ENTRE A NORMA E O CAMPO: A EFETIVIDADE DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL NAS PEQUENAS PROPRIEDADES RURAIS DE MARABÁ/PA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202511300311


Daniel Aguiar Vieira Teixeira1
João Lucas Barbosa Serra2
Orientador: Prof. Huakim Zarrur Lima de Oliveira


RESUMO

Nas últimas décadas, a proteção ambiental consolidou-se como um dos maiores desafios do Estado brasileiro, especialmente diante do avanço das atividades agropecuárias e da expansão desordenada das fronteiras agrícolas sobre áreas de relevante interesse ecológico. No meio rural, a necessidade de conciliar a produção econômica com a preservação dos recursos naturais impõe a efetiva aplicação da legislação ambiental, que deve ser compreendida não apenas como um conjunto de normas restritivas, mas como um instrumento essencial para a concretização do desenvolvimento sustentável e da função socioambiental da propriedade.

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 225, estabelece que todos têm direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. No mesmo sentido, o artigo 186, inciso II, determina que a propriedade rural cumpre sua função social quando o uso da terra observa critérios de aproveitamento racional e adequado, compatíveis com a preservação ambiental. Desse modo, a legislação ambiental brasileira não se limita a impor sanções, mas busca assegurar um modelo de produção que harmonize eficiência econômica, justiça social e equilíbrio ecológico.

Entretanto, a aplicação dessas normas enfrenta desafios significativos, sobretudo nas pequenas propriedades rurais, que representam a base da agricultura familiar brasileira e desempenham papel essencial na segurança alimentar do país. No município de Marabá, situado no sudeste do Pará, essa realidade é especialmente evidente. A região, marcada pela diversidade produtiva e pela proximidade com áreas de floresta e de uso extrativista, enfrenta tensões entre a necessidade de expandir a produção agrícola e o dever de preservar os ecossistemas locais. A falta de assistência técnica, a complexidade da legislação e as dificuldades econômicas dos pequenos produtores constituem barreiras concretas à efetividade da norma ambiental.

Nesse contexto, instrumentos como o Código Florestal (Lei nº 12.651/2012) e a Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998) ganham especial relevância, pois definem parâmetros jurídicos para o uso sustentável da terra, a preservação das áreas de reserva legal e de proteção permanente, e a responsabilização por condutas lesivas ao meio ambiente. Contudo, a simples existência dessas normas não garante sua aplicação prática. É preciso que o Estado, por meio de políticas públicas e de uma fiscalização efetiva, promova a conscientização e o apoio técnico aos pequenos produtores, de modo que a legislação ambiental seja compreendida como um instrumento de incentivo à produção sustentável, e não como um obstáculo à atividade rural.

Dessa forma, o presente estudo tem por objetivo analisar a aplicação da legislação ambiental nas pequenas propriedades rurais do município de Marabá/PA, investigando como os dispositivos legais que compõem o sistema jurídico ambiental brasileiro são implementados na realidade local. Busca-se compreender de que forma a efetividade da norma depende da integração entre o poder público, os produtores e a sociedade civil, bem como identificar os principais entraves e possibilidades de aprimoramento na concretização dos princípios constitucionais da função socioambiental da propriedade e do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Assim, a pesquisa pretende contribuir para o debate sobre a efetividade das políticas ambientais e o fortalecimento da agricultura familiar sustentável na região.

PALAVRAS-CHAVE: Legislação Ambiental. Pequenas Propriedades Rurais. Sustentabilidade. Regularização Ambiental. 

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS 

A efetiva aplicação da legislação ambiental nas pequenas propriedades rurais representa um dos temas mais complexos e relevantes do Direito Ambiental contemporâneo, especialmente diante da necessidade de compatibilizar o desenvolvimento econômico com a proteção dos recursos naturais. Embora o Brasil possua um dos arcabouços normativos mais avançados do mundo em matéria ambiental — consubstanciado na Constituição Federal de 1988, no Código Florestal (Lei nº 12.651/2012) e na Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998) —, a distância entre o texto legal e a realidade prática ainda é significativa, sobretudo no contexto das pequenas propriedades rurais.

A Constituição Federal, em seu artigo 225, estabelece o direito fundamental de todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. No mesmo sentido, o artigo 186, inciso II, vincula a função social da propriedade ao uso racional e adequado dos recursos naturais. Tais dispositivos configuram o núcleo axiológico da política ambiental brasileira, orientando a conduta estatal e privada no meio rural. Contudo, a efetividade desses princípios enfrenta obstáculos concretos quando confrontada com as limitações materiais e estruturais dos pequenos produtores rurais.

No plano jurídico e burocrático, observa-se uma elevada complexidade normativa, marcada por sobreposição de leis, regulamentos e competências administrativas. A exigência de cumprimento de procedimentos como o Cadastro Ambiental Rural (CAR), a delimitação da Reserva Legal e o licenciamento ambiental revela-se excessivamente burocrática e onerosa para o pequeno agricultor, que, em regra, carece de assessoria jurídica e técnica. Soma-se a isso a instabilidade normativa e a ausência de políticas estatais de apoio efetivo, que resultam em insegurança jurídica e desestímulo à regularização ambiental.

Sob o aspecto técnico e estrutural, evidencia-se a carência de assistência técnica especializada, de capacitação continuada e de acesso a tecnologias adequadas para a implementação de práticas sustentáveis. A ausência de programas eficazes de extensão rural e de difusão de conhecimento técnico impede o manejo adequado da terra e a recuperação de áreas degradadas, conduzindo a uma situação em que o descumprimento da legislação ambiental decorre mais da falta de condições objetivas do que da vontade do produtor.

No campo socioeconômico, as dificuldades tornam-se ainda mais expressivas. A hipossuficiência econômica dos pequenos produtores inviabiliza a adoção de medidas de regularização ambiental, como a contratação de profissionais habilitados, a recomposição de vegetação nativa e a adequação de áreas de preservação permanente. Além disso, a inexistência de incentivos governamentais concretos, linhas de crédito ambiental acessíveis e programas de pagamento por serviços ambientais reforça a percepção de que a legislação atua prioritariamente de forma punitiva, e não como um instrumento de fomento à sustentabilidade.

No caso específico do município de Marabá/PA, inserido na região sudeste do Pará, tais desafios assumem contornos ainda mais complexos. A expansão agropecuária, a pressão pela exploração de novas áreas e a fragilidade institucional dos órgãos ambientais locais revelam um cenário em que a legislação ambiental, embora existente e robusta, carece de mecanismos efetivos de implementação. A carência de infraestrutura administrativa, somada à ausência de integração entre os entes federativos e à falta de políticas públicas voltadas à agricultura familiar sustentável, compromete a concretização da função socioambiental da propriedade rural.

Diante desse panorama, constata-se que os obstáculos enfrentados pelos pequenos produtores de Marabá/PA não decorrem apenas do desconhecimento das normas ambientais, mas de um conjunto de fatores interdependentes que abrangem questões jurídicas, técnicas e econômicas, além de aspectos culturais e institucionais. Assim, o presente estudo parte da premissa de que a superação dessas barreiras demanda uma atuação articulada entre Estado, produtores rurais e sociedade civil, de modo a transformar a legislação ambiental em um instrumento de incentivo à sustentabilidade e não em um entrave ao desenvolvimento do campo.

Nos tópicos seguintes, cada uma dessas dimensões — jurídica, técnica e socioeconômica — será analisada de forma detalhada, à luz do ordenamento jurídico brasileiro e das peculiaridades regionais de Marabá/PA, com o intuito de compreender os fatores que limitam a efetividade da legislação ambiental e apontar caminhos possíveis para sua concretização prática.

2 REFERENCIAL TEÓRICO 

A legislação ambiental brasileira consolidou-se ao longo das últimas décadas como um dos ramos mais relevantes e complexos do ordenamento jurídico, refletindo a necessidade de compatibilizar o desenvolvimento econômico com a preservação dos recursos naturais. A preocupação com o meio ambiente, antes marginalizada, ganhou relevância a partir da segunda metade do século XX, sobretudo após a Conferência de Estocolmo, em 1972, que inaugurou a era do desenvolvimento sustentável. No Brasil, esse processo evolutivo foi fortemente influenciado por eventos internacionais e pela crescente consciência ecológica, culminando na promulgação da Constituição Federal de 1988, marco jurídico que consagrou o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental de todos.

O artigo 225 da Constituição Federal estabelece que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Esse dispositivo constitucional insere o meio ambiente no rol dos direitos fundamentais de terceira geração, representando um avanço significativo na tutela ambiental. Paralelamente, o artigo 186, inciso II, da mesma Carta, determina que a propriedade rural cumpre sua função social quando o uso da terra observa critérios de aproveitamento racional e adequado, compatíveis com a preservação ambiental e com as relações de trabalho justas. Assim, a Constituição impõe ao proprietário rural uma obrigação positiva de adequar suas atividades produtivas aos princípios da sustentabilidade, conferindo à propriedade uma função socioambiental.

Segundo José Afonso da Silva (2012), a função socioambiental da propriedade traduz a conciliação entre o interesse individual e o interesse coletivo, na medida em que o uso da terra deve respeitar os limites ecológicos e promover o bem-estar social. Da mesma forma, Édis Milaré (2015) ressalta que a proteção ambiental somente se torna efetiva quando considerada dentro de um contexto e uma realidade específica, tratando-se de um processo contínuo e coparticipativo, do Estado, da sociedade e do setor produtivo, reforçando o caráter coletivo da responsabilidade ambiental. Nesse contexto, o papel do pequeno produtor rural adquire destaque, pois ele se encontra na base da produção de alimentos e da conservação ambiental, sendo responsável por parcela significativa do território nacional.

O principal diploma infraconstitucional que regula o uso da terra e a proteção dos ecossistemas é o Código Florestal (Lei nº 12.651/2012), o qual estabelece instrumentos fundamentais, como o Cadastro Ambiental Rural (CAR), a Reserva Legal e as Áreas de Preservação Permanente (APPs). Esses mecanismos têm por objetivo garantir a manutenção da cobertura vegetal, o controle do desmatamento e o equilíbrio dos biomas. Já a Lei nº 9.605/1998 (Lei de Crimes Ambientais) define sanções penais e administrativas às condutas lesivas ao meio ambiente, conferindo efetividade ao princípio da responsabilidade ambiental. Como observa Fiorillo (2021), a legislação ambiental brasileira é ampla e tecnicamente estruturada, mas sua efetividade prática depende de condições materiais e institucionais que permitam a sua correta aplicação.

Nas pequenas propriedades rurais, contudo, o cumprimento dessas normas enfrenta sérios obstáculos. Muitos produtores não dispõem de orientação técnica adequada, de recursos financeiros ou de conhecimento suficiente sobre as exigências legais. Em diversas regiões do país, especialmente na Amazônia Legal, a carência de assistência técnica e de acesso a políticas públicas impede que os agricultores familiares se adequem às exigências do Código Florestal, como a averbação da Reserva Legal ou a recuperação de áreas degradadas. Esses entraves acabam gerando um ciclo de irregularidades e penalidades, que fragiliza economicamente o pequeno produtor e reforça a percepção de que a legislação ambiental atua mais como instrumento punitivo do que como incentivo à produção sustentável.

No município de Marabá/PA, essa problemática se mostra ainda mais evidente. A região, caracterizada por intensa atividade agropecuária e pela proximidade com áreas de floresta e uso extrativista, enfrenta dificuldades históricas na conciliação entre produção e preservação. Muitos produtores familiares sobrevivem em condições precárias, dependem de pequenas áreas para sustento próprio e carecem de apoio governamental para a regularização ambiental. A ausência de uma política pública integrada, capaz de unir educação ambiental, assistência técnica e incentivos econômicos, torna a aplicação da legislação um desafio constante.

Além dos obstáculos materiais, há também um fator cultural e educacional relevante: a percepção de que a legislação ambiental representa uma limitação ao direito de produzir. Essa visão decorre, em grande parte, do distanciamento entre o discurso jurídico e a realidade socioeconômica das pequenas propriedades. Conforme leciona Paulo Affonso Leme Machado (2018), a proteção ambiental não pode ser imposta de forma vertical e autoritária, mas deve ser construída de modo participativo, valorizando o diálogo entre Estado e sociedade civil. Somente a partir dessa integração é possível transformar a legislação ambiental em um verdadeiro instrumento de fomento à sustentabilidade.

Diante disso, a aplicação efetiva da legislação ambiental nas pequenas propriedades rurais exige mais do que o simples cumprimento de normas legais; requer integração institucional, apoio técnico, incentivos financeiros e conscientização social. O desafio é garantir que a norma ambiental seja compreendida como um meio de fortalecimento da produção rural sustentável e da qualidade de vida no campo, e não como um obstáculo ao desenvolvimento econômico. Portanto, compreender a relação entre a norma jurídica e a realidade do pequeno produtor em Marabá/PA é fundamental para avaliar a efetividade dos instrumentos de proteção ambiental e propor medidas que tornem o sistema jurídico mais inclusivo, eficiente e coerente com os princípios constitucionais da função socioambiental da propriedade e do direito ao meio ambiente equilibrado.

3 METODOLOGIA DA PESQUISA

A metodologia adotada neste estudo foi estruturada de modo a permitir uma análise crítica, fundamentada e contextualizada sobre a aplicação da legislação ambiental nas pequenas propriedades rurais do município de Marabá/PA, buscando compreender os fatores jurídicos, técnicos e socioeconômicos que influenciam sua efetividade.

Trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa e descritiva, uma vez que tem por finalidade compreender e interpretar a realidade social e normativa a partir de dados não numéricos, enfatizando o significado das práticas e percepções dos sujeitos envolvidos. Conforme Gil (2019), esse tipo de abordagem permite aprofundar a compreensão de fenômenos complexos, como a relação entre o direito ambiental e a atividade rural, valorizando a análise interpretativa dos contextos em que se aplicam as normas jurídicas.

O método de abordagem utilizado será o dedutivo, partindo-se dos princípios gerais do Direito Ambiental — especialmente os previstos na Constituição Federal de 1988 e na legislação infraconstitucional, como o Código Florestal (Lei nº 12.651/2012) e a Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998) — para a análise específica da realidade local das pequenas propriedades rurais de Marabá/PA. Tal método é adequado ao campo jurídico, pois permite aplicar os fundamentos teóricos universais à investigação empírica de um contexto regional, promovendo uma leitura concreta do ordenamento jurídico.

Quanto aos métodos de procedimento, adotar-se-á a pesquisa bibliográfica e documental, com base em doutrinas, artigos científicos, legislações, jurisprudências e relatórios técnicos de órgãos como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (SEMAS), e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). Essa análise documental possibilitará identificar as principais diretrizes legais, bem como as lacunas e desafios na sua implementação.

Complementarmente, poderá ser utilizada a pesquisa de campo indireta, mediante consulta a dados secundários disponíveis em fontes oficiais, como o Censo Agropecuário do IBGE, relatórios da EMATER e do Cadastro Ambiental Rural (CAR). Esses dados auxiliarão na caracterização socioeconômica das pequenas propriedades e na identificação das condições materiais que impactam a conformidade ambiental.

O recorte espacial será o município de Marabá, situado na região sudeste do Estado do Pará, área que reúne características representativas da dinâmica rural amazônica, marcada pela coexistência entre atividades agropecuárias, extrativistas e áreas de preservação. O recorte temático concentrar-se-á nas dificuldades de aplicação da legislação ambiental e nas estratégias necessárias para sua efetividade, especialmente no contexto da agricultura familiar e das pequenas propriedades.

A técnica de análise dos dados consistirá na análise de conteúdo e interpretação sistemática, buscando relacionar os elementos normativos, doutrinários e empíricos à luz dos princípios constitucionais da função socioambiental da propriedade e do desenvolvimento sustentável. Essa abordagem permitirá construir um panorama teórico-prático sobre a efetividade da legislação ambiental e os entraves enfrentados pelos pequenos produtores rurais na região estudada.

Assim, a metodologia proposta visa garantir o rigor científico, a coerência teórica e a aplicabilidade prática do estudo, contribuindo para uma reflexão crítica sobre o papel do Estado, da sociedade e dos produtores na consolidação de um modelo rural ambientalmente responsável e socialmente justo.

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES DOS DADOS

4.1 DIFICULDADES JURÍDICAS E BUROCRÁTICAS NA APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL

A efetividade da legislação ambiental no meio rural brasileiro, em especial nas pequenas propriedades, depende diretamente da capacidade de o produtor compreender, interpretar e aplicar as normas que regem o uso dos recursos naturais. No entanto, o sistema jurídico ambiental brasileiro apresenta um grau de complexidade e fragmentação normativa que dificulta essa compreensão, tornando o cumprimento da lei um desafio prático e técnico. Esse cenário é agravado por fatores como a burocratização dos processos administrativos, a falta de orientação institucional e a insegurança jurídica decorrente da instabilidade normativa e da morosidade estatal.

O Brasil possui uma das legislações ambientais mais completas e detalhadas do mundo, composta por um vasto conjunto de leis, decretos, resoluções e instruções normativas em diferentes esferas federativas. Contudo, essa amplitude normativa resulta, muitas vezes, em excesso de tecnicidade e sobreposição de competências, dificultando sua aplicabilidade prática pelos pequenos produtores.

O Código Florestal (Lei nº 12.651/2012), a Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998), a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/1981) e diversas normas complementares impõem obrigações de conduta complexas, cuja interpretação exige conhecimento técnico-jurídico especializado. Como observa Fiorillo (2021), o Direito Ambiental, a densidade técnica exige constante atualização e atuação interdisciplinar para sua correta aplicação.

Nas pequenas propriedades rurais, onde predominam agricultores familiares com baixo nível de escolaridade formal e acesso restrito à informação, essa complexidade se converte em barreira real à efetividade normativa. Muitos produtores de Marabá/PA, por exemplo, desconhecem o conteúdo e as exigências do Cadastro Ambiental Rural (CAR) ou os critérios técnicos para delimitação da Reserva Legal e das Áreas de Preservação Permanente (APPs). A ausência de clareza e acessibilidade das normas acaba criando um abismo entre a teoria jurídica e a realidade do campo.

Outro entrave relevante diz respeito à burocratização dos processos administrativos ambientais. O cumprimento das obrigações legais — como o registro do CAR, a regularização de Reserva Legal e a obtenção de licenças ambientais — envolve etapas extensas, formulários técnicos, prazos longos e custos elevados.

Essa burocracia não apenas retarda o processo de regularização ambiental, como também gera desestímulo entre os pequenos produtores, que veem a legislação como um sistema punitivo, e não educativo. O Cadastro Ambiental Rural, por exemplo, embora seja um importante instrumento de planejamento e controle ambiental, enfrenta dificuldades de implementação em municípios como Marabá, onde a cobertura técnica é insuficiente para atender a todos os produtores.

De acordo com dados do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (IMAZON, 2023), mais de 30% dos pequenos produtores do sudeste do Pará ainda não concluíram o processo de validação do CAR devido à falta de orientação técnica e ao excesso de trâmites administrativos. Esse quadro reforça a necessidade de políticas públicas que simplifiquem os procedimentos e promovam a descentralização da gestão ambiental.

A ausência de orientação e assistência técnica institucional é outro ponto crítico que fragiliza a aplicação da legislação ambiental nas pequenas propriedades. Órgãos como a Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Estado do Pará (SEMAS) e a Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Marabá (SEMMA) enfrentam limitações estruturais, orçamentárias e de pessoal, o que compromete o atendimento aos produtores.

Essa deficiência institucional revela uma falha na dimensão pedagógica do Direito Ambiental, que, segundo Milaré (2015), deve atuar de forma preventiva e educativa, e não apenas repressiva. A inexistência de programas permanentes de capacitação técnica e jurídica voltados ao pequeno produtor cria uma lacuna entre o dever legal e a capacidade material de cumpri-lo. O produtor rural, sem orientação adequada, acaba vulnerável a autuações e sanções, mesmo quando há boa-fé e intenção de se adequar às normas.

Além disso, a desarticulação entre os órgãos das três esferas federativas — União, Estado e Município — gera duplicidade de exigências e conflitos de competência, dificultando ainda mais o processo de regularização. Esse problema é agravado em municípios de grande extensão territorial, como Marabá, onde a presença do Estado é reduzida e o acesso a serviços públicos é desigual.

A insegurança jurídica é outro fator que compromete a eficácia do sistema de proteção ambiental. A constante alteração de normas e regulamentos, aliada às interpretações divergentes entre os órgãos fiscalizadores, cria um ambiente de incerteza que desestimula a regularização voluntária.

O próprio Código Florestal de 2012 passou por intensos debates e alterações desde sua promulgação, gerando dúvidas sobre a extensão e a aplicação de dispositivos relativos à compensação de Reserva Legal e ao Programa de Regularização Ambiental (PRA). Essa instabilidade normativa afeta diretamente os produtores, que não sabem com clareza quais obrigações devem cumprir ou se as medidas adotadas permanecerão válidas no futuro.

Como destaca Paulo Affonso Leme Machado (2018), “a efetividade do Direito Ambiental pressupõe segurança e previsibilidade jurídica, sem as quais o cidadão não tem condições de planejar sua conduta conforme a lei”. No caso das pequenas propriedades de Marabá, a morosidade administrativa e a ausência de respostas claras por parte dos órgãos competentes tornam o processo de regularização ambiental incerto e frustrante.

Em síntese, as dificuldades jurídicas e burocráticas enfrentadas pelos pequenos produtores rurais na aplicação da legislação ambiental decorrem da combinação entre complexidade normativa, excesso de burocracia, insuficiência de apoio institucional e insegurança jurídica. Esses fatores transformam a norma ambiental em um instrumento de difícil aplicação, afastando-a de sua função social e educativa.

A superação desses entraves exige uma abordagem integrada, pautada na simplificação dos procedimentos legais, na capacitação contínua dos produtores rurais e no fortalecimento das instituições ambientais locais, especialmente no contexto amazônico. Somente por meio da desburocratização e do fortalecimento do diálogo entre Estado e sociedade será possível tornar o Direito Ambiental um verdadeiro instrumento de inclusão e sustentabilidade no campo.

4.2 DIFICULDADES TÉCNICAS E ESTRUTURAIS NA APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL

Além dos entraves jurídicos e burocráticos, a efetivação da legislação ambiental no meio rural enfrenta obstáculos de natureza técnica e estrutural, especialmente entre os pequenos produtores. A falta de assistência técnica especializada, o baixo acesso à tecnologia e o desconhecimento técnico-operacional das normas ambientais formam um conjunto de fatores que limitam a capacidade desses agentes de adequarem suas atividades produtivas às exigências legais.

Essas dificuldades estão diretamente ligadas à desigualdade estrutural que marca o campo brasileiro, onde predomina a agricultura familiar, responsável por significativa parcela da produção de alimentos, mas historicamente marginalizada das políticas públicas de apoio técnico, tecnológico e educacional. Conforme destaca Veiga (2019), “a sustentabilidade ambiental da pequena produção rural depende não apenas da vontade do produtor, mas de condições materiais e cognitivas que o Estado deve assegurar”.

A ausência de acompanhamento técnico especializado constitui um dos principais entraves à correta aplicação da legislação ambiental nas pequenas propriedades. O manejo sustentável do solo, a recuperação de áreas degradadas, a recomposição de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e o cumprimento da função ecológica da Reserva Legal exigem conhecimentos específicos de engenharia florestal, agronomia e gestão ambiental — competências muitas vezes inacessíveis ao pequeno produtor.

No contexto amazônico, a carência de assistência técnica e extensão rural ambiental (ATER) é particularmente evidente. Em municípios como Marabá/PA, as unidades locais da EMATER e dos órgãos ambientais (SEMAS e SEMMA) possuem estrutura reduzida, não conseguindo atender à demanda de centenas de agricultores familiares espalhados por grandes áreas rurais.

A ausência de acompanhamento profissional compromete não apenas o cumprimento formal das normas, mas também a adoção de práticas agroecológicas sustentáveis, que poderiam conciliar a produção com a conservação. Como observa Milaré (2015), “o Direito Ambiental é de natureza essencialmente técnica, e sua efetividade depende da interação constante entre conhecimento científico e ação administrativa”. Sem suporte técnico, o produtor rural fica à mercê da informalidade e do improviso, o que o expõe a infrações involuntárias e a prejuízos produtivos.

Outro ponto crítico é o déficit tecnológico que afeta a realidade das pequenas propriedades. O cumprimento de exigências legais, como o Cadastro Ambiental Rural (CAR), o monitoramento de APPs e a georreferenciação de imóveis rurais, depende do uso de equipamentos de medição, sistemas digitais e acesso à internet — recursos muitas vezes inexistentes em regiões rurais.

Segundo dados da Agência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (ANATER, 2023), cerca de 45% dos estabelecimentos rurais familiares da Região Norte não possuem acesso regular à internet, e apenas 12% utilizam tecnologias de georreferenciamento. Essa exclusão digital cria uma barreira significativa à regularização ambiental, pois muitos processos são realizados exclusivamente por meio eletrônico.

Em Marabá, por exemplo, grande parte das propriedades está localizada em áreas distantes dos centros urbanos, onde o sinal de internet é instável ou inexistente. Assim, a submissão de documentos, retificação de coordenadas geográficas e acompanhamento de notificações ambientais tornam-se inviáveis. O resultado é a exclusão prática do pequeno produtor de um sistema que deveria promover sua inclusão e sustentabilidade.

A modernização tecnológica, portanto, não pode ser dissociada da democratização do acesso. O princípio da função socioambiental da propriedade rural, previsto no art. 186, II, da Constituição Federal, pressupõe que o produtor tenha condições materiais de atender às exigências legais — e isso inclui o acesso à infraestrutura tecnológica mínima.

O desconhecimento técnico-operacional das normas ambientais é outro fator recorrente que dificulta a conformidade legal no campo. As regras que tratam da delimitação de APPs, da Reserva Legal, do uso e destinação de agrotóxicos e do manejo de recursos hídricos e florestais são densamente técnicas, e sua compreensão exige não apenas leitura, mas interpretação técnica interdisciplinar.

Muitos pequenos produtores interpretam de forma equivocada conceitos como “margem de curso d’água”, “topo de morro” e “área consolidada”, o que leva a práticas de uso do solo em desconformidade com o Código Florestal, ainda que sem dolo. Esse fenômeno é reflexo da falta de capacitação técnica e da ausência de material educativo acessível.

Como aponta Fiorillo (2021), “a aplicação concreta do Direito Ambiental demanda mais que boa-fé do agente; requer conhecimento técnico para que a conduta se alinhe à norma”. Assim, a boa intenção dos produtores em respeitar a legislação ambiental é frequentemente frustrada pela carência de conhecimento técnico e pela distância entre o conteúdo legal e sua tradução prática no cotidiano rural.

O problema agrava-se pela falta de integração entre os órgãos ambientais e as entidades de assistência técnica, que deveriam atuar de forma coordenada na capacitação do produtor. O resultado é um cenário em que o descumprimento involuntário da legislação é comum, gerando autuações e insegurança para o pequeno agricultor, além de comprometer os objetivos da política ambiental.

As dificuldades técnicas e estruturais enfrentadas pelos pequenos produtores rurais revelam um descompasso entre as exigências legais e as condições reais de cumprimento no meio rural. A ausência de assistência técnica, o déficit tecnológico e o desconhecimento técnico-operacional das normas constituem barreiras concretas à efetividade do Direito Ambiental.

A superação desses desafios exige a implementação de políticas públicas de extensão rural ambiental, a ampliação da conectividade digital no campo e a criação de programas permanentes de capacitação e educação ambiental voltados aos agricultores familiares. Somente com a integração entre saber técnico, tecnologia acessível e apoio institucional será possível transformar a legislação ambiental em instrumento de inclusão e sustentabilidade, e não de exclusão social e produtiva.

4.3 DIFICULDADES SOCIOECONÔMICAS NA APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL

A efetiva implementação da legislação ambiental nas pequenas propriedades rurais está diretamente condicionada às condições socioeconômicas dos produtores. No caso de municípios amazônicos como Marabá/PA, observa-se que a fragilidade econômica, a dependência de modelos produtivos tradicionais e a ausência de políticas públicas eficazes configuram um cenário de vulnerabilidade que dificulta o cumprimento das normas ambientais.

O meio rural brasileiro é caracterizado por profundas desigualdades estruturais. Segundo o Censo Agropecuário (IBGE, 2017), mais de 70% dos estabelecimentos rurais do país são de agricultura familiar, mas concentram apenas 23% da área total ocupada pela agropecuária. Essa concentração fundiária se reflete na baixa capacidade de investimento e na restrição de acesso a crédito e assistência técnica, o que limita a adoção de práticas ambientalmente adequadas. Assim, o cumprimento das exigências legais acaba sendo percebido pelos pequenos produtores como um ônus financeiro e operacional, e não como um mecanismo de promoção da sustentabilidade.

O primeiro e mais evidente obstáculo é a baixa capacidade financeira dos pequenos produtores rurais. A regularização ambiental — que envolve custos com topografia, georreferenciamento, elaboração de projetos técnicos, licenciamento, averbação de Reserva Legal e, em muitos casos, recuperação de áreas degradadas — exige investimentos significativos.

Em Marabá, a realidade socioeconômica do campo demonstra que muitos agricultores familiares operam em regime de subsistência, dependendo diretamente da renda gerada pela produção agrícola para sua manutenção básica. O custo de contratação de engenheiros agrônomos, técnicos florestais e topógrafos, somado às taxas administrativas e aos prazos exíguos impostos pela burocracia estatal, torna o processo de regularização praticamente inviável sem apoio governamental.

Como observa Antunes (2020), “a efetividade do Direito Ambiental depende da proporcionalidade entre as exigências normativas e as capacidades econômicas dos agentes regulados”. No caso dos pequenos produtores, a ausência dessa proporcionalidade resulta na inexecução prática da lei, ainda que exista boa-fé e disposição em se adequar.

Outro fator relevante é a dependência econômica da produção extensiva e de baixo valor agregado, que ainda predomina entre as pequenas propriedades rurais amazônicas. A subsistência das famílias depende do uso contínuo da terra para plantio, criação de animais e extração de produtos florestais, o que torna difícil destinar parte da área à preservação ambiental.

A exigência legal de manutenção de Reserva Legal e de Áreas de Preservação Permanente (APPs) — ainda que fundamental à proteção ecológica — gera, na prática, uma tensão entre a necessidade de produção e o dever de conservação. Sem alternativas produtivas sustentáveis e sem compensações financeiras, o produtor vê-se diante de um dilema: preservar e comprometer sua renda ou produzir e correr o risco de sanções ambientais.

Essa realidade é agravada pela falta de políticas de incentivo à produção sustentável e pelo baixo preço dos produtos agrícolas no mercado local. Conforme destacam Souza e Trindade (2022), “a sustentabilidade ambiental só é viável quando há sustentabilidade econômica”. Logo, sem geração de renda adequada, as normas ambientais acabam se tornando, para muitos pequenos produtores, formalidades distantes da realidade cotidiana.

A ausência de políticas públicas consistentes voltadas à sustentabilidade rural é outro entrave à efetividade da legislação ambiental. Embora existam instrumentos como o Programa de Regularização Ambiental (PRA), o Crédito Rural Verde e a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (Lei nº 14.119/2021), sua aplicação prática ainda é limitada, sobretudo na Amazônia Legal.

Em Marabá e municípios vizinhos, observa-se que as iniciativas de compensação ambiental ou de fomento à produção sustentável são pontuais, descontinuadas e pouco acessíveis aos pequenos produtores. Falta integração entre as esferas municipal, estadual e federal, o que compromete a eficiência das ações. Além disso, a morosidade na liberação de recursos e a burocracia excessiva para acesso a linhas de crédito desestimulam a adesão dos agricultores.

A inexistência de uma política de incentivos consistente faz com que o cumprimento das obrigações ambientais dependa quase exclusivamente da capacidade individual do produtor, e não de um sistema de corresponsabilidade estatal, como prevê o art. 225 da Constituição Federal. Nesse contexto, o Estado falha em seu dever de assegurar as condições necessárias para que os particulares possam exercer a função socioambiental de suas propriedades.

Por fim, a desigualdade no acesso à informação e à capacitação ambiental agrava ainda mais o quadro de exclusão. Muitos produtores rurais, especialmente os situados em comunidades distantes ou assentamentos informais, não têm acesso a orientações claras sobre suas obrigações legais nem sobre os benefícios decorrentes da regularização.

A ausência de programas de educação ambiental rural e de canais acessíveis de comunicação com os órgãos públicos cria um ambiente de desinformação, em que prevalecem boatos, interpretações incorretas e desconfiança em relação às instituições ambientais. Conforme defende Benjamin (2018), “a democratização da informação ambiental é requisito indispensável à cidadania ecológica e à eficácia das normas protetivas”.

Nesse sentido, a carência de campanhas educativas e de material técnico simplificado — aliado à linguagem excessivamente complexa das normas — distancia o pequeno produtor da compreensão dos seus direitos e deveres. A comunicação ambiental, portanto, deve ser tratada como instrumento de inclusão social e de promoção da sustentabilidade.

As dificuldades socioeconômicas enfrentadas pelos pequenos produtores rurais representam um dos principais entraves à concretização da legislação ambiental no Brasil. O baixo poder aquisitivo, a dependência de práticas produtivas intensivas, a falta de incentivos governamentais e a desigualdade informacional formam um conjunto de fatores que limitam a capacidade de cumprimento da norma e perpetuam a exclusão social no campo.

Para superar esse cenário, é imprescindível que o Estado adote políticas públicas voltadas à justiça ambiental, com incentivos financeiros, assistência técnica e acesso à informação, de modo a equilibrar as exigências legais com as possibilidades econômicas dos produtores. Somente assim será possível transformar o cumprimento da legislação ambiental em um processo inclusivo, participativo e efetivamente sustentável, e não em um fardo que recai desproporcionalmente sobre os mais vulneráveis.

4.4 PROPOSTAS E ESTRATÉGIAS PARA O FORTALECIMENTO DA APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL NAS PEQUENAS PROPRIEDADES DE MARABÁ/PA

A efetividade da legislação ambiental nas pequenas propriedades rurais do município de Marabá/PA depende não apenas da rigidez normativa, mas, sobretudo, da implementação de políticas públicas que conciliem a proteção ambiental com a viabilidade econômica e social do produtor rural. Nesse contexto, apresentam-se propostas de caráter jurídico, administrativo, técnico e socioeconômico, voltadas à superação das dificuldades anteriormente identificadas.

4.5 MEDIDAS JURÍDICAS E ADMINISTRATIVAS

A primeira medida essencial consiste na simplificação das normas ambientais que regem as pequenas propriedades, sobretudo no que se refere ao Cadastro Ambiental Rural (CAR), à Reserva Legal e ao licenciamento ambiental. A linguagem técnica e os múltiplos atos normativos dificultam a compreensão dos produtores e tornam o cumprimento das exigências um processo burocrático e oneroso. Assim, é necessária a criação de procedimentos simplificados e manuais orientativos municipais e estaduais, adequados à realidade das pequenas propriedades da região de Marabá.

Outra medida importante é a realização de mutirões de regularização ambiental, promovidos de forma integrada entre os órgãos estaduais (SEMAS/PA), municipais (SEMMA/Marabá) e instituições de ensino superior, com o objetivo de oferecer atendimento gratuito e coletivo aos produtores que buscam regularizar suas propriedades. Essas ações devem incluir análise técnica de documentos, georreferenciamento básico e emissão de orientações jurídicas.

Paralelamente, recomenda-se a criação de um programa permanente de assistência jurídica rural ambiental, em parceria com a Defensoria Pública, o Ministério Público e universidades locais. Esse programa teria como finalidade orientar pequenos produtores sobre suas obrigações legais e meios de regularização, evitando autuações e litígios desnecessários. Além disso, políticas de integração administrativa entre órgãos ambientais devem ser incentivadas, a fim de reduzir a sobreposição de competências e a morosidade processual.

4.6 MEDIDAS TÉCNICAS E ESTRUTURAIS

A insuficiência de suporte técnico é uma das principais barreiras ao cumprimento da legislação ambiental. Nesse sentido, propõe-se a ampliação dos serviços de assistência técnica e extensão rural, com enfoque na sustentabilidade. Profissionais de engenharia ambiental, agronomia e gestão ambiental devem ser disponibilizados para acompanhar a implementação de práticas conservacionistas, manejo adequado do solo, recuperação de áreas degradadas e monitoramento das Áreas de Preservação Permanente (APPs).

A capacitação técnica dos produtores é igualmente fundamental. Programas de capacitação, realizados em parceria com universidades e institutos federais, podem oferecer cursos e oficinas sobre manejo sustentável, uso racional de agrotóxicos, recuperação de matas ciliares e regularização ambiental. Essas ações devem ser contínuas e adaptadas à linguagem do campo, facilitando o aprendizado e a aplicação prática das normas.

Outra proposta de grande relevância é a inclusão de tecnologias acessíveis, como o uso de aplicativos e sistemas simplificados de georreferenciamento. Convênios com instituições acadêmicas e tecnológicas podem proporcionar o desenvolvimento de plataformas gratuitas ou de baixo custo que auxiliem o produtor a identificar suas APPs, delimitar aReserva Legal e acompanhar o status de seu CAR. Essas ferramentas tornam o processo de adequação mais eficiente e menos dependente de serviços particulares caros.

4.7 MEDIDAS SOCIOECONÔMICAS

No campo econômico, a criação de incentivos fiscais e linhas de crédito verde é imprescindível para estimular a regularização ambiental das pequenas propriedades. Programas de financiamento com juros reduzidos, voltados à recuperação de áreas degradadas e ao manejo sustentável, poderiam ser implementados em parceria entre o governo estadual, bancos públicos e cooperativas de crédito rural.

O fortalecimento de políticas de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), conforme previsto na Lei nº 14.119/2021, é outra medida estratégica. O PSA pode garantir remuneração aos produtores que preservam florestas, nascentes e áreas de relevância ecológica, reconhecendo o valor econômico do serviço ambiental prestado à coletividade. Essa política transforma a conservação ambiental em fonte de renda, e não em ônus.

Por fim, a ampliação de políticas públicas municipais e estaduais de apoio à sustentabilidade rural é fundamental. A criação de conselhos municipais de meio ambiente com participação de produtores, a implantação de programas de certificação ambiental e a difusão de informações acessíveis são instrumentos que fortalecem o engajamento local e promovem a justiça ambiental.

As medidas propostas jurídicas, administrativas, técnicas e socioeconômicas formam um conjunto de ações interdependentes que buscam garantir a efetividade da legislação ambiental e a inclusão do pequeno produtor como protagonista na conservação dos recursos naturais. A implementação dessas iniciativas requer vontade política, integração institucional e, sobretudo, a compreensão de que a sustentabilidade ambiental e a produção rural podem coexistir, desde que amparadas por políticas públicas adequadas e acessíveis.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise desenvolvida ao longo deste estudo demonstrou que a aplicação da legislação ambiental nas pequenas propriedades rurais do município de Marabá/PA revela um quadro de profunda assimetria entre a norma jurídica e a realidade prática do campo brasileiro. Embora o arcabouço normativo ambiental do país seja um dos mais avançados do mundo — consagrado pela Constituição Federal de 1988 e consolidado em diplomas como o Código Florestal (Lei nº 12.651/2012) e a Lei nº 9.605/1998 (Lei de Crimes Ambientais) —, sua efetividade depende de condições materiais, institucionais e culturais que, muitas vezes, estão ausentes no cotidiano das pequenas propriedades rurais.

A pesquisa evidenciou que a legislação ambiental brasileira, apesar de tecnicamente bem estruturada, apresenta uma aplicação desigual, marcada por obstáculos jurídicos, burocráticos, técnicos e socioeconômicos. No plano jurídico e administrativo, a complexidade normativa e o excesso de exigências burocráticas tornam o cumprimento das obrigações legais uma tarefa quase inviável para o pequeno produtor, que geralmente carece de formação técnica e de acesso à assessoria especializada. A constante modificação de normas e a falta de uniformidade interpretativa reforçam a sensação de insegurança jurídica, corroendo a confiança nas instituições ambientais.

No aspecto técnico, observou-se que a carência de assistência profissional e de tecnologias acessíveis compromete a implementação de práticas sustentáveis, como o manejo adequado do solo, o reflorestamento de áreas degradadas e o monitoramento das Áreas de Preservação Permanente (APPs). A ausência de uma política de extensão rural voltada especificamente à sustentabilidade ambiental contribui para que o produtor permaneça à margem do processo de regularização, muitas vezes descumprindo normas não por má-fé, mas por desconhecimento ou impossibilidade técnica.

Do ponto de vista socioeconômico, o estudo revelou que a baixa capacidade financeira e a falta de incentivos públicos eficazes são fatores determinantes para a dificuldade de cumprimento da legislação. A regularização ambiental, por envolver custos com topografia, elaboração de projetos técnicos, licenciamento e recuperação de áreas, torna-se economicamente inviável para o pequeno produtor, cuja renda frequentemente depende da produção intensiva e de subsistência. A ausência de políticas de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) e de linhas de crédito sustentável reforça o círculo vicioso da irregularidade e da informalidade ambiental.

Nesse contexto, as propostas delineadas neste trabalho — como a simplificação normativa, os mutirões de regularização ambiental, a criação de núcleos de assistência jurídica e técnica rural, o uso de geotecnologias acessíveis e a implementação de incentivos fiscais e econômicos sustentáveis — representam caminhos concretos para promover uma transição de um modelo de fiscalização punitiva para um modelo de governança ambiental colaborativa.

A efetividade da legislação ambiental não pode ser medida apenas pelo número de autuações ou pela rigidez da norma, mas sim pela capacidade do Estado e da sociedade de promover a adesão consciente e participativa do produtor rural às práticas sustentáveis. Em outras palavras, a proteção ambiental eficaz não decorre apenas da coerção, mas da construção coletiva de uma cultura de sustentabilidade, na qual o agricultor é compreendido como aliado e não como antagonista do meio ambiente.

Dessa forma, a função socioambiental da propriedade rural — princípio consagrado no artigo 186 da Constituição Federal — deve ser interpretada em conjunto com o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225 da CF/88). Ambos os dispositivos convergem para uma concepção moderna de desenvolvimento sustentável, que não dissocia a proteção dos recursos naturais da valorização social e econômica do homem do campo.

Em síntese, a aplicação efetiva da legislação ambiental nas pequenas propriedades rurais de Marabá/PA depende da integração entre instrumentos jurídicos, políticas públicas e ações educativas, que tornem a sustentabilidade uma prática viável e vantajosa. A criação de políticas municipais e estaduais de incentivo, a presença de órgãos ambientais acessíveis e a articulação com universidades e institutos de pesquisa são passos essenciais para que o cumprimento das normas ambientais se converta em oportunidade de fortalecimento econômico, inclusão social e preservação ambiental.

Conclui-se, portanto, que o futuro da sustentabilidade no campo brasileiro — e, em especial, nas pequenas propriedades de Marabá — exige um novo paradigma de governança ambiental, pautado na cooperação, na inclusão e na valorização do conhecimento local. A legislação ambiental deve deixar de ser percebida como um instrumento de coerção distante e passar a ser entendida como ferramenta de emancipação social, justiça intergeracional e cidadania ecológica. Somente assim será possível concretizar o ideal constitucional de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, indispensável à sadia qualidade de vida dos presentes e futuras gerações, conforme determina o artigo 225 da Carta Magna.

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1Acadêmico do Curso de Bacharelado em Direito da Faculdade Carajás
2Acadêmico do Curso de Bacharelado em Direito da Faculdade Carajás