REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10574848
Rubia Carla Kandalski
Resumo: O fardamento constitui-se de objeto de debates relacionados com a ergonomia, modelagem, aspectos anatômicos e a qualidade de saúde no uso cotidiano desse uniforme. A partir dessa constatação, destaca-se que o presente estudo teve objetivo de analisar como mudanças na farda dos policiais podem trazer maior qualidade de saúde. Mediante pesquisa bibliográfica e qualitativa, os resultados demonstraram que os processos de saúde são apontados pelos pesquisadores mediante interdisciplinaridade e ação multiprofissional, focada na enfermagem, medicina, moda e segurança pública, pois todos esses fatores precisam ser considerados na relação com o fardamento. Em conclusão, a necessidade de aumento das produções intelectuais sobre o tema, assim como reflexões associadas ao tema em outros Estados do Brasil, pois a qualidade da saúde precisa ser pensada de maneira ampla.
Palavras-Chave: Uniforme; Anatomia; Mobilidade; Segurança; Saúde.
INTRODUÇÃO
Assim como a Guarda Municipal possui importância significativa na realidade municipal e as Forças Armadas possuem abrangência nacional, a Polícia Militar destaca-se pela sua amplitude de responsabilidades quanto à segurança pública em esfera estadual. Segundo os dados retirados do site da PMPR (2020)1, a Polícia Militar do Paraná promove atendimento qualitativo no Estado e conta, atualmente, com 18.639 colaboradores, dos quais 8.237 são mulheres, tais dados foram obtidos mediante consulta ao Portal Institucional.
A farda é parte do cotidiano do policial. Todos os policiais militares precisam utilizar o uniforme, e este caracteriza e identifica visualmente a instituição. A farda pode variar de modelo e cor, conforme o tipo de policiamento ou Batalhão especializado; fardamento de policiamento Aéreo, Ambiental, de Fronteira, Cavalaria, Batalhão de Operações Especiais (BOPE), etc.
Salvo essas exceções, o fardamento é padrão, com o uso do cáqui2 (PMPR, 2020), sua cor padrão, boina preta com o símbolo da instituição, mesma marca inserida na região superior esquerda, identificação em preto do nome do soldado, cor da fonte em amarelo. Assim como em outras profissões, em relação ao uniforme, a farda não passou por um profundo ponto de ruptura. Nos processos históricos e sociais, há rupturas e permanências, mas verifica-se que foi esse último valor que predominou na trajetória da farda. Houveram alterações históricas nas décadas de 1950 a 1980, no caso do fardamento.
Porém, a evolução do traje da polícia militar acompanhou outros trajes da área, sem levar em conta mudanças anatômicas e ergonômicas específicas do gênero e das condições de trabalho desempenhadas. O resultado é uma disparidade de condições de trabalho. Enquanto os homens possuem uma farda que atende às suas estruturas anatômicas e ergonômicas, o mesmo não ocorreu com as mulheres, por exemplo. Sua funcionalidade está em promover mobilidade e segurança para que a policial possa exercer suas atividades laborais, seja administrativamente ou operacionalmente.
Essa pesquisa se justifica na necessidade de discutir as particularidades da farda militar atual, assim como enfatizar os aspectos de saúde que podem ser otimizados com uma nova farda. Tal discussão é de grande importância para os profissionais de segurança pública, do ponto de vista psicológico, pois gera um conforto emocional em virtude de que sintam segurança em desempenhar suas funções, e que exijam uma resposta imediata de sua farda, ao sentar, correr, pular, dentre outras ações.
O problema de pesquisa se efetivou na seguinte indagação: como o desenvolvimento de uma Farda com maior conforto, segurança, mobilidade, pode otimizar as condições de saúde desses profissionais da polícia militar do Paraná? O objetivo geral do estudo foi analisar como as mudanças na farda dos policiais militares podem trazer maior qualidade de saúde. Dentre os objetivos específicos destaca-se: descrever aspectos de um fardamento com modelagem adequada ao corpo, com flexibilidade para desenvolver atividades operacionais da Polícia Militar; compreender como um novo fardamento pode proporcionar melhores condições de saúde.
METODOLOGIA
Metodologicamente, essa pesquisa efetua revisão bibliográfica qualitativa para conceituar e contextualizar os conceitos de ergonomia e qualidade de saúde atreladas ao conforto, assim como a breve trajetória histórica do fardamento militar. Inicialmente, foram pesquisados os conceitos de ergonomia e qualidade de saúde, além do contexto histórico do fardamento no Brasil e no Paraná. Com as experiências construídas no cotidiano do trabalho como policial, a autora selecionou o material de bases teóricas sólidas (CAPES, SCIELO, Google Scholar) para trazer fundamentação ao estudo. Em seguida, foram pesquisados aspectos relacionados aos melhores tecidos, a gramatura e as possíveis melhorias ergonômicas, de modelagem e anatômicas de diferentes modelos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A História do fardamento militar cruza-se, em muitos pontos, com a trajetória da própria Polícia Militar. Para Amaral (2019), o fardamento padrão se efetiva logo após a criação da instituição, após a emancipação do Paraná e ainda enquanto instituição de caráter protetivo local, com semelhanças em relação à Guarda Nacional.
Segundo os autores Medeiros (2014), a categoria policial foi criada para apoio da Guarda Nacional, no Estado do Rio de Janeiro, que era a capital do país. A farda fazia com que o profissional obtivesse identidade quanto ao seu papel profissional em nível estrito, com identificação relacionada a cada Estado do qual faria parte. Nesse ponto, cada secretaria de segurança pública ficaria encarregada de criar um uniforme para que esse policial estivesse destacado de outros sujeitos, policiais ou civis, assim como pudesse ser chamado em casos de flagrantes ou eventos adversos.
O surgimento do fardamento ocorreu de forma mundial, em modo gradativo, a partir da necessidade de proteção interna e patrulhamento ostensivo visível, com vistas às garantias da qualidade de vida e saúde da população. A padronização do uniforme vem de encontro com a necessidade de uniformidade em relação ao fardamento, que deveria identificar o colaborador em relação ao que seria desempenhado no trabalho (MEDEIROS, 2014).
Nos estudos de Tomazelli e Klaes (2015), o 1º uniforme da polícia militar paranaense era azul ferrete, pois a cor era próxima dos fardamentos portugueses que foram inseridos pelo Conde de Lipe, a partir de 1764. Nesse momento, o Paraná ainda não era emancipado e o fardamento se assemelhava com o de policiais do Estado de São Paulo e do Rio de Janeiro. A cor cáqui é tardia na inserção dos uniformes, pois sua adesão se dá apenas em 1912, com utilização até os dias atuais.
Da mesma maneira, é importante mencionar que o fardamento também possui divisão associado ao gênero, ou seja, homens e mulheres possuem necessidades distintas na utilização e mobilidade no cotidiano de trabalho. Segundo Costa (2012), no Brasil, a efetivação dessa ideia foi realizada pelo presidente Jânio Quadros por meio do decreto N. 24:548, de 12 de maio de 1955. No início do Decreto é escrito,
Considerando, inicialmente, que consoante dispositivo constitucional expresso, ‘os cargos públicos são acessíveis a todos os brasileiros’, sem distinção do sexo observados os requisitos prescritos nas leis e regulamentos. (BRASIL, 1955, s/p).
No entanto, o fardamento se coloca como fator de uniformidade, mesmo que os exame admissionais e de sobreposição de grau tenham sido alterados, com equidade entre homens e mulheres. Para ambos os gêneros, a utilização do uniforme se torna cada vez menos ergonômica, com mobilidade reduzida e, inclusive, possibilidade de inclusão de riscos em situações de perseguição ou monitoramento.
Outro ponto de grande relevância, em relação ao fardamento, é destacado por Bispo (2021). Para o pesquisador, o redesign do uniforme deve levar em consideração os aspectos teciduais contemporâneos, com materiais mais leves e que tragam conforto para o profissional em policiamento ostensivo, mas também que façam com que a população continue identificando o policial na multidão, que reconheça e respeite sua História e funcionalidade para manutenção e promoção da segurança no Paraná.
Assim, o autor ainda reitera que é preciso a um novo uniforme que seja bonito e elegante, mas que também traga conforto e imponha autoridade mediante o fardamento utilizado. Nesse ponto, a modelagem pode ser atualizada, assim como as alterações propostas podem ser pontuais e posteriormente testadas. Em caso de novas mudanças, as necessidades podem ser apontadas pelos próprios usuários. Diante disso, passado e presente podem ser fundamentais na reflexão, pois indica-se a relevância de uma uniformidade, ao mesmo tempo em que é importante refletir sobre o colaborador que está em campo, com suas demandas e necessidades cotidianas (BISPO, 2021).
Para Amaral (2019), o fardamento também já foi analisado em outros contextos, como o caso de forças armadas federais, tais como a Polícia Federal e o Exército Nacional. No entanto, assim como é o caso da Polícia Militar paranaense, as mudanças exigem uma pesquisa aprofundada e testagem ampla, assim como o respeito a normas internas e processos constitucionais que exigem a padronização. Tal equidade ainda leva em consideração, nos casos federais, as características regionais, pois há Estados brasileiros com temperaturas mais elevadas no decorrer do ano, assim como Estados que possuem temperaturas mais amenas ou regiões frias, de modo que um tecido mais leve poderia trazer outros entraves.
Da mesma maneira, para Silva, Garcia e Oliveira (2023), o patrulhamento urbano e o patrulhamento rural também exigem condições distintas em relação à mobilidade e fardamento. Questões relacionadas com a faixa etária do profissional, suas especificidades de saúde, dentre outras particularidades, vão além das questões de gênero mencionadas anteriormente. No entanto, a avaliação do fardamento relacionada com a pluralidade de profissionais que trabalham na polícia militar também é algo recente.
Souza (2014) menciona que a função do patrulhamento era restrita. Com enfoque em atuar somente na atenção às mulheres, idosos e crianças, o governo Ney Braga, durante seu segundo mandato de 1979 – 1982, não considerava que haveria ampliação futura da atuação da mulher em outros espaços. O mesmo governo ainda considerou que policiais com faixa etária mais elevada ou que possuíssem limitações físicas geradas como consequência da profissão realizassem atividades administrativas internas, no atendimento a ocorrências ou mesmo na organização de arquivos, dentre outros aspectos.
A relação dos sujeitos policiais militares com a farda, para Bispo (2021), revela que existem condições distintas de tratamento e há predomínio do componente de homogeneização na Polícia Militar. Vale lembrar que o fardamento masculino foi construído como base e o fardamento feminino é um mero desdobramento deste. Assim, Souza (2014) reitera que mudanças efetuadas no fardamento de ambos podem ser feitas para que haja maior modelagem, ergonomia e potencial de mobilidade nas atividades diárias desempenhadas pelo profissional em questão. Portanto, entender esse padrão e veicular uma imagem que reflita sobre o profissional é também uma forma de educação para a igualdade e melhoria das condições de trabalho na polícia militar.
Outro fator, mencionado por Duarte (2014), ressalta às supressões identitárias do ser no uso da farda. A masculinização transparece no fardamento tradicional, o que imprime uma relação autoritária diferenciada no policiamento ostensivo. Assim, defende que o fardamento poderia trazer maior autonomia para observação da identidade, destacando maior elo identitário com papeis sociais externos, mas complementares e interiorizados na atividade laboral.
Quanto aos aspectos de saúde, é válido reiterar também que o fardamento não era avaliado mediante as condições físicas do policial militar. Em outras palavras, a inserção era pensada em forma hierárquica, com planejamento realizado pelos superiores e utilização obrigatória pelos subalternos. As reclamações existentes eram suprimidas, principalmente por ocasião do ambiente militarizado e do receio de represálias, sobretudo antes de uma institucionalização mais formalizada. A partir do momento em que há ouvidoria capacitada para uma escuta qualificada desses profissionais e expansão dos estudos relacionados ao fardamento, as mudanças passam a ser mais nítidas (BISPO, 2021).
Nesse ponto, a atualização e otimização de uso do fardamento militar torna-se objeto de reflexão voltada também para a saúde, de modo que sujeitos e instituições internas em posição superior possam ter maleabilidade de reconhecimento no uso de tecidos e modelos que sejam anatômicos, modeladores e ergonômicos, visando maior qualidade de vida e de trabalho para os policiais militares que estão em trabalho. Assim, os uniformes ainda poderão manter os aspectos de imposição da autoridade e reconhecimento, mas com patrulhamento mais confortável em relação ao que se expressa na realidade cotidiana atual (BISPO, 2021).
A relação do profissional com a farda, para Shactae e Martins (2010), poderia ofertar maior conforto e identificação com a figura dos sujeitos que estão representando esses papéis sociais, visto que poderia trazer uma abordagem diferenciada para a imagem desses indivíduos na Polícia Militar. Dessa maneira, quando se pensa em uma farda cujo modelo seja ergonômico, anatômico e adaptado às formas, a ênfase que se dá é na valorização do trabalho policial, na ética profissional, na mobilidade e no conforto para esses trabalhadores.
Da mesma maneira, ainda é válido verificar que a História da Polícia Militar do Paraná é permeada de predomínio masculino elitizado e possui componentes vinculados com a trajetória militar portuguesa, vide o primeiro fardamento de segurança interno promulgado no Brasil. Portanto, uma readequação da farda para garantir maior ergonomia não se tornou preocupação da instituição naquele momento. Ainda que as cores tenham se alterado, a preocupação estética não acompanhou outros fatores, como peso, altura, particularidades físicas e ergonomia. Trazer tal temática é mencionar que o lugar social desses sujeitos que são trabalhadores na Polícia Militar, de modo que suas especificidades anatômicas sejam respeitadas (MEDEIROS, 2014).
Os resultados se apresentam na problemática já referida dessa pesquisa. Shactae e Martins (2010) criticam que neles há pouca ergonomia, modelagem deficitária, relação anatômica que não facilita a mobilidade. Repensar a farda e tê-la como aceita, no meio militar, seria como efetuar a transição de um modelo não tão eficiente para outro, com suas vantagens.
O uso do uniforme é essencial na identificação do policial, na visão de Shactae e Martins (2010). Assim, não há alteração nas cores que o compõem. O primeiro aspecto a se pensar é a ergonomia. Sua definição, na moda, está diretamente relacionada com a modelagem. É necessário que haja obediência a aspectos de criação, tecido e limitações relacionadas ao corpo.
A ergonomia, em essência, trabalha as relações entre humano e maquinário, trabalho, espaço, ferramentas, bem como sua prática de conciliação dos diferentes itens para obter soluções a problemas do cotidiano. Para Gonçalves e Lopes (2006), a moda se apresenta nessa relação ergonômica com relação à função, conforto, proteção e informação.
A ergonomia, para Abling e Maggio (2014), pode também ser definida como uma qualidade impressa na peça, visto que proporciona maior compatibilidade com o usuário, adaptação anatômica, sensação e efetivação de segurança e uso confortável por período de tempo curto, médio e longo. A ergonomia ainda se relaciona com aspectos de temperatura e particularidades estruturais do sujeito que utiliza determinada peça.
Para Romani (2016), o processo de tensão do elastano permite maior flexibilidade e mobilidade, além de seu potencial modelatório, com ênfase na segurança e ergonomia. Apesar de seu enfoque ser a moda esportiva, a efetividade do tecido é a mesma, visto que a prática de esportes exige mobilidade, rapidez e segurança nos movimentos, o mesmo que a atividade policial. Da mesma forma, trabalha que o ajuste a partir da elasticidade enfatiza modelagem e flexibilização do ponto de tensão, dando maior conforto para quem utiliza.
Em relação aos aspectos ergonômicos, a farda modificada pode trazer maior maleabilidade, facilitando exercícios de corrida e salto, além de proporcionar outras particularidades, como o conforto no cotidiano e trazer melhorias de longo prazo, o que evitaria problemas de saúde relacionados à temperatura, seja em dias quentes ou em dias mais frios (ROMANI, 2016).
Em relação ao padrão da polícia militar, ressalta-se que a utilização do atual fardamento é resultado de processos históricos que levaram em consideração questões estéticas e práticas, principalmente na identificação de policiamento ostensivo urbano. A partir do momento em que há prioridade para aspectos ligados à saúde, o significado trazido nesse contexto permeia novas configurações de estudos que não estão direcionando as ações apenas para a estética, mas principalmente para a saúde e bem estar (MEDEIROS, 2014).
As condições anatômicas relacionadas com o corpo são distintas e os impactos trazidos no uso cotidiano dos uniformes tradicionais podem ser efetivamente verificados nos estudos de Santos e Luz (2019) e Rocha (2009). Para Rocha (2009), tecidos mais pesados e com menor mobilidade para atividades de alto impacto podem trazer desconforto e desidratação, assim como dificuldades em contextos do cotidiano do policial militar.
Em relação a materiais mais leves, os autores consideram que a mobilidade maior e extensão do tecido, assim como modelagem mais adequada, podem trazer conforto e possibilidade mais evidente de movimentação eficaz em contextos de perseguição ou que envolvam outras atividades. Segundo Santos e Luz (2019), é importante que a instituição pense em formas mais úteis de utilização dos uniformes, para que os tecidos e aspectos de modelagem sejam pensados para as atividades do cotidiano, com finalidade estética complementar.
Para os pesquisadores, é essencial que os processos de saúde na utilização de uniformes sejam articulados com posturas interdisciplinares e multiprofissionais, de maneira que profissionais da enfermagem e da medicina estejam em conjunto com a elaboração de práticas e suporte capaz de promover mudanças mais expressivas no setor de segurança pública.
Dessa forma, tecidos de algodão e poliéster, segundo Rocha (2009), possuem maior facilidade para lavagem, secagem mais rápida e leveza maior. Além disso, são tecidos que podem ser utilizados em outras ocasiões, substituindo os tradicionais cortes de alfaiataria amplamente conhecidos. Porém, é essencial constatar que o desgaste desses tecidos pode ser maior, levando a trocas maiores e descarte de material em quantidade mais expressiva.
Materiais em brim são mais resistentes, mas também possuem menor mobilidade. Assim, diante das especificações das atividades relacionadas com a profissão militar, é singular que haja planejamento e avaliação dos tecidos que mais produzem mobilidade e que podem trazer maiores vantagens em relação aos processos de saúde. Tecidos grossos, mais ásperos e duros possuem menor conforto térmico e trazem prejuízos para a saúde da mulher (SOUZA, 2016).
Com mobilidade reduzida, o esforço passa a ser maior e a ergonomia passa a ser prejudicada, o que pode gerar problemas de saúde em longo prazo. Além disso, é fundamental que o conforto térmico seja pensado como prioridade em um país de características climáticas tropicais, com verões intensos e ações externas que exigem atenção (SOUZA, 2016).
Na instituição, ainda é essencial que haja educação para a saúde, com palestras e processo de conscientização sobre o corpo, com ações práticas em prol da equidade de saúde para mulheres e homens, com valorização de ambos. O fardamento modificado pode favorecer ambos, mas os cortes precisam ser desenvolvidos de forma particular, com direcionamento para cada corpo e suas respectivas peculiaridades (SOUZA, 2016).
Para Amorim, Martins e Martins (2018), é válido compreender que a questão envolvendo a escolha de tecido é apenas um dos aspectos de enfoque na ergonomia e qualidade de saúde para policiais militares. A proposta de uma nova farda possui diferentes funções. Uma delas é a busca por conforto, mas outras encontram-se em outras categorias: modelo anatômico, facilidade no trabalho e ergonomia. Tais mudanças consistiriam em um choque inicial por parte da instituição, das corporações, comandos e da própria sociedade civil.
Nesse sentido, é importante que o modelo criado preserve aspectos éticos, mas busque revolucionar o atual fardamento seja ele feminino ou masculino, com um tecido de gramatura menor e mais flexível (strech), detalhes que proporcionem movimentação mais harmoniosa, facilidade nas ações de sentar e levantar, bolsos auxiliares fechados, mangas com detalhes que oportunizam melhor ergonomia, zíper e elevação da cintura. Esse modelo não pode ser pensado somente para uma faixa de peso, visto que sua modelagem anatômica se estende para pessoas com diferentes características físicas e proporciona maior conforto.
Nesse contexto, a qualidade de saúde deve enfocar em aspectos distintos, como faixa etária, tipo corporal, condição física, área de trabalho e conforto térmico. Questionários e entrevistas podem ser aplicados antes da identificação dos traços relevantes, assim como é fundamental compreender que o fardamento pode ser trabalhado mediante experimentações e mudanças, com alterações de protótipo.
Segundo Minayo, Assis e Oliveira (2011), materiais mais leves podem trazer conforto térmico em situação de policiamento ostensivo, mas também podem ser importantes para profissionais que atuam em funções administrativas mais particularizada. As alternativas têxteis precisam ser verificadas para que a qualidade de saúde seja verificada em longo prazo, o que incide também mediante questionários e entrevistas realizadas após a utilização, de modo que o acompanhamento e avaliação dos processos sejam feitas adequadamente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir dos estudos realizados, os pesquisadores selecionados reconhecem que o fardamento tradicional pode ser revisitado, com mudanças no tecido e produção de componentes que tragam maior ergonomia. Quanto aos aspectos relacionados com a saúde dos policiais, é singular verificar que os processos de saúde são apontados pelos pesquisadores mediante interdisciplinaridade e ação multiprofissional, focada na enfermagem, medicina, moda e segurança pública, pois todos esses fatores precisam ser considerados na relação com o fardamento.
Os pesquisadores também salientam que os componentes de ergonomia devem ser pensados em uma relação de equidade, pois os componentes anatômicos do corpo masculino e feminino são distintos, o que exige análises e avaliações diferenciadas em cada aspecto. Nesse ponto, entender o cotidiano dos policiais militares é parte integrante de um processo que passa pelas trocas de uniforme no poder público, mas também de escuta qualificada dos trabalhadores, pois é a partir de suas reivindicações que são estruturadas formas de melhoria no processo de ação ostensiva.
Assim, o objetivo geral do estudo foi alcançado, pois foi possível analisar como mudanças na farda de policiais podem trazer maior qualidade de saúde. A partir desse ponto, destaca-se que as necessidades de mudança do fardamento são imediatas e fundamentais para melhoria da qualidade da saúde desses profissionais, com aprimoramento dos processos ergonômicos. Diante disso, salienta-se ainda a necessidade de aumento das produções intelectuais sobre o tema, assim como reflexões associadas ao tema em outros Estados do Brasil, pois a qualidade da saúde precisa ser pensada de maneira ampla, com contribuição da sociedade civil e do poder público.
1http://www.pmpr.pr.gov.br/pagina/organograma Acesso em 16/11/2023.
2“O uniforme cáqui – A palavra cáqui tem origem no idioma persa (khak), que significa cor de terra,empoeirado, pardo, etc. Em 1848 o Brigadeiro Harry Bunett Lumsden, oficial comissionado na Campanha Britânica das Índias Orientais, observando que o uniforme branco de suas tropas era inadequado ao clima quente e poeirento da Índia, adotou pela primeira vez um fardamento nessa cor. […] No Brasil ele foi introduzido para o Exército Nacional em 1903, e progressivamente pelas demais forças militares ( Tiros de Guerra, Guarda Nacional, e Forças Estaduais). No Paraná, procurando-se dar a imagem de modernização diante do agravamento da crise do Contestado, foi incorporado em 1912 para o Regimento de Segurança, e em 1915 para o Corpo de Bombeiros. A partir de então passou a ser a cor tradicional dos uniformes de serviço, pela qual o policial militar é identificado no Estado”. Disponível em: http://www.pmpr.pr.gov.br/Pagina/Fardamento Acesso em 16/11/2023.
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