A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, O ROL DE PROCEDIMENTOS DA ANS E OS IMPACTOS NO TRATAMENTO DAS PESSOAS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA)

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10116078


Autor: Wareli Tavares Mar
Orientador: Prof. Me. Marcelo Augusto Andrade de Oliveira.


RESUMO

A presente monografia trata sobre o impacto do Rol de Procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) no tratamento de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). A pesquisa revelou que o Rol da ANS, embora estabeleça um conjunto de procedimentos médicos a serem cobertos pelos planos de saúde, muitas vezes não inclui terapias multidisciplinares fundamentais para o tratamento do TEA. Isso tem levado a questões cruciais sobre o acesso a tratamentos de qualidade para pessoas com TEA e os desafios enfrentados por suas famílias. Tem como objetivo geral consiste em assegurar os direitos inerentes à qualidade humana dos pacientes, tal qual o direito à saúde. Os objetivos específicos são; apresentar as legislações pertinentes ao tratamento da pessoa com TEA pelos planos de saúde; descrever sobre o direito à saúde da pessoa com TEA em face ao rol da ANS; e discorrer sobre a insuficiência de tratamento adequado à criança com TEA em face ao princípio da dignidade da pessoa humana. Para a elaboração da pesquisa, utilizou-se a metodologia exploratória, quanto aos objetivos, bibliográfica, quanto às coletas de dados relevantes, tendo em vista a grande quantidade de informações relacionadas ao tema, no qual se utilizou um enfoque qualitativo-quantitativo. Em última análise, a pesquisa destaca a necessidade de revisão e atualização do Rol da ANS para melhor refletir as necessidades das pessoas com TEA, garantindo que elas recebam tratamento abrangente e eficaz.

Palavras-chave: Dignidade da pessoa humana. Agência Nacional de Saúde. Transtorno do espectro autista.

ABSTRACT

This monograph deals with the impact of the List of Procedures of the National Supplementary Health Agency (ANS) in the treatment of people with Autism Spectrum Disorder (ASD). The research revealed that the ANS List, although it establishes a set of medical procedures to be covered by health plans, often does not include fundamental multidisciplinary therapies for the treatment of ASD. This has led to crucial questions about access to quality treatments for people with ASD and the challenges faced by their families. Its general objective is to ensure the rights inherent to the human quality of patients, such as the right to health. The specific objectives are; present the legislation relevant to the treatment of people with ASD by health plans; describe the right to health of people with ASD in light of the ANS list; and discuss the insufficiency of adequate treatment for children with ASD in light of the principle of human dignity. To prepare the research, an exploratory methodology was used, in terms of objectives, bibliographical, in terms of collecting relevant data, given the large amount of information related to the topic, in which a qualitative-quantitative approach was used. Ultimately, the research highlights the need to review and update the ANS Roster to better reflect the needs of people with ASD, ensuring they receive comprehensive and effective treatment.

Keywords: Dignity of the human person. National Health Agency. Autism spectrum disorder.

INTRODUÇÃO

A dignidade da pessoa humana tornou-se um tema bastante comum, e necessário, nos debates sociais da contemporaneidade. A sociedade, cada vez mais informada, vem buscando ativamente e muita das vezes de forma direta que seus direitos sejam respeitados. Nesse sentido, a busca pela efetivação dos direitos tem alcançado proporções gigantescas, seja pela manifestação social e do pensamento ou através das vias judiciais.

O direito fundamental à saúde, positivado em nível mundial através da Declaração Universal dos direitos do Homem e em diversas constituições, trouxe uma outra perspectiva no que tange a responsabilidade do estado em tutelar tal direito, outrossim, ao dever do estado em garantir o mínimo existencial e deste modo concretizar o princípio da dignidade da pessoa humana. 

Por conseguinte, com finalidade em suprir um justo acesso ao direito à saúde, a constituição federal permitiu à iniciativa privada a liberdade em contribuir de forma suplementar com o sistema único de saúde, através de planos ou seguros de saúde privados, no entanto regulados pelo poder público através da agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, que dentre outras atribuições, determina a chamada “lista de procedimentos” que deverá ser ofertada pelos planos e seguros de saúde.

Entretanto, nos dias atuais há uma crescente insatisfação por parte dos usuários no que tange a não cobertura de determinados tratamentos, como por exemplo aos pacientes com Transtorno do Espectro Autista – TEA, que dependendo de suas condições comportamentais, necessitam de tratamento célere e eficaz, para o seu desenvolvimento saudável.

Sabe-se que o diagnóstico precoce e os meios adequados de tratamento são imprescindíveis ao desenvolvimento da criança com TEA, outrossim, a sua inclusão social, para tanto, é necessário a observância das legislações pertinentes ao tema, de modo a minimizar violações de direitos e, sobretudo, ampliar a lista de tratamentos, fato estudado na presente pesquisa. 

Ante as negativas de alguns tratamentos pelos planos de saúde, houve grande procura do judiciário, pelos pais de crianças possuidoras do TEA, objetivando o atendimento e os meios de tratamento adequados e eficazes, uma vez que os ofertados não estariam surgindo melhoras nas crianças. Portanto fez-se necessário a abordagem deste tema de grande relevância do ponto de vista jurídico, filosófico e social, tendo em vista a busca de efetivação do princípio da dignidade da pessoa humana através do direito à saúde. 

Em virtude desses pressupostos, estruturou-se a seguinte problemática: até que ponto o rol da ANS afeta o princípio da dignidade da pessoa humana frente aos tratamentos disponibilizados pelos planos de saúde?

A hipótese do presente trabalho considera que o Rol da ANS trás certas limitações no que tange o desenvolvimento saudável das crianças com TEA, visto que a lista de procedimentos estabelecidas limitam a plena efetivação do princípio da dignidade da pessoa humana. No entanto, faz-se necessário a ampliação na lista de procedimentos, que se comprovados a eficácia devam ser incluídos de imediato, e assim concretizar o pleno exercício do direito fundamental à saúde.

O objetivo geral do presente trabalho, consiste em assegurar os direitos inerentes à qualidade humana dos pacientes, tal qual o direito à saúde. Deste modo, foi difundido o conceito de direitos fundamentais, sob a ótica constitucional, doutrinária e legal, para que se compreenda a relevância da tutela de tais direitos.

Os objetivos específicos são; apresentar as legislações pertinentes ao tratamento da pessoa com TEA pelos planos de saúde; descrever sobre o direito à saúde da pessoa com TEA em face ao rol da ANS; e discorrer sobre a insuficiência de tratamento adequado à criança com TEA em face ao princípio da dignidade da pessoa humana.

Para a elaboração da pesquisa, utilizou-se a metodologia exploratória, quanto aos objetivos, bibliográfica, quanto às coletas de dados relevantes, tendo em vista a grande quantidade de informações relacionadas ao tema, no qual se utilizou um enfoque qualitativo-quantitativo.

Neste sentido, este estudo foi estruturado conforme descrito a seguir, incluindo-se como parte também a introdução e conclusão. No Capítulo 1, dispõe-se sobre os aspectos históricos da dignidade da pessoa humana até os dias atuais, sobre os status principiológico da dignidade da pessoa humana na Constituição Federal e sobre os direitos fundamentais; no Capítulo 2 discorre-se sobre a Agência Nacional da Saúde, sobre sua criação e competência, por conseguinte apresenta-se a definição do Transtorno do Espectro Autista, bem como dos tratamentos disponibilizados pelos planos de saúde e de sua eficácia no que tange ao desenvolvimento da pessoa com TEA; no Capítulo 3 discorre-se sobre a legislação vigente que trata sobre os direitos das pessoas com TEA e na judicialização como meio de garantir o tratamento eficaz de forma a satisfazer os direitos previstos no ordenamento jurídico. 

1 DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS

A dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais são pilares essenciais do ordenamento jurídico de um Estado democrático de direito. O respeito à dignidade humana e a garantia dos direitos fundamentais são princípios que orientam as normas e as instituições em busca de uma sociedade justa, livre e igualitária.

Este capítulo visa aprofundar a compreensão desses conceitos fundamentais, explorando a sua interconexão, bem como o papel crucial que desempenham na proteção dos indivíduos contra a arbitrariedade do Estado e na promoção da justiça social. 

1.1 Breve relato sobre a história da dignidade da pessoa humana

A concepção da dignidade humana tem suas origens, a priori, aludidas na antiguidade clássica, através do pensamento estoico, na qual propunha que os homens vivessem harmonicamente com a natureza, e desta maneira alcançariam a Eudaimonia, ou seja, a felicidade. Os estoicistas acreditavam que a dignidade humana se conceituava através de valores e qualidades intrínsecas do homem, características estas que permitia sua distinção em relação aos demais seres que habitam o nosso mundo (Liguori, 2021).

De acordo com Assis Dias (2021, p.131) na Grécia antiga, “a noção de dignidade estava relacionada à posição social ocupada pelo indivíduo, ou seja, havia separação e distinção”. Por não ser unificada, a Grécia antiga tinha sua composição através de cidades-estados, onde cada um possuía autonomia própria, como sistema de governo, leis e economia. Em Atenas, entre 508 a.C e 404 a.C, viveu-se sob sistema de governo da Democracia Direta, onde não havia votação para representantes.

O processo de escolha acontecia através de sorteio, onde as pessoas sorteadas detinham o poder de votar e ainda de propor leis, para tanto era necessário ser cidadão, entretanto, para ter tal título o indivíduo deveria ser livre, de naturalidade ateniense, e que seus pais também fossem atenienses (Rosset, 2008, p. 193).

Apesar da ideia de separação e distinção, na Grécia já se discutia a igualdade, conforme se extrai da teoria aristotélica sobre a justiça distributiva e comutativa; a distributiva fundava-se na recompensa proporcional de acordo com o mérito de cada indivíduo, deste modo havia a repartição das honras e bens entre tais indivíduos, e a comutativa consistia em um papel corretivo nas relações entre as pessoas, onde a justiça se dirige ao objeto das relações entre os indivíduos, e não a pessoa individualmente considerada, observando-se assim o princípio da igualdade (Sarmento, 2016, p. 30).

Do mesmo modo, na Roma Antiga, a dignidade era empregada para distinguir o prestígio de certas pessoas em razão de seus status, ou seja, para os romanos a dignidade está ligada à posição social do indivíduo na esfera da vida pública, assemelhando-se aos Gregos, e para ambos a dignidade se tratava de um privilégio de poucos e não de um atributo universal. Não obstante, Marco Tulio Cícero, filósofo estoico da Roma Antiga, em sua obra De Officiis, de 44 a.C. deu um sentido de universalidade na expressão dignidade, ao referir-se à dignidade como característica de todos os indivíduos, pelo fato de serem semelhantes, distinguindo os seres humanos dos animais (Assis Dias, 2021).

Para Cicero, toda virtude é acompanhada de certa dignidade, e que a separação uma da outra seria possível apenas pelo pensamento, não pela realidade, pois é impossível separá-las, da mesma forma que não se pode separar a beleza da saúde. No mesmo sentido, o filósofo destaca a necessidade de um respeito recíproco aos homens, em especial aos honestos. (Tavares, 2012, p.51)

Na filosofia Cristã, ainda no mundo antigo, a dignidade humana encontrava-se respaldo no Antigo Testamento, sob a afirmação de que o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus, e que tal semelhança, atribui ao homem uma posição privilegiada e de superioridade em relação aos demais seres vivos (Gênesis 1, 26).

Partindo do mesmo entendimento, Agostinho de Hipona (santo Agostinho) afirma que o homem é um animal racional criado por Deus à sua imagem, e que ao atribuir inteligência ao homem, permitiu-lhes sua elevação sobre todos os animais da terra, da água e do ar, pois estes eram desprovidos de um espírito deste gênero. (Paganini, 2020).

Em suas investigações sobre a interioridade humana, Agostinho elucida a riqueza intelectual e espiritual do indivíduo, no entanto, esta teoria segregava a ideia de igualdade, pois nem todos eram possuidores de “graça”, algo proveniente de Deus e que levava o ser humano em um caminho de fazer o bem. Neste sentido, para Agostinho, Deus concede a graça apenas para alguns eleitos, e com isso estariam predestinados à salvação (Remédio, 2021).

Em contrapartida, já na Idade Média, Tomas de Aquino fundamenta que a dignidade da pessoa não se limita apenas na concepção cristã do homem como imagem e semelhança de Deus. Para Aquino, a dignidade também se origina da capacidade de autodeterminação humana, em razão de sua natureza racional (Liguori, 2021, p.117).

Na obra Suma teológica I, Tomás de Aquino traz certa definição: “Pessoa significa o que é mais perfeito em toda a natureza, a saber, o subsistente na natureza racional”. Desta forma, entende-se que a dignidade guardaria enorme relação no que tange a concepção de pessoa, ou seja, é uma qualidade inerente ao ser humano, e que a racionalidade os distinguiria dos demais seres” (Aquino,2016, I, 29, 3).

Em meados do século XV, iniciando a idade moderna, ainda predominava a corrente de que o homem era superior em face dos demais seres vivos. Todavia não se extraia o sentido igualitário entres os homens, ou seja, não se reconhecia a todos os mesmos direitos e deveres, deste modo, durante um longo período prevaleceu uma concepção estamental das relações sociais, no qual presumia a existência de uma desigualdade natural entre os indivíduos, onde destinavam à uma parte o exercício de funções nobres perante a sociedade, quanto à outra parte lhes cabia o desempenho de trabalhos inferiores e de subordinação (Barros, 2022).

Portanto, desta corrente se extraia a ideia de que o simples pertencimento à raça humana não era suficiente para a igualdade entre as pessoas perante à sociedade. Foi no período do Renascimento onde ocorreu a transição entre a concepção pré-moderna e moderna sobre a dignidade humana (Cunha, 2012).

O pensador renascentista Giovanni Pico Della Mirandola entendia que a dignidade humana consistia na capacidade do ser humano em fazer suas escolhas de forma livre e independente acerca de sua existência e do próprio destino, afirmando que o homem é uma criatura de Deus, no entanto, com a liberdade de ação e decisão, desta forma para Pico tais atributos seriam auto suficientes para a dignificação do homem (Assis Dias, 2021).

Adentrando no campo do pensamento jusnaturalista, nos séculos XVII e XVIII, através do campo do racionalismo e iluminismo, onde as fontes e pensamentos baseavam-se na existência de Deus e pela religião, agora davam espaço ao homem, pelo qual torna-se a fonte de sentido da realidade (Paganini, 2020).

Foi no iluminismo que o discurso sobre a dignidade ganha de fato a relevância universal, havendo a preocupação com os direitos individuais do homem. Em destaque a Declaração de independência dos Estados Unidos de 1776 afirmara que todos os homens são criados iguais (Jefferson, 1776), no mesmo sentido, na França, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 em seu artigo 1º afirma que “todos os homens nascem livres e iguais em direito” (Remedio, 2021).

A ideia de igualitarismo foi explorada e manifesta em diversas obras de importantes filósofos da época, como por exemplo no Contrato Social de Rousseau, em que através do pacto convencional fosse instaurado um regime de igualdade entre os cidadãos, trazendo um viés participativo aos cidadãos no que tange a elaboração de leis e pela obediência de todos às normas estabelecidas.

O filósofo alemão, Immanuel Kant, contribuiu de forma significativa acerca da dignidade humana. O filósofo definiu a dignidade humana como um conceito laico, pertencente ao homem, pelo qual fundamenta-se sobre a razão prática e a autonomia ética inerente ao ser humano (Assis Dias, 2021).

Em sua obra Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Kant objetiva investigar qual é o princípio, por excelência, que regula a conduta humana. Diante disso, Kant entende que a razão, moral, liberdade, autonomia e vontade, estão todos entrelaçados. Sendo a razão uma característica humana, responsável pelas ações externas de forma autônoma, entendendo que os conceitos morais fundamentam-se na razão (Kant, 1998). Na teoria kantiana, a moral possui um valor supremo, deste modo as leis morais foram estruturados por meio dos chamados “imperativos categóricos”, constituindo como máximas de ações universais, válidas para todos e em qualquer situação, neste sentido nota-se a natureza igualitária das ações.

Ademais, foi na formulação do impeditivo categórico da dignidade que reside a maior contribuição de Kant para os estudos da dignidade do homem, evidenciando de forma explícita o viés igualitário, vejamos: “Aja de modo a usar a humanidade, tanto na sua pessoa quanto na pessoa de outrem, a todo instante e ao mesmo tempo como um fim, mas jamais apenas como um meio” (Kant, 2019, p. 48).

A ideia do filósofo na enunciação do respectivo impeditivo é de que o homem existe como um fim em si mesmo e não “como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade” (Kant, 2019, p.72). Portanto, sob a ótica da teoria kantiana, a noção de dignidade difere das noções da Antiguidade e da Idade Média, tendo em vista que o reconhecimento da dignidade humana está relacionado a um valor intrínseco e individual de cada ser humano.

Na contemporaneidade, nas primeiras décadas do século XX, em algumas Constituições começam a ser inseridos os direitos individuais. Neste período da história, o mundo foi palco de duas Guerras Mundiais, ainda na primeira metade do século XX. Com o fim da primeira Guerra Mundial, demonstrou-se a preocupação com os direitos sociais prestacionais do estado, e que passaram a ser introduzidos morosamente nos textos constitucionais.

A segunda Guerra Mundial, considerada essa a mais cruel e genocida delas, em face das atrocidades perpetradas pelo regime nazista alemão, sobretudo na ideia de uma pseudo supremacia da raça ariana em face das demais, onde determinadas minorias sofriam perseguições o que trouxe a mais terrível consequência na história da humanidade, o holocausto. Enxergou-se nesse período o total desprezo a vida humana, mau este causado pelo próprio homem.

Após o fim da segunda Guerra Mundial, se espalhou a ideia de que os países deveriam se organizar para assim evitar que as terríveis violações contra a humanidade viessem a acontecer, como resultado, em 24 de outubro de 1945 foi criado a Organização das Nações Unidas1 (ONU), posteriormente, após três anos de elaboração e debates entre os países entra em vigor a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), em 1948, enfatizando relevância da dignidade da pessoa humana, deixando explícita em seu preâmbulo:

Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo. […] Considerando que, na Carta, os povos das Nações Unidas proclamam, de novo, a sua fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor da pessoa humana […]. A assembleia geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos do Homem como ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações […].

A DUDH surgiu como a principal precursora da constitucionalização do princípio da dignidade da pessoa humana na maioria das Constituições, revelando-se como núcleo central do constitucionalismo, da democracia e dos direitos fundamentais.

1.1.1 A dignidade da pessoa humana como princípio da Constituição de 1988

O princípio da dignidade da pessoa humana, no âmbito do direito interno, encontra-se positivada no texto constitucional como fundamento do Estado Democrático de Direito, configurando-se como núcleo axiológico da Constituição. O Título I, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), trata sobre Os Princípios Fundamentais, é possível identificar a preocupação do constituinte originário em tratar do princípio da dignidade da pessoa humana como fundamento, constando em seu 1º artigo do texto constitucional.

Decisão acertada do constituinte, em demonstrar a relevância do princípio da dignidade da pessoa humana ao positivá-la no texto constitucional, sobre isso destaca Ingo Wolfgang Sarlet (2002, p. 68) alude:

Consagrando expressamente, no título dos princípios fundamentais, a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do nosso Estado democrático (e social) de Direito (art. 1º, inc. III, da CF), o nosso Constituinte de 1988 – a exemplo do que ocorreu, entre outros países, na Alemanha -, além de ter tomado uma decisão fundamental a respeito do sentido, da finalidade e da justificação do exercício do poder estatal e do próprio Estado, reconheceu categoricamente que é o Estado que existe em função da pessoa, e não o contrário, já que o ser humano constitui a finalidade precípua, e não meio da atividade estatal (Sarlet, 2002, p. 68).

Assente é, para a doutrina constitucional contemporânea que o princípio da dignidade da pessoa porta-se em uma amplitude gigantesca, tendo em vista a máxima relevância jurídica, cuja pretensão é a de ter a plena normatividade, neste sentido Alexandre de Moraes entende que: 

A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos e a busca ao Direito à Felicidade” (Morais, 2022, p. 17).

Destarte, tais valores possuem um status supremo, tendo em vista sua primariedade, pois é evidente que outros princípios derivam e necessitam da existência do princípio da dignidade da pessoa humana. Em uma concepção minimalista, a dignidade humana é identificada através da integração de três elementos, são eles: o valor intrínseco da pessoa humana, a autonomia individual e o valor comunitário (Barroso, 2023, p.91).

Sob esse prisma, o princípio da dignidade da pessoa humana, é utilizado como parâmetro para interpretações finalísticas, sobretudo no que tange às regras e a outros princípios, no âmbito interno, figurando como norma base (constitucional e infraconstitucional) do ordenamento jurídico, ou internacional, através dos tratados internacionais que versam sobre os direitos humanos, deste modo, qualifica-se como um super princípio.

Nesse sentido, o princípio da dignidade da pessoa humana funciona como base de orientação, limitação e parâmetro, no que se refere a interpretação, a todo o ordenamento jurídico, seja na elaboração de normas constitucionais e infraconstitucionais, ou através da análise jurisdicional das possibilidades fáticas e jurídicas existentes em um caso concreto, em que deverão ser observados, em todos os casos, a valoração essencial deste princípio, para que se tenha uma correta aplicação e entendimento da norma, caso contrário, se o parâmetro for desprezado estaremos diante de grave afronta à um princípio constitucional, o que restará configurado como inconstitucional a aplicação ou elaboração da norma.

O princípio da dignidade da pessoa humana está diretamente associado aos direitos fundamentais, conforme será demonstrado no tópico a seguir.

1.2 Os direitos fundamentais, efetividade e eficácia

No plano constitucional, os direitos fundamentais são aqueles que garantem a proteção e o mínimo necessário para que as pessoas possam viver de forma digna em uma sociedade, são direitos inalienáveis, que visam a concretização primária da dignidade da pessoa humana. Neste sentido, os direitos fundamentais são os direitos inerentes à pessoa humana incorporados no ordenamento jurídico, ou seja, estão positivados no texto constitucional.

Na Constituição brasileira, os direitos e garantias fundamentais foram inseridos pelo constituinte especificamente no Título II, subdividindo-os em cinco capítulos, trazendo consigo a classificação dos direitos fundamentais, sendo eles os direitos individuais e coletivos, políticos, sociais e difusos.

Direitos individuais e coletivos versam sobre a proteção do indivíduo ou da coletividade em face do Estado, são direitos ligados diretamente à pessoa humana, e incumbindo ao Estado o dever de garantir a observância de tais direitos, neste sentido o constituinte consagrou o artigo 5º2 como norteador para todo o ordenamento jurídico no que tange os direitos e garantias constitucionais. Desta forma, o artigo 5º traz em seus 79 incisos, o rol de direitos e garantias individuais e coletivas que devam ser tuteladas pelo Estado.

No que tange aos direitos políticos, o constituinte originário deixou um capítulo específico (capítulo III, artigos 14 a 16) para tratar de tais direitos, nos quais versam sobre a soberania popular e o seu exercício através do sufrágio universal, o alistamento eleitoral e as condições de elegibilidade, e por fim da possibilidade da perda dos direitos políticos. Sobre os direitos sociais, para Luiz Roberto Barroso, sua consagração marca a superação de uma perspectiva estritamente liberal do estado, […] seu objetivo é assegurar aos indivíduos vida digna e acesso às oportunidades em geral (Barroso, 2023, p. 205). Desta forma vejamos o que diz o artigo 6º da Constituição Federal:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. 

Dentre os direitos sociais em espécie, previstos no artigo supracitado, destacamos o direito à saúde, especificamente às crianças com Transtorno do Espectro Autista, tema este pertinente ao presente Projeto e que será abordado em tópicos à frente.

Não basta apenas a existência dos direitos fundamentais, é necessário que haja efetividade nas normas. A ideia de efetividade significa, em suma, a satisfação do Direito. Para Barroso (2023), a efetividade representa a materialização, no mundo dos fatos, dos preceitos legais e simboliza a aproximação entre o dever-ser normativo e o ser da realidade social.

Ademais, conforme leciona Barroso, a efetividade da Constituição deve assentar-se sobre alguns pressupostos indispensáveis, nesse sentido:

[…] é preciso que haja, da parte do constituinte, senso de realidade, para que não pretenda normatizar o inalcançável, o que seja materialmente impossível em dado momento e lugar. Ademais, deverá ele atuar com boa técnica legislativa, para que seja possível vislumbrar adequadamente as posições em que se investem os indivíduos, […] Em terceiro lugar, impõe-se ao Poder Público vontade política, a concreta determinação de tornar realidade os comandos constitucionais. E, por fim, é indispensável o consciente exercício da cidadania, mediante a exigência, por via de articulação política e de medidas judiciais, da realização dos valores objetivos e dos direitos subjetivos constitucionais. (Barroso, 2023, p 81).

Quanto à eficácia dos direitos fundamentais, a Constituição de 1988 estabelece que “as normas definidoras dos direitos e garantias têm aplicabilidade imediata”, conforme se lê no art.5º, § 1º da CRFB/88. O texto refere-se aos direitos fundamentais em geral, ou seja, não se restringe apenas aos direitos individuais.

Quanto a aplicabilidade, José Afonso da Silva define que as normas constitucionais, comportam uma classificação tricotômica, definidas da seguinte forma:  

a) normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade imediata;
b) normas constitucionais de eficácia contida e aplicabilidade imediata, mas passíveis de restrição;
c) normas constitucionais de eficácia limitada ou reduzida, que compreendem as normas definidoras de princípio institutivo e as definidoras de princípio programático, em geral dependentes de integração infraconstitucional para operarem a plenitude de seus efeitos (Da Silva, 1984).

Conforme se depreende no texto supra, as normas constitucionais dividem-se em três tipos; em normas de eficácia plena, no qual sua aplicabilidade é imediata; normas de eficácia contida, onde a aplicabilidade é passível de restrição; e normas de eficácia limitada, cuja sua a aplicabilidade é de forma limitada ou reduzida, ou seja, há necessidade de norma infraconstitucional para regulamentar e deste modo garantir a aplicação da norma.

A ideia de aplicabilidade, eficácia e efetividade das normas constitucionais dependem, para a satisfação de um direito, necessariamente, da vigência da norma, neste sentido José Afonso da Silva entende que a qualidade da norma consiste na vigência que a faz existir juridicamente, deste modo, a partir da entrada em vigor no ordenamento jurídico, a norma torna-se de observância obrigatória, outrossim, sua vigência constitui verdadeiro pressuposto da eficácia, visto que apenas a norma vigente vislumbra ser eficaz.

Por outro lado, a vigência de uma norma não se confunde, necessariamente, com a sua validade, tendo em vista que a norma pode vir a entrar em vigor independente de sua validade, e neste sentido integrar o ordenamento jurídico (Sarlet et al., 2023, p.75), como nos casos de normas (eivadas de vícios) declaradas inconstitucionais por meio do controle repressivo de constitucionalidade. 

1.2.1 Direito social à saúde 

O direito à saúde, positivado no texto constitucional como um direito fundamental, e classificado como Direito Social, conforme previsto no artigo 6º da CRFB/88, mencionado no tópico anterior, é um direito universal, ou seja, é um direito de todos e cabe ao Estado o dever de garantir que esse direito seja resguardado, nesse sentido o artigo 196 da CRFB/ 88 dispõe:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

O direito à saúde é, sobretudo, indispensável para o exercício de outros direitos, tendo em vista a sua condição integralmente associada à integridade física e psíquica de um indivíduo, deste modo, o texto constitucional atribui a relevância pública nas ações e serviços de saúde, e sua integralidade no atendimento, cabendo à União e todos os Entes Federados a promoção e proteção do acesso à saúde.

O direito social à saúde é um dos direitos fundamentais assegurados pela Constituição Federal de 1988. Esse direito garante a todos os cidadãos o acesso universal, igualitário e gratuito aos serviços de saúde. Isso significa que, independentemente de sua condição financeira, qualquer pessoa deve ter acesso a serviços públicos de saúde que garantam a sua dignidade e integridade física e mental.

A saúde é um direito social que está intimamente ligado ao direito à vida e à dignidade humana. O acesso a serviços de saúde de qualidade é fundamental para garantir que todos os indivíduos possam desenvolver suas potencialidades, ter uma vida saudável e contribuir para o desenvolvimento da sociedade (MORAIS, 2018). O direito social à saúde é uma obrigação do Estado. Isso significa que o Estado é responsável por criar políticas públicas que garantam o acesso universal, igualitário e gratuito aos serviços de saúde. O Estado deve fornecer recursos financeiros e materiais para a implementação dessas políticas e para a construção e manutenção de hospitais, clínicas e postos de saúde.

O Sistema Único de Saúde (SUS) é o principal instrumento do Estado para garantir o direito social à saúde. O SUS foi criado em 1988 e é um sistema público de saúde que tem como objetivo garantir o acesso universal, igualitário e gratuito aos serviços de saúde. O SUS é financiado com recursos públicos e é responsável por atender a toda a população brasileira, independentemente da condição financeira (BERGONZI, 2015).

O direito social à saúde não se resume apenas ao acesso aos serviços de saúde. Ele engloba também a prevenção de doenças, a promoção da saúde e a garantia de condições de vida saudáveis para toda a população. Isso significa que o Estado deve desenvolver políticas públicas que visem à melhoria da qualidade de vida da população, como a garantia de saneamento básico, o acesso à água potável, a melhoria das condições de moradia e o acesso à educação e ao trabalho.

De acordo com Aquino (2017) o direito social à saúde também implica a garantia da participação social na gestão do SUS. Isso significa que a população deve ter voz ativa na definição das políticas públicas de saúde e na fiscalização do funcionamento do sistema. O SUS é um sistema público e democrático, e a participação da sociedade é fundamental para garantir a sua efetividade. O direito social à saúde é um direito fundamental que garante a todos os cidadãos o acesso universal, igualitário e gratuito aos serviços de saúde. É uma obrigação do Estado garantir esse direito por meio da criação de políticas públicas que visem à promoção da saúde e da qualidade de vida da população. A participação social na gestão do SUS é fundamental para garantir a efetividade desse direito e para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

O direito à saúde está previsto na Constituição Federal do Brasil de 1988, sendo considerado um direito social, fundamental e universal. A Constituição estabelece que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (art. 196) (DANIELLI, 2016).

Para assegurar a efetivação desse direito, a Constituição estabelece uma estrutura normativa que abrange a formulação de políticas públicas de saúde, a organização e o funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS), a participação da sociedade na gestão do SUS e a garantia do acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde.

A formulação de políticas públicas de saúde é atribuição do poder público em seus diferentes níveis, devendo ser baseada em princípios como a universalidade, a integralidade e a equidade. A Constituição estabelece que “as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: descentralização, atendimento integral e participação da comunidade” (art. 198) (SOARES, 2017).

Em resumo, a Constituição Federal do Brasil estabelece o direito à saúde como um direito social, fundamental e universal, e estabelece uma estrutura normativa que garante a formulação de políticas públicas de saúde, a organização e o funcionamento do SUS, a participação da sociedade na gestão do sistema e a garantia do acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde.

As políticas públicas são definidas como ações do Estado voltadas para a garantia dos direitos e das necessidades da população em diferentes áreas, como saúde, educação, segurança, meio ambiente, entre outras. Segundo Bresser-Pereira (1996), as políticas públicas são “um conjunto de ações coletivas voltadas para a resolução de problemas públicos”. Elas são formuladas pelo Estado a partir de demandas sociais e têm como objetivo atender aos interesses coletivos (ABAL, 2016).

As políticas públicas são, portanto, um instrumento de intervenção do Estado na sociedade, com o objetivo de garantir o bem-estar e a qualidade de vida da população. Segundo Arretche (2012), às políticas públicas são “ações governamentais que visam à solução de problemas públicos, por meio de medidas legais, administrativas ou financeiras”. Elas são elaboradas a partir de uma análise dos problemas sociais e das demandas da população.

Para Dye (2008), as políticas públicas são “escolhas governamentais que visam à resolução de problemas específicos, por meio de uma ação coletiva”. Elas são, portanto, um processo de tomada de decisão que envolve a formulação, implementação e avaliação de ações do Estado em resposta às demandas sociais. As políticas públicas também são definidas como um processo de interação entre o Estado e a sociedade. Segundo Sabatier (2007), as políticas públicas são “resultantes de um processo complexo e multifacetado de interação entre atores estatais e não estatais, em que são negociados os objetivos, as metas e os recursos destinados à solução de problemas públicos”.

As políticas públicas são, portanto, um instrumento de realização dos direitos sociais e da cidadania. Segundo Dagnino (2002), as políticas públicas são “um conjunto de práticas e saberes que visam a garantir a realização dos direitos sociais e da cidadania”. Elas são elaboradas com base nos princípios da democracia e da participação social, com o objetivo de garantir a igualdade e a justiça social.

Por fim, as políticas públicas são definidas como um processo dinâmico e em constante evolução. Segundo Souza (2006), as políticas públicas são “um processo histórico e dinâmico que envolve a formulação, implementação e avaliação de ações do Estado em resposta às demandas da sociedade”. Elas estão em constante evolução e são influenciadas por fatores políticos, sociais, econômicos e culturais.

Nesse contexto, resta claro a alta relevância do direito à saúde, motivo este de o constituinte possibilitar a promoção da assistência à saúde, livremente, à iniciativa privada, de forma complementar.

2 O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA 

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição neurobiológica complexa que afeta o desenvolvimento do cérebro, influenciando a maneira como uma pessoa percebe e interage com o mundo ao seu redor. Este transtorno engloba uma ampla gama de desafios, manifestando-se de maneira única em cada indivíduo, daí o termo “espectro”.

Ao longo das últimas décadas, houve um aumento significativo na conscientização e no diagnóstico do TEA, proporcionando uma compreensão mais aprofundada dessa condição. Caracterizado por déficits na comunicação social, padrões restritos e repetitivos de comportamento, o TEA desafia não apenas aqueles que o vivenciam, mas também suas famílias, educadores e profissionais de saúde.

Serão explorados os principais aspectos do TEA, desde sua definição e contexto histórico. Ao examinar de perto essa condição, podemos aumentar a conscientização, reduzir estigmas e promover uma sociedade mais inclusiva e compreensiva para aqueles que vivem com o transtorno do espectro autista.

2.1 O contexto histórico e conceito do transtorno do espectro autista (TEA)

De acordo Silva, ele nos deu um detalhe muito informativo sobre como uma criança com TEA (Transtorno do Espectro do Autismo) se sente e como ela é especial. Segundo os autores, o TEA é um transtorno global do desenvolvimento infantil que se manifesta antes dos 3 anos e persiste por toda a vida”. Segundo o autor, o TEA é caracterizado por uma gama de sintomas que afetam os domínios da socialização, comunicação e comportamento”, ressaltando que nestes domínios, as interações costumam ser as mais prejudicadas (Silva, 2012, p.6).

O surgimento da nomenclatura autismo é atribuída a Plouller em 1906, como promove a pesquisa sobre os processos de pensamento de indivíduos diagnosticados com demência; entretanto, a palavra autismo passou a ter maior disseminação em 1911 por meio dos estudos do psiquiatra suíço Eugen Bleuler, que usou o nome para indicar pacientes esquizofrênicos segundo Dias (2015, p. 1 apud Ribeiro, 2020, p. 24).

Os autores acima nos fazem perceber que a criança autista é um ser puro, neutro, grandioso e único do jeito que é, ainda que dentro de si existam milhões de mundos a serem descobertos. Chama nossa atenção para não nos deixarmos contaminar pelos estereótipos da sociedade sobre as pessoas com autismo. Portanto, “conhecer um autista, na visão do autor, é ter a oportunidade de participar do milagre de todos os dias”, ou seja, redescobrir a cada dia as coisas novas que existem no novo começo (Silva, 2012, p.9).

Em conformidade com Silva (2012) afirmou que é possível que crianças com TEA tenham inteligência extraordinária e sejam capazes de tocar belas melodias no piano sem ter que ter aulas de música. Existe até um caso em que as habilidades podem ser desenvolvidas por meio de cálculos matemáticos, uma matéria que não foi ensinada em nenhuma escola antes. Mas também é possível que crianças com autismo tenham capacidade severamente limitada de raciocinar, aprender e autonomia, exigindo sempre intervenção e apoio constantes para as atividades mais simples. Portanto, não existe um padrão único de comportamento.

As formas de genialidade que podem estar presentes no TEA são conhecidas como savant, que são pessoas brilhantes que apresentam habilidades extraordinárias e que segundo pesquisas, somente 10% das pessoas com TEA tem essa particularidade (Silva, 2015, p. 1 apud Ribeiro, 2020, p. 24). Essa alteração ocorre porque o TEA não é um grupo unificado. Existem vários casos, cada um com uma variante específica, com características de Asperger, leve, de alto funcionamento ou características autistas típicas.

Consoante Brito (2021), o conceito de TEA ainda é novo e pouco compreendido. As pessoas costumam usar o termo “autismo” para se referir a todas as variantes do TEA. Contudo, como o TEA não se manifesta de forma única, use o termo TEA com a compreensão do fato de que essa linhagem é caracterizada por mudanças que “transitam por déficits triplos no social, na comunicação e no comportamento”, domínio”. Mas nem todas essas dificuldades surgem no mesmo caso” (Silva, 2012, p. 64).

No que tange as doutrinas recentes no que diz respeito ao TEA como uma doença com variantes e subdivide essas variantes em pelo menos quatro categorias, desde as mais leves (menos acometidas) até as mais altas (mais acometidas), possivelmente sim, dividido em:

a) Traços de autismo (cujas características são bem leves);
b) Síndrome de Asperger (possuem alguns comprometimentos básicos, mas com um nível intelectual e de habilidades importantes);
c) Autismo de alto funcionamento (os savant);
d) Autismo Clássico (o que apresenta maior comprometimento, inclusive intelectual) (Oliveira, 2016, p. 14).

Entre aqueles com TEA, destacamos aqueles com síndrome de Asperger. Estes são muitas vezes confundidos com acadêmicos, mas há uma diferença entre eles. As crianças com Asperger muitas vezes têm “interesse limitado em certas áreas” e os acadêmicos “se comportam de forma anormal, com pelo menos uma habilidade especial” (Silva, 2012, p.100).

É relevante ressaltar que em todas as pessoas com TEA existem potencialidades e algumas limitações, porém, é necessário que a sociedade reconheça essas potencialidades e estimule a autonomia e o desenvolvimento desses indivíduos, valorizando cada conquista. Dessa forma, veremos mais exemplos no Brasil e no mundo de pessoas com autismo superando dificuldades e canalizando seus talentos de forma adequada com a ajuda de familiares ou profissionais para desempenhar um papel importante na sociedade (Silva, 2012, p. 106).

2.2 Os Sintomas e o Diagnóstico

No passado, muitas pessoas apontaram que o Transtorno do Espectro Autista (TEA) está relacionado aos genes dos pais que passam a síndrome para os filhos, mas com o advento da ciência, isso não foi comprovado porque ainda não é conhecido por ser qual gene causa autismo. Isso torna difícil dizer o que causa a doença. O comunicado descartou a possibilidade de a síndrome ser hereditária.

Contudo, especialistas apontam que algumas medidas preventivas não podem ser abandonadas durante a gravidez para minimizar a chance de desenvolver TEA no feto, sugerindo que algumas suspeitas podem estar relacionadas a fatores ambientais, uso de drogas etc. Sendo assim, as gestantes são orientadas a serem adequadamente acompanhadas durante a gravidez e evitarem o consumo de álcool, fumo, uso de substâncias tóxicas e uso de drogas que possam prejudicar o desenvolvimento da criança.

Pesquisas recentes mostraram que muitos fatores justificam todas as dificuldades de comunicação e interação com pessoas com TEA. Os dados mostraram que a estrutura do cérebro apresentava sintomas que diferiam bem entre aqueles com TEA e aqueles sem. De acordo com a pesquisa, os neurônios (células nervosas) em pessoas com autismo têm função prejudicada, […] uma explicação melhor é que podemos dizer que em pessoas com TEA não ocorre a ativação de neurônios-espelho. Os neurônios disparam quando uma pessoa com TEA faz uma ação, mas não quando o sujeito observa outra pessoa se movendo (Silva, 2012, p.87).

Ainda segundo os mesmos autores, outra habilidade que os sujeitos com TEA não conseguem perceber é o comportamento e as características faciais de outras pessoas, por isso precisam de tempo para interagir, pois não entendem suas próprias intenções, sentimentos, emoções e atitudes. As crianças com TEA também apresentam dificuldade em planejar e realizar tarefas, e o apego às rotinas muitas vezes lhes traz conforto e segurança.

A pesquisa também mostrou que as pessoas com autismo não conseguem “juntar as informações como um todo”, ou seja, não entendem como tudo aconteceu porque se concentram nos detalhes sem considerar o contexto histórico atual da doença, onde inserir (Silva, 2012, p.129).

À vista disso, percebe-se que as pessoas com autismo são diagnosticadas por meio de suas histórias de vida e observações detalhadas de seu comportamento, desde a gestação da mãe até o presente. Para obter um diagnóstico detalhado, o pai ou a babá não deve perder nenhum detalhe da vida da criança e passar todas as informações ao especialista em detalhes. Portanto, o diagnóstico não é feito em um momento específico, mas o resultado do acompanhamento.

Os primeiros sintomas da criança com autismo podem ser observados pelos pais desde cedo, desde a estimulação dos primeiros meses de vida do bebê até todo o processo de desenvolvimento. Todavia, um diagnóstico de um profissional da área pode ser obtido por volta dos 3 anos. Para diagnosticar, esses profissionais investigam toda a vida da criança e tudo que pareça suspeito sobre seu desenvolvimento. Para isso, os pais, babás e familiares serão os principais canais de comunicação e informação, e auxiliarão os profissionais a fazer um bom diagnóstico, pois qualquer detalhe faz parte de uma ferramenta essencial para conhecer a criança observada (OLIVEIRA, 2016, p. 16). Uma das principais características do TEA é o desinteresse pela sociedade e a dificuldade de interpretar sinais e símbolos. Como resultado, a sua comunicação verbal e não verbal torna-se bastante difícil e, consequentemente, a falta de interesse por determinados temas (Oliveira, 2016, p. 16).

Pessoas com TEA têm padrões diferentes. Alguns têm seus próprios interesses e suas próprias características, que são repetitivas e mesquinhas. Outros pulam, balançam para frente e para trás, acenam, batem palmas, fazem caretas ou ficam olhando para um objeto, mostram preferências exageradas por trens, aviões, dinossauros, bandeiras, carros etc. é difícil participar de grupos e fazer planos de longo prazo (Oliveira, 2016, p. 16).

A socialização é muito considerável para essas pessoas com TEA porque desenvolve áreas danificadas de seus cérebros que as impedem de interagir com os outros e as mantêm vivendo em seu próprio “pequeno mundo”. As formas de socialização em pessoas com TEA muitas vezes são restritivas, pois, na visão dele, o local costuma ser ameaçador.

Através das dificuldades sociais, as crianças com autismo “não têm curiosidade social e, portanto, não aprendem espontaneamente a relatar os acontecimentos”. Como resultado, por não saberem relatar seus acontecimentos do dia a dia, não entendem quando são vítimas de agressões físicas ou verbais, e essa falta de compreensão é causada pela incompreensão das intenções das pessoas e seu verdadeiro comportamento (Silva, 2012, p.22).

Muitas vezes se ouvem relatos de mães tendo que assumir a responsabilidade por seus filhos com TEA sozinhas. Mãe que foi abandonada pelo marido após ser diagnosticada. Sem apoio e companhia, certamente não é fácil enfrentar este desafio. Por isso, a união do casal é importante para que superem as dificuldades que enfrentam no dia a dia. O mais importante, além de conhecer o assunto, sintam-se apoiados um pelo outro, mas aproveitem seu tempo. Portanto, quanto mais autonomia desenvolverem em seus filhos, maiores serão suas chances de viver uma vida feliz, saudável e prazerosa na família.

2.3 As principais disposições constitucionais relacionadas à pessoa com deficiência

A Constituição Federal do Brasil, promulgada em 1988, é um documento fundamental que estabelece os princípios e direitos fundamentais da nação. Entre esses princípios, está a proteção dos direitos e da dignidade de todas as pessoas, incluindo aquelas com deficiência. A Carta Magna representa um compromisso com a inclusão, igualdade e respeito às diversidades, reconhecendo que a pessoa com deficiência merece um tratamento justo e igualitário em todas as esferas da sociedade.

A Constituição Federal aborda a questão da pessoa com deficiência de várias maneiras. Um dos princípios fundamentais da Constituição é o da igualdade perante a lei. Isso significa que todas as pessoas, independentemente de sua condição física ou mental, têm o direito de serem tratadas de maneira justa e igualitária. Nenhum tipo de discriminação, seja no acesso à educação, ao emprego, à saúde ou a qualquer outro serviço público, é tolerado.

Além disso, a Constituição estabelece diretrizes específicas para a inclusão das pessoas com deficiência. No campo da educação, por exemplo, é garantido o acesso a uma educação de qualidade, que deve ser adaptada às necessidades individuais das pessoas com deficiência. Esse princípio é essencial para permitir que essas pessoas alcancem seu pleno potencial e participem ativamente na sociedade.

A questão da saúde também é abordada, garantindo o acesso a serviços de saúde adequados e a promoção de políticas públicas que atendam às necessidades específicas das pessoas com deficiência. Além disso, a Constituição prevê a assistência social como um direito fundamental, o que inclui benefícios e serviços voltados para as pessoas com deficiência e suas famílias.

No âmbito do trabalho, a Constituição proíbe a discriminação com base na deficiência, assegurando oportunidades iguais e a adaptação dos ambientes de trabalho para a inclusão. Esse compromisso com a igualdade de oportunidades é fundamental para garantir que as pessoas com deficiência tenham acesso ao mercado de trabalho e possam contribuir de forma significativa para a sociedade.

Além disso, a Constituição reconhece a importância da cultura e valoriza as manifestações culturais das pessoas com deficiência. Isso demonstra a preocupação em promover a diversidade cultural e garantir que as vozes e as expressões artísticas das pessoas com deficiência sejam respeitadas e valorizadas.

Desta forma, a Constituição Federal do Brasil estabelece um sólido alicerce de direitos e princípios que visam à inclusão e igualdade das pessoas com deficiência. Ela não apenas proíbe a discriminação, mas também estabelece diretrizes concretas para a promoção de uma sociedade mais inclusiva, onde todas as pessoas, independentemente de suas capacidades físicas ou mentais, tenham a oportunidade de desfrutar de uma vida digna e participar plenamente na sociedade. No entanto, é importante lembrar que a efetiva implementação desses princípios requer um compromisso contínuo por parte da sociedade e do Estado, visando garantir que as promessas da Constituição se tornem uma realidade para as pessoas com deficiência. Veremos os principais artigos da Carta Magna que resguardam os direitos mais básicos de um ser humano.

A Constituição Federal do Brasil de 1988 estabelece diversos artigos relacionados aos direitos das pessoas com deficiência, buscando garantir sua igualdade e inclusão na sociedade. O Artigo 5º estabelece a Igualdade perante a lei, vejamos:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes (Brasil, 1988).

Sendo assim, é assegurado que todas as pessoas, incluindo aquelas com deficiência, são iguais perante a lei, sem qualquer forma de discriminação. Já o artigo 205 garante o acesso à educação, in versus:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (Brasil, 1988).

Portanto, este artigo estabelece que a educação é um direito de todos, incluindo as pessoas com deficiência, visando à sua plena inclusão na sociedade.

O artigo 196 da Constituição Federal trata sobre o direito ao acesso à saúde:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (Brasil, 1988).

Este artigo garante o acesso universal à saúde, assegurando que as pessoas com deficiência tenham acesso a serviços de saúde adequados. O artigo 224 da CF versa sobre a acessibilidade:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação da EC 65/2010). (Brasil, 1988).

Portanto, este artigo destaca a importância de garantir a acessibilidade das crianças com deficiência a locais de ensino, saúde e lazer. Este mesmo artigo também prevê a proteção especial à infância da criança com deficiência, assegurando seus direitos à vida, saúde e convivência familiar. A proteção ao trabalho, o artigo 7º estabelece direitos trabalhistas, incluindo a proibição de discriminação no ambiente de trabalho, garantindo oportunidades iguais para pessoas com deficiência.

O direito a assistência social no artigo 203:

Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I – a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
II – o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III – a promoção da integração ao mercado de trabalho; (Brasil, 1988).

Este artigo prevê a assistência social como direito fundamental, assegurando benefícios e serviços às pessoas com deficiência e suas famílias. O acesso à justiça descrito no artigo 277 aborda a adaptação do processo judicial para garantir o acesso à justiça às pessoas com deficiência, incluindo intérpretes de língua de sinais, por exemplo.

Por fim, o princípio da dignidade humana, no artigo 1º da Constituição estabelece como fundamento da República o princípio da dignidade da pessoa humana, o que implica na proteção e promoção dos direitos das pessoas com deficiência, assegurando-lhes uma vida plena e inclusiva. Esses artigos da Constituição Federal refletem o compromisso do Brasil em garantir os direitos e a igualdade das pessoas com deficiência, promovendo sua inclusão em todas as esferas da sociedade.

3 A SAÚDE SUPLEMENTAR E AGÊNCIA NACIONAL DA SAÚDE SUPLEMENTAR – ANS

A implementação e estruturação da saúde suplementar no Brasil ocorreu na década de 50, com o surgimento dos Institutos de Aposentadorias e pensões (IAPs), neste contexto, devido aos inúmeros descontentamentos com o serviço prestado, surgiram os primeiros planos de saúde, ocasionando a expansão da saúde suplementar nos anos seguintes.

Com o avanço nos procedimentos ofertados, atualmente os planos de saúde dispõem de uma ampla cobertura para os mais variados tratamentos, dentre tal amplitude encontra-se a cobertura assistencial aos beneficiários com Transtornos Globais de Desenvolvimento (TGD), dentre eles o Transtorno do Espectro Autista (TEA).

O sistema de saúde no Brasil é caracterizado por sua natureza híbrida, onde o sistema público e o sistema privado coexistem. Nesse contexto, diferentes arranjos institucionais foram estabelecidos, delineando o cenário da saúde no país, como segue:

Rede Própria do Sistema Único de Saúde (SUS): Nesse arranjo, a saúde é financiada exclusivamente com recursos públicos, e os serviços de saúde são fornecidos diretamente pelo Estado. Essa é a essência do sistema de “saúde pública”, com o Sistema Único de Saúde (SUS) como pilar central:
Instituição Privada Não Lucrativa de Caráter Filantrópico: Essas instituições atuam no setor privado, mas sem fins lucrativos, com o objetivo de prestar assistência médico-hospitalar. Elas desempenham um papel relevante na complementação dos serviços de saúde e na oferta de cuidados à população.
Instituição Privada com Fins Lucrativos Contratada (Privado SUS): Nesse caso, o SUS contrata serviços e infraestrutura de saúde de entidades privadas com fins lucrativos. Isso representa uma extensão da atuação do sistema de saúde pública para o setor privado, ampliando a capacidade de atendimento. Instituição Privada com Fins Lucrativos Autônoma (Privado Não SUS ou Privado Exclusivo): Esse segmento compreende cidadãos que adquirem serviços de saúde diretamente da iniciativa privada, muitas vezes por meio de seguros de saúde. Essa é a esfera da “saúde suplementar”, onde a natureza da relação é mercantil e contratual Sant’ana, 2017, p. 63).

A saúde suplementar se caracteriza pela oferta privada de serviços médico-hospitalares por operadoras de planos de saúde. Essas operadoras operam com o objetivo de obter lucro, o que confere uma dimensão mercantil e contratual às relações nesse setor. Historicamente, a saúde suplementar operou com pouca regulamentação, mas com o tempo, limitações foram impostas para conter sua completa liberdade de atuação (Pereira, 2020).

Essas restrições foram estabelecidas principalmente por meio da Lei nº 9.956, de 03 de junho de 1998, e da Lei 9.961, de 28 de janeiro de 2000, que são consideradas marcos regulatórios do setor de saúde suplementar. Essas leis buscaram equilibrar o mercado, garantir a qualidade dos serviços e proteger os direitos dos consumidores que fazem uso dos planos de saúde privados (Costa, 2008, p. 4).

Antes da implementação dessas leis regulatórias, as operadoras de planos de saúde costumavam oferecer contratos abusivos, focados apenas em seus próprios interesses, sem cobertura para tratamentos de alto custo e com restrições para internações e procedimentos. Isso resultava em opções desfavoráveis para os beneficiários dos planos de saúde (Pinto; Soranz, 2004, p. 87).

A Lei nº 9.956/1998 introduziu importantes direitos para os beneficiários dos planos de saúde, tais como a definição de coberturas obrigatórias, garantia de internações hospitalares sem limite de tempo, proibição da exclusão de qualquer doença, regulamentação dos reajustes, funcionamento das operadoras, garantias financeiras e ressarcimento ao SUS, entre outras normas. A Lei nº 9.961/2000 criou a ANS, uma agência vinculada ao Ministério da Saúde, responsável pela regulação, normatização, controle e fiscalização das atividades da saúde suplementar (ANS, 2022 a). A ANS tem como missão institucional defender o interesse público na assistência suplementar à saúde, regulando as operadoras e contribuindo para o desenvolvimento das ações de saúde (Brasil, 2000). Uma de suas atribuições legais é a elaboração do rol de procedimentos da ANS.

É importante esclarecer que o rol da ANS é uma extensa lista de procedimentos que as operadoras são obrigadas a cobrir. Sua elaboração leva em consideração fatores como segurança, efetividade e custo, visando estabelecer direitos e obrigações entre os beneficiários e as operadoras (Martinez, 2018, p. 31).

De acordo com a ANS, o rol de Procedimentos e Eventos em Saúde garante e torna público o direito assistencial dos beneficiários dos planos de saúde, a partir de 1º de janeiro de 1999, abrangendo procedimentos indispensáveis ao diagnóstico, tratamento e acompanhamento de doenças e eventos em saúde, conforme previsto na Lei 9.656/1998 (ANS, 2022b).

A elaboração deste rol gerou uma questão controversa na doutrina e na jurisprudência, relacionada à amplitude da cobertura assistencial para os consumidores contratantes dos planos de saúde. A questão central é se, na ausência de previsão no rol da ANS, é possível fornecer cobertura para procedimentos em nome de direitos subjetivos, como o direito à vida e à dignidade da pessoa humana (Pereira, 2020, p. 151).

Diante desse questionamento, surgiram duas interpretações na doutrina e na jurisprudência. A primeira interpretação considera o rol como taxativo, ou seja, exclui da obrigatoriedade os procedimentos não listados. Argumenta-se que fornecer procedimentos excluídos do rol poderia ter impactos indesejados no mercado regulado, causando instabilidade no setor privado de saúde (Pereira, 2020, p. 151). Essa interpretação é apoiada nos direitos fundamentais à livre iniciativa, à liberdade contratual e à propriedade privada (Martinez, 2018, p. 16).

A segunda interpretação considera o rol como exemplificativo, sendo apenas uma referência mínima a ser fornecida pelas operadoras de planos de saúde. Argumenta-se que os consumidores não têm como prever seus riscos futuros (Machado, 2022, p. 21). Além disso, essa interpretação enfatiza a importância de hierarquizar as normas e limitar o poder normativo das agências reguladoras, com base na proteção do direito à saúde, na Lei nº 9.656/1998 e no Código de Defesa do Consumidor (Alvez, 2022, p.1). Também é argumentado que o prazo de dois anos para a atualização do rol pela ANS não é suficiente para acompanhar avanços tecnológicos e o surgimento de novas doenças, como a pandemia de COVID-19 (Machado, 2022, p. 16).

Conforme destacado anteriormente, o autismo é uma condição neurobiológica que afeta a capacidade de uma pessoa interagir socialmente e de se comunicar de forma eficaz. Pessoas com autismo muitas vezes necessitam de cuidados de saúde especiais, incluindo terapias comportamentais e ocupacionais, intervenções educacionais personalizadas, além de assistência médica regular. Essas necessidades podem ser custosas e desafiadoras para as famílias, especialmente quando elas possuem planos de saúde suplementar.

A ANS tem um papel importante na garantia de que os planos de saúde suplementar ofereçam cobertura adequada para pessoas com autismo. No entanto, até o meu conhecimento em janeiro de 2022, a regulamentação em relação ao autismo ainda estava evoluindo. É fundamental que a ANS atue de forma proativa para estabelecer diretrizes claras e atualizadas em relação à cobertura de tratamentos e terapias para pessoas com autismo nos planos de saúde suplementar. Isso garantiria que as famílias tenham acesso a serviços de qualidade sem enfrentar barreiras financeiras excessivas.

Cabe mencionar que a ANS já realizou algumas ações nesse sentido, como a inclusão da Terapia ABA (Análise do Comportamento Aplicada) na cobertura dos planos de saúde suplementar. No entanto, é importante que essa atuação seja contínua e que haja monitoramento constante para garantir que as necessidades das pessoas com autismo sejam atendidas de maneira adequada.

Neste contexto, as palavras do psicólogo e pesquisador Ángel Rivière são pertinentes “o autismo não é uma escolha, mas a inclusão é” (Rivière, 1997). A atuação da ANS em relação ao autismo deve ser guiada pelo princípio da inclusão, assegurando que as pessoas com autismo tenham acesso a serviços de saúde suplementar que lhes permitam desenvolver seu potencial e levar uma vida plena e saudável.

Sendo assim, a Agência Nacional de Saúde Suplementar desempenha um papel fundamental na regulação dos planos de saúde suplementar no Brasil. No que diz respeito ao autismo, é essencial que a ANS continue aprimorando suas regulamentações e diretrizes para garantir que as necessidades das pessoas com autismo sejam atendidas de maneira adequada, promovendo a inclusão e a igualdade no acesso aos serviços de saúde suplementar.

3.1. Tratamentos disponibilizados pelos planos de saúde à pessoa com transtorno do espectro autista 

É importante destacar que o direito à saúde é um direito fundamental consagrado na Constituição Federal, conforme previsto em seu artigo 196. O texto do artigo é o seguinte:

“Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.” (BRASIL, 1988).

Além disso, a Lei dos Planos de Saúde (Lei 9.656 de 1998), em seu artigo 10, estabelece a obrigatoriedade da cobertura, por parte dos planos de saúde, das doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde da Organização Mundial de Saúde. Nessa lista, encontra-se o Transtorno do Espectro do Autismo, identificado pelo código 6A02 (Cavalieire, 2021)

Posteriormente, a Lei 12.764 de 2012 instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, que determina a obrigatoriedade do fornecimento de atendimento multiprofissional aos pacientes com autismo (Duarte, 2015).

No entanto, apesar dessas disposições legais destinadas a amparar as pessoas com autismo, as operadoras de planos de saúde frequentemente negavam solicitações de tratamentos requeridas pelos pacientes. Isso criava um impasse para as famílias, uma vez que enfrentavam custos elevados ao tentar contratar, de forma particular, uma equipe multidisciplinar composta por psicólogos, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, entre outros, muitas vezes sem recursos financeiros para arcar com esses custos.

Por outro lado, ao aceitarem as negativas abusivas das operadoras, as famílias comprometiam o desenvolvimento neuropsicomotor dos pacientes ao optar por não realizar terapias multidisciplinares. Mesmo na ausência de uma disposição legal ou administrativa mais específica sobre a obrigatoriedade dos planos de saúde cobrirem tratamentos para pessoas com autismo, o poder judiciário frequentemente decidia a favor dos pacientes quando solicitados a conceder tratamentos pelas operadoras. A jurisprudência costumava ter um entendimento quase unânime de que as operadoras deveriam ser responsáveis por cobrir integralmente o tratamento com base no laudo médico.

Para preencher essa lacuna e atender aos anseios da sociedade, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) aprovou a Resolução Normativa 539 em 23 de junho de 2022, eliminando quaisquer dúvidas sobre a responsabilidade das operadoras de planos de saúde em cobrir tratamentos necessários e ilimitados para o desenvolvimento ideal dos pacientes autistas, conforme prescrição médica individual.

Desde 1º de julho de 2022, passou a vigorar a obrigatoriedade de que qualquer método ou técnica indicados pelo médico assistente para o tratamento do paciente com autismo deve ser coberto pelo plano de saúde. A resolução também estabelece que esses procedimentos podem ser executados por qualquer profissional de saúde habilitado, respeitando os critérios de credenciamento, referenciamento, reembolso ou qualquer outro tipo de relação entre a operadora e os prestadores de serviços de saúde (Lima, 2018).

Além disso, a resolução proíbe os planos de saúde de limitar a quantidade de terapias de psicologia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e fisioterapia para pacientes, garantindo um uso ilimitado de acordo com as necessidades de saúde de cada paciente.

Sendo assim, os planos de saúde são obrigados a cobrir integralmente o tratamento prescrito no laudo médico, sem limitações na quantidade de terapias, para garantir o desenvolvimento eficaz dos pacientes com transtorno do espectro autista. Se as operadoras não cumprirem essas determinações, podem ser responsabilizadas por reparar os danos causados aos pacientes, que têm o direito de buscar o cumprimento do dispositivo normativo e até mesmo requerer indenizações por danos morais.

Os tratamentos que são disponibilizados pelos planos de saúde para pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) podem variar dependendo da cobertura do plano e das regulamentações em vigor. No entanto, com base nas regulamentações recentes e na legislação brasileira, os principais tratamentos e terapias geralmente cobertos pelos planos de saúde incluem:

a) Atendimento Multiprofissional: Isso inclui o suporte de uma equipe multidisciplinar composta por profissionais como psicólogos, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas e fonoaudiólogos. O atendimento multiprofissional é essencial para abordar as diversas necessidades de desenvolvimento das pessoas com TEA.

b) Psicoterapia e Intervenções Comportamentais: Terapias baseadas em evidências, como a Análise do Comportamento Aplicada (ABA) e outras abordagens terapêuticas, são frequentemente usadas para melhorar as habilidades de comunicação, interação social e comportamento de pessoas com TEA.

c) Fonoaudiologia: A Terapia fonoaudiológica pode ser essencial para melhorar a comunicação verbal e não verbal, a articulação da fala e a linguagem.

d) Terapia Ocupacional: Esta terapia visa desenvolver habilidades de vida diária, coordenação motora e independência nas atividades cotidianas.

e) Fisioterapia: A fisioterapia pode ser necessária para melhorar a mobilidade, a força muscular e o equilíbrio de pessoas com TEA.

f) Medicamentos: Em alguns casos, podem ser prescritos medicamentos para tratar sintomas específicos, como ansiedade, hiperatividade ou problemas de sono. A cobertura de medicamentos específicos pode variar de acordo com o plano de saúde.

g) Acompanhamento Médico: Consultas regulares com um médico, especializado em transtornos do desenvolvimento, são essenciais para monitorar a saúde física e emocional das pessoas com TEA (Martins, 2022).

É importante ressaltar que a Resolução Normativa 539 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) estabeleceu que qualquer método ou técnica indicados pelo médico assistente para o tratamento do paciente com autismo deve ser coberto pelo plano de saúde. Além disso, a resolução proíbe a limitação da quantidade de terapias de psicologia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e fisioterapia para pacientes com TEA, permitindo um tratamento ilimitado conforme a necessidade de saúde de cada paciente.

Os tratamentos oferecidos pelos planos de saúde devem ser personalizados e baseados nas necessidades clínicas individuais da pessoa com TEA. Portanto, a equipe médica, em conjunto com a equipe multidisciplinar, deve determinar quais intervenções são mais apropriadas para cada caso.

É fundamental que as famílias e os cuidadores estejam cientes dos direitos e regulamentações relacionados ao tratamento do TEA e que exijam que os planos de saúde cumpram suas obrigações, garantindo que as terapias e tratamentos necessários sejam acessíveis e eficazes.

3.2. A insuficiência dos tratamentos cobertos pelos planos de saúde e o desenvolvimento da pessoa com TEA 

A insuficiência dos tratamentos cobertos pelos planos de saúde e seu impacto no desenvolvimento das pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma questão de grande relevância e preocupação. A falta de cobertura adequada para os tratamentos relacionados ao TEA representa um desafio significativo para as famílias e indivíduos afetados. Neste texto dissertativo, examinaremos essa problemática, citando autores notáveis para embasar nossa discussão.

Segundo Kanner (2015), pioneiro na descrição do autismo, enfatizou a necessidade de intervenções individualizadas para pessoas com TEA. Ele reconheceu a complexidade do transtorno e a importância de abordagens terapêuticas sob medida.

No entanto, a realidade atual mostra que muitos planos de saúde limitam a cobertura de terapias específicas, como a ABA (Análise do Comportamento Aplicada), que é amplamente reconhecida como eficaz no tratamento de TEA (Smith et al., 2018). Essa restrição pode resultar em uma lacuna no atendimento adequado para crianças com TEA.

Os tratamentos comportamentais, como a ABA, têm demonstrado ser eficazes na melhoria das habilidades sociais e de comunicação de pessoas com TEA (National Research Council, 2001). Contudo, a falta de cobertura integral por planos de saúde limita o acesso a essas intervenções terapêuticas essenciais.

Além das terapias comportamentais, o acesso a tratamentos médicos, como medicamentos para gerenciar sintomas relacionados ao TEA, é frequentemente prejudicado pela falta de cobertura (Mandell & Novak, 2015). Essa limitação pode ser especialmente prejudicial para indivíduos com TEA que enfrentam desafios significativos em termos de comportamento e saúde mental.

A falta de acesso a terapias especializadas pode resultar em um atraso significativo no desenvolvimento de crianças com TEA, tornando mais difícil alcançar um nível de independência satisfatório (Ozonoff et al., 2011). Isso reforça a necessidade de intervenções precoces e intensivas, que muitas vezes não são completamente cobertas pelos planos de saúde.

Para as famílias, os custos financeiros associados ao tratamento de TEA podem ser esmagadores, causando estresse adicional e preocupações sobre o acesso a tratamentos adequados (Lavelle et al., 2014). Essas preocupações financeiras podem impactar adversamente a qualidade de vida das famílias, já que o tratamento adequado é crucial para o bem-estar da pessoa com TEA.

Sendo assim, a insuficiência dos tratamentos cobertos pelos planos de saúde representa um desafio significativo para o desenvolvimento das pessoas com TEA. É essencial que sejam implementadas políticas e regulamentações que garantam o acesso adequado a terapias e tratamentos necessários, considerando as recomendações de especialistas no campo do autismo. A igualdade de acesso aos cuidados de saúde é fundamental para assegurar que as pessoas com TEA tenham a oportunidade de atingir todo o seu potencial de desenvolvimento.

Os planos de saúde no Brasil frequentemente deixam a desejar no que diz respeito à cobertura de tratamentos para o TEA, um transtorno que afeta um número crescente de brasileiros. A falta de abrangência das terapias, como a Análise do Comportamento Aplicada (ABA) e a Terapia Ocupacional, limita o acesso das crianças e adultos com TEA a intervenções terapêuticas de qualidade.Têm se destacado na pesquisa sobre o TEA e têm alertado para a necessidade de políticas mais abrangentes de tratamento. Eles enfatizam que o desenvolvimento das pessoas com TEA é altamente dependente de intervenções precoces e adequadas, incluindo terapias comportamentais e educacionais (De Castro, 2023).

A ausência de cobertura completa de tratamentos, tanto terapêuticos como médicos, por parte dos planos de saúde, cria um fardo financeiro para as famílias que buscam fornecer o melhor cuidado possível para seus entes queridos com TEA. Isso pode resultar em um acesso desigual aos recursos necessários para promover o desenvolvimento da pessoa com TEA. A falta de tratamento adequado pode levar a uma sobrecarga do sistema de saúde público, já que muitas famílias recorrem a ele em busca de tratamento devido à insuficiência dos planos de saúde. Isso, por sua vez, contribui para o congestionamento dos serviços de saúde e pode prejudicar o atendimento a outras condições médicas (Souza; Santos, 2019).

Para melhorar o desenvolvimento das pessoas com TEA no Brasil, é crucial que as políticas de saúde e os planos de saúde revejam suas práticas e expandam a cobertura de tratamentos e terapias comprovadamente eficazes. As famílias afetadas e os profissionais da saúde no Brasil precisam de apoio para garantir que todos os indivíduos com TEA tenham acesso a intervenções apropriadas e oportunidades de desenvolvimento. Isso não só beneficiará as pessoas com TEA, mas também a sociedade como um todo, à medida que esses indivíduos possam alcançar todo o seu potencial e contribuir de maneira significativa.

4. DO DIREITO DOS AUTISTAS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA 

A inclusão e a proteção dos direitos das pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) na legislação brasileira têm sido pautas de extrema relevância e crescente atenção nos últimos anos. À medida que a conscientização sobre o TEA avança, torna-se imperativo que o sistema legal brasileiro acompanhe esses avanços, garantindo direitos, acessibilidade e igualdade de oportunidades para aqueles que vivem com o TEA. 

Este capítulo visa explorar o cenário atual dos direitos dos autistas na legislação brasileira, examinando as principais leis, regulamentações e políticas que têm moldado o panorama legal e social em relação a essa população. 

4.1 Lei 12.764/2012 e a garantia dos direitos das pessoas com TEA

Considerando a possível negligência dos direitos à saúde e bem-estar das pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) devido à falta de fornecimento adequado de tratamentos, é crucial reconhecer a importância da intervenção multidisciplinar. O estímulo precoce do cérebro em crianças autistas, durante os primeiros três anos de vida, desempenha um papel vital no desenvolvimento cognitivo, uma vez que o TEA pode causar atrasos na assimilação de novas habilidades, o que exige tratamento especializado.

Pesquisas também indicam que a falta de tratamentos apropriados ou a sua má qualidade podem resultar na ausência de progresso ou até mesmo no agravamento dos sintomas em crianças autistas. Portanto, é crucial realizar uma avaliação focada nesse contexto para estabelecer normas mais específicas sobre o acompanhamento terapêutico oferecido por planos e operadoras de saúde complementar.

Apesar de existir conhecimento sobre o TEA e leis como a Lei nº 12.764/2012, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, bem como disposições na Constituição Federal relacionadas à proteção de crianças com deficiência intelectual, ainda não existe uma legislação específica diretamente relacionada aos tratamentos que devem ser fornecidos pelas operadoras de saúde complementar.

A Lei nº 12.764/2012 estabelece que as pessoas com TEA são consideradas pessoas com deficiência para fins legais. Portanto, essa lei define diretrizes, como a atenção integral às necessidades de saúde das pessoas com TEA, visando ao diagnóstico precoce, ao atendimento multiprofissional e ao acesso a medicamentos e nutrientes. Portanto, todas as proteções legais concedidas a pessoas com deficiência são aplicáveis aos autistas (Grimaldi, 2023).

A lei estabelece diretrizes essenciais da Política Nacional de Proteção para pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), enfatizando a necessidade de abordagens interdisciplinares e a participação da comunidade. Essas diretrizes ampliam a compreensão do tratamento do autismo, indo além da esfera médica, incorporando diversas áreas. A participação social, conforme destacada por Renata Flores Tibyriçá (2013), é um elemento crucial, assegurando que as políticas públicas sejam formuladas com a contribuição não apenas de profissionais, mas também da comunidade. Isso permite que os pais de crianças autistas desempenhem um papel ativo na criação de políticas públicas.

A lei também enfatiza a atenção integral à saúde, incluindo o diagnóstico precoce, atendimento multiprofissional e acesso a medicamentos e nutrientes necessários. O Decreto 8.368/2014 regulamenta essa diretriz, detalhando o direito das pessoas com TEA a receber atendimento adequado no Sistema Único de Saúde, levando em consideração suas necessidades específicas. Outra diretriz trata da inclusão das pessoas com TEA no mercado de trabalho, com respeito às adaptações necessárias para acomodar suas peculiaridades (Nascimento; Kabbaz, 2023).

As diretrizes subsequentes abordam a disseminação de informações sobre o autismo e outros transtornos do espectro autista, bem como a promoção da capacitação de profissionais e da pesquisa científica para expandir o conhecimento e reduzir o preconceito na sociedade. A lei reconhece a importância de parcerias público-privadas para garantir um atendimento amplo e eficaz, evitando a escassez de profissionais especializados.

É crucial ressaltar que as pessoas com deficiência gozam dos mesmos direitos de qualquer indivíduo, incluindo os previstos em legislações específicas e a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência, considerada uma norma constitucional. No caso de crianças, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) também deve ser considerado.

De acordo Lei Berenice Piana que fala sobre o direito dos autistas na sociedade em seu art. 3° diz:

Art. 3º São direitos da pessoa com transtorno do espectro autista:
I – a vida digna, a integridade física e moral, o livre desenvolvimento da personalidade, a segurança e o lazer;
II – a proteção contra qualquer forma de abuso e exploração;
III – o acesso a ações e serviços de saúde, com vistas à atenção integral às suas necessidades de saúde, incluindo:
a) o diagnóstico precoce, ainda que não definitivo;
b) o atendimento multiprofissional;
c) a nutrição adequada e a terapia nutricional;
d) os medicamentos;
e) informações que auxiliem no diagnóstico e no tratamento (BRASIL, 2012).

Neste artigo, fica evidente que as pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) têm direito ao tratamento adequado. Portanto, se os pais de uma criança autista optarem por utilizar o plano de saúde com o qual são conveniados para o tratamento, é responsabilidade do plano de saúde custear o tratamento.

Art. 5º A pessoa com transtorno do espectro autista não será impedida de participar de planos privados de assistência à saúde em razão de sua condição de pessoa com deficiência, conforme dispõe o art. 14 da Lei nº 9.656, de 3 de junho de 1998.

As pessoas diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) têm o direito de adquirir um plano de saúde, e esse direito não pode ser negado com base no diagnóstico prévio. Embora o plano de saúde possa aplicar um período de carência, no qual o beneficiário deve esperar antes de utilizar seus benefícios, é importante ressaltar que o plano não pode se recusar a cobrir os benefícios aos quais o contratante tem direito, mesmo durante esse período de carência.

A lei assegura que as pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) não serão submetidas a tratamentos desumanos ou degradantes, preservando seu direito ao convívio familiar e proibindo a discriminação com base em sua deficiência. Além disso, a legislação garante o acesso dessas pessoas a planos privados de assistência à saúde. Por último, a lei estabelece que gestores escolares não podem recusar a matrícula de crianças com TEA, sujeitos a penalidades, incluindo multas de três a vinte salários mínimos (Dos Santos, 2023).

Embora a legislação forneça uma estrutura sólida e coerente para proteger os direitos das pessoas com TEA e integrá-las na sociedade, é importante avaliar sua eficácia na prática, garantindo o acesso aos direitos fundamentais e a inclusão sem discriminação com base em sua condição.

4.2 Lei Romeo Mion

Em 8 de janeiro de 2020, foi sancionada a Lei nº 13.977, que institui a Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Ciptea), conhecida como “Lei Romeo Mion”, em homenagem ao filho do apresentador Marcos Mion, Romeo, um jovem de 14 anos que enfrenta o Transtorno do Espectro Autista (TEA). Marcos Mion sempre demonstrou um sólido comprometimento com a causa do autismo, utilizando suas redes sociais para compartilhar a vida de sua família. Para ele, essa conquista representa um marco significativo, pois confere maior visibilidade e, por conseguinte, promove um ambiente mais acolhedor para as pessoas com TEA na sociedade (Vieira; Brito, 2023).

A Lei Romeo Mion traz alterações à Lei nº 12.764 de 2012, também conhecida como “Lei Berenice Piana”, que estabeleceu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. De acordo com a nova legislação, a Ciptea tem o propósito de proporcionar aos portadores de TEA dedicação integral, pontos de apoio e prioridade nos atendimentos, especialmente nos setores de educação, saúde e assistência social, tanto em âmbito público quanto privado (Vasconcelos, 2022).

A Ciptea será emitida por órgãos estaduais, distritais e municipais responsáveis pela implementação da Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Para obter a carteira, as famílias deverão apresentar um requerimento acompanhado de um relatório médico que identifique o código da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID). Além disso, o requerimento deve conter informações pessoais do indivíduo com TEA, como nome completo, filiação, data e local de nascimento, número de identidade, CPF, tipo sanguíneo, endereço residencial, telefone, bem como uma foto 3×4, assinatura ou impressão digital do interessado. Também são necessários os dados do responsável legal ou cuidador, incluindo nome completo, documento de identificação, endereço residencial, telefone e e-mail (Da Silva, 2023).

A Ciptea terá validade por cinco anos, mas a família deverá manter seus dados cadastrais atualizados. Na renovação, o número de identificação será mantido, contribuindo para a contagem precisa das pessoas com TEA em todo o território nacional. A nova lei ainda recomenda que os órgãos encarregados da emissão de documentos de identidade incluam informações sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA) (Vieira; Brito, 2023).

No caso de indivíduos estrangeiros com autorização de residência, residentes fronteiriços, solicitantes de refúgio ou visto temporário, será exigida a apresentação da Cédula de Identidade de Estrangeiro, da Carteira de Registro Nacional Migratório ou do Documento Provisório de Registro Nacional Migratório. A lei também ajusta a Lei nº 9.265 de 1996, que trata da Gratuidade dos Atos de Cidadania, para garantir que a emissão da Ciptea seja gratuita, da mesma forma que já ocorre com documentos como certidões de nascimento, óbito, título de eleitor e certificado de reservista (Vasconcelos, 2022).

Por fim, a senadora Soraya Thronicke (PSL-MS), relatora da matéria na Comissão de Direitos Humanos (CDH), ressalta a importância da Ciptea, afirmando que não se trata apenas de um documento, mas de um direito verdadeiramente essencial. Especialmente em estabelecimentos comerciais ou públicos, e, notadamente, em serviços de saúde, a Ciptea assegura o reconhecimento necessário às pessoas com transtorno do espectro autista, proporcionando-lhes um direito fundamental que fomenta a inclusão social, um desejo intrínseco a todo ser humano: ser acolhido e respeitado em sua essência (Da Silva, 2023).

4.3. Da Lei 14.454/2022

A Lei Ordinária nº 14.454/2022, resultante do projeto de lei nº 2.033/2022, trouxe uma alteração significativa em relação à previsão de cobertura de tratamentos ou procedimentos que não constassem no Rol de Procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Aprovada em plenário em 3 de agosto de 2022 e sancionada pelo Presidente da República em 21 de setembro do mesmo ano, essa lei estabeleceu condições específicas para a garantia de cobertura, mesmo na ausência de previsão no referido rol (Pessoa, 2023, online).

A doutrina e jurisprudência analisaram que a lei não apenas reconheceu a possibilidade de cobertura além do rol, mas também definiu a natureza exemplificativa desse rol. Em outras palavras, a legislação autorizou expressamente a cobertura de tratamentos ou procedimentos não previstos no Rol da ANS, desde que atendidos dois requisitos fundamentais.

É relevante observar que a mudança legislativa reflete uma ampliação da autonomia dos beneficiários de planos de saúde, proporcionando maior flexibilidade e proteção. Os dois requisitos mencionados na lei para a autorização de cobertura além do rol devem ser examinados detalhadamente para compreender completamente o alcance dessa inovação.

Sendo assim, a Lei Ordinária nº 14.454/2022 representou um marco na regulamentação dos planos de saúde, ao reconhecer a possibilidade de cobertura para tratamentos e procedimentos não contemplados no Rol de Procedimentos da ANS, desde que observados os critérios estabelecidos pela legislação. Essa reformulação legislativa visa assegurar uma maior abrangência e adequação dos planos de saúde às necessidades dos beneficiários. Vejamos:

Em caso de tratamento ou procedimento prescrito por médico ou odontólogo assistente que não estejam previstos no rol referido no § 12 deste artigo, a cobertura deverá ser autorizada pela operadora de planos de assistência à saúde, desde que:
I – exista comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico; ou
II – existam recomendações pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), ou exista recomendação de, no mínimo, 1 (um) órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional, desde que sejam aprovadas também para seus nacionais (BRASIL, 2022, art. 2º, §13 apud Pessoa, 2023).

Entretanto, é importante ressaltar que, embora a nova lei pareça resolver a controvérsia jurídica anterior e legalizar explicitamente a cobertura além do rol, ela destaca apenas sua exemplificatividade de maneira indireta. Essa abordagem é justificada pela observação de que alguns dos requisitos estabelecidos pela Segunda Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça foram mantidos no texto legal como condições para a efetivação da cobertura em situações não contempladas.

Dessa forma, percebe-se a prudência manifestada pelo legislador, uma vez que uma cobertura irrestrita poderia impactar substancialmente a estrutura interna do sistema de saúde suplementar no país. Portanto, torna-se imprescindível uma análise cuidadosa sobre as possíveis repercussões da promulgação da Lei nº 14.454/2022 nos planos de assistência à saúde e seus beneficiários.

De acordo com Silva (2022) em 21 de setembro de 2022, foi promulgada a Lei nº 14.454, conforme registrado no Diário Oficial da União, cujo título destaca: “Altera a Lei nº 9.656, de 3 de junho de 1998, que versa sobre os planos privados de assistência à saúde, para estabelecer critérios que permitam a cobertura de exames ou tratamentos de saúde não contemplados no rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar.”

Esta legislação representa uma modificação em uma lei já presente no ordenamento jurídico brasileiro, a Lei 9.656, que regula os planos e seguros privados de assistência à saúde. Ao longo de sua existência, a Lei 9.656 foi objeto de diversas atualizações, seja por meio de medidas provisórias ou por meio de novas leis, como é o caso específico abordado neste contexto.

A Lei nº 14.454 promoveu alterações em diversos dispositivos da Lei 9.656, incluindo o art. 1º, cuja redação original era a seguinte: Inserir a redação original do art. 1º da Lei 9.656. Na nova configuração pós-alteração pela Lei nº 14.454, o art. 1º passa a dispor: 

 “Art. 1º Submetem-se às disposições desta Lei as pessoas jurídicas de direito privado que operam planos de assistência à saúde, sem prejuízo do cumprimento da legislação específica que rege a sua atividade, adotando-se, para fins de aplicação das normas aqui estabelecidas, as seguintes definições: […].” (BRASIL, 1998).

Essa modificação evidencia a intenção do legislador em ajustar e aprimorar os termos da Lei 9.656, incorporando as mudanças propostas pela Lei nº 14.454 no sentido de estabelecer critérios para a cobertura de exames ou tratamentos de saúde que não estão originalmente previstos no rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar. De acordo com as mudanças trazidas pela Lei n 14.454, a nova redação diz:

“Art. 1º Submetem-se às disposições desta Lei as pessoas jurídicas de direito privado que operam planos de assistência à saúde, sem prejuízo do cumprimento da legislação específica que rege a sua atividade e, simultaneamente, das disposições da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), adotando-se, para fins de aplicação das normas aqui estabelecidas, as seguintes definições […]”(Brasil, 2022).

Essa modificação teve como propósito formalizar que os planos de saúde, para além da regulação específica que governa sua atividade, também devem aderir às disposições do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Embora essa alteração possa passar despercebida em uma análise superficial, o fato de a submissão dos planos de saúde ao Código de Defesa do Consumidor estar expressamente prevista no próprio diploma normativo reforça e consolida esse direito. Isso contribui para proporcionar maior segurança jurídica à população e ampliar a efetividade na busca pelo acesso à saúde, consolidando-se como um elemento crucial nessa temática (Silva, 2022).

Adicionalmente, a legislação abordada neste capítulo promoveu modificações nos parágrafos 4º e 12 do artigo 10, estabelecendo as seguintes regulamentações: 

“Art. 10 […] § 4º A amplitude das coberturas no âmbito da saúde suplementar, inclusive de transplantes e de procedimentos de alta complexidade, será estabelecida em norma editada pela ANS, que publicará rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar, atualizado a cada incorporação. […]
§ 12. O rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar, atualizado pela ANS a cada nova incorporação, constitui a referência básica para os planos privados de assistência à saúde contratados a partir de 1º de janeiro de 1999 e para os contratos adaptados a esta Lei e fixa as diretrizes de atenção à saúde” (Brasil, 2022).

Essas alterações evidenciam a abrangência da revisão normativa, demonstrando a intenção do legislador em ajustar especificamente as disposições do artigo 10, parágrafos 4º e 12, para aprimorar as regras que norteiam a atuação dos planos de saúde no contexto em questão.

Esta seção do dispositivo normativo estipula que os planos de saúde devem basear a extensão de sua cobertura no rol estabelecido pela Agência Nacional de Saúde, com algumas exceções. O parágrafo 4º, estabelece como regra a aderência ao rol de procedimentos da mencionada agência. Adicionalmente, o parágrafo 12 determina que essa lista de tratamentos seja atualizada a cada nova incorporação, sendo que tal processo teve seu prazo reduzido de dois anos para seis meses pela Resolução Normativa nº 465/2021.

A frequente atualização desse rol possibilita a inclusão de procedimentos para tratar novas enfermidades, como ocorreu com a Covid-19, demandando exames de diagnóstico. Em junho de 2022, a agência listou mais de 3.360 itens.

Por fim, o art. 10, § 13, da Lei nº 14.454, estipula: “§ 13. Em situações em que o tratamento ou procedimento prescrito por médico ou odontólogo assistente não esteja previsto no rol referido no § 12 deste artigo, a operadora de planos de assistência à saúde deverá autorizar a cobertura, desde que:

I – exista comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico; ou
II – existam recomendações pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), ou exista recomendação de, no mínimo, 1 (um) órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional, desde que sejam aprovadas também para seus nacionais” (Brasil, 2022).

Esta seção do diploma normativo é frequentemente considerada a mais crucial, pois é nela que a lei elenca as situações excepcionais que permitem ao consumidor buscar tratamentos não contemplados no rol de procedimentos. Para tal, é necessário que o consumidor demonstre enquadrar-se em uma das três conjunturas previstas na legislação.

É importante ressaltar que a redação desse parágrafo utiliza o conectivo “ou”, indicando que o tratamento proposto pelo consumidor não precisa necessariamente estar dentro das três situações excepcionais elencadas. Basta que esteja em uma delas para que seja configurado o dever do plano de saúde de atender a esse procedimento. Apesar de parecer um detalhe à primeira vista, esse aspecto é crucial, facilitando a consideração do procedimento como um direito do consumidor e, consequentemente, tornando mais acessível o próprio acesso à saúde (Gonçalves, 2022).

No entanto, como já observado, nem todos estão satisfeitos com essa situação. O advogado Henrique Alencar Fiorentino destaca a insegurança jurídica que pode surgir dessa lei, argumentando que a cobertura de procedimentos não previstos no rol da ANS pode violar o princípio da intervenção mínima e excepcionalidade da revisão contratual. Ele ressalta que tal obrigação muitas vezes vai além do entendimento da própria agência reguladora (ANS) e se opõe ao artigo 10 da Lei nº 9.656/98, resultando em uma vulneração da segurança jurídica (Pessoa, 2023).

Por outro lado, o advogado Jefferson Henrique de Souza Alves refuta a ideia de que a lei tornaria os planos de saúde inviáveis, destacando que, mesmo com as liminares cumpridas, as operadoras tiveram lucros significativos. Ele argumenta que a lei não é um cheque em branco para todo e qualquer tratamento, salientando a necessidade de comprovação científica de eficácia e prescrição por profissional médico (Silva, 2022).

Para Laura Gomes, advogada do Bezerra Gonçalves Advocacia, vê a aprovação da Lei nº 14.454/22 como um avanço significativo para o acesso à saúde, proporcionando maior legitimidade aos consumidores para buscar assistência judicial diante de recusas de tratamento fora dos parâmetros da lei. Em uma sessão virtual realizada em novembro de 2022, o STF determinou o arquivamento de ações relacionadas ao rol de cobertura dos planos de saúde, indicando que, para a maioria do plenário, o Poder Legislativo já resolveu a questão. Isso reforça a vitória popular e capacita ainda mais as pessoas para lutar por seus direitos (Mazzoli, 2022).

Sendo assim, a Lei nº 14.454 tornou mais acessível a situação de obter procedimentos não listados no rol da ANS, proporcionando uma base legal sólida e superando a jurisprudência anterior do Superior Tribunal de Justiça, que mantinha a taxatividade do rol. Por outro lado, urge destacar que o Brasil vivencia reiterado aumento de preços nos planos de saúde, posto que “o valor médio que se paga por um plano de saúde aumentou no Brasil em 600% entre 2002 e 2021”, conforme afirmou Ligia Bahia, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, no 1º Congresso do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde (Fonajus) (SALLES et al., 2022, p. 38).

É crucial destacar que o Brasil enfrenta um contínuo aumento nos preços dos planos de saúde, sendo que, segundo Ligia Bahia, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o valor médio pago por um plano de saúde aumentou em 600% entre 2002 e 2021, conforme afirmado no 1º Congresso do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde (Fonajus) (SALLES, 2022).

Diante desse cenário, é evidente que a Lei nº 14.454/2022 representa um novo fator impactante nos cálculos atuariais dos convênios de saúde. Esses cálculos, baseados em um “método probabilístico, formado pela avaliação do preço das coberturas ofertadas, da idade do usuário e dos custos e efeitos de doenças e acidentes” (REZENDE, 2011), serão afetados pela natureza exemplificativa do rol. Isso implica na reorganização financeira, pois as operadoras terão a responsabilidade de cobrir procedimentos e tratamentos não considerados em suas análises de riscos. Consequentemente, haverá ajustes nas contraprestações pagas pelos beneficiários dos planos de saúde, visando complementar o fundo comum de cobertura.

Além disso, é imperativo considerar a adesão ao princípio do mutualismo, intrínseco aos contratos de planos de saúde. A carteira de beneficiários contribui para o fundo comum, destinando recursos àqueles que necessitam no momento. Nesse sentido, alguns são privilegiados em detrimento de outros, e a distorção desse sistema pode levar ao desequilíbrio econômico na relação contratual entre operadora e usuários. O desequilíbrio atuarial, aliado ao aumento de preços, marginaliza ainda mais a camada economicamente vulnerável, dificultando sua participação na saúde suplementar no Brasil, especialmente diante da possibilidade de falta de recursos para cobrir todos os conveniados (REZENDE, 2011).

Além disso, para Salles (2022) a judicialização da questão de saúde continuará, envolvendo outros sujeitos e abordando diferentes aspectos, incluindo o Estado como garantidor originário do direito à saúde, especialmente em casos de tratamentos emergenciais ou demora nos atendimentos. Esse entendimento foi expresso pelo presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar durante o 5º Seminário Jurídico de Seguros.

Por fim, percebe-se a possibilidade de uma padronização nos planos de assistência à saúde e uma significativa restrição à livre concorrência, ou até mesmo, em uma perspectiva mais crítica, a eliminação da necessidade de edição do rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar.

4.3.1. Analise a inconstitucionalidade da lei nº 14.454/2022

Em 4 de novembro de 2022, a União Nacional das Instituições de Autogestão em Saúde – Unidas propôs a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 7265/DF. O objetivo principal dessa ação é pleitear a declaração de inconstitucionalidade do artigo 10, §13, da Lei nº 9.656/1998, conforme alterado pela Lei nº 14.454/2022. Dentre os argumentos centrais apresentados, destaca-se a alegação de que essa modificação desrespeita o próprio sistema de saúde suplementar brasileiro, especialmente no que diz respeito à natureza complementar e subsidiária da prestação de saúde pela iniciativa privada, considerando que a responsabilidade primordial recai sobre o Estado (Pessoa, 2022).

A Unidas sustenta que a definição da exemplificatividade do rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar impõe às operadoras de saúde um ônus superior ao destinado ao Sistema Único de Saúde (SUS), que, mais uma vez, é uma responsabilidade estatal. Argumentam, ainda, que essa mudança interfere no equilíbrio do sistema de freios e contrapesos, uma vez que a regulação da saúde suplementar no Brasil é de competência da Agência Nacional de Saúde Suplementar. Além disso, a Unidas alerta para possíveis impactos negativos nos beneficiários, que poderiam enfrentar aumentos nas mensalidades dos contratos (Pessoa, 2022).

Importante ressaltar que, até a presente data, a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 7265/DF aguarda julgamento.

4.4 A judicialização como alternativa para garantir o tratamento eficaz 

Embora as regulamentações específicas para os planos de saúde, como a Lei 9.656/98 (Lei dos Planos de Saúde) e a Lei 9.961/00 (que criou a Agência Nacional de Saúde Suplementar), tenham sido implementadas para considerar os interesses de todos os envolvidos na relação contratual, estabelecer equilíbrio relacional, eliminar práticas abusivas, garantir direitos, promover igualdade e qualidade nos serviços, bem como controlar reajustes, observa-se um aumento significativo de litígios entre consumidores e operadoras nos tribunais, o que é denominado de “judicialização da saúde suplementar”.

Isso acontece devido à falta de clareza nas cláusulas contratuais, à recusa de cobertura de procedimentos médicos e hospitalares, à insuficiência da rede pública de saúde e à necessidade de tratamentos que levam os beneficiários a recorrer ao poder judiciário para assegurar seus direitos. A maioria da jurisprudência brasileira costumava considerar o rol de procedimentos da ANS como exemplificativo, permitindo que os planos de saúde cobrissem tratamentos não listados desde que fossem prescritos por médicos (Lima, 2022).

Segundo o Ministro Menezes Direito, a escolha do tratamento deve ser feita pelo médico, não pela empresa de plano de saúde, desde que a doença seja coberta pelo contrato. Isso evita que a empresa substitua os médicos na escolha da terapia adequada. Além disso, o amicus curiae do departamento de Proteção e Defesa do Consumidor da Secretaria Nacional do Consumidor argumenta que o rol não é meramente exemplificativo, pois define uma cobertura mínima necessária para manter preços acessíveis e garantir a saúde dos beneficiários (Ferreira, 2022).

Com base nessas considerações e em outras opiniões de especialistas, a posição majoritária é que a lista de procedimentos e eventos relativos à saúde é taxativa. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem se preocupado com a saúde suplementar, uma vez que atende a um grande número de beneficiários que buscam atendimento no setor privado.

O STJ, por maioria dos votos, estabeleceu que o rol da ANS é, em regra, taxativo. Além disso, a operadora de plano de saúde não é obrigada a cobrir tratamentos não listados se houver um procedimento eficaz e seguro já incorporado ao rol. No entanto, é possível contratar coberturas ampliadas ou aditivos contratuais para procedimentos fora do rol. Em casos excepcionais, quando não houver alternativas terapêuticas no rol da ANS, o tratamento indicado pelo médico assistente pode ser coberto, desde que atendidas diversas exigências, como a comprovação da eficácia do tratamento e recomendações de órgãos técnicos (Grimaldi, 2023).

Essas diretrizes permitem que as operadoras de planos de saúde se isentem da obrigação de cobrir tratamentos e assistência médica não listados no rol da ANS, desde que haja alternativas eficazes. No entanto, em casos excepcionais, o tratamento indicado pelo médico assistente pode ser coberto, sujeito a várias condições específicas.

De acordo com o Superior Tribunal de Justiça STJ – RECURSO ESPECIAL: REsp 2043003 SP 2022/0386675-0:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AUSÊNCIA. PLANO DE SAÚDE. NATUREZA TAXATIVA, EM REGRA, DO ROL DA ANS. TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR PRESCRITO PARA BENEFICIÁRIO PORTADOR DE TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. MUSICOTERAPIA. COBERTURA OBRIGATÓRIA. REEMBOLSO INTEGRAL. EXCEPCIONALIDADE. 1. Ação de obrigação de fazer, ajuizada em 23/10/2020, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 06/04/2022 e concluso ao gabinete em 15/12/2022.2. O propósito recursal é decidir sobre: (i) a negativa de prestação jurisdicional; (ii) a obrigação de a operadora do plano de saúde cobrir as terapias multidisciplinares prescritas para usuário com transtorno do espectro autista, incluindo a musicoterapia; e (iii) a obrigação de reembolso integral das despesas assumidas pelo beneficiário com o custeio do tratamento realizado fora da rede credenciada (…).

A decisão citada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) trata de um recurso especial relacionado a uma ação de obrigação de fazer em que se discutia a cobertura de terapias multidisciplinares, incluindo a musicoterapia, para beneficiários com transtorno do espectro autista por parte de uma operadora de plano de saúde. O tribunal decidiu que a negativa da operadora em cobrir essas terapias era abusiva, apoiando-se em manifestações posteriores da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) que reforçaram a importância desses tratamentos para transtornos do desenvolvimento. 

A decisão também afirmou que a musicoterapia é de cobertura obrigatória no tratamento multidisciplinar para beneficiários com transtorno do espectro autista, conforme a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares do Sistema Único de Saúde (SUS). 

Além disso, o tribunal destacou que o reembolso de despesas médicas fora da rede credenciada do plano de saúde só é permitido em circunstâncias excepcionais e, nesse caso, seria limitado aos preços contratados com o plano de saúde. A decisão manteve o tratamento multidisciplinar prescrito pelo médico assistente e o reembolso integral das despesas apenas se houvesse descumprimento de uma ordem judicial anterior que concedeu antecipação dos efeitos da tutela.

Durante um extenso período, o Superior Tribunal de Justiça manteve um entendimento unânime de que o “Rol de Procedimentos da ANS” possuía natureza exemplificativa. De acordo com essa perspectiva, a simples prescrição médica de um tratamento ou procedimento era suficiente para garantir sua cobertura pelos planos de assistência à saúde. Contudo, ocorreu uma mudança significativa desse entendimento em parte do colegiado, especialmente na Quarta Turma do referido tribunal (Pessoa, 2022).

Essa alteração de posição, conhecida como overruling, resultou em uma conclusão oposta à anteriormente sustentada pelos julgados, passando a considerar o rol como taxativo. Parte da ementa do acórdão que registrou essa mudança destaca que a caracterização do rol como meramente exemplificativo é impossível. O overruling ocorreu em função da necessidade de harmonizar os interesses das partes na relação contratual, aplicando o Código de Defesa do Consumidor (CDC) para garantir o equilíbrio econômico-financeiro, atuarial e a segurança jurídica. O acórdão ressalta que a recusa de cobertura de procedimento não abrangido no rol da ANS ou por disposição contratual deve ser analisada sob esses princípios (Gonçalves, 2022).

Como resultado dessa revisão aprofundada do tema, concluiu-se que a interpretação de que o rol é meramente exemplificativo e que a cobertura mínima não tem limitações definidas é inviável. Esse raciocínio, segundo o acórdão, tenderia a encarecer e padronizar os planos de saúde, obrigando-os implicitamente a fornecer qualquer tratamento prescrito, o que poderia restringir a livre concorrência e negar vigência aos dispositivos legais que estabelecem o plano-referência de assistência à saúde e a possibilidade de definição contratual de outras coberturas (BRASIL, 2020).

Enquanto a Quarta Turma adotava essa nova perspectiva, a Terceira Turma continuava a afirmar o entendimento já consolidado de que a lista deveria ser interpretada como exemplificativa. Essa divergência entre as turmas do tribunal superior, juntamente com julgamentos discrepantes em diferentes instâncias, gerou uma situação de instabilidade e insegurança jurídica em relação à questão em análise durante um determinado período (Barros, 2020).

No cenário de divergências no âmbito do Poder Judiciário, em 24 de fevereiro de 2021, a Agência Nacional de Saúde Suplementar implementou a Resolução Normativa nº 465/2021, que reconheceu a taxatividade do mencionado rol. Conforme estabelecido por esta resolução:

“Para fins de cobertura, considera-se taxativo o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde disposto nesta Resolução Normativa e seus anexos, podendo as operadoras de planos de assistência à saúde oferecer cobertura maior que a obrigatória, por sua iniciativa ou mediante expressa previsão no instrumento contratual referente ao plano privado de assistência à saúde” (ANS, 2021, art. 2º).

Vale destacar também a promulgação da Lei nº 14.307, de 3 de março de 2022, que alterou o §4º do artigo 10 da Lei nº 9.656/1998, indicando que a amplitude das coberturas “[…] será estabelecida em norma editada pela ANS” (BRASIL, 2022, art. 1º). Diante da falta de ressalva legal quanto à previsão de taxatividade do rol na Resolução Normativa nº 465/2021, alguns acórdãos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo entenderam pela recepção legal dessa natureza jurídica para a interpretação da lista, ressalvando, no entanto, a irretroatividade da norma em relação aos fatos passados. In versis:

RECURSO ESPECIAL Nº 2047956 – SP (2023/0013326-4) EMENTA PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO COMINATÓRIA. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. TERAPIAS MULTIDISCIPLINARES. COBERTURA. NEGATIVA INDEVIDA (STJ – REsp: 2047956 SP 2023/0013326-4, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Publicação: DJ 27/02/2023).

A decisão citada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) trata de um recurso especial relacionado a uma ação de obrigação de fazer em que se discutia a cobertura de terapias multidisciplinares, incluindo a musicoterapia, para beneficiários com transtorno do espectro autista por parte de uma operadora de plano de saúde. O tribunal decidiu que a negativa da operadora em cobrir essas terapias era abusiva, apoiando-se em manifestações posteriores da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) que reforçaram a importância desses tratamentos para transtornos do desenvolvimento. 

A decisão também afirmou que a musicoterapia é de cobertura obrigatória no tratamento multidisciplinar para beneficiários com transtorno do espectro autista, conforme a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares do Sistema Único de Saúde (SUS). 

Além disso, o tribunal destacou que o reembolso de despesas médicas fora da rede credenciada do plano de saúde só é permitido em circunstâncias excepcionais e, nesse caso, seria limitado aos preços contratados com o plano de saúde. A decisão manteve o tratamento multidisciplinar prescrito pelo médico assistente e o reembolso integral das despesas apenas se houvesse descumprimento de uma ordem judicial anterior que concedeu antecipação dos efeitos da tutela.

Durante um extenso período, o Superior Tribunal de Justiça manteve um entendimento unânime de que o “Rol de Procedimentos da ANS” possuía natureza exemplificativa. De acordo com essa perspectiva, a simples prescrição médica de um tratamento ou procedimento era suficiente para garantir sua cobertura pelos planos de assistência à saúde. Contudo, ocorreu uma mudança significativa desse entendimento em parte do colegiado, especialmente na Quarta Turma do referido tribunal (Pessoa, 2022).

Essa alteração de posição, conhecida como overruling, resultou em uma conclusão oposta à anteriormente sustentada pelos julgados, passando a considerar o rol como taxativo. Parte da ementa do acórdão que registrou essa mudança destaca que a caracterização do rol como meramente exemplificativo é impossível. O overruling ocorreu em função da necessidade de harmonizar os interesses das partes na relação contratual, aplicando o Código de Defesa do Consumidor (CDC) para garantir o equilíbrio econômico-financeiro, atuarial e a segurança jurídica. O acórdão ressalta que a recusa de cobertura de procedimento não abrangido no rol da ANS ou por disposição contratual deve ser analisada sob esses princípios (Gonçalves, 2022).

Como resultado dessa revisão aprofundada do tema, concluiu-se que a interpretação de que o rol é meramente exemplificativo e que a cobertura mínima não tem limitações definidas é inviável. Esse raciocínio, segundo o acórdão, tenderia a encarecer e padronizar os planos de saúde, obrigando-os implicitamente a fornecer qualquer tratamento prescrito, o que poderia restringir a livre concorrência e negar vigência aos dispositivos legais que estabelecem o plano-referência de assistência à saúde e a possibilidade de definição contratual de outras coberturas (BRASIL, 2020).

Enquanto a Quarta Turma adotava essa nova perspectiva, a Terceira Turma continuava a afirmar o entendimento já consolidado de que a lista deveria ser interpretada como exemplificativa. Essa divergência entre as turmas do tribunal superior, juntamente com julgamentos discrepantes em diferentes instâncias, gerou uma situação de instabilidade e insegurança jurídica em relação à questão em análise durante um determinado período (Barros, 2020).

No cenário de divergências no âmbito do Poder Judiciário, em 24 de fevereiro de 2021, a Agência Nacional de Saúde Suplementar implementou a Resolução Normativa nº 465/2021, que reconheceu a taxatividade do mencionado rol. Conforme estabelecido por esta resolução:

“Para fins de cobertura, considera-se taxativo o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde disposto nesta Resolução Normativa e seus anexos, podendo as operadoras de planos de assistência à saúde oferecer cobertura maior que a obrigatória, por sua iniciativa ou mediante expressa previsão no instrumento contratual referente ao plano privado de assistência à saúde” (ANS, 2021, art. 2º).

Vale destacar também a promulgação da Lei nº 14.307, de 3 de março de 2022, que alterou o §4º do artigo 10 da Lei nº 9.656/1998, indicando que a amplitude das coberturas “[…] será estabelecida em norma editada pela ANS” (BRASIL, 2022, art. 1º). Diante da falta de ressalva legal quanto à previsão de taxatividade do rol na Resolução Normativa nº 465/2021, alguns acórdãos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo entenderam pela recepção legal dessa natureza jurídica para a interpretação da lista, ressalvando, no entanto, a irretroatividade da norma em relação aos fatos passados. In versis:

RECURSO ESPECIAL Nº 2047956 – SP (2023/0013326-4) EMENTA PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO COMINATÓRIA. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. TERAPIAS MULTIDISCIPLINARES. COBERTURA. NEGATIVA INDEVIDA (STJ – REsp: 2047956 SP 2023/0013326-4, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Publicação: DJ 27/02/2023).

Esta decisão destaca a evolução normativa, a jurisprudência relacionada ao tratamento do TEA e a decisão do tribunal em conformidade com as normas vigentes e as diretrizes da ANS.

Ademais, cabe ressaltar que em 5 de março de 2022, foi apresentada perante o Supremo Tribunal Federal a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 7088, pela Associação Brasileira de Proteção aos Consumidores de Planos e Sistema de Saúde – Saúde Brasil. O intuito desta ação é pleitear a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 4º, 7º e 8º da Lei nº 14.307/2022, buscando assim a possibilidade de considerar o “Rol de Procedimentos da ANS” como exemplificativo.

Diante do exposto, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, incumbida de uniformizar o entendimento das terceira e quarta turmas deste tribunal, deliberou no julgamento dos Embargos de Divergência do REsp nº 1.886.929 – SP (2020/0191677-6), realizado em 8 de junho de 2022. Nessa ocasião, estabeleceu-se que o “Rol de Procedimentos da ANS” seria, em princípio, taxativo, admitindo-se exceções mediante estritos requisitos, conforme delineado no respectivo acórdão:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. ROL DA ANS. TAXATIVIDADE. HIPÓTESES EXCEPCIONAIS. ANÁLISE PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. DECISÃO MANTIDA. 1. A Segunda Seção do STJ firmou entendimento de que o rol de procedimentos e eventos em saúde complementar é, em regra, taxativo, não sendo a operadora de plano ou seguro de saúde obrigada a custear procedimento ou terapia não listados, se existe, para a cura do paciente, alternativa eficaz, efetiva e segura já incorporada (EREsps n. 1.889.704/SP e 1.886.929/SP, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgados em 8/6/2022, DJe de 3/8/2022). 2. Cumpre observar os seguintes parâmetros objetivos para admitir, em hipóteses excepcionais e restritas, o afastamento das limitações contidas na lista da ANS: “1 – o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar é, em regra, taxativo; 2 – a operadora de plano ou seguro de saúde não é obrigada a arcar com tratamento não constante do Rol da ANS se existe, para a cura do paciente, outro procedimento eficaz, efetivo e seguro já incorporado à lista; 3 – é possível a contratação de cobertura ampliada ou a negociação de aditivo contratual para a cobertura de procedimento extrarrol; 4 – não havendo substituto terapêutico ou estando esgotados os procedimentos do Rol da ANS, pode haver, a título de excepcionalidade, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo-assistente, desde que (i) não tenha sido indeferida expressamente pela ANS a incorporação do procedimento ao Rol da Saúde Suplementar; (ii) haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências; (iii) haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacionais (como Conitec e NatJus) e estrangeiros; e (iv) seja realizado, quando possível, o diálogo interinstitucional do magistrado com entes ou pessoas com expertise na área da saúde, incluída a Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar, sem deslocamento da competência do julgamento do feito para a Justiça Federal, ante a ilegitimidade passiva ad causam da ANS” (EREsp n. 1.886.929/SP, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 8/6/2022, DJe de 3/8/2022). 3. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ – AgInt no REsp: 1932967 RJ 2021/0111454-5, Data de Julgamento: 28/11/2022, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/12/2022).

É imperativo destacar que, após a mencionada decisão, ainda não se havia alcançado uma conclusão no julgamento da corte constitucional por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 7088. Esse novo entendimento passaria a exercer influência sobre os demais órgãos do poder judiciário. Contudo, esse desfecho gerou uma considerável comoção social, especialmente entre os beneficiários de planos de assistência à saúde, que se opuseram à conclusão delineada no acórdão de uniformização. A controvérsia ganhou dimensões significativas, uma vez que muitos tratamentos e procedimentos ficariam desprovidos de cobertura, desencadeando um efeito “cascata”. Isso se deve ao fato de que várias terapias utilizadas como intervenções não estavam previstas no rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar.

Diante desse cenário e considerando o intenso conflito jurídico e a mobilização social, projetos de lei foram rapidamente apresentados no Congresso Nacional. O objetivo era estabelecer e positivar a mencionada natureza jurídica do rol, proporcionando uma solução definitiva para a litigiosidade em torno dessa questão.

Portanto, se a operadora do plano de saúde não cumprir as determinações da decisão judicial e não fornecer o tratamento multidisciplinar, incluindo a musicoterapia, conforme exigido pelas normas estabelecidas, ela pode ser responsabilizada por reparar os danos causados ao paciente. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho buscou analisar a questão crucial da responsabilidade dos planos de saúde em cobrir ilimitadamente o tratamento de pacientes autistas, bem como a influência do Rol de Procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) nesse contexto. Durante a pesquisa, exploramos a complexa interação entre os pacientes autistas, as operadoras de planos de saúde e a regulamentação da ANS, com o objetivo de esclarecer o atual panorama jurídico e a importância da cobertura integral desses tratamentos.

Em nossa análise, ficou evidente que o Rol de Procedimentos da ANS estabelece uma lista de procedimentos e eventos de saúde a serem cobertos pelos planos de saúde, mas em relação ao tratamento de pacientes autistas, ele deixa espaço para discussão e evolução. O entendimento contemporâneo é que as terapias multidisciplinares, incluindo a musicoterapia, desempenham um papel fundamental no tratamento do transtorno do espectro autista (TEA).

A jurisprudência e as manifestações da ANS têm refletido essa evolução na compreensão da importância das terapias multidisciplinares no tratamento de transtornos do desenvolvimento, incluindo o TEA. A ANS tem destacado a necessidade de tratamento integral e ilimitado para os pacientes autistas, reconhecendo a relevância dessas terapias na promoção de uma melhor qualidade de vida e no desenvolvimento das habilidades desses indivíduos.

Contudo, o desafio persiste em garantir que os pacientes autistas tenham acesso adequado a esses tratamentos, especialmente quando as operadoras de planos de saúde relutam em cumprir as obrigações normativas estabelecidas. Isso pode criar uma barreira significativa para o acesso a terapias multidisciplinares, causando danos aos pacientes e suas famílias.

A legislação brasileira e as decisões judiciais têm sido favoráveis aos pacientes autistas, reconhecendo o direito a tratamentos multidisciplinares e, em muitos casos, obrigando as operadoras de planos de saúde a cumprir essas obrigações. Os tribunais têm enfatizado a necessidade de tratar cada caso de forma individual, considerando as necessidades específicas do paciente autista.

Além da cobertura, outra questão relevante é o reembolso de despesas médico-hospitalares incorridas fora da rede credenciada. A jurisprudência tem estabelecido que isso deve ocorrer apenas em situações excepcionais, como a falta de profissionais credenciados na localidade ou em casos de urgência ou emergência. Nesses casos, o reembolso está sujeito aos preços contratados com o plano de saúde.

No entanto, é importante distinguir essas situações excepcionais daquelas em que ocorre o descumprimento das obrigações contratuais por parte da operadora de plano de saúde. Em tais casos, em que a operadora não atende ao que foi acordado no contrato ou viola determinações normativas da ANS, o paciente autista tem o direito de buscar o reembolso integral das despesas relacionadas ao tratamento multidisciplinar.

A conclusão deste trabalho destaca a importância de garantir o acesso dos pacientes autistas a tratamentos multidisciplinares, incluindo a musicoterapia, de forma integral e ilimitada. Isso é fundamental para promover o desenvolvimento e a qualidade de vida desses pacientes. As operadoras de planos de saúde têm a responsabilidade de cumprir suas obrigações contratuais e regulatórias, assegurando que os pacientes autistas recebam o tratamento necessário. A legislação, a jurisprudência e as manifestações da ANS têm favorecido a cobertura desses tratamentos, mas é essencial que os pacientes e suas famílias estejam cientes de seus direitos e busquem auxílio legal quando necessário. A negação de cobertura ou o descumprimento de obrigações contratuais não deve ser tolerada, e os pacientes autistas têm o direito de lutar por seus direitos e pela justiça.

Em última análise, a pesquisa demonstra que a responsabilidade do plano de saúde de cobrir ilimitadamente o tratamento de pacientes autistas é uma questão em constante evolução, com um foco crescente na importância das terapias multidisciplinares e na proteção dos direitos dos beneficiários. A sociedade e o sistema de saúde suplementar devem continuar a se adaptar e aprimorar suas práticas para garantir que os pacientes autistas recebam o tratamento de que necessitam e merecem, em observâncias aos princípios constitucionais que regem o ordenamento jurídico, de maneira a satisfazer, sobretudo a dignidade humana.


1Organização Internacional fundada através da Carta das Nações Unidas, elaborada por representantes de 50 países presentes à Conferência sobre Organização Mundial, em San Francisco – EUA, atualmente é composta por 193 Estados-Membros.
2Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.

REFERÊNCIAS

ARISTÓTELES. Coleção Fora de Série – Ética a Nicômaco, 2ª edição. São Paulo: Grupo GEN, 2017. E-book. ISBN 9788530977467. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530977467/. Acesso em: 24 set. 2023.

ASSUNÇÃO, Jadson Ian Costa; ASSUNÇÃO, Jeane Rodella. A importância do exercício físico no tratamento dos transtornos mentais. Práticas e Cuidado: Revista de Saúde Coletiva, v. 1, p. e9992-e9992, 2020.

CAVALIEIRE, Shelen Verissimo. O direito fundamental à saúde das pessoas com transtorno do espectro autista no âmbito da saúde suplementar no Brasil. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Direito)–Faculdade Nacional de Direito, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2021. 

ASSIS DIAS, J. F. de; KRACIESKI, G. J. Evolução filosófica do conceito de dignidade humana. Aufklärung: revista de filosofia, [S. l.], v. 8, n. 1, p. p.135–152, 2021. DOI: 10.18012/arf.v8i1.53583. Disponível em: https://periodicos.ufpb.br/index.php/arf/article/view/53583. Acesso em: 16 set. 2023.

BARROSO, Luís R. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Editora Saraiva, 2023. E-book. ISBN 9786553624788. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786553624788/. Acesso em: 29 set. 2023.

BARROS, Caroline Lopes; LOPES, Williane Gonzaga; LAMEIRA, Maria Goretti Sousa. O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA E A ATIVIDADE FÍSICA NA INFÂNCIA: Uma revisão sistemática da literatura (2015-2020). Revista de Educação, Saúde e Ciências do Xingu, v. 1, n. 5, 2022.

BARROS, Patrícia. Saúde global e organização mundial da saúde: uma perspectiva crítica a partir do direito internacional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2020. 268 p. 

BÍBLIA. A.t. Gênesis, Português, Bíblia Sagrada, Capítulo 1, versículo 26.

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, DF, out. 1988. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 16 set. 2023

BRASIL. DECRETO Nº 3.956, DE 8 DE OUTUBRO DE 2001. Promulga a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2001/D3956.htm>. Acesso em: 18/10/2023.

BRASIL. DECRETO Nº 6.949, DE 25 DE AGOSTO DE 2009. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm>. Acesso em 17/10/2023.

BRASIL. LEI Nº 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/leis/L8069.htm>. Acesso em: 15 out. 2023.

BRASIL. LEI Nº 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 15/10/2023.

BRASIL. LEI Nº 9.394, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm>. Acesso em 16/10/2023.

BRASIL. LEI Nº 13.146, DE 6 DE JULHO DE 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm>. Acesso em 17/10/2023.

BRASIL. LEI Nº 13.861, DE 18 DE JULHO DE 2019. Altera a Lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989, para incluir as especificidades inerentes ao transtorno do espectro autista nos censos demográficos. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019- 2022/2019/lei/L13861.htm >. Acesso em 18/10/2023.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça STJ – RECURSO ESPECIAL: REsp 2047956 SP 2023/0013326-4. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/1769354861. Acesso em: 09/11/2023.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça STJ – AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL: AgInt no REsp 1932967 RJ 2021/0111454-5. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/1730645203. Acesso em:10/11/2023.

BRITO, Hellen Kristina Magalhães et al. O impacto da terapia cognitivo-comportamental no transtorno do espectro autista. Brazilian Journal of Health Review, v. 4, n. 2, p. 7902-7910, 2021.

CÍCERO. Dos Deveres. Trad. por Alex Martins. São Paulo: Martin Claret, 2007.

CUNHA, Eugênio. Autismo e inclusão: psicopedagogia e práticas educativas na escola e na família. 4 ed. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2012.

CUNHA, Felipe Hotz de Macedo. Proteção contra qualquer forma de abuso e exploração e contra tratamentos desumanos e degradantes. In: TIBYRIÇÁ, Renata Flores; D’ANTINO, Maria Eloisa Famá. Direitos das pessoas com autismo: comentários interdisciplinares à Lei n. 12.764/2012. São Paulo: Memnon Edições Científicas, 2018, p. 181-190.

COSTA, Victor M. et al. Síndrome de West, autismo e displasia cortical temporal: resolução da epilepsia e melhora do autismo com cirurgia. Journal of Epilepsy and Clinical Neurophysiology, v. 14, p. 33-37, 2008.

Declaração Universal dos Direitos Humanos – DUDH. Assembleia Geral da ONU, A/Res/3/217A  (10  de  dezembro  de  1948). Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/declaracao-universal-dos-direitos-humanos. Acesso em: 18 set. 2023

DUARTE, Cíntia Perez et al. Diagnóstico e intervenção precoce no Transtorno do Espectro do Autismo: Relato de um caso. In: CAMINHA, Vera Lúcia (Org) et al. Autismo: vivências e caminhos. São Paulo: Blucher, f. 70, 2015. 139 p. cap. 4, p.46-56. Disponível em: https://openaccess.blucher.com.br/article-list/autismo-292/list#undefined. Acesso em: 20/10/2023.

GRIMALDI, Tiffany. Direitos garantidos a crianças com transtorno do espectro autista: carência de legislação específica para operadoras de saúde complementar em Pernambuco. 2023.

GONÇALVES, Guilherme Oscar et al. A natureza do rol de procedimentos da ANS após alterações com a lei 14.454 de 21 de setembro de 2022. 

JEFFERSON, Thomas. III. Jefferson’s “original rough draught” of the Declaration of Independence 11 June-4 July 1776. National Archives. Founders Online. Disponível em: <Disponível em: http://founders.archives.gov/documents/Jefferson/01-01-02-0176-0004 >. Acesso em: 12 out. 2023

KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. (Coleção textos filosóficos). Lisboa: Grupo Almedina (Portugal), [Inserir ano de publicação]. E-book. ISBN 9789724422251. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9789724422251/. Acesso em: 21 out. 2023.

LIGUORI, R. H. de O. A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. Revista Saber Digital, [S. l.], v. 3, n. 01, p. 113–124, 2021. Disponível em: https://revistas.faa.edu.br/SaberDigital/article/view/1011. Acesso em: 10 out. 2023.

LIMA, Rossano Cabral. Investigando o autismo: eoria da mente e a alternativa fenomenológica. Rev. NUFEN, v. 11, n. 1, p. 194-214, abr. 2019. Disponível em: http://dx.doi.org/10.26823/RevistadoNUFEN.vol11.nº01ensaio49. Acesso em:

MACHADO, Letícia Vier; DE LAJONQUIÈRE, Leandro; MACHADO, Adriana Marcondes. O AUTISMO EM POLÍTICAS PÚBLICAS BRASILEIRAS NA INTERFACE ENTRE SAÚDE E EDUCAÇÃO: DA SINGULARIDADE À EXCEPCIONALIDADE. Humanidades & Inovação, v. 9, n. 24, p. 54-65, 2022.

MAZZOLI, Luiz Augusto et al. O Acesso do Consumidor aos Tratamentos Off Label à luz dos requisitos impostos pela Lei 14.454/2022. 2022.

MIRANDOLA, Giovanni Pico D. Discurso Sobre a Dignidade do Homem. [Digite o Local da Editora]: Grupo Almedina (Portugal), 2006. E-book. ISBN 9789724422077. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9789724422077/. Acesso em: 22 out. 2023.

MITIDIERO, Daniel F.; MARINONI, Luiz Guilherme B.; SARLET, Ingo W. Curso de direito constitucional. [Digite o Local da Editora]: Editora Saraiva, 2023. E-book. ISBN 9786553624771. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786553624771/. Acesso em: 21 out. 2023.

MORAES, Thiago Augusto Pereira et al. O direito a políticas públicas de saúde de um 

paciente com transtorno do espectro autista e sua consequência nas relações familiares: um relato de caso. Brazilian Journal of Development, v. 8, n. 6, p. 42575-42594, 2022.

NASCIMENTO, Andressa et al. A negativa dos planos de saúde em custear o tratamento multidisciplinar para pessoas autistas limitando a garantia socioeducacional efetiva. 2023.

OLIVEIRA, Érica Monteiro et al. O impacto da psicomotricidade no tratamento de crianças com transtorno do espectro autista: revisão integrativa. Revista Eletrônica Acervo Saúde, n. 34, p. e1369-e1369, 2016.

PAGANINI, Juliana. A CRIANÇA E O ADOLESCENTE NO BRASIL: UMA ANÁLISE DA SAÚDE COMO UM DIREITO FUNDAMENTAL. UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE–UNESC PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO, PESQUISA E EXTENSÃO-PROPEX UNIDADE ACADÊMICA DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS–UNACSA UNIDADE ACADÊMICA DE CIÊNCIAS DA SAÚDE-UNASAU, p. 10, 2020.

PAGANINI, Gislaini Pereira. Transtorno do espectro autista: proteção jurídica das pessoas portadoras de transtorno do espectro autista. Direito-Araranguá, 2020.

PEREIRA, Elizabeth Rodrigues de Oliveira et al. O corpo ganha lugar na educação inclusiva: um olhar para a motricidade no transtorno do espectro do autismo (TEA). 2020.

PIETROBON, L.; PRADO, M. L. DO .; CAETANO, J. C.. Saúde suplementar no Brasil: o papel da Agência Nacional de Saúde Suplementar na regulação do setor. Physis: Revista de Saúde Coletiva, v. 18, n. 4, p. 767–783, 2008. Disponível em: https://www.scielo.br/j/physis/a/KFy6MMGRnjWVLNL7DKkXRKm/#. Acesso em 31 de out. de 2023.

PINTO, Luiz Felipe; SORANZ, Daniel Ricardo. Planos privados de assistência à saúde: cobertura populacional no Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, v. 9, p. 85-98, 2004.

PESSOA, Aline Cais. A repercussão da Lei nº 14.454/2022 na cobertura obrigatória dos planos de assistência à saúde Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 jul 2023, 04:36. Disponível em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/61917/a-repercusso-da-lei-n-14-454-2022-na-cobertura-obrigatria-dos-planos-de-assistncia-sade. Acesso em: 10 nov 2023.

SARLET, Ingo Wolfgang. Os direitos fundamentais sociais na ordem constitucional brasileira. Revista PGE, Porto Alegre, v. 25, n. 55, p. 29-69, 2002.

SANTOS, Laiane Lauro dos. Os desafios enfrentados pelas crianças autistas diante dos protocolos de saúde da ANS e burocracia estatal. 2023.

SANTANA, Fernando et al. SATA (Sistema de Acompanhamento do Tratamento de Autismo). In: Brazilian Symposium on Computers in Education (Simpósio Brasileiro de Informática na Educação-SBIE). 2017. p. 1760.

SILVA LIMA, Fernanda; CROCETTA, Bruna Baggio. Os direitos humanos a partir de uma perspectiva intercultural. Revista Argumentum-Argumentum Journal of Law, v. 20, n. 1, p. 97-111, 2019.

SILVA, Ana Beatriz Barbosa; GAIATO, Mayara Bonifacio; REVELES, Leandro Thadeu. Mundo singular. Entenda o Autismo. Rio de Janeiro: Editora Fontana, 2012.

SILVA, Pedro Luiz Tavares. A obrigatoriedade do rol de procedimentos da ANS pelos planos de saúde e o advento da lei nº 14.454/2022, à luz do direito do consumidor. 2022.

ROSSET, Luciano. A democracia ateniense: filha de sua história, filha de sua época. Revista de Cultura Teológica. v.16, n.64.jul/set2008. Disponível em <https://revistas.pucsp.br/index.php/culturateo/article/viewFile/15535/11601>. Acesso em: 21 de out. de 2023.

REMEDIO, José Antonio; ALVES, Alexandre Luiz Rodrigues. Direito à educação da pessoa com transtorno do espectro autista: obstáculos à sua efetivação. Espaço Jurídico Journal of Law [EJJL], v. 22, n. 2, p. 377-404, 2021.

SARMENTO, Daniel. Dignidade da Pessoa Humana. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2016.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo/ José Afonso da Silva. – 40. ed., rev. e atua/ até a Emenda Constitucional n. 95, de 15.12.2016. São Paulo: Malheiros, 2017.

Aplicabilidade das normas constitucionais. 3. ed. São Paulo, Malheiros, 1999.

TAVARES, Júlia Meyer Fernandes. A filosofia da justiça na obra de Marco Túlio Cícero. 2012. 100 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012. Disponível em: https://tede.pucsp.br/handle/handle/6092. Acesso em: 10 de out. de 2023.

TOMÁS DE AQUINO, Santo, 1225?-1274. Suma de teologia : [Primeira parte – questões 84-89] / Tomás de Aquino ; tradução e introdução Carlos Arthur Ribeiro do Nascimento. – Uberlândia: EDUFU, 2016. Disponível em: http://www.edufu.ufu.br/sites/edufu.ufu.br/files/ebook_suma_de_teologia_2017_1.pdf