Esse fenômeno de expansão e essencialização da mídia pode levar tanto a uma ação cívica efetiva quanto à aparência de uma experiência democrática. Analisando isso, a observação de Machado e Santos (2009 p. 25):

(…) O potencial da mídia pode tanto maximizar a cidadania quanto diminuir a experiência democrática pela ilusão de participação e transparência.  (…) Democracia, como fator de proximidade entre os cidadãos e a justiça. No entanto, a mediação judicial também serve para manter e reproduzir relações de poder ao mesmo tempo em que reforça a ilusão de participação, transparência e avaliação cívica.

No primeiro caso, a maximização da cidadania é percebida a partir de ações midiáticas no sentido de facilitar o esclarecimento e escrutínio dos cidadãos sobre atos do poder público, incluindo decisões do judiciário e investigações criminais. Nesse contexto, as agências de comunicação colaboram para fomentar o senso de cidadania e a disposição autoritária e crítica para as decisões relacionadas aos destinos políticos, sociais e econômicos de um país ou região, maximizando assim a concretização da democracia e da cidadania. No segundo caso, o potencial da mídia pode ser usado como um verdadeiro placebo, trazendo falsas percepções de engajamento e transparência, quando na verdade essa estrutura ajuda a manter o status quo. Essa situação pode permanecer imperceptível ao observador inexperiente, mas pode levar a uma redução da vivência democrática a um patamar inferior e, pior, dar a impressão de que a sociedade está engajada criticamente em questões de interesse público.

Este debate é adequado para a questão da influência da mídia nas investigações criminais. De fato, sobretudo em processos criminais, acontece frequentemente que os factos sejam relatados de forma a promover o consumo e o entretenimento de notícias como forma de entretenimento afastada da educação e da formação cívica. Nesse caso, notícias sobre crimes de grande repercussão adquirem a dramatização e a contextualização de adivinhações, nas quais os envolvidos aparecem como personagens fictícios reais.  O conteúdo “espetacular” transforma notícias formais e programação informativa em recursos de apresentação tipo show, onde a exposição do “apresentador” é comum, e vão além de gestos e entonação para manter a atenção do espectador.

Nos casos específicos que nos interessam neste trabalho, a cobertura midiática, especialmente de crimes de grande repercussão, passa por um processo tipicamente dramático pelo qual informações são processadas e transformadas em produtos para consumo e entretenimento, enquanto não se preocupa com o caráter instrucional e formação educacional que deve existir no jornalismo. Trata-se do “infoentretenimento”, caracterizado pela dramatização da justiça e pela “espetacularização” do crime por meio da criação e construção midiática de situações e narrativas lúgubres de determinado evento criminoso.

Tais normas não são respeitadas no dia a dia devido ao predomínio de conteúdos não educativos e não culturais nos meios de comunicação de massa. Nesse caso, inclusive programas com conteúdo policial, responsáveis ​​pela “espetacularização” do crime e pelo tratamento sensacionalista das notícias relacionadas ao crime. Esta situação tem consequências estruturais para o desenvolvimento das atividades investigativas, um dos pilares da persecução penal. Em um Estado Democrático de Direito, é importante ressaltar que o processo penal deve obedecer à lei, em especial ao princípio do devido processo legal, embora este princípio tenha um temperamento natural durante a fase investigativa devido à natureza tipicamente investigativa do processo investigação.

Com efeito, importa referir que é hipotética a função idealizada dos meios de comunicação como fonte de educação pública e de difusão de cultura e informação. Todos sabemos que a privatização da mídia é uma ideia real, ainda que uma franquia pública, baseada no surgimento de uma visão comercial do que a mídia deve transmitir. Essa conjectura agrava o conflito entre a função social da mídia de fornecer informações e a pressão natural dos investidores para ver os destinatários do conteúdo da mídia como meros consumidores. A busca pelo aumento da audiência por meio da programação policial e sensacionalista acaba por promover a “espetacularização” do crime, explorando imagens chocantes e a situação desesperadora de familiares e amigos das vítimas. A comunicação social, em especial a televisão, “tem sido influenciada por esta ideologia do entretenimento para atingir níveis mais elevados de audiência e receitas, privilegiando a forma de espetáculo” (REZENDE, 2000).

Não é incomum fazer um breve julgamento sobre a situação e expor acidentalmente a imagem do personagem. Muitas vezes, tais ações acabam comprometendo a proteção de elementos vitais da cena do crime. Os dispositivos dramáticos são comuns nessas transmissões, especialmente nas transmissões televisivas, em termos de linguagem, som e combinação de elementos icônicos, absorvendo as imagens das pessoas envolvidas nos personagens do programa. As tragédias da vida humana são agora vistas como capítulos de uma novela. A esse respeito, é interessante a análise de Negrini (2009 p. 34): ″As pessoas passam a ocupar espaços que não lhes pertencem, e seus verdadeiros papéis tornam-se roteiros do espetáculo. As vidas humanas fornecem ao teatro os mais diversos elementos e têm obtido grande sucesso de público″.

A ampla divulgação de informações e notícias nos meios de comunicação de massa tem forte impacto nas sociedades receptivas. Dependendo da atenção dada às notícias, pode parecer que a qualidade do trabalho realizado pelos profissionais envolvidos no processo penal fica comprometida. A influência da mídia na investigação criminal é direta, imediata e poderosa. Conforme mencionado anteriormente, após um crime, especialmente um crime sequela, há maior cobertura da mídia sobre o incidente, especialmente durante a fase de investigação policial. Quando os fatos ainda não estão totalmente esclarecidos, como quando é necessário esclarecer a autoria, o significado ou as circunstâncias, as empresas de comunicação costumam praticar assédio genuíno a testemunhas e pessoas envolvidas na investigação, sejam policiais, peritos, investigadores ou outros profissionais.

Esse tipo de assédio não é incomum e pode levar a diversas situações que acabam comprometendo a rápida resolução da investigação investigativa. Se a equipe de investigação não tiver profissionalismo, prontidão técnica e experiência para lidar com o assédio da mídia, podem surgir conflitos entre os profissionais da mídia e a equipe responsável pela investigação. Percebe-se que os meios de comunicação, em especial os meios de comunicação de massa, exercem forte influência nas investigações criminais, sendo necessário analisar essa influência a fim de apresentar sugestões para otimizar o relacionamento necessário entre os meios de comunicação e o órgão policial responsável pela investigação.

2.3. OS REFLEXOS MIDIÁTICOS NA ATUAÇÃO DA POLÍCIA MILITAR

A divulgação dos incidentes criminais pela mídia, assim como a resposta da polícia militar a esses eventos, têm um impacto considerável na opinião pública e na própria dinâmica de trabalho das forças de segurança. Desde os anos 1920, observa-se uma transformação na maneira como tais ocorrências são narradas pela imprensa, embora ainda seja vital exercer cautela na apresentação dos acontecimentos atualmente. Ramos e Paiva (2007) esclarecem que compreender a relação entre a Polícia Militar e a imprensa requer um conhecimento prévio da cultura desta instituição, marcada por restrições e modos de operação que evoluíram ao longo do tempo. Esta relação histórica muitas vezes envolveu tentativas de obstrução, distorção ou mesmo ignorância por parte das forças policiais em relação à cobertura midiática. No entanto, reconhecem os autores, a legitimidade da polícia hoje depende em grande medida da percepção pública, influenciada em grande parte pela mídia.

A interação entre mídia e polícia é complexa, pois ambos os lados buscam atender a seus próprios interesses: enquanto a mídia busca acesso a informações relevantes, a polícia deseja destacar suas ações positivas para reforçar sua credibilidade. Este relacionamento delicado, conforme argumentado por Tristão, Sanglard e Nunes (2010), muitas vezes resulta em uma representação exagerada da violência e da criminalidade pelos meios de comunicação, levando a uma sensação generalizada de insegurança na sociedade. Essa percepção negativa pode afetar os comportamentos das pessoas, como observado por Amaral (2007), que ressalta o poder da mídia em moldar as atitudes e preocupações do público.

Embora a mídia tenha o potencial de promover políticas de segurança pública e conscientização, muitas vezes falha em apresentar soluções eficazes para o enfrentamento da violência. Em vez disso, concentra-se predominantemente em narrativas sensacionalistas que perpetuam o medo e a desconfiança na eficácia das autoridades. Carvalho, Freire e Vilar (2012) destacam a responsabilidade da mídia em equilibrar sua cobertura, destacando tanto os problemas quanto às soluções, algo que raramente é realizado de forma abrangente. Portanto, a narrativa midiática desempenha um papel crucial na percepção da segurança pública, mas também carrega o ônus de influenciar negativamente a confiança na polícia e na eficácia das políticas de segurança.

2.3.1. Dramatização e “espetacularização” do crime

A cobertura da mídia de crimes de alto perfil pode ter algumas consequências pessoais para os envolvidos direta ou indiretamente no incidente. Igualmente, no que diz respeito à investigação e processo criminal, o forte contributo dos meios de comunicação social para o espaço de denúncia e análise de crimes que afetam a sociedade tem implicações no tratamento das condutas. De facto, o já referido sensacionalismo na cobertura mediática teve impacto no desempenho do Ministério Público Nacional. A representação superficial de programas de televisão que divulgam opiniões e comentários sobre a atuação da polícia e demais órgãos do Ministério Público quase sempre facilita a dramatização dos casos e atribui à sociedade um senso de imediatismo e julgamento sumário.

Essa situação é bem descrita por Andrade (2012) em sua análise do caso Nardoni, no qual Isabella de Oliveira Nardoni, de cinco anos, foi investigada em março de 2008. A esse respeito, afirma o autor:

 A cobertura sensacionalista de casos criminais pela mídia pode ser evidenciada por uma série de sinais e sintomas mais ou menos perceptíveis. Entre eles, estão: a) personagens separados em um determinado episódio entre mocinhos (muitas vezes claramente equiparados a “nós”) e bandidos (sempre claramente equiparados a “eles”) de forma maniqueísta e simplista); b) “maus estereótipos da categoria cara” que definem claramente os papéis (ruim = “eles”); c) a criação e recriação de diferentes distorções da realidade (às vezes expressas como uma preferência por suposições oficiais a priori e, portanto, versões acusatórias); d) A penetração crescente de ideologias de medo na sociedade e crescente sensação de (in)segurança do público em geral (ANDRADE, 2012 p. 24).

Para obter maior audiência, os meios de comunicação de massa adotam uma versão acusatória, selecionando os que podem ser responsáveis ​​por um crime com base em evidências que geralmente não existem na parte investigativa. Ao apoiarem mensagens de justiça imediata, estas ferramentas aumentam a pressão social para a apreensão dos responsáveis ​​pelos seus atos, obrigando ao recurso a mecanismos processuais de isolamento preventivo, como a vaga noção de salvaguarda da ordem pública. Sobre esse tema, ainda incipiente do ponto de vista da análise científica, alguns autores têm se debruçado sobre a relação entre a mídia e o sistema de justiça incluindo o sistema de persecução penal como um todo, o impacto do alto volume de casos, o impacto nas percepções e avaliações dos cidadãos e outras questões relacionadas com a observação de tendências nesta relação.

A relação entre a mídia e o sistema de justiça é caracterizada por uma interação que está em constante tensão, decorrente do natural e aparente conflito entre a busca constante e imediata da mídia por informações e a necessidade de cautela, em alguns casos, casos, consistindo em Sigilo institucional do sistema judicial. De facto, no âmbito das investigações criminais, esta tensão permanente decorre da necessidade de manter em sigilo determinadas informações de forma a garantir a validade e eficácia da investigação sobre a identidade, importância e circunstâncias dos autores. Por outro lado, a fome de notícias dos media, sobretudo dos programas sensacionalistas, assente na ideia de liberdade de informação e imprensa, pressiona a persecução penal a obter informação de imediato e a esclarecer os crimes com celeridade.

Esse foco de tensão entre a mídia e o sistema de persecução penal é agravado em casos que geram grande repercussão, onde a busca por informações torna-se constante e as tentativas de “furos” se sobrepõem à ideia de manter um relacionamento cordial e respeitoso com a imprensa e instituições públicas. A esse respeito, vale citar Machado e Santos:

 Investigações criminais com grande exposição na mídia têm exacerbado as tensões entre a mídia e o judiciário. Traduzir o potencial dramático do exercício da justiça para o drama da mídia ajuda a expandir a noção de que a justiça é lenta, fraca e ineficaz na identificação e punição dos infratores. Além disso, a mídia pode funcionar em competição com o exercício da justiça na forma de justiça supra popular baseada no imediatismo, no drama e no apelo à emoção (MACHADO; SANTOS, 2008 p. 15)

De fato, a lógica midiática favorece o imediatismo na tentativa de adaptar as complexas realidades das investigações criminais ao seu público, na tentativa de simplificar a mensagem e sensacionalizar o papel da polícia na investigação. Esse discurso midiático acaba por facilitar a aproximação das fronteiras entre realidade e ficção nas investigações criminais, a partir da tradução de informações oficiais do grande público, para a produção de estabelecimentos sobre crimes, investigações, assuntos correlatos e ordem social.

Nessa mensagem, o discurso da justiça é comumente usado na mídia, pedindo uma resolução rápida da situação de conflito resultante e afirmando que o sistema de persecução criminal deve funcionar com rapidez, transparência e eficácia. Num extremo, a situação pode pôr em causa a legalidade do funcionamento da função de inquérito ou de qualquer outra instituição do sistema nacional de persecução penal. Por vezes, no próprio processo de investigação do caso, as notícias aparecem alternadamente, ora referindo-se a determinada pessoa, ora a um suspeito, ora a uma vítima, ou mesmo a uma testemunha relevante dos fatos. Esse tipo de choque é extremamente prejudicial para as partes envolvidas, seus familiares e parentes da vítima, causando abalo psicológico e dificuldades nas relações sociais.

2.3.2. Necessidade de garantia de imparcialidade e isonomia

Conforme mencionado no tópico sobre investigações criminais, esta é uma das etapas do processo penal nacional que deve ser conduzida de acordo com a Constituição e os princípios constitucionais pertinentes à matéria. Neste ponto do presente trabalho, ainda se insiste que as investigações criminais devem ser pautadas por métodos científicos e não podem ser conduzidas de forma arbitrária e sem normas, até porque se trata de um instrumento estatal que pode afetar os direitos básicos dos investigados e das pessoas, direta ou indiretamente relacionados com a investigação. Os pilares do Estado Democrático de Direito não reconhecem que os processos criminais, especialmente as investigações criminais, sejam conduzidos de forma precipitada, intempestiva e técnica, pois, caso isso ocorra, é passível de prejuízo aos direitos fundamentais dos cidadãos envolvidos na investigação.

É importante ter em conta que o princípio da isonomia deve ser respeitado nas investigações criminais, por exemplo, devido ao conteúdo midiático que as notícias sobre crimes adquiriram, os casos não podem ascender à condição de prioridade absoluta. Respeitar os direitos e garantias dos investigados e evitar julgamentos precipitados e due diligences errôneas. A esse respeito, vale a pena transcrever um trecho de artigo de Eleonora Rangel Nacif no Observatório da Imprensa:

 Na busca frenética por audiências mais altas e, portanto, maiores lucros com a publicidade, a função social da imprensa em uma democracia de direito e suas premissas morais são muitas vezes deixadas de lado. A mídia elege certos cidadãos, que muitas vezes nem são acusados ​​em processos criminais, e, para substituir os próprios tribunais, transferem para si o tribunal, pré-condenando e crucificando homens e mulheres, independentemente de sua culpa ou inocência (NACIF, 2010 s.p.)

Um Estado Democrático de Direito, através das instituições que o compõem – incluindo os órgãos policiais e todo o pessoal necessário ao processo penal – não pode ceder à influência e pressão dos meios de comunicação. Esta situação, em casos concretos, compromete inevitavelmente a imparcialidade e imparcialidade necessárias à condução das investigações, conduzindo, em última análise, a dificuldades na reconstituição dos acontecimentos e a um trabalho ineficiente ou falhado da polícia judiciária. Nesse caso, há claro conflito entre os princípios constitucionais da liberdade de expressão e o dever de conduzir o processo penal de forma efetiva e legal. Os Estados têm o dever, por meio de seus agentes públicos, de conduzir com profissionalismo e tranquilidade as investigações criminais e evitar que a influência da mídia distorça as investigações e cause violação à igualdade e ao respeito aos direitos e garantias fundamentais.

A ausência de condições necessárias para a realização de trabalhos investigativos faz com que as taxas de detecção de crimes no Brasil sejam naturalmente baixas. Nesse contexto, não é razoável e irracional desviar muita energia, mão de obra e recursos materiais para dar atenção a um caso ressonante apenas porque o foco da sociedade e da mídia mudou para um caso ressonante. Se isso acontecesse, seria uma violação do princípio da igualdade, considerando que, sem motivo razoável – simplesmente porque a mídia insinuou uma investigação em andamento – uma investigação prevaleceria sobre as outras. 

As relações entre os meios de comunicação e os órgãos responsáveis ​​pelas investigações criminais devem ser mantidas para a promoção dos direitos e garantias fundamentais com base na defesa dos princípios norteadores de um Estado democrático e de direito. As investigações criminais devem seguir esse viés, pautadas na atitude serena e sensata das autoridades policiais e investigadores, evitando que o impacto social, político ou econômico dos crimes desvirtue a condução científica das respectivas investigações criminais.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como conclusão da pesquisa acadêmica abrangente em curso, concluiu-se que o fenômeno da maior cobertura da mídia trouxe contornos mais complexos para o curso de ação dos órgãos estatais encarregados de facilitar o processo penal, especialmente no contexto da necessidade de respeitar os titulares de direitos fundamentais envolvidos direta ou indiretamente em atos criminosos. De fato, dada a alta cobertura de notícias criminais e suas posteriores investigações sobre autoria, significado e circunstâncias, a exposição das imagens dos envolvidos nos fatos pode ser mais prejudicial, como vítimas e seus familiares.

É dever do Estado centrar-se na eficácia da resposta dos órgãos de persecução penal e promover esforços significativos para a implementação das medidas necessárias à investigação e punição legal dos responsáveis ​​pela prática de atos criminosos. Diante da escassez de recursos humanos e de infraestrutura comuns a todos os órgãos policiais, o deslocamento desproporcional de pessoal e equipamentos torna questionável o acobertamento de crimes que foram “escolhidos” pela mídia como de repercussão.

Tal conduta fere a obrigação legal inerente ao princípio do equinócio como cláusula pétrea do art. O artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, em parte, promove a priorização da “seleção” de um caso quando os recursos geralmente são escassos, em detrimento de vários outros casos que não foram resolvidos ou estão sendo abandonados em processo. A cobertura da mídia imediata, sensacionalista e ávida de público muitas vezes expõe imagens daqueles direta ou indiretamente envolvidos em eventos criminosos. Em um ambiente onde a sociedade exige uma rápida aplicação da lei, julgamentos apressados ​​e acusações apressadas da mídia podem ter impactos psicológicos, econômicos e sociais irreversíveis na vida de uma pessoa.

Não é incomum que pessoas cuja imagem seja exposta publicamente devido à reação da mídia sejam absolvidas nos respectivos processos judiciais. No entanto, a mesma pessoa nunca consegue se recuperar totalmente do choque sofrido. O debate é, portanto, complexo, pois envolve um aparente conflito entre diversos princípios constitucionais, como a liberdade de imprensa e informação e o direito à privacidade, a eficiência do aparato estatal e a autonomia da persecução penal no desenvolvimento dos trabalhos. Pode ainda ser feita referência ao direito dos cidadãos a obterem esclarecimentos relativos a incidentes criminais, bem como a outros temas que possam surgir no decurso de aparentes conflitos em casos concretos.

Portanto, sejam equipamentos de segurança pública ou jornalistas, sejam eles direta ou indiretamente envolvidos nos fatos, todos defendem a atuação serena, prudente e racional dos sujeitos envolvidos no ocorrido. Dentre os pressupostos mais complexos, propõe-se a utilização do princípio da proporcionalidade para resolver os aspectos jurídicos do problema, ponderando princípios jurídicos aparentemente conflitantes.

O propósito deste estudo consistiu em examinar como a mídia retrata a imagem da polícia e da segurança pública em seus veículos de comunicação em massa, além de explorar o poder da mídia e suas consequências, analisar a maneira pela qual a mídia reporta a criminalidade, discutir a cultura do medo e evidenciar os impactos da cobertura midiática na atuação policial. Atualmente, a mídia possui uma influência considerável devido à sua forte conexão com o status social, podendo causar alarme e exigindo, portanto, cautela em sua abordagem, uma vez que pode moldar percepções por meio dos diversos sentidos humanos, sendo a visão o mais influente. É perceptível que a mídia exerce grande influência sobre as opiniões públicas, podendo distorcer a realidade ou, por vezes, ser excessivamente transparente, promovendo assim a disseminação da cultura do medo.

A mídia tem um impacto significativo na opinião pública, aproveitando seu poder de influência e, ao relacionar o lucro derivado da cobertura de eventos violentos com sua repercussão, muitas vezes exagera ou distorce sua apresentação. As opiniões formadas pelos telespectadores frequentemente incluem avaliações sobre a eficácia da Polícia Militar, quando percebem que a segurança pública é inadequada para proteger a sociedade. As notícias sobre crimes e violências veiculadas diariamente pela mídia frequentemente exploram de forma desrespeitosa as emoções das pessoas afetadas pelos eventos e os familiares das vítimas.

Infelizmente, a mídia muitas vezes se torna uma fonte constante de disseminação da cultura do medo, divulgando notícias sensacionalistas com o propósito não de informar, mas de amedrontar. Embora os meios de comunicação de massa, especialmente a televisão, tenham a obrigação legal de elevar o nível civilizatório da sociedade e mostrar alternativas à violência, frequentemente fazem o oposto, contribuindo para a perpetuação da violência. A mídia influencia significativamente a opinião pública, especialmente em relação à atuação da Polícia Militar, levando muitas vezes à percepção de falhas na segurança pública.

Os crimes frequentemente recebem ampla cobertura midiática, provocando reações emocionais nos telespectadores e pressionando-os a formar opiniões públicas, muitas vezes baseadas em pré-julgamentos exagerados ou distorcidos pela mídia. Isso pode gerar indignação e medo na população, levando-a a exigir justiça. É responsabilidade dos cidadãos verificar a veracidade das informações veiculadas pela mídia, pois estas podem muitas vezes criar rivalidades entre a população e a Polícia Militar, alimentando um ciclo de violência.

Apesar da importância de ouvir a voz do povo como parte da democracia, é necessário reconhecer que a mídia muitas vezes seleciona e manipula as informações, o que pode prejudicar a imagem da polícia e alimentar uma visão distorcida da realidade. Isso resulta em prejuízos para a organização policial, que pode ser percebida como falsa, corrupta e desumana, entre outros estigmas.

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