A JUDICIALIZAÇÃO DO DIREITO À SAÚDE: UMA QUESTÃO DE DIGNIDADE DA PESSOA  HUMANA 

THE JUDICIALIZATION OF THE RIGHT TO HEALTH: A QUESTION OF HUMAN DIGNITY

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10045626


Cristiane Sousa Leite1
Rosa Tavares2


RESUMO: O presente trabalho visa analisar o descaso do poder público com a sociedade  especificamente relacionado à saúde, o que fere o princípio da dignidade da pessoa humana,  elencado na Carta Magna, e a consequente necessidade de intervenção do Poder Judiciário para  a efetivação desse direito. É necessário dar ênfase a esse problema tendo em vista o descaso e  a desatenção das autoridades competentes em solucionar as mais diversas dificuldades, sendo  imprescindível a interferência do Poder Judiciário para que o cidadão possa, com dignidade,  exercer o seu direito. O objetivo geral da pesquisa foi analisar a efetivação do direito  fundamental à saúde, ancorada na dignidade da pessoa humana, pela intervenção do Poder  Judiciário. Na metodologia optou pela qualitativa, quanto aos fins, realizou uma pesquisa  exploratória e quantos aos meios apresentou-se uma revisão bibliográfica. A falta de atenção  governamental motivou tal pesquisa visto que se deparou com determinadas situações que são  ignoradas pelo Estado. Assim, pretende-se trazer a discussão para o cenário acadêmico com o  intento de apontar possibilidades para minimizar essa questão que atinge diretamente uma  garantia fundamental concedida, constitucionalmente, ao cidadão brasileiro. 

Palavras-chave: Poder Judiciário. Saúde. Direito. 

ABSTRACT: The present work aims to analyze the disregard of the public power with society  specifically related to health, which violates the Magna Carta, and the consequent need for  intervention by the Judiciary to make this right effective. It is necessary to emphasize this  problem in view of the negligence and inattention of the competent authorities in solving the  most diverse difficulties, being essential the interference of the Judiciary Power so that the  citizen can, with dignity, exercise his right. The general objective of the research was to analyze  the realization of the fundamental right to health, anchored in the dignity of the human person,  through the intervention of the Judiciary. In the methodology, we opted for the qualitative one,  as for the purposes, we carried out an exploratory research and, regarding the means, we  presented a literature review. The lack of government attention motivated this research as we  came across certain situations that are ignored by the State. Thus, it intends to bring the  discussion to the academic scene with the intention of pointing out possibilities to minimize  this issue that directly affects a fundamental guarantee granted, constitutionally, to the Brazilian  citizen. 

Keywords: Judiciary Branch. Health. Law. 

1 INTRODUÇÃO: 

O presente trabalho visa expor o descaso do poder público com a sociedade  especificamente relacionado à saúde, o que fere gravemente um princípio fundamental  estabelecido na Carta Magna, e a consequente necessidade de intervenção do Poder Judiciário  para a efetivação desse direito. É de extrema importância dar ênfase a esse problema tendo em  vista o descaso e a desatenção das autoridades competentes em solucionar os mais diversos  problemas, sendo necessária a interferência do Poder Judiciário para que o cidadão possa, com  dignidade, exercer o seu direito. 

A Constituição Federal de 1988 foi a primeira a considerar a importância com a saúde  das pessoas, tratando-a como direito social e fundamental, com isso, demonstrando uma fina  sintonia entre o texto constitucional e as declarações internacionais de direitos humanos. A  saúde é um dever do Estado e direito de todos, externado na definição ampla de Poder Público.  A sua aplicação deve ter eficácia imediata, pois, o que está em ação é o direito à vida, a qual é  superior a todos.  

Esse descaso governamental motivou tal projeto, de certa forma, depara-se com  determinadas situações que são ignoradas pelo Estado. Assim, pretende trazer a discussão para  o cenário acadêmico com o intento de apontar possibilidades para minimizar essa problemática  que atinge diretamente uma garantia fundamental concedida, constitucionalmente, ao cidadão  brasileiro. 

Nesse impasse, a justificativa do tema surgiu: Sabe-se que o direito à saúde é um direito  social com fulcro na Constituição Federal e no princípio da dignidade da pessoa humana,  todavia há número significativo de ações judiciais voltadas à efetividade do direito à saúde,  pleiteando desde atendimento médico a procedimentos diagnósticos. O problema se deu em: O  que inviabiliza a efetivação do direito à saúde ancorada na dignidade da pessoa humana,  provocando a necessidade de intervenção do Poder Judiciário? 

O objetivo geral do trabalho foi analisar a efetivação do direito fundamental à saúde,  ancorada na dignidade da pessoa humana, pela intervenção do Poder Judiciário. E os objetivos  específicos foram: abordar acerca das garantias apresentadas pela Constituição quanto ao  direito à Saúde; estabelecer a relação entre o direito à saúde e o princípio da dignidade da pessoa  humana e identificar as políticas públicas voltadas à saúde. 

Optou-se por uma pesquisa de caráter bibliográfico. Utilizou-se meios de pesquisas  bases eletrônicas de dados tais como: livros, revistas e artigos científicos. Sendo as principais:  Scientific Electronic Library online (SciELO), Revista Brasileira de Ciência e Movimento.  Revista Inspirar, Moreira Júnior Editora.

Tendo como método o descritivo, já que se partirá das conclusões dos autores (GIL,  2010), consideradas, aqui, premissas maiores, para então inferir-se sobre realidades específicas.  O principal método a ser utilizado nesse projeto será bibliográfico elencando de forma  descritivo qualitativo. 

A fim de realizar uma revisão da literatura, procedeu-se à pesquisa de artigos científicos,  publicados nos bancos de dados da SciELO, revistas eletrônicas, Biblioteca Virtual em saúde e  repositórios. A palavra-chave selecionada para a pesquisa serão “.” e a busca será realizada nos  seguintes campos: título, resumo e descritores.  

Para poder descrever o quadro da gestação e a prática de exercício físico. A pesquisa  bibliográfica procurou por artigos publicados nas seguintes plataformas: SciELO, revistas  eletrônicas, Biblioteca Virtual em saúde e repositórios, e livros relacionados ao tema. 

2. O DIREITO À SAÚDE NO BRASIL 

A Constituição Federal de 1988 foi o primeiro documento a inserir o direito à saúde  definitivamente no ordenamento jurídico brasileiro. A saúde passou a ser um direito do cidadão e um  dever do Estado. A Constituição ainda determina que o sistema de saúde pública deva ser gratuito, de  qualidade e universal, isto é, acessível a todos os brasileiros e/ou residentes no Brasil. (BRASIL, 1988) 

Por ser a saúde tipificada como um bem jurídico inseparável do direito à vida, percebemos que  o Estado tem o dever de protegê-la. Segundo André da Silva Ordacgy (2009, p.1):  

A saúde é um dos bens intangíveis mais preciosos das pessoas, dignos da proteção do  
Estado, porque é uma característica indissociável do direito à vida. Assim, a saúde é um direito de todo cidadão e um dever do Estado, e deve estar totalmente integrada às políticas públicas de governo. 

A Constituição Federal, em seu artigo 196, contém uma norma de natureza programática,  exigindo a complementação legislativa ordinária. Assim, como afirma Henrique Hoffmann Monteiro  Castro (2011, 88), “o Estado assume a responsabilidade pela criação dos serviços necessários à saúde e  o faz por meio de normas infraconstitucionais”. Com base nesse contexto, foi promulgada a lei 8.080 /  90, regulamentando o Sistema Único de Saúde, e estabelecendo princípios e diretrizes para a saúde em  nosso país. 

Com a criação do SUS, foram definidos os papéis em cada ente federado, decretando-se as  responsabilidades precípuas de cada um. Henrique Hoffmann Monteiro Castro (2011, 88) explica: 

Nesse âmbito, estabelece-se uma divisão de tarefas no que tange ao fornecimento de  medicamentos, de maneira que o sistema básico de saúde fica a cargo dos Municípios  (medicamentos básicos), o fornecimento de medicamentos classificados como extraordinários compete à União e os medicamentos ditos excepcionais são fornecidos pelos Estados. Percebe-se claramente, a composição de um sistema único, que segue uma diretriz clara descentralização, com uma direção única em cada esfera de  governo.”

Assim, para os cidadãos deve ser indiferente a forma como o Estado se organiza para promover  o direito à saúde. O importante é que o direito esteja sendo garantido, permanecendo a necessidade de a  sociedade exigir do Estado a sua devida aplicação.  

O Poder Público, seja qual for a esfera institucional, não pode se mostrar indiferente aos  problemas de saúde da população. A já citada garantia constitucional permite ao cidadão o ingresso no  judiciário com ações que venham a garantir a efetividade dos seus direitos, sob pena de sofrer medidas  judiciais, ainda que por omissão, por conduta inconstitucional grave. 

A interpretação da norma constitucional não pode assumir a forma de uma simples promessa  superficial. Assim, o SUS não deve atuar como uma rede sem sentido e sem o compromisso social. Como vimos, o Sistema Único de Saúde, após a sua implantação pela Constituição Federal, foi  regulado posteriormente pela lei 8.080 de 1990. Nesta lei estão elencadas as atribuições e funções desse  sistema. Além disso, a Lei 8.142, do mesmo ano, dispõe sobre o modelo tripartite, a participação da  comunidade, sua gestão e seu financiamento (SILVA, 2010). 

Importante acrescentar, que o direito à saúde no Brasil foi fruto de anos de luta de um  movimento conhecido como Reforma Sanitária, uma reforma democrática da saúde. O movimento  surgiu a partir de ações contra a ditadura no início dos anos 1970 e em virtude do conhecimento dos  novos conceitos de saúde trazidos pela Declaração de Alma-Ata, documento elaborado na Conferência  Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, realizada em 1978, o documento expressava a  necessidade de ação urgente de todos os governos, de todos os que trabalham nos campos da saúde e do  desenvolvimento e da comunidade mundial para promover a saúde de todos os povos do mundo. A  discussão sobre o novo modelo de saúde ocorreu na Conferência Nacional de Saúde (8º CNS), 1986  (SOUZA, 2018). 

As discussões do 8º CNS serviu como base para a compilação da caderneta da saúde, na  Constituição Federal de 1988 e foi uma das etapas de criação do Sistema Único de Saúde (SUS), junto  com os mais democráticos princípios de universalidade e igualdade, seguindo o processo de  democratização no Brasil após a ditadura (SOUZA, 2018). 

A saúde é um direito fundamental previsto na Constituição Federal brasileira e está consagrado  no artigo 6º, como um direito social. No mesmo contexto, o artigo 23 da CF, aduz que a prestação de  assistência à saúde e assistência pública, à proteção e garantia das pessoas com deficiência é  competência comum da União, do Estado, do Distrito Federal e dos Territórios (BRASIL, 1988). 

No setor de ordem social, em especial a previdenciária, encontra-se o setor saúde, entre os  artigos 196 e 200, base legal do SUS, que considera a saúde um direito de toda pessoa e dever do Estado  e tem relação com a saúde no Brasil.

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas  sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. (BRASIL, 1988) 

A Lei nº 8.080, de 1990, dispõe sobre a saúde, como direito humano fundamental, e fortalece o  papel do Estado em todo o território nacional, incluindo as práticas de saúde. Já a Lei nº 8.142, de 1990,  estabelece dois eventos de engajamento social para a participação da comunidade na gestão do SUS e  repasse de recursos financeiros: Conferências de Saúde e Conselhos de Saúde (BRASIL, 1990). 

2.1 O acesso à saúde: um direito social 

Considerando o contexto histórico com relação à saúde pública, Molinaro e Sarlet (2011),  indicam dois momentos a serem apreciados, quais sejam: o movimento da saúde pública do século XIX  e o reconhecimento dos direitos sociais no século XX.  

Hodiernamente, há inúmeros documentos internacionais e constituições diversas que garantem  direitos relacionados à saúde. vale enfatizar ainda, de acordo com Gandini, Barione e Souza (2008) que  após a Segunda Guerra Mundial, ocorreu mundialmente um movimento em prol do resgate aos direitos  humanos, com a elaboração de Declarações Internacionais para reconhecimento dos direitos sociais,  dentre eles o direito à saúde, mencionado na Declaração Universal dos Direitos Humanos. 

Nessa declaração em seu artigo XXV, enfatiza-se que: 

Todo homem tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis […]. 

Atrelado a esse aporte internacional, Sarlet (2007) enfatiza que coube à Declaração Universal  da Organização das Nações Unidas (1948), arts. 22 e 25, abordar sobre esse direito, bem como ao Pacto  Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966) e a Convenção dos Direitos da  Criança e a Convenção Americana dos Direitos Humanos (1989). Vale ressaltar que todos esses  documentos foram ratificados pelo Brasil. 

No contexto brasileiro, ancorada nas Declarações de Direito, foi promulgada a Constituição  Federal de 1988, na qual o direito à saúde tem previsão expressa no âmbito da seguridade social e ostenta  o status de direito fundamental, conforme arts. 6º e 196, nos quais consagra-se a saúde como direito de  todos e dever do Estado, com a garantia a ser efetivada por políticas públicas que possibilitem o acesso  universal e igualitário à saúde. Desse modo, para Sarlet (2007), a Constituição Federal de 1988 encontra-se em harmonia com a garantia do “mais alto nível possível de saúde”, quando contempla tanto a saúde  preventiva quanto curativa, seguindo os ditames prescritos no art. 12 do Pacto Internacional De direitos  Econômicos, Sociais e Culturais (1966), também ratificado pelo Brasil.

Esse direito suscita uma implantação no mundo dos fatos, não bastando sua eficácia formal com  a existência de normas. Significa dizer que é dever do Estado, de acordo com sistema constitucional  brasileiro, a proteção à saúde, correlato ao direito público subjetivo irradiado. Consequentemente, ele  pode ser inquirido via judicial, caso descumpra seu dever assistencial. (MOLINARO; SARLET, 2011)  

Desse modo, entende-se que o direito à saúde é um direito social que deveria ser garantido, mas  que, caso não o seja, faz-se necessária a atuação do judiciário com vistas a efetivá-lo. 

2.2 A saúde como um Direito Humano 

A Constituição Federal de 1988, que serve de base a todo o ordenamento jurídico e normativo  brasileiro, incluiu em seu texto disposições elementares sobre diversos temas, os direitos sociais estão  dispostos no artigo 6º: 

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantida por políticas sociais e econômicas que visam à redução do risco de doenças e demais agravos à saúde e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. (BRASIL, 1988)

Nesse sentido, estudos como o de Fernando Mussa Abujamra Aith (2013), mostram ainda que  o direito à saúde, reconhecido como um Direito Humano fundamental por diversos instrumentos  internacionais, encontra-se categorizado em nossa Constituição no que se convencionou chamar de  Direitos Sociais ou Direitos Humanos de segunda geração. 

Além disso, o artigo 197 da Constituição Federal de 1988 dispõe que:

Art.197. são de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao poder público, nos termos da lei, dispor sobre sua regulamentação, fiscalização e controle,devendo sua execução ser feita diretamente ou por meio de terceiros e, ainda, por pessoa física ou jurídica de direito privado. (BRASIL, 1988) 

Em obediência a este dispositivo, entrou em vigor a Lei 8.080/90, denominada Lei Orgânica da  Saúde, que mais adiante será analisada neste estudo. A possibilidade de prestação de saúde pela  iniciativa privada encontra-se fundamentada no artigo 199 da Constituição Federal de 1988, que  organiza e delimita condições para a execução dessa competência, discorrendo que as instituições  privadas poderão participar de forma complementar do Sistema Único de Saúde, segundo suas diretrizes,  mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem  fins lucrativos, (MORAES, 2018). 

2.3 A Declaração Universal dos Direitos Humanos e sua contribuição 

A Declaração Universal dos Direitos do Homem foi publicada pela Organização das Nações  Unidas (ONU) em 1948. A sua publicação representa um marco histórico fundamental na história do  reconhecimento internacional dos direitos humanos e um grande divisor de águas. Com força obrigatória  para seus participantes, a Declaração reconheceu no mesmo documento as diversas gerações de direitos:  civis, políticos, econômicos e sociais, e direitos culturais. 

Assim, todas as gerações de direitos passaram a estar protegidas pela Declaração. Sobre esse  assunto os doutrinadores Accioly, Silva e Casella (2009, p. 137), afirmam: 

A Declaração Universal de 1948, bem como os instrumentos subsequentes adotados, no contexto da ONU inscrevem-se no movimento de busca de recuperação da dignidade humana, após os horrores cometidos pelo nazifascismo, mas sobretudo se dá a uma mudança no enfoque, quanto a ser o estabelecimento de sistema de proteção dos direitos fundamentais intrinsecamente internacional. 

Desde então, a saúde foi reconhecida como um direito inalienável de todos os seres humanos e  como um valor social que deve abranger toda a humanidade. Assim, pouco a pouco, vários Estados  começaram a incorporar este e outros direitos em suas constituições, e transferi-los para os direitos  fundamentais consagrados no contrato social estabelecido em cada país. Participante desse processo, o  Brasil concedeu esse status à saúde em 1988, quando, sob forte pressão pública, estabeleceu a  universalidade como um de seus princípios fundamentais. No entanto, duas décadas e meia após a  promulgação da atual Constituição, o direito à saúde ainda está longe de ser integralmente aplicado de forma efetiva (RASIA, 2011). 

Levando em consideração todos os direitos humanos básicos, a relação com a saúde vai além  da possibilidade de redução de danos, em termos de problemas e fatores de risco. O direito à saúde  também se aplica a questões de violação de direitos humanos, como a violência em grandes cidades, os  incidentes de tortura, a escravidão e a violência sexual, pois são fatores que podem prejudicar a saúde. 

2.4 Princípio da dignidade da pessoa humana e o direito à saúde 

A dignidade da pessoa humana tornou-se, nas últimas décadas, um dos grandes consensos éticos  do mundo ocidental. É mencionada em incontáveis documentos internacionais, em Constituições, leis e  decisões judiciais, segundo Barroso (2007), está elencada no artigo 1º da Carta Magna, sendo um dos  princípios fundamentais da República Federativa do Brasil. Ela constitui um valor universal e é  composta por um conjunto de direitos existenciais compartilhados por todos os homens, em igual  proporção. Um indivíduo, pelo só fato de integrar o gênero humano, já é detentor de dignidade, é  qualidade ou atributo inerente a todos os homens, decorrente da própria condição humana, que o torna  credor de igual consideração e respeito por parte de seus semelhantes.  

Ingo Wolfgang Sarlet (2007), analiticamente, define a dignidade da pessoa humana como:  

[…] a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como  venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos. 

Entender o verdadeiro significado de expressão “dignidade humana” é importante, visto que seu  conceito possui uma complexidade histórica que aponta para um horizonte de sentido desde a  Antiguidade Clássica, passando pela cultura judaico-cristã e, na atualidade, após a II Guerra Mundial,  fundamenta os documentos internacionais mais importantes da humanidade. Ao longo das civilizações,  o valor da pessoa humana já encontrava suas raízes no pensamento clássico, bem como na reflexão  teológica (SARLET, 2007). 

De acordo com Vanessa Elias de Oliveira, São Tomás de Aquino foi quem, pela primeira vez,  cunhou a expressão dignitas humana, afirmando que “a dignidade é inerente ao homem, como espécie;  e ela existe in actu só no homem enquanto indivíduo” (OLIVEIRA, 2007, p. 34).  

No Brasil, a dignidade da pessoa humana figura como “fundamento da República” no art. 1º,  inciso III, da Constituição brasileira. O princípio já foi apontado pela doutrina como o “valor supremo  da democracia”, como a “norma das normas dos direitos fundamentais”, como “princípio dos princípios  constitucionais”, como o “coração do patrimônio jurídico-moral da pessoa humana”. O reconhecimento  da centralidade do princípio da dignidade da pessoa humana é recorrente na jurisprudência brasileira,  tendo o STF afirmado que se trata do verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo ordenamento  constitucional vigente em nosso país (SARMENTO; TELES, 2012, p. 14). 

É importante observar que a Constituição Federal de 1988 reservou um capítulo inteiro somente  para os direitos sociais e dentre eles, a saúde: Art. 196 CF/88. A saúde é direito de todos e dever do  Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e  recuperação. Trata-se de uma garantia constitucional a todos. A respeito do tema, vem sendo esse o  entendimento adotado pelo doutrinador José Afonso da Silva (2014, p. 831), in verbis: 

As ações e serviços de saúde são de relevância pública, por isso, por isso, ficam inteiramente sujeitos à regulamentação fiscalização e controle do Poder Público, nos termos da lei, a que cabe executá-los diretamente ou por terceiros, pessoas físicas ou jurídicas de direito privado. Se a Constituição atribui ao Poder Público o controle das  ações e serviços de saúde, significa que sobre tais ações e serviços tem ele integral poder de dominação, que é o sentido do termo controle, mormente quando aparece ao lado da palavra fiscalização.

Dito isso, faz-se necessário destacar que o direito fundamental à saúde, tornou-se matéria cada  vez mais promovida no meio jurídico, por causa do grande número de ações no Judiciário, pleiteando a  liberação de medicamentos, entre outras obrigações de prestação médica pelo Estado. Cumpre salientar  que a constituinte destinou esforços significativos ancorados na Constituição Federal de 1988 para  solidificar esse direito. Por esse motivo, a saúde prepondera no sistema jurídico brasileiro como um  preceito fundamental a todos, sem distinção de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas  de discriminação, mediante a execução do, então, dever do Estado.  

A dignidade da pessoa humana tem apertada afinidade com os direitos fundamentais,  considerando como o núcleo em torno do qual gravitam esses direitos, adaptando-lhe um caráter  sistemático. Pode ser acatada como o baseamento dos direitos fundamentais, isto é, o princípio jurídico  básico que releva de forma lógica a existência destes direitos (FIGUEIREDO, 2007). 

O direito à saúde depara, em sua essência, íntima afinidade com o direito à vida e o princípio da  dignidade da pessoa humana, tanto é, que não tem como ponderar do direito à saúde se não existe vida,  muito menos descrever uma vida digna sem a promoção à saúde, deste modo, dignidade da pessoa  humana, saúde e vida estão unidos e o sacrifício de um constitui diminuir ou acabar os outros. E apesar  de toda essa essencialidade seja agregada ao direito à saúde, este, no plano nacional, foi apenas obrigado  na Constituição Federal de 1988, sendo mencionado por diferentes vezes ao longo do documento  constitucional. 

Pessoas pelos corredores, deitadas pelo chão, expostas a qualquer tipo de infecção e descaso, à espera de um leito. Indivíduos sem acesso a medicamentos, tratamentos, cirurgias essenciais para manutenção da sua própria vida. Profissionais em número insuficiente e desestimulados para enfrentar uma realidade totalmente incondizente com os ditames de dignidade da pessoa humana. A atual situação dos hospitais públicos demostra um contexto diametralmente oposto à vontade da constituição. O direito à saúde, infelizmente, vem encontrando alguns obstáculos para sua efetivação e, embora seja um direito constitucionalmente garantido e de extrema relevância, o simples fato de estar descrito na Constituição Federal não traz sua automática concretização (FIGUEIREDO, 2007, p. 32).

Assim, é necessário que o Estado tome as rédeas da circunstância e admitir o direito social à  saúde, ou seja, reconhecer-se tacitamente o que é disposto no artigo 196 da Constituição Federal de 1988  e colocar-se como agente político-econômico de estilo imperativo à concretização do direito à saúde,  garantindo, por consoante, a dignidade da pessoa humana e o direito à vida. 

O direito fundamental à saúde, estabelecido em diferentes dispositivos constitucionais, é  imperativo à concretização da dignidade da pessoa humana e eficaz para a defesa do direito à vida.  Conforme Marmelstein (2013) os direitos fundamentais são normas jurídicas fortemente ligadas ao  conceito de dignidade da pessoa humana (valores fundamentais para uma vida digna em coletividade) e  estabelecidas no âmbito constitucional de um Estado Democrático de Direito. 

De acordo com que pontua Rocha (2011) ainda que, mesmo que se aceitasse a essência de  direitos fundamentais em sentido estritamente formal, o direito à saúde não se combinaria nesta classe.  Isto acontece do fato deste direito ser de grande importância para as pessoas, até mesmo sendo essencial  para a sustentação da vida e imperativa para a concretização da dignidade da pessoa humana. 

2.5 Sistema único de saúde 

2.5.1 Surgimento do SUS e suas realizações 

O SUS é uma instituição jurídica que foi criada quando da redemocratização do país com a  promulgação da Constituição Federal de 1988. Muitos autores afirmam que o SUS foi inspirado no NHS  (National Health Service), o sistema de saúde da Inglaterra.  

De acordo com o Ministério da Saúde, o SUS é uma grande conquista da sociedade brasileira e  foi idealizado com o firme propósito de promover a justiça social e superar as desigualdades na  assistência à saúde da população, tornando obrigatório e gratuito o atendimento a todos os indivíduos.  Ainda com base em dados do Ministério da Saúde, temos que: antes de 1988, o atendimento dos  hospitais públicos estava restrito a 30 milhões de brasileiros. Com a Constituição de 1988, mais de 70  milhões de pessoas passaram a ter direito ao atendimento pelo Sistema Único de Saúde. (MINISTÉRIO  DA SAÚDE, 2011) 

Para uma melhor comparação entre os dois sistemas, faz-se necessário frisar algumas mudanças  ocorridas no Sistema de saúde britânico. A partir da década de 1990 o NHS passou por uma reforma e  o aprofundamento político organizacional desse processo de reforma do referido Sistema permite a  identificação de analogias com o SUS. O NHS é universalista, com ampla cobertura e acesso gratuito  aos cidadãos, financiado pelo Estado por meio de recursos fiscais (OLIVEIRA, 2007). 

Apesar do distinto contexto histórico de construção desses dois sistemas universalistas é  possível identificar experiências e lições que poderão ser úteis ao processo de aprimoramento dos  princípios de Universalidade, Integralidade e Equidade, propostos pelo SUS (OLIVEIRA, 2007).

É possível verificar ainda a importância de um sistema de saúde inteiramente baseado no  financiamento e prestação de serviços públicos. Pode-se perceber também que não precisamos atribuir  valores positivos ao sistema privado e valores negativos ao sistema público. A analogia que se faz entre  o NHS (National Health Service) e o SUS (Sistema Único de Saúde), foram em razão de serem baseados  no mesmo modelo (OLIVEIRA, 2007). 

O sistema britânico é parecido com o nosso, mas mesmo que aplicássemos exatamente os  mesmos critérios, teríamos a variável da inviabilidade das políticas universais em um país de dimensões  continentais, extremamente populoso e injusto. O máximo que fazemos é preencher as lacunas do SUS  com médicos. A intenção avança sobre as atrasadas promessas de compra de equipamentos e construção  de prédios, sem previsão de fontes de financiamento para custeá-las. É possível identificar experiências  e lições que poderão ser úteis ao processo de aprimoramento dos princípios de Universalidade,  Integralidade e Equidade, proposto pelo SUS. Apesar do contexto social e histórico distinto, isso,  possibilita a identificação de limites e alcances desses movimentos de reforma no contexto de construção  dessa política pública em nosso país (OLIVEIRA, 2007). 

A importância de um sistema de saúde que depende exclusivamente da provisão de fundos e da  provisão de serviços governamentais está bem estabelecida. Pode-se ver que não precisamos vincular  atitudes positivas aos sistemas privados e atitudes negativas à sociedade. O exemplo entre o NHS  (National Health Service) e o SUS (Sistema Único de Saúde), é que, além de estarmos baseados no  mesmo modelo, podemos resolver os mesmos problemas, como linha de qualidade do serviço  (OLIVEIRA, 2007). 

Em todo o mundo, não diferentemente no Brasil há uma preocupação com o aumento dos custos  administrativos, com a crescente integração tecnológica na medicina e com o envelhecimento da  população. Esses são fatores de extrema relevância. É de suma importância diminuir a distância entre o  legislador, as autoridades políticas e o contribuinte (OLIVEIRA, 2007). 

A combinação de determinados fatores e os resultados alcançados pela reforma do sistema de  saúde inglês, em diferentes casos de construção de um Estado de bem-estar público, permite a  identificação de conhecimentos relevantes para a estruturação do SUS. Apesar dessa revisão histórica,  mesmo com a adoção de melhorias no sistema de saúde tornando-o um sistema mais equilibrado, ainda  são exigidos ajustes periódicos para atender às necessidades epidêmicas e políticas, o que resulta em  barreiras de desenvolvimento como as encontradas no SUS. O trabalho desenvolvido pelo SUS merece  toda a atenção da sociedade, pois faz-se necessária a compreensão dos limites e das reformas  organizacionais e estruturais, bem como a concepção de novas propostas de reforma no futuro  (OLIVEIRA, 2007). 

2.6 Judicialização do direito à saúde

A judicialização do direito à saúde é um fenômeno que ocorre quando os cidadãos  buscam o Poder Judiciário para obter acesso a tratamentos médicos, medicamentos,  procedimentos cirúrgicos ou outros serviços de saúde que não foram disponibilizados pelo  sistema de saúde pública ou privada. Essa prática tem se tornado cada vez mais comum em  muitos países, incluindo o Brasil, devido a diversos fatores, como a falta de acesso adequado  aos serviços de saúde, a demora no atendimento, a escassez de recursos e a inadequação das  políticas públicas de saúde (SARLET, 2007). 

A relação entre a judicialização do direito à saúde e a dignidade da pessoa humana é  evidente. A dignidade da pessoa humana é um princípio fundamental que está presente em  muitas constituições ao redor do mundo, incluindo a Constituição Brasileira. Esse princípio  reconhece a importância intrínseca e o valor inalienável de cada ser humano,  independentemente de sua condição social, econômica, étnica, ou de saúde (SARLET, 2007). 

Quando um indivíduo busca o Judiciário para garantir o acesso à saúde, muitas vezes o  faz em situações de extrema necessidade, quando sua vida ou bem-estar estão em risco. A  decisão judicial pode ser a única forma de obter tratamento ou medicamentos que são essenciais  para sua sobrevivência ou qualidade de vida (SARLET, 2007). Nesse contexto, a judicialização  se torna um meio de resguardar a dignidade da pessoa humana, garantindo que ela tenha a  oportunidade de receber o cuidado necessário para preservar sua vida e sua integridade física. 

No entanto, a judicialização do direito à saúde também gera desafios. Ela pode  sobrecarregar o sistema judicial, criar desigualdades no acesso à saúde e alocar recursos de  forma não sustentável. Portanto, é importante buscar um equilíbrio entre o acesso à justiça para  proteger a dignidade da pessoa humana e a necessidade de políticas de saúde mais eficientes e  equitativas. 

Em resumo, a judicialização do direito à saúde é uma questão complexa que envolve a  busca por equidade e justiça no sistema de saúde, ao mesmo tempo em que se assegura o  respeito à dignidade da pessoa humana. Encontrar soluções para esse desafio requer uma abordagem multidisciplinar que envolva o sistema de saúde, o sistema jurídico e a sociedade  como um todo. 

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Para a efetivação do presente estudo, começou através do conceito da Dignidade  Humana e como o direito à saúde está conexo à mesma. Respectivamente, pesquisou-se acerca das ações por efetividade à saúde como um item essencial à recuperação e meio para a obtenção  desse direito constitucional.  

Objetivou-se com esta pesquisa, analisar a efetivação do direito fundamental à saúde,  ancorada na dignidade da pessoa humana, pela intervenção do Poder Judiciário, abordando  acerca das garantias apresentadas pela Constituição quanto ao direito à Saúde, estabelecendo a  relação entre o direito à saúde e o princípio da dignidade da pessoa humana e identificando as  políticas públicas voltadas à saúde. 

A judicialização pode ocasionar efeitos diretos acerca das ações da Política de  Assistência Farmacêutica e Médica, pois leva a anulação de seus princípios e diretrizes, basear  no SUS, assim como, lesa a evolução do Ciclo da Assistência Farmacêutica e Médica, que  abrange desde a seleção, aquisição, programação, controle de qualidade, dispensação,  manutenção e emprego racional de medicamentos. 

As ações judiciais afetam à saúde e têm buscado atender o pedido do autor por se abordar  de um direito fundamental. Ainda que o ideal seja o pleno contentamento do direito à saúde de  todo o povo, determinadas decisões têm enfatizado a importância de se analisar, no caso  concreto, os recursos públicos acarretados para o tratamento de saúde particular, por motivo  dos altos custos, e em detrimento de toda a sociedade, na medida em que essa prática pode  contrafazer a estabilização orçamentária da administração pública.  

Ao conferir o direito demandado pelo paciente, o Poder Judiciário ficará, e não poucas  ocasiões, coagindo a administração pública a aplicar altos recursos para o atendimento da saúde  a uma singular pessoa, enquanto que, com aquele verificado valor seria possível atender  diferentes outras demandas que, por conseguinte, defenderiam um número muito maior de  pessoas e, também, o que é pior, essa operação do Judiciário afeta orçamentos já  antecipadamente aprovados e com recursos propostos ao funcionamento de postos de hospitais  e atendimento públicos que, por falta daquelas verbas, deixam de oferecer os serviços básicos  de saúde a todo o povo. 

A operação do Poder Judiciário no âmbito da saúde pública tem sido empregada como  garantia ao cidadão para concretização desse direito diante da omissão Estatal. De tal modo, a  atenção do Poder Judiciário precisa-se voltar não apenas a garantir o direito à saúde aos que  protestam a jurisdição, contudo ainda, na procura de implementar meios materiais adequados  de levar à toda sociedade a plena prestação da saúde.  

Por último, analisando que o Trabalho de Conclusão de Curso precisa problematizar  aspectos do habitual do Poder Judiciário, sugerindo inovações, melhorias ou mudanças de  determinada prática jurisdicional, de administrativa ou de gestão, apresenta-se a implicação para que, sejam constituídos critérios mínimos de admissibilidade dos assuntos referentes à  saúde, como a prévia cobrança administrativa, constatação da urgência e imprescindibilidade  do tratamento para conservação da vida e/ou saúde do paciente e, quando se falar de pedido de  custeio para tratamento uma única pessoa, a constatação de impossibilidade do abastecimento  na rede pública, admitindo de tal modo a prestação jurisdicional nas causas de saúde de maneira  mais igualitária, tanto para o Poder Público, quanto para os pacientes. 

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1Acadêmico do Curso de Direito 
2Professora Orientadora