TRIBUNAL DO JÚRI: A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NAS DECISÕES DO  CONSELHO DE SENTENÇA FRENTE AO DEVIDO PROCESSO LEGAL¹

JURY COURT: THE INFLUENCE OF THE MEDIA ON THE DECISIONS OF THE SENTENCING COUNCIL IN THE FACE OF DUE PROCESS OF LAW

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10047778


Wesley da Silva Alves2
Karoline Silva Costa3


RESUMO: O presente artigo tem como objetivo analisar a influência da mídia no tribunal do júri frente às decisões do conselho de sentença com foco no devido processo legal. visto que a crescente presença da mídia na sociedade tem levado a uma maior exposição e interesse público em relação aos processos judiciais, em especial os que envolvem o tribunal do júri, devido ao grande poder de persuasão que a mídia detém, e assim gerando uma exposição maior que acaba por interferir no processo legal, se tornando um desafio para o sistema jurídico brasileiro. Para alcançar os objetivos aqui apresentados a metodologia adotada foi a revisão de literatura, por meio de análise de livros, artigos, monografias e dissertações disponíveis na internet. Essa abordagem permitiu o levantamento de informações relevantes e a construção de um arcabouço teórico consistente para agregar a discussão  acerca do tema proposto. Foi abordado o papel da mídia assim como os meios de preservar um processo legal justo e célere, analisando desta forma o sigilo das investigações e consequentemente dos autos processuais, nesse sentido é de suma relevância entender a interação entre a mídia e o tribunal do júri e como essa relação acaba por impactar nas decisões do conselho de sentença. Com base na revisão de literatura realizada, este artigo está estruturado em quatro seções, além desta introdução. A segunda seção visa sobre, a influência da mídia no tribunal do júri frente às decisões do conselho de sentença, já a terceira seção analisa o tribunal do júri e suas atribuições dentro do sistema jurídico brasileiro, e por fim a quarta seção que examina os casos emblemáticos e consequentemente discute a veracidade das decisões e identifica estratégias para assegurar o devido processo legal.

Palavras-Chave: Tribunal do Júri. Mídia. Devido processo legal.

ABSTRACT: This article aims to analyze the influence of the media in the jury’s court in relation to the decisions of the sentencing council with a focus on due process of law. since the growing presence of the media in society has led to greater exposure and public interest in relation to judicial proceedings, especially those involving the jury court, due to the great power of persuasion that the media has, and thus generating exposure which ends up interfering in the legal process, becoming a challenge for the Brazilian legal system. To achieve the objectives presented here, the methodology adopted was the literature review, through the analysis of books, articles, monographs and dissertations available on the internet. This approach allowed the collection of relevant information and the construction of a consistent theoretical framework to aggregate the discourse on the proposed topic. The role of the media was addressed, as well as the means of preserving a fair and speedy legal process, analyzing in this way the secrecy of investigations and consequently of the procedural records, in this sense it is of paramount importance to understand the interaction between the media and the jury court how this relationship ends up impacting the decisions of the sentencing council. Based on the literature review carried out, this article is structured in four sections, in addition to this introduction. The second section aims at the influence of the media in the jury court against the decisions of the sentencing council, the third section analyzes the jury court and its attributions within the Brazilian legal system, and finally the fourth section that examines the emblematic cases and consequently discusses the veracity of decisions and identifies strategies to ensure due process of law.

KEYWORD: Jury court. Media. Due process of law.

1 INTRODUÇÃO 

Há décadas, a mídia vem assumindo um papel de mediadora do conhecimento, já que está inserida cada vez mais no dia a dia dos indivíduos, alcançado a população através dos mais diversos meios de comunicação, desempenhando um papel de grande influência na sociedade, tanto nos costumes como nas relações de trabalho, comportamentais e na formação de ideologias, exercendo assim um papel de formadora de caráter.

A crescente presença da mídia na sociedade tem levado a uma maior exposição e interesse público em relação aos processo judiciais, em especial os que envolvem o tribunal do júri, devido ao grande poder de persuasão que a mídia detém.

A autenticidade das publicações não dita as prioridades dos meios midiáticos, que é de fato importante ferramenta formadora de opinião, se tornando perigosa diante de sua propagação, pois os danos que pode causar à privacidade, à imagem, e a honra do indivíduo são irreparáveis, direitos estes que estão protegidos pela Constituição da República Federativa do Brasil, em seu art.5º, X. sendo esta cláusula pétrea (BRASIL, 1988).

As informações advindas da mídia imediatista têm força e repercussão em várias áreas, mas em especial no âmbito jurídico, principalmente na esfera penal e processual penal, em relação a um acusado, é inequivocamente grave, podendo causar prejuízos irreparáveis, custando até mesmo a restrição de liberdade, e dessa forma influenciando os membros do Tribunal do Júri que compõe o conselho de sentença.

O Tribunal do Júri, desde sua inserção na sistemática legal brasileira, tem evoluído e se adaptado aos regimes políticos, e pela soberania dos veredictos assegurada pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é tido por muitos como um instituto imprescindível à consagração da democracia, pois além de ser um instituto jurídico, é também um instrumento político, pois retirou das mãos dos monarcas o poder soberano de decidir e julgar, partilhando com cidadãos comuns. 

Ressalta-se que o respectivo instituto detém competência constitucional de julgar os chamados crimes dolosos contra a vida, ou seja, aqueles que resultem em morte, ou foram cometidos com a intenção de matar, entre outros. Sendo composto por um juiz togado e um conselho de sentença, formado por jurados leigos comuns ao povo, que decidem sobre a absolvição ou condenação do réu, com previsão normativa no maior diploma jurídico brasileiro, art. 5º, XXXVIII d. (BRASIL 1988).

Dessa forma, o presente trabalho visa demonstrar e  entender a interação entre a mídia e o tribunal do júri e como essa relação acaba por impactar nas decisões do conselho de sentença. Assim sendo necessário identificar estratégias que visam preservar um processo penal justo e célere, minimizar consequentemente a influência da mídia nas tomadas de decisões do conselho de sentença. 

Ao explorar o respectivo tema, o presente artigo contribui para o debate sobre o papel da mídia no sistema jurídico e oferece subsídios para a reflexão acerca das práticas e medidas que possam ser adotadas a fim de garantir um devido processo legal, sem vícios ou inveracidades. Diante todo o exposto, o presente artigo busca investigar o problema da influência da mídia no tribunal do júri frente às decisões do conselho de sentença.

O objetivo geral deste artigo é verificar a influência da mídia no tribunal do júri frente às decisões do conselho de sentença, com foco no devido processo legal. Os objetivos específicos incluem: analisar o tribunal do júri e suas atribuições dentro do sistema jurídico brasileiro; compreender o papel da mídia a quanto formadora de opinião pública frente às decisões advindas do conselho de sentença; examinar os casos emblemáticos e discutir consequentemente  a veracidade das decisões e identificar estratégias para assegurar o devido processo legal, como o sigilo das investigações e dos autos processuais.

Para alcançar os objetivos propostos, a metodologia adotada foi a revisão de literatura, por meio de análise de livros, artigos, monografias e dissertações disponíveis na internet. Essa abordagem permitiu o levantamento de informações relevantes e a construção de um arcabouço teórico consistente para agregar a discussão acerca do tema apresentado.

Com base na revisão de literatura realizada, este artigo está estruturado em quatro seções, além desta introdução. A seção 2, a influência da mídia no tribunal do júri frente às decisões do conselho de sentença, bem como os casos emblemáticos, a seção 3, analisar o tribunal do júrí e suas atribuições dentro do sistema jurídico brasileiro, e a seção 4; identificar estratégias para assegurar o devido processo legal. Por fim, na conclusão serão retomados os principais pontos discutidos ao longo do texto, ressaltando a importância do tema aqui apresentado. 

2 TRIBUNAL DO JÚRI E SUAS ATRIBUIÇÕES DENTRO DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

O desenvolvimento histórico do tribunal do júri, bem como dos demais ramos do direito, vem contribuindo para o avanço jurídico através da valorização da dignidade humana e a proteção dos direitos que a estes são inerentes, sendo evidenciados como cláusula pétrea na Constituição da República Federativa do Brasil, em seu art.5º e seguintes (BRASIL, 1988) tratando-se de direitos fundamentais, sendo estes assegurados pelo dispositivo legal citado.

Nesse sentido é válido destacar que o Tribunal do júri foi instituído no Brasil, pelo decreto imperial de 18 de junho de 1822, tendo como competência inicial julgar crimes de imprensa, e desde sua instituição dentro do ordenamento brasileiro vem sendo aperfeiçoado e atualizado de acordo com as necessidades da época em questão, voltado para um procedimento ou processo, justo, célere respeitando a dignidade humana e os direitos que estes detêm.

Em conformidade ao exposto é válido mencionar que o Instituto do Tribunal  do Júri é assegurado pelo Código de Processo Penal (BRASIL, 1941), (BRASIL,1988), dentre vários dispositivos legais, sendo este um direito e garantia individual disposto no artigo 5º, inciso XXXVIII da Constituição da República Federativa do Brasil 1988. Sendo assim, o respectivo instituto é consolidado como cláusula pétrea, significa que o Júri não poderá ser alterado nem mesmo por emenda Constitucional, tendo sua organização evidenciada no Código de Processo Penal:

O júri na atual Constituição encontra-se disciplinado no art. 5º, XXXVIII, inserido no capítulo dos Direitos e Garantias Individuais. Sua finalidade é a de ampliar o direito de defesa dos réus, funcionando como uma garantia individual dos acusados pela prática de crimes dolosos contra a vida e permitir que, em lugar do juiz togado, preso a regras jurídicas, sejam julgados pelos seus pares. Com direito e garantia individual, não pode ser suprimido nem por emenda constitucional, constituindo verdadeira Cláusula Pétrea (núcleo constitucional intangível). Tudo por força da limitação material explicita contida no art. 60, §4º, IV, Constituição Federal (CAPEZ, 2018, p 646).

Nesse sentido, Távora (2017) entende que o respectivo instituto do Júri foi criado como um meio garantidor de defesa do acusado e do devido processo legal, constituindo direito e garantia fundamental, o qual deve ser ratificado e respeitado. Assim, nota-se que o tribunal do júri é uma instituição do sistema de justiça brasileiro que julga os crimes dolosos contra a vida, ou seja, os crimes que resultam em morte ou que foram cometidos com a intenção de matar. 

Além de que o legislador não faz distinção entre crimes consumados e tentados, de modo que o Tribunal do Júri tem competência para julgar a ambos, assim sendo o Tribunal do Júri também é responsável por julgar os crimes conexos ou continentes aos crimes dolosos contra a vida, como prevê o art. 78, inciso I, Código de Processo Penal (BRASIL, 1941).

Desse modo, é de grande relevância destacar os princípios indispensáveis   para processo penal, sendo, a competência para julgar crimes dolosos contra a vida, assegurado a plenitude de defesa, o sigilo das votações e a soberania dos veredictos, desta forma entende-se que o respectivo instituto é dotado de disposição legal.

Por conseguinte, é válido mencionar a obrigatoriedade que no rito do júri, sejam assegurados os respectivos princípios prelecionados acima, com o fim de que seja garantido o devido processo legal e consequentemente, a decretação de uma decisão legal e justa.

Para maior compreensão, entende-se que o indivíduo que praticou, por exemplo, um estupro, e não satisfeito praticou ainda um homicídio doloso, de forma conexa, será julgado por ambas as condutas perante o Tribunal do Júri, conforme legislação pertinente.

Conseguinte ao exposto, é inerente mencionar que há uma grande aflição com as decisões proferidas pelo Tribunal do Júri, em virtude da consequência no ordenamento jurídico e nos meios sociais. Uma vez que, suas decisões são de suma importância para a coletividade, afetando de forma direta a vida privada ou coletiva dos indivíduos que recebem a decisão proferida pelo respectivo tribunal.

3 ESTRATÉGIAS PARA PRESERVAR O DEVIDO PROCESSO LEGAL

Frente a influência que a mídia exerce fortemente quanto a opinião pública e consequentemente nos casos de grande clamor social, é de suma relevância apresentar estratégias eficazes que visem assegurar um devido processo legal, através de enfatizar o princípio da presunção de inocência para os jurados que compõe o conselho de sentença, explicando-lhes que se presume inocente até prova contrária, como preleciona a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, em seu art. 11º.

Vale registrar, ainda, sobre o princípio da imparcialidade disposto (BRASIL, 1988) art. 5º, XXXVII, uma vez que não haverá tribunal de exceção, o qual as regras seriam criadas conforme a conveniência de julgamento de réus sem dar chance para uma defesa. Dessa maneira o processo deve seguir conforme os parâmetros legais, caso não seja voltado a legalidade não há em que se falar em um processo válido e justo.

Questiona-se até que ponto pode chegar à liberdade midiática frente ao judiciário, visto que essa não detém proteção e poderes absolutos, uma vez que se deve respeitar sua regulamentação e demais legislações pertinentes, não afrontando direitos  conferidos por leis vigentes para a pessoa humana.

Sendo assim, é válido salientar que ante todos os conflitos que perfazem o mundo jurídico, trata-se nessa temática da colisão entre direitos e princípios fundamentais, mais precisamente do direito à liberdade de imprensa contra-atacando o direito à inocência presumida, devido processo legal e um julgamento justo.

A atividade exercida pela mídia na forma ampla como cobre determinados casos e sem a presença de seus devidos limites tem causado sério desequilíbrio no processo penal, em especial ao indivíduo submetido a julgamento popular que, antes mesmo de enfrentar o processo legal, acaba absorvendo a presunção de culpa em virtude do impacto negativo que as informações, arbitrarias veiculadas a imprensa repercutem. Deste modo:

Veríamos os mesmos delitos punidos diferentemente, em diferentes tempos, pelo mesmo tribunal, porque, em lugar de escutar a voz constante e invariável das leis, ele se entregaria á instabilidade enganosa das interpretações arbitrárias ̈ (BECCARIA,2017, p. 27).

Pelas razões alinhadas, observando o apanhado geral do Tribunal do Júri, bem como os princípios atinentes a essa instituição, cabe reforçar que é de suma importância que o respectivo instituto seja considerado e apreciado de forma direta por todos os que estão sujeitos às legislações pertinentes, mesmo que este não se encontre na posição de acusado, uma vez que o referido instituto é uma garantia legal, sendo inerente à dignidade humana.

Destaca-se ainda como meio para preservar o devido processo legal, as regras de admissibilidade da prova são fundamentais para garantir que o Tribunal do Júri tome decisões baseadas em evidências sólidas e confiáveis, minimizando a influência de fatores externos, como a mídia. Nesta seção, discutiremos como as regras de admissibilidade podem contribuir para um julgamento justo e imparcial, mesmo em casos de grande clamor social e cobertura midiática intensa (TOURINHO FILHO, 2012).

O sigilo das investigações e dos autos processuais é uma ferramenta importante para minimizar a influência midiática no Tribunal do Júri e garantir um julgamento justo e imparcial. Ao proteger informações sensíveis e os direitos fundamentais das partes envolvidas, o sigilo contribui para a preservação dos princípios da presunção de inocência e imparcialidade  (TOURINHO FILHO, 2012). 

O sigilo das investigações ajuda a proteger informações sensíveis que, se divulgadas prematuramente, podem comprometer a efetividade das apurações e o desfecho do processo. 

Ao manter o sigilo das investigações, o Poder Judiciário e as autoridades responsáveis pela investigação evitam que a mídia tenha acesso a detalhes que possam ser distorcidos ou usados de forma sensacionalista, reduzindo a influência midiática sobre a opinião pública e os jurados (MORAES, 2015).

4 A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NO TRIBUNAL DO JÚRI FRENTE ÀS DECISÕES DO CONSELHO DE SENTENÇA

O instituto do Júri busca proteger e assegurar um processo justo, voltado na legalidade, entretanto o respectivo instituto, por mais que tenha todas essas proteções legais, vem sendo atacado e influenciado em suas decisões, por um instituto que está sendo idealizado como quarto poder, sendo esta, a mídia, que ao decorrer dos anos vem se mostrado presente em todo e qualquer momento da vida humana, seja ele bom ou ruim, visando noticiar um determinado acontecimento ou vários. 

O Tribunal do Júri frente às divulgações exageradas feitas pela mídia acaba por ser prejudicado, quando se está diante de casos de grande repercussão, ou seja, aqueles que a mídia faz cobertura de forma sensacionalista e tendenciosa. A imprensa, sendo um dos principais meios de comunicações e informações, exerce influência direta na construção das narrativas, na seleção dos fatos e na interpretação dos acontecimentos (PRADO, 2010).

4.1. A influência da mídia na opinião pública

Compreende-se que a mídia e suas ferramentas detêm forte influência sobre o comportamento humano, seja ele social, cultural, interpessoal ou até mesmo jurídico, contribuindo nas mudanças de valores e atitudes, através das informações e mensagens que propaga. O conceito de mídia vem teoricamente dessa ideia de comunicação em massa, conforme dispõe, Garcia (2015, p. 71):

[…] representa o conjunto de instituições que utiliza tecnologias específicas para realizar a comunicação humana, assumindo um papel intermediário tecnológico para que a comunicação se realize. A comunicação passa, portanto, a ser uma comunicação midiatizada, constituindo-se em um dos importantes símbolos da modernidade. (Garcia.2015, p. 71).

Visto esse poder que a mídia detém sobre a sociedade, ratifica-se  que a influência midiática é um dos maiores formadores de opinião pública, tendo como pressuposto o livre e pleno exercício de liberdade de pensamento e de propagar informações, como dispõe art. 5º, IX, XIV d. (BRASIL, 1988) e Lei nº 5.250, de 9 de fevereiro de 1967 em seu art.1º.

Nesse contexto, destacam-se os crimes de grande violência, que são os holofotes para a mídia, uma vez que está ligado diretamente com a emoção e clamor social, vale mencionar que a mídia tem feito desse cenário um verdadeiro circo, desta forma atingindo diretamente o cenário jurídico, principalmente em relação ao instituto do Tribunal do Júri, uma vez que esses respectivos jurados conheçam e simpatizem com a notícia evidenciada, desta maneira indo para o respectivo julgamento já com sua decisão em mente, antes mesmo de compreender e analisar o delito praticado pelo indivíduo. 

Esses casos ilustram o poder da mídia na construção das narrativas e na formação da opinião pública, bem como a influência que essas narrativas podem exercer sobre os julgamentos e a imparcialidade dos júris. A exposição excessiva e a exploração sensacionalista dos casos criminais podem criar um ambiente de pressão e pré-julgamento, comprometendo a preservação dos princípios da presunção da inocência e da imparcialidade nas decisões do conselho de sentença (MARICATO,2017).

Em síntese, entende-se por elemento manifestadamente cultural a postura da    mídia, assumindo um papel latente de formador de opiniões, tanto que já se usa a expressão de Quarto Poder.

Para aferir tamanha influência que a mídia tem exercido sobre a sociedade, principalmente em relação ao meio jurídico, ao se tratar do tribunal do júri, uma vez que, é possível que os jurados ao julgar um caso concreto já tenham recebido algumas informações pela a mídia e assim idealizado suas convicções e opiniões sobre o respectivo caso, somente pelo exposto e informado pelos meios midiáticos, acarretando assim, um julgamento prévio. Nesse contexto, o réu chega no tribunal já condenado, antes mesmo de passar pelos ditames legais ou julgamento processual. 

Em conformidade ao exposto. Dificilmente um jurado consegue manter-se inerte diante da pressão da mídia e do prévio julgamento extrajudicial transmitido diariamente para as suas casas¨ (PRATES; TAVARES, 2008, p. 33-39).

4.2. Casos Emblemáticos

A crescente interferência e influência da mídia na opinião pública é preocupante uma vez que, são diversos os instrumentos e meios usados para influenciar e atacar suas as decisões advindas do tribunal do júri, tendo como principal inibidor desta circunstância, a mídia, que ao longo dos anos evoluiu de forma significativa em vários cenários, sendo estes, sociais, culturais, político, estruturais e até mesmo no âmbito jurídico.

Neste sentido, ratifica-se o poder de manipulação que a mídia exerce sobre a opinião pública, e em especial com relação aos crimes que despertam, o sentimento de revolta nas pessoas. 

É oportuno, ainda, evidenciar a presença de tal influência nas decisões proferidas pelo Conselho de Sentença do Tribunal do Júri, uma vez que, estes não embasados no saber jurídico, acaba interpretando de forma arbitrária o delito exposto a eles, e se deixando influenciar diretamente pelas notícias que os cercam, assim não respeitando o que preleciona a Carta Magna de 1988.

4.2.1. Caso Boate Kiss

O caso da Boate Kiss que ocorreu em Santa Maria-RS em 27 de janeiro de 2013, o qual houve um incêndio que resultou na morte de 242 pessoas e feriu outras 636 sendo as vítimas em sua maioria, jovens e  estudantes com idades entre 17 e 30 anos. 

O respectivo caso foi abordado de forma contínua e duradoura pela mídia, ou seja, bastava ligar a TV em qualquer canal que lá estaria passando a triste tragédia ocorrida em Santa Maria-RS e essa situação se estendeu por vários meses e até anos, pois a mídia sempre ficava em cima tentando fornecer a qualquer custo notícias sobre o acontecido para deixar a sociedade atualizada visando manter a Tragédia da Boate Kiss sempre no ar, garantido assim, audiência certa.

Porém, fazer com que o respectivo caso não saísse das telas dos televisores, smartphones, dentre outros dispositivos e do conhecimento do povo, acarretou em informações, especulações e opiniões sem fundamentos, tornando as notícias midiáticas inconstantes e desnecessárias por repetições relacionadas ao incêndio.

Tal ocorrido se tornou tão popular entre os meios de informações, que toda a sociedade que tivesse o mínimo de acesso possível á um meio de comunicação tinha domínio do caso referido, assim chamando atenção da justiça brasileira que depois de um grande lapso temporal decidiu por mandar os acusados a júri popular, por entender que estavam diante de um crime doloso contra a vida, previsto no art.5º, inciso XXXVIII, alínea “d” (BRASIL, 1988).

Desse modo, pode-se verificar que a anulação do julgamento da boate kiss se deu devido á pressão midiática sobre o caso, no qual o Ministério Público se apressou em “em dar uma resposta”, à sociedade, o que foi seguido pelo judiciário.

Nota-se que que antes dos acusados serem julgados  de fato, já chegariam com uma sentença prévia, que advém das informações divulgadas pela mídia.

4.2.2. Elize Matsunaga

O caso Elize Matsunaga se refere ao homicídio do empresário Marcos Kitano Matsunaga, que ocorreu em 19 de maio de 2012, na cidade de São Paulo, crime cometido por sua esposa Elize Matsunaga, que confessou tê-lo assassinado com um tiro na cabeça, usando como arma do crime uma pistola. Após atirar em Marcos Matsunaga, Elize decide esquartejar o corpo, dividindo o cadáver em sete partes no apartamento da família e colocando-o em três malas, visando jogar o descarte na estrada.

Segundo a perícia, Marcos foi baleado e esquartejado, resultando assim em uma morte quase instantânea. Segundo a acusada, a descoberta de uma relação extraconjugal de seu marido teria motivado o delito. De acordo com Elize, somente ela teria sido responsável pelo crime, afastando assim a possível participação de outra pessoa.

O caso deu-se por encerrado na madrugada do dia 5 de dezembro de 2016, após 4 anos da data do assassinato, visto que este foi coberto de forma incisiva pela midía e, consequentemente retirando da acusada um devido processo legal, visto que já chegava no plenário com uma sentença pré-estabelecida, sem chance de defesa e   , consequentemente, sua presunção de inocência.

O referido crime teve a cobertura midiática tendenciosa e sensacionalista, todos os dias eram divulgados fatos que não condizem com a realidade e não constavam no processo, gerando, desse modo, clamor social que para fazer certa pressão ao sistema jurídico, para uma decisão apressada.

O fato ocorrido paralisou toda a mídia brasileira, o qual buscava a todo tempo ter notícias para divulgarem, uma vez que os espectadores estavam antenados aos meios de comunicação, buscando a todo minuto informações atualizadas, ou seja, o caso exposto se tornou um verdadeiro espetáculo. 

Destaca-se que determinadas violações ocorreram devido a condutas omissivas e comissivas dos agentes públicos que seriam responsáveis por todo o processo criminal e até mesmo pelas investigações.

Nesse aspecto, é importante salientar que a sociedade não pode naturalizar que o investigado vire um objeto, no qual a mídia tenta de todas as formas propagar informações que sequer foram apuradas, vindo a punir o acusado antes do seu julgamento formal. Assim, mesmo em casos de absolvição, tais influências acabam por prejudicar o indivíduo em sua vida perante a sociedade, visto que após o exposto a sua imagem ficará sempre ligada às acusações imputadas a este.

5 CONCLUSÃO

Diante do exposto, é possível afirmar que os objetivos deste artigo foram alcançados. Foi analisada a relação entre a mídia e o Tribunal do Júri, com ênfase na preservação do devido processo legal, através  da veracidade das informações, sigilo das investigações, e consequentemente verificou-se a influência da mídia nas decisões proferidas pelo conselho de sentença do Tribunal do Júri, após a análise dos casos emblemáticos e a divulgação tendenciosa e sensacionalista feita pela mídia.

Compreendeu-se o papel da mídia enquanto formadora de opinião pública, bem como sua persuasão dentro da sociedade, através das divulgações incisivas. a partir das reflexões apresentadas, conclui-se que é fundamental a adoção de medidas que possibilitem a imparcialidade e a presunção da inocência nos julgamentos do Tribunal do Júri para que se tenha um devido processo legal célere e baseado na veracidade.

 A garantia do devido processo legal é essencial para assegurar a justiça no processo penal e a proteção dos direitos fundamentais dos acusados. Além disso, é preciso um acompanhamento atento da mídia e da opinião pública, para minimizar a influência externa no júri e nas decisões proferidas pelo conselho de sentença. 

A responsabilidade social da mídia deve ser levada em consideração, uma vez que a divulgação de informações distorcidas ou incompletas pode causar consequências graves e irreparáveis, tanto para os envolvidos quanto para a credibilidade do sistema judiciário (SANTOS, 2009).

Adotar estratégias para preservar a imparcialidade e a presunção da inocência no Tribunal do Júri é crucial para garantir a justiça e a integridade do processo penal. Tais estratégias envolvem a atuação das autoridades judiciárias e a implementação de medidas específicas para minimizar a influência externa, especialmente a midiática, no julgamento.

A busca por soluções para aprimorar a prestação jurisdicional, com o objetivo de evitar danos aos jurisdicionados e, consequentemente, a responsabilização do Estado na esfera cível, deve ser uma constante na agenda jurídica e política do país. Afinal, a celeridade da justiça é uma forma de efetivação da democracia e dos direitos fundamentais.

Logo, é importante ressaltar que a preservação do devido processo legal no Tribunal do Júri é um desafio constante para o sistema de justiça brasileiro, sendo assim necessário o aprimoramento constante das estratégias de preservação desse direito, em busca de um processo penal justo, célere e que atenda as necessidades de todas as partes envolvidas, garantindo os direitos assegurados pela Constituição da República Federativa do Brasil.

REFERÊNCIAS

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1Artigo Científico apresentado ao curso de Bacharelado em Direito na Unidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão – IESMA/UNISULMA, como Trabalho de Conclusão de Curso, Imperatriz – MA, 2023
2Acadêmico do Curso de Bacharelado em Direito da Unisulma/IESM
3Mestra em Sociologia (UFMA). Especialista em Direito Penal (FDDJ). Especialista em Gestão Pública (UEMA). Professora de Direito Penal e Sociologia Jurídica da Unidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão (UNISULMA). E-mail: karolinecosta.adv@gmail.com