DA RELEVÂNCIA DA PARTILHA TESTAMENTÁRIA COMO INSTRUMENTO DE PREVENÇÃO DE LITÍGIOS ENTRE OS HERDEIROS E SEU REGRAMENTO LEGAL PARA GARANTIA DO EQUILÍBRIO DOS QUINHOS DOS HERDEIROS NECESSÁRIOS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10260353


Bruno Chemin Borsoi1


Resumo: O presente trabalho tem como principal objetivo a análise do regramento que disciplina as disposições testamentárias, mormente a viabilidade e limites da realização da partilha de bens através do testamento. Passa-se, assim, por uma análise prévia quanto às formas de realização de partilha dos bens que compõem a herança, para, então, realizar a investigação quanto à autonomia da vontade do testador quanto à indicação dos bens que irão compor o quinhão hereditário de cada herdeiro. Ainda, busca-se explanar a compatibilização desse instituto da partilha em vida, prevista no artigo 2.014 do Código Civil com o que dispõe o mesmo diploma legal em seu artigo 1.857, § 1º, ou seja, a vedação quanto a inclusão da legítima em testamento. Por fim, aborda-se a realização da redução da disposição testamentária, prevista no artigo 1.967 do Código Civil como mecanismo de equilibrar a vontade do testador e o direito à legítima dos herdeiros necessários.

Palavras-chave: Partilha em vida. Composição dos quinhões, legítima dos herdeiros necessários.

Abstract: The main objective of this work is to analyze the rules that govern testamentary provisions, particularly the feasibility and limits of sharing assets through a will. Therefore, a preliminary analysis is carried out regarding the ways in which the assets that make up the inheritance can be shared, to then carry out an investigation into the autonomy of the testator’s will regarding the indication of the assets that will make up the hereditary share of each heir. Furthermore, we seek to explain the compatibility of this institute of sharing in life, provided for in article 2014 of the Civil Code with what the same legal diploma provides in its article 1857, § 1, that is, the prohibition regarding the inclusion of the legitimate party in a will . Finally, the reduction of the testamentary disposition, provided for in article 1967 of the Civil Code, is discussed as a mechanism to balance the will of the testator and the legitimate right of the necessary heirs.

Keywords: Share in life. Composition of shares. legitimate inheritance of the necessary heirs.

1 INTRODUÇÃO

O direito à sucessão é finalísticamente vocacionado a continuidade nas relações jurídicas de cunho patrimonial do de cujus, que com o evento morte transmite-se automaticamente aos herdeiros do falecido a titularidade dessas relações. Para tanto, o Código Civil trabalha em duas frentes no que diz respeito aos legitimados à sucessão. 

A primeira delas representa a sucessão legítima ou legal, segundo a qual presume-se a vontade do de cujus, estabelecendo o Código Civil uma ordem legal de sucessão. 

Já a segunda forma sucessória é a via testamentária, a qual a disposição patrimonial é realizada através da figura do testamento. 

A escolha desta última via permite ao autor da herança dispor por vontade própria a forma de partilha do patrimônio transmitido, indicando os bens que irão compor o quinhão hereditário de cada herdeiro. 

Para tanto, todavia, o Código Civil estabelece no mecanismo da legítima um claro limite a vontade do testador em eventual composição dos quinhões hereditários de forma diversa. 

Nessa linha de raciocínio, a composição dos quinhões deve seguir a ideia de maior igualdade possível, sob pena de reconhecimento da nulidade parcial da disposição efetuada, levando a redução da disposição testamentária. 

A partilha pela via testamentária possui relevantes efeitos práticos, tendo em vista que permite ao testador estabelecer um planejamento sucessório ou simplesmente evitar conflitos futuros que possam ocorrer entre os herdeiros em decorrência de uma partilha que estabeleça uma situação de condomínio em todos os bens que componham o acervo hereditário. 

2. DA PARTILHA 

Como dito alhures, em decorrência do princípio da saisine, aberta a sucessão transmite-se desde logo a posse e propriedade dos bens aos herdeiros. Nessa linha de ideias, a partilha visa tão somente declarar o direito individual de cada sucessor. Portanto, com a partilha cessa-se o estado de indivisão da herança, pondo fim a universalidade patrimonial. 

A partilha pode ser conceituada nas palavras de (FARIA, NETTO, ROSENVALD, 2022, P. 1465/1466):

A partilha é ato tendente à cessação da comunhão estabelecida entre os sucessores, por força da transmissão automática (CC, art. 1.784), partindo o patrimônio entre os interessados, sem necessariamente dividi-lo. Transmuda, pois, o patrimônio comum existente entre os sucessores particulares. Bem antes, Pontes de Miranda já vaticinava também que a partilha é “a operação processual pela qual a herança passa do estado de comunhão por indiviso, estabelecido pela morte e pela transmissão por força de lei, ou de cláusula testamentária, ao estado de quotas completamente separadas, ou ao estado de comunhão pro indiviso ou pro diviso, por força da sentença.

A partilha representa direito subjetivo dos herdeiros, podendo ser requerida por qualquer deles, sendo ineficaz qualquer disposição testamentária proibitiva de sua realização. Por lógica também possuem legitimidade para requerer a partilha o cessionário dos direitos, bem como os credores do espólio. 

Não bastando, pode o cônjuge meeiro requerer a partilha, tudo porque é inequívoco seu interesse em separar sua meação do condomínio com os herdeiros.  

Assim como o requerimento de abertura de inventário, a partilha não possui caráter compulsório, desta feita revela-se como direito potestativo, ou seja, enquanto houver a comunhão, qualquer herdeiro, cessionário, cônjuge meeiro e até mesmo os credores poderão pedir sua divisão. 

O Código Civil em seu artigo 2.015 permite que os herdeiros maiores e capazes realizem a partilha dos bens de forma amigável. Nesse caso há um negócio jurídico firmado tanto por escritura pública, por termos nos autos de inventário, ou até mesmo escrito particular homologado judicialmente. 

Por ser negócio jurídico com margem de liberdade quanto a manifestação de vontade, não exige o estabelecimento de proporcionalidade dos quinhões. Sobre o tema (GODOY, PELUSO APUD OLIVEIRA, 2021, P. 2350):

A partilha amigável, como salienta Euclides de Oliveira (Código Civil comentado. São Paulo, Altas, 2004, v. XX, p.191) não exige exata proporcionalidade dos quinhões: na parte em que não for observada perfeita igualdade, o ato será de transmissão inter vivos; sendo possível, ainda, a previsão de partilha na qual se atribui usufruto a um herdeiro e a nua-propriedade a outro. A partilha amigável pressupõe participação de todos os herdeiros e legatários, e também do cônjuge meeiro, sob pena de ineficácia. A partilha amigável pode ser anulada por dolo, coação, erro essencial ou intervenção de incapaz como estatui o art. 657 do CPC, ou, segundo o art. 2.023 deste Código, pelos vícios e defeitos que invalidam, em geral, os negócios jurídicos.

Com a edição da Lei nº 11.441/07 o ordenamento passou a contemplar a figura do inventário e partilha por escritura pública, desde que todos os interessados fossem capazes e estejam de pleno acordo, sendo a escritura título hábil para o registro imobiliário

Em cenário diverso, ou seja, inexistindo convergência entre os herdeiros ou presente incapaz, a partilha deve ser realizada pela via judicial.  

3. DA PARTILHA EM VIDA

O Código Civil no artigo 2.018 ainda estabelece uma regra peculiar na qual consiste na realização da partilha de bens. Pode o ascendente, por ato entre vivos ou declaração de última vontade, realizar a partilha de seus bens, desde que respeitada a legítima dos herdeiros necessários.  Assim dispõe o texto legal: 

Art. 2.018. É válida a partilha feita por ascendente, por ato entre vivos ou de última vontade, contanto que não prejudique a legítima dos herdeiros necessários.

A lume da redação do dispositivo citado a doutrina aponta que duas são as modalidades de partilha em vida: partilha doação e partilha testamentária. 

No primeiro caso a partilha se opera por ato entre vivos e equivale a ato de adiantamento do legítima aos herdeiros necessários. Há típico contrato de doação no qual os herdeiros são os donatários, não sendo necessária aceitação, que pode ser tácita, entrando na posse e propriedade ainda em vida do doador, de modo que a transferência se efetiva pelo registro da escritura no caso de bens imóveis ou com a tradição quando envolver bens móveis.

No segundo caso positivado no artigo, a partilha testamento também deve respeitar a legítima dos herdeiros necessários, diferenciando-se da primeira, no particular que a produção de seus efeitos ocorre apenas após a morte, caracterizando-se pela revogabilidade.

Portanto, nessa figura há somente a distribuição dos bens que compõem o quinhão de cada herdeiro. Assim, pode o testador através da via testamentária dispor sobre todos seus bens, indicando quais devam integrar o quinhão hereditário de cada um de seus herdeiros.

Não bastando, pode o testador realizar disposições em favor de terceiros, instituindo legados, ou eventualmente, privilegiando um herdeiro com maior parcela do patrimônio em detrimento de outros, desde que respeite a legítima de cada um deles. 

A legítima consiste em direito dos herdeiros necessários e é composta pela metade dos bens da herança. Assim dispõe o artigo 1.846 do Código Civil:

Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima.

Em consonância com essa disposição o artigo 1.857, § 1º, do Código Civil que a legítima não poderá ser incluída no testamento. Cite-se:

Art. 1.857. Toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da totalidade dos seus bens, ou de parte deles, para depois de sua morte.

§ 1 A legítima dos herdeiros necessários não poderá ser incluída no testamento.

Importante destacar que os herdeiros necessários não se confundem com a ordem de vocação hereditária prevista para a sucessão legítima.

Art. 1.845. São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge.

Nos termos do que dispõe o artigo 1.845 do Código Civil, os herdeiros necessários não compreendem os herdeiros colaterais, tais como irmãos, de forma que a legítima não os abrange. 

De bom alvitre esclarecer que a norma quando menciona que a legítima não poderá ser incluída no testamento visa com que o testador não disponha de seu patrimônio em desfavor de seus herdeiros necessários em um percentual superior a metade de seu patrimônio líquido.

A título de exemplo, havendo um patrimônio líquido partilhável de R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais) a ser dividido entre quatro herdeiros necessários, pode o testador indicar o percentual que irá compor os quinhões de cada um, desde que respeitada a legítima de cada herdeiro, que em concreto é de 1.250.000,00 (um milhão duzentos e cinquenta reais), ou seja, 12,5% que por quatro equivalem a 50%.

A legítima pode sim compor o testamento quanto aos bens que a compõe, desde que observado os valores reais dos bens que irão integrar sua composição. 

Tal possibilidade possui guarida no artigo 2.014 do Código Civil:

Art. 2.014. Pode o testador indicar os bens e valores que devem compor os quinhões hereditários, deliberando ele próprio a partilha, que prevalecerá, salvo se o valor dos bens não corresponder às quotas estabelecidas.

Sobre o tema explica (GONÇALVES, 2021, P. 83):

“Malgrado a legítima seja intocável e não possa ser desfalcada em detrimento dos herdeiros necessários, admite-se que o testador indique os bens que a comporão. Preceitua o art. 2.014 do Código Civil: “Pode o testador indicar os bens e valores que devem compor os quinhões hereditários, deliberando ele próprio a partilha, que prevalecerá, salvo se o valor dos bens não corresponder às quotas estabelecidas”. Por seu turno, proclama o art. 2.018: “É válida a partilha feita por ascendente, por ato entre vivos ou de última vontade, contanto que não prejudique a legítima dos herdeiros necessários”. Desse modo, não havendo ofensa à legítima, pode o autor da herança realizar a partilha dos bens em vida, ou estipulá-la por disposição de última vontade. Se, no entanto, for casado pelo regime da comunhão universal de bens e o cônjuge lhe sobreviver, a indicação dos bens constitutivos da legítima será reputada simples conselho, que o juiz atenderá ou não, porque o cônjuge sobrevivente tem preferência na escolha dos bens a serem partilhados, cuja metade já lhe pertence como meação”.

Em arremate a lição de (GODOY, PELUSO, 2021, P. 2349/2350):

O art. 2.013 reforça a disposição do art. 2.018, este similar ao art. 1.776 do Código anterior. O art. 2.018 faculta ao ascendente efetuar partilha em vida, por testamento, em relação a seus descendentes. O art. 2.014 assegura ao testador, em todas as situações e não somente quando se trata de ascendente em face de descendentes, o direito de, no testamento, deliberar sobre a partilha, indicando quais bens e valores irão compor o quinhão de cada herdeiro. Essa disposição testamentária será válida se a divisão respeitar as quotas intangíveis dos herdeiros necessários. Se houver violação dessas quotas, aplicam-se as regras de redução das disposições testamentárias (arts. 1.967 e 1.968).  Embora deva respeitar a legítima, o testador, ao deliberar sobre a partilha, poderá escolher quais os bens irão compor os quinhões dos herdeiros necessários. A deliberação do testador sobre a partilha fica limitada, também, pela meação do cônjuge sobrevivente. Relembre-se de que meação não é herança. Uma vez separada a meação do cônjuge, o restante será a herança, cuja partilha poderá ser deliberada pelo testador. 

Assim, é de bom alvitre a nota no sentido de esclarecer que a disposição total do patrimônio pelo testador, no cenário que indica os bens que compõe o quinhão de seus herdeiros, inclusive da legítima de cada um, não representa qualquer violação ao regramento do artigo 1.857, § 1º do Código Civil. 

Em arremate, o herdeiro não possui direito de escolher os bens do acervo hereditário que porventura lhe convenha. Tal indicação, representa direito potestativo do autor da herança, que tem a faculdade de através do testamento realizar a partilha e compor a legítima de cada herdeiro. 

Como explica (DIAS, 2008, p. 272): 

o autor da herança pode individualizar os bens que tocarão aos herdeiros necessários. Como lembra Orosimbo Nonato, o herdeiro não tem direito a este ou a aquele bem. A faculdade de definir bens é do testador e não do herdeiro, que não pode exigir determinado bem (sem grifos no original)

Logo, com base nessa explicação, retomando ao exemplo apresentado alhures, em que há quatro herdeiros e um patrimônio líquido de R$ 10.000.000,00 (dez milhões), agora composto por bens móveis, imóveis e dinheiro, pode o testador indicar que para o herdeiro “a” sua legítima será composta somente por bens imóveis e móveis e para os demais o dinheiro; pode, ainda, compô-la com bens da mesma natureza para cada um dos herdeiros.

Assim, são diversas as possibilidades que podem ser adotadas conforme o cenário do caso concreto, desde que respeitada a legítima hereditária.

4. DA REDUÇÃO TESTAMENTÁRIA

Caso a distribuição dos bens que irão integrar o quinhão hereditário seja realizada de forma desigual atingindo a legítima, deve-se observar o regramento previsto no artigo 1.967 do Código Civil. Vejamos: 

Art. 1.967. As disposições que excederem a parte disponível reduzir-se-ão aos limites dela, de conformidade com o disposto nos parágrafos seguintes.

O artigo em comento trata da redução das disposições testamentárias, instituto este que explica (VENOSA, 2017, P. 357): 

Segundo estabelecemos nos capítulos anteriores, havendo herdeiros necessários (ascendentes ou descendentes, bem como o cônjuge em determinadas situações), o testador não pode atribuir no testamento senão a metade de seu patrimônio. A outra metade constitui a legítima dos herdeiros necessários. Pode ocorrer, contudo, que, por inadvertência, desconhecimento, diminuição ou desvalorização de seu patrimônio, fatores alheios à sua própria vontade, ou malícia, o testador tenha a ultrapassar a metade disponível. O mesmo pode acontecer nas doações. Em qualquer situação há que se ajustar a legítima. Aqui se trata de redução nas deixas testamentárias. Nas doações, o fenômeno ocorre pelas mesmas razões e estão entrelaçadas (arts. 549, 2.008, 1.789,1 .846, 1.846). Também ocorrendo a situação na partilha em vida, permitida pelo art. 2.018, poderá haver redução, já que o sentido é o mesmo (aqui se trata de ação de anulação de partilha por ato inter vivos, referida pelo art. 657 do CPC, como veremos).

A redução testamentária exige, via de regra, ação autônoma de nulidade visando desconstituir a disposição realizada em excesso. Todavia, não demandado grandes discussões probatórias é plenamente possível o reconhecimento desta nulidade parcial dentro do próprio inventário.

Sobre o tema cite-se os julgados abaixo do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

Em casos análogos, o e. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assim pronunciou-se: AGRAVO DE INSTRUMENTO. Ação de inventário. Decisão que, dentre outras deliberações, deferiu o pedido dos herdeiros para ajustar o plano de partilha para redução do usufruto sobre metade dos bens deixados (parte disponível). Inconformismo da viúva, ora inventariante. Falecido que testou à esposa a totalidade do usufruto de todos os seus bens móveis e imóveis. Violação à legítima dos herdeiros. Necessidade de redução das disposições testamentárias. Decisão mantida. Recurso a que se nega provimento. (TJSP; Agravo de Instrumento 2131370-39.2021.8.26.0000; Relator (a): José Rubens Queiroz Gomes; Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santos – 2ª Vara de Família e Sucessões; Data do Julgamento:09/08/2021; Data de Registro: 09/08/2021). G. N.

ANULATÓRIA DE TESTAMENTO – USUFRUTO VITALÍCIO DE IMÓVEISDEIXADO COMO LEGADO A VIÚVA – VIOLAÇÃO DA LEGÍTIMA -CIRCUNSTÂNCIA QUE NÃO CONDUZ À NULIDADE OU ANULAÇÃO DA CLÁUSULA OU DO TESTAMENTO – POSSIBILIDADE DE REDUÇÃO DA DISPOSIÇÃO, DE MODO A RESPEITAR A LEGÍTIMA E PRIVILEGIAR A VONTADE DO TESTADOR – PROVIDÊNCIA A SER TOMADA NO INVENTÁRIO, APÓS DEFINIÇÃO DA LEGÍTIMA E AVALIAÇÃO DO USUFRUTO, DESCONSIDERADA A NUA-PROPRIEDADE – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA -RECURSO DESPROVIDO, COM OBSERVAÇÃO.(TJSP; Apelação Cível 0325812-50.2009.8.26.0100; Relator (a): Moreira Viegas; Órgão Julgador: 5ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível- 10ª Vara da Família e Sucessões; Data do Julgamento: 15/06/2016; Data de Registro: 15/06/2016). G. N.

SUCESSÃO. Ação de redução de disposição testamentária. Sentença de procedência. Insurgência do réu. Falecida que testou ao cônjuge usufruto vitalício sobre o único imóvel de sua propriedade. Violação à legítima dos herdeiros. Redução cabível. Direito real de habitação do cônjuge sobrevivente que foi preservado. Sentença mantida. Recurso desprovido. (TJSP; Apelação Cível 1008032-53.2019.8.26.0602; Relator (a): Maria de Lourdes Lopez Gil; Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Privado; Foro de Sorocaba – 1ª Vara de Família e Sucessões; Data do Julgamento:12/07/2021; Data de Registro: 12/07/2021).

Desta feita, a ideia de redução das disposições testamentárias representa instituto que possui o condão de equilibrar a preservação da vontade do testador e o direito dos herdeiros necessários à respectiva legítima. 

Vale destacar que, ocorrendo a necessidade de reconhecimento de ineficácia de algumas disposições testamentárias, será necessário observar se as disposições não afetadas pela ineficácia deveriam ser observadas em conjunto.

Dito de outro modo, a redução das disposições testamentárias por terem alcançado a legítima dos herdeiros necessários pode, a depender da situação, desvirtuar a própria vontade do testador, de modo que assim dispõe o artigo 1.910 do Código Civil:

Art. 1.910. A ineficácia de uma disposição testamentária importa a das outras que, sem aquela, não teriam sido determinadas pelo testador.

A normativa garante que, quando as cláusulas lícitas da disposição testamentárias forem decorrentes diretas das declaradas ineficazes, estas também devem ser igualmente ineficazes, com vistas a não desvirtuar a disposição de última vontade.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

 Embora a realização de testamento não seja praticada por parcela expressiva da população brasileira, a sua realização é um poderoso instrumento para organização e planejamento da sucessão hereditária.

A sucessão testamentária goza de certas peculiaridades que, uma vez observadas, garantem que o testador possa dispor plenamente de seu patrimônio, evitando que possam ocorrer desavenças após a sua morte.

A principal peculiaridade deste tipo de sucessão compreende o instituto da legítima. Contudo, conforme relatado ao longo deste trabalho, existem várias formas de respeitar o instituto sem que ocorra qualquer prejuízo aos herdeiros necessários, equilibrando a vontade do testador.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Código Civil Brasileiro. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm,  acesso em: 10/10/2023;

GOLÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Volume 7, 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2021;

DIAS, Maria Berenice; Manual das Sucessões. Revista dos Tribunais, Rio de Janeiro, 1ª Ed, 2008;

FARIA, Cristiano Chaves de; Netto, Felipe Braga; ROSENVALD, Nelson. Manual de Direito Civil – Volume Único -, 7ª Ed. Ver. Ampl e atual. – São Paulo, Ed. Juspodivm, 2022;

GODOY, Claudio Luiz Bueno; PELUSO, Cezar. Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência, 15ª Ed. Santana de Parnaíba: Manole, 2021.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Sucessões, 18ª ed. São Paulo: Atlas, 2017.

GAGLIANO, Pablo Stolze. Manual de Direito Civil Volume Único, 7ª Edição; Saraivajur; 2023.


1Advogado. Pós Graduado em Processo Civil pela Universidade Anhanguera. Possui graduação em Direito pela Associação Educacional do Vale da Jurumirim – Faculdade Eduvale de Avaré/SP. E-mail: brunoborsoi@borsoiadvogados.com.br