ASSÉDIO MORAL: RELAÇÕES NO TRABALHO SOB A ÓTICA SOCIAL

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202505312040


Fernanda Cirqueira Dias1
Joyciony Gomes Sousa1
Janayny Hayumy de Freitas2


RESUMO

O presente artigo aborda as principais razões para a persistência do assédio moral no ambiente de trabalho, especialmente sob a ótica social, destacando a falta de conscientização e conhecimento sobre as suas causas, consequências e formas de mitigação. A ausência de políticas organizacionais eficazes e a banalização das práticas abusivas contribuem para a manutenção desse fenômeno, que compromete tanto a saúde psicológica quanto a dignidade dos trabalhadores. Como solução, propõe-se a implementação de campanhas de conscientização, treinamentos específicos e a inclusão de normas rigorosas contra o assédio moral nas políticas corporativas. Dessa forma, espera-se promover um ambiente de trabalho mais justo e saudável, com ênfase no respeito às relações interpessoais. Este artigo justifica-se pela necessidade de ampliação do conhecimento e da conscientização sobre o assédio moral, visando a sua erradicação e a promoção do bem-estar no ambiente de trabalho. A metodologia aplicada baseia-se em uma pesquisa bibliográfica exploratória e descritiva, com análise de livros, artigos e estudos científicos, complementada por um exame de casos práticos. Em síntese, o estudo serve como um alerta sobre a importância de transformar os desafios sociais no trabalho em oportunidades para o desenvolvimento de ambientes laborais mais saudáveis e respeitosos. Ao avançarmos nesse debate, surge a pergunta: estamos preparados para enfrentar e eliminar o assédio moral em nossas organizações?

Palavras-chave: Assédio Moral, Ambiente de Trabalho, Conscientização, Saúde Ocupacional.

1. INTRODUÇÃO

Quando o assunto abordado se direciona ao assédio moral, a priori é necessário um conceito epistemológico do assunto. Para Valdemar P. da Luz (Dicionário Jurídico, 3. ed – Manole 2020) trata-se de uma conduta abusiva praticada pelo empregador, ou pessoa a ele subordinada, contra empregados no ambiente de trabalho, de modo a sujeitá-los a situações humilhantes e constrangedoras. Caracteriza-se pela degradação deliberada das condições de trabalho em que prevalecem atitudes e condutas negativas dos chefes em relação aos seus subordinados, acarretando prejuízos práticos e emocionais para o trabalhador. 

Corroborando a esta conceituação, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) e Conselho Superior de Justiça (CSJT) pontua que é toda e qualquer conduta abusiva (gestos, palavras, escritos, comportamentos, atitudes, etc) que intencional e frequente, fira a integridade física e psíquica de uma pessoa.

Marie-France Hirigoyen (2000) conceitua o assédio moral como toda conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude…) que atenta, por sua repetição ou sistematização, contra a dignidade ou à integridade psíquica ou física de uma pessoa, colocando em perigo seu emprego ou degradando seu ambiente de trabalho. 

Contreras, Sérgio Gamonal (2011) define o assédio moral como sendo o processo constituído por um conjunto de ações ou omissões, no âmbito das relações de trabalho públicas e privadas, em virtude do qual um ou mais sujeitos assediadores criam um ambiente laboral hostil e intimidatório em relação a um ou mais assediados, afetando gravemente sua dignidade pessoal e causando danos à saúde dos afetados com vistas a obter distintos fins de tipo persecutório. 

Márcia Novaes Guedes (2008), em preciosa monografia, define os seus contornos, identificando dois aspectos essenciais: a regularidade dos ataques – trata-se de uma violência sistemática e que dura um certo tempo – e a determinação de desestabilizar emocionalmente a vítima para obrigá-la a se afastar do trabalho. A amplitude das hipóteses possíveis de serem enquadradas como assédio moral dificulta a precisão conceitual, desde que pode alcançar situações de ressentimento justificado que acabam por desestabilizar emocionalmente o trabalhador em decorrência da continuidade de procedimento incômodo e injustificado causador do constrangimento no ambiente de trabalho. 

Quais as situações conflitivas e fisiológicas envolvidas no processo do assédio moral no ambiente do trabalho?

A justificativa da escolha do tema inclina-se sobre a situação do assédio moral no ambiente de trabalho como força propulsora de situações de absenteísmo, demissões involuntárias bem como outras patologias que podem ser desenvolvidas pelas pessoas que passam pelo processo do assédio moral ou como autores trazem na atualidade este termo conceituado como mobbing.

Desta forma, o esclarecimento de nuances e situações ansiogênicas ligadas a este fator, buscam de forma bibliográfica clarear as ideias e subjetividades dos envolvidos, de forma que a pesquisa na área da medicina do trabalho possa garantir uma vida mais salutar daqueles que se encontram em pleno processo laboral em sua vida ativa.

O objetivo geral deste estudo é clarificar as situações centrais dos fatores negativos do assédio moral no ambiente de trabalho. Os objetivos específicos incluem: 

1) Pontuar bibliograficamente o fenômeno do assédio moral no ambiente de trabalho;

2) Direcionar a situação do fenômeno psicológico para o cunho de problemas fisiológicos do envolvido no fenômeno;

3) Clarificar as formas de trabalho que podem auxiliar o envolvido a extinguir o fenômeno no ambiente de trabalho.

2. REVISÃO DE LITERATURA

No final do século XX, as violências no contexto laboral, muitas vezes naturalizadas e negligenciadas como um produto da construção social (Arendt, 1985; Espinosa, 2017), passaram a ganhar maior visibilidade como fatores que desencadeiam sofrimento no trabalho (Freitas, Heloani, & Barreto, 2008; Segundo Espinosa (2017), as transformações nas relações interpessoais e as mudanças no mundo do trabalho, que resultam na redução dos postos de trabalho, intensificam medos e orientações para a banalização da violência no ambiente laboral. No Brasil, o abuso moral no trabalho (AMT) foi formalmente reconhecido com essa nomenclatura em 2000 (Soboll, 2015). Atualmente, este fenômeno constitui um objeto relevante de estudo na Psicologia das Organizações e do Trabalho, e o desenvolvimento de pesquisas reflete a crescente preocupação da comunidade científica e dos profissionais da área em aprofundar o conhecimento sobre a AMT e os seus efeitos na saúde mental.

Através de um resgate histórico, foi obtido que os pesquisadores escandinavos foram pioneiros na descrição do impacto e da prevalência do assédio moral no trabalho (Fahie, 2014). Entre eles, destaca-se o psicólogo alemão Heinz Leymann, que se naturalizou sueco e iniciou seus estudos sobre “mobbing” na década de 1980. Para Leymann, a aparência ocorre quando uma vítima é sujeita a uma estigmatização sistemática, caracterizada por injustiças e ações repetidas ao longo de um período prolongado, resultando em danos psicológicos, psicossomáticos e sociais. Assim, trata-se de uma forma de comunicação hostil e antiética, geralmente direcionada a uma pessoa específica, sendo os agressores tanto colegas quanto a própria gestão da organização (Leymann, 1996).

As denúncias de abuso moral no trabalho ganharam maior visibilidade na França durante a mesma década, quando Marie-France Hirigoyen o definiu como uma conduta abusiva manifestada principalmente por comportamentos, palavras, atos e escritos que causam danos à personalidade, dignidade e/ ou à integridade física ou psíquica da vítima (Hirigoyen, 2008). Embora não haja um consenso completo entre os autores que estudam as características, é amplamente aceito que o AMT tenha um caráter processual (Hirigoyen, 2008; Soboll, 2015), caracterizado por comportamentos repetitivos e frequentes, expressos de diversas formas abusivas, com o objetivo de diminuir, humilhar, estranhar, desqualificar e destruir psicologicamente um indivíduo ou grupo (Freitas, Heloani & Barreto, 2008).

O AMT está associado a práticas abusivas dirigidas a um trabalhador, que podem ter graves consequências e implicações (Hirigoyen, 2008). As atitudes hostis são definidas em quatro categorias:

a) a intencionalidade das condições de trabalho, que inclui contestar sistematicamente todas as decisões de vítima, críticas desproporcionadas e injustiças, entre outras; 

b) o isolamento e a recusa de comunicação, como excluir a vítima de forma objetiva; 

c) o atentado à dignidade, que envolve chacotas sobre características pessoais e profissionais, gestos de desprezo e insultos; 

d) a violência verbal, física e sexual, que pode incluir ameaças, empurrões, gritos, insinuações e assédio sexual (Hirigoyen, 2015).

No que diz respeito à legislação nacional sobre o tema, observa-se uma falta de especificidade e efetividade, com regulamentações presentes principalmente nas esferas estaduais e municipais. Nogueira e Ferreira (2017) apontam algumas normatizações referentes à prática de abuso moral no trabalho (AMT) no âmbito civil, tanto na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) quanto no Código Civil Brasileiro, onde é possível identificar a natureza ilícita dessa prática, seja ela decorrente de um ato comissivo ou omissivo, de negligência ou imperícia, uma vez que provoca danos morais à vítima. Os autores também ressaltam as dificuldades na criação de normas específicas para combater essa prática, bem como os desafios enfrentados pela vítima em comprovar o assédio, devido à natureza subjetiva das especificidades (Nogueira & Ferreira, 2017).

2.1 O QUE CARACTERIZA O ASSÉDIO MORAL?

O assédio moral no trabalho é caracterizado a partir de situações recorrentes que expõem o colaborador a circunstâncias constrangedoras, vexatórias e ofensivas à sua moral (Pontotel, 2024).

Para ser caracterizado como assédio moral no ambiente de trabalho essas práticas negativas precisam ocorrer de forma frequente e não esporádica. Ela pode partir de qualquer membro da empresa, desde gestores a colegas de trabalho da mesma função (Pontotel, 2024).

O principal objetivo de quem pratica o assédio moral no trabalho é diminuir, desestabilizar, físico e mentalmente, o profissional em questão. Caracterizam o assédio moral, xingamentos, metas consideradas abusivas, humilhações, cobranças desnecessárias, etc (Pontotel, 2024).

Investigar comportamentos abusivos dentro das organizações é uma tarefa complexa, pois poucos estão interessados ​​em falar sobre o tema, e o número de pessoas interessadas em ouvir parece ser ainda menor. Nesse sentido, há décadas, pesquisadores de diversas partes do mundo têm colaborado com sindicatos, organizações de saúde e outros organismos profissionais para obter acesso a casos de assédio, buscando avançar na discussão sobre o tema (RAYNER, SHEEHAN e BARKER, 1999). Além disso, é crucial considerar outras perspectivas, além das vítimas, quando se trata de assédio moral no trabalho. Salin (2003b) e Daniel (2009) sugerem que é necessário avançar nessa direção, visto ser raro estudos que explorem as visões de gestores(as) e, especialmente, dos(as) agressores(as).

Exemplos mais comuns: 

a) retirar autonomia funcional dos trabalhadores ou privá-los de acesso aos instrumentos de trabalho;

b) sonegar informações úteis para a realização de suas tarefas ou induzi-los a erro;

c) contestar segregar a pessoa sistematicamente todas as suas decisões e criticar o seu trabalho de modo exagerado ou injusto; 

d) entregar, de forma permanente, quantidade superior de tarefas comparativamente a seus colegas ou exigir a execução de tarefas urgentes de forma permanente; 

e) atribuir, de propósito e com frequência, tarefas inferiores ou superiores, distintas das suas atribuições; 

f) controlar a frequência e o tempo de utilização de banheiros; 

g) pressionar para que não exerçam seus direitos estatutários ou trabalhistas; 

h) dificultar ou impedir promoções ou o exercício de funções diferenciadas; 

i) invadir a vida privada da pessoa com ligações telefônicas ou cartas; 

j) assediada no ambiente de trabalho, seja fisicamente, seja mediante recusa de comunicação;

k) agredir verbalmente, dirigir gestos de desprezo, alterar o tom de voz ou ameaçar com outras formas de violência física; 

l) criticar a vida privada, as preferências pessoais ou as convicções da pessoa assediada; 

m) espalhar boatos ou fofocas a respeito da pessoa assediada, ou fazer piadas, procurando desmerecê-la ou constrangê-la perante seus superiores, colegas ou subordinados;

n) desconsiderar problemas de saúde ou recomendações médicas na distribuição de tarefas; 

o) isolar a pessoa assediada de confraternizações, almoços e atividades realizadas em conjunto com os demais colegas.

2.1.1 TERMINOLOGIA DE ASSÉDIO MORAL

O assédio moral pode ser compreendido como o “dano que compromete o estado psicológico, moral e intelectual da vítima, incidindo diretamente sobre os direitos da personalidade” (VENOSA, 2008, p. 41), fundamentando-se nas áreas de estudo da sociologia e da psicologia.

Caracteriza-se pela intencionalidade constante de desqualificação da vítima, seguida da sua fragilização, no desígnio de neutralizá-la em termos de poder nas relações sociais e atividades do trabalho (FREITAS, 2001).  

Reginald Felker (2006) esclarece que a questão vai além de meros desentendimentos ou conflitos cotidianos, caracterizando-se como uma conduta deliberada e intencional, na qual o agressor tem como objetivo destruir a autoestima da vítima. Isso ocorre por meio de ataques muitas vezes indiretos e sutis, que nem sempre são imediatamente percebidos pela vítima ou por aqueles que testemunham a agressão. É importante destacar que, para que o assédio moral seja configurado, é necessária a repetição dessas condutas ao longo de um período razoável, diferenciando-se de ações isoladas pela sua natureza reiterativa.

3. VARIEDADES DE ASSÉDIO MORAL

3.1 Assédio moral vertical descendente  

Trata-se do tipo de assédio moral mais comum nas empresas. Esse tipo de assédio toma forma quando o assédio é praticado por um trabalhador hierarquicamente superior ao empregado assediado.

Pode-se visualizar esse tipo de assédio, por exemplo, quando um gerente cobra metas de seus subordinados e, para isso, os coloca em situações vexatórias, fazendo com que fazem “dancinhas”, paguem “micos”, apelidando-os com cognomes pejorativos, etc.

Nessa dinâmica, o agressor distorce seu papel de liderança, abusando do poder diretivo e disciplinar, geralmente com a intenção de forçar a vítima a pedir demissão. Situações como a retirada de autonomia do funcionário, o seu isolamento dos demais colegas e a criação de circunstâncias vexatórias podem levar o trabalhador, pressionado por essas agressões, a se desligar voluntariamente. Esses casos caracterizam o assédio moral vertical ascendente (Hirigoyen, 2015).

3.2 Assédio moral vertical ascendente  

O assédio vertical ascendente, embora seja extremamente raro, ocorre quando um funcionário hierarquicamente inferior assedia seu superior.

Embora seja mais difícil de visualizar na prática, pode-se visualizá-lo em situações em que um funcionário sabe alguma informação sigilosa da empresa ou do seu superior hierárquico e a utiliza como meio de chantagem para benefício próprio (faltar injustificadamente, pedir aumento de salário, etc.).

Busca-se excluir um colega que foi elevado a uma posição de liderança, por considerarem que ele não possui as qualificações necessárias para desempenhar o novo papel (Hirigoyen, 2015).

3.3 Assédio moral horizontal  

Nesse caso de assédio, os agressores são os próprios colegas de trabalho que ocupam a mesma posição hierárquica. A violência manifesta-se por meio de comentários depreciativos, tanto sobre a vida pessoal quanto sobre a atuação profissional da vítima. Exemplos disso incluem piadas mal-intencionadas e insultuosas, cujo propósito é desmoralizar o colega. Além disso, esse tipo de assédio pode envolver discriminação relacionada a crenças religiosas, posições políticas, raça ou orientação sexual (Hirigoyen, 2015).

Sobre esse assunto, Carvalho (2009, p. 67) afirma: “A própria competitividade é outro fator que favorece a prática da discriminação entre colegas de trabalho.”

Segundo Carvalho (2009, p. 68), o assédio moral horizontal pode surgir devido à competitividade exacerbada nas empresas. Um exemplo simples é a situação em que uma empresa estabelece metas a serem atingidas, e o primeiro a alcançar essas metas recebe um prêmio ou é “bajulado” de alguma forma por seus superiores. 

É importante destacar que essa prática, embora possa gerar um ambiente competitivo, não é ilegal. A Constituição Federal do Brasil, ao definir os fundamentos da República Federativa, reconhece os “valores sociais do trabalho e da livre iniciativa” (Constituição Federal/1988, art. 1°, IV), o que legitima a busca por resultados e o incentivo à produtividade dentro das empresas.

Tarcitano e Guimarães (2004) argumentam que o assédio moral horizontal surge devido a múltiplos fatores, incluindo:

  • As exigências excessivas para produção,
  • O abuso de poder,
  • Instruções confusas e frequentes,
  • Ofensas repetitivas e agressões,
  • A maximização dos erros e culpas,

Esses fatores, que ocorrem ao longo da jornada de trabalho, contribuem para a degradação deliberada das condições laborais, transformando o ambiente de trabalho em um “campo minado” repleto de medo, inveja, disputas, fofocas e rivalidades. Esses sentimentos são transmitidos tanto verticalmente quanto horizontalmente entre gerentes e trabalhadores em diferentes posições dentro da empresa (TARCITANO; GUIMARÃES, 2004).

3.4 Assédio moral misto

Quando os assédios vertical e horizontal se dão de modo simultâneo; na hipótese, o alvo sofre pela ação de superiores hierárquicos e também por colegas com os quais não tem relação de subordinação.

Nesse tipo de assédio, a vítima enfrenta problemas de várias frentes: de colegas de trabalho, de seus superiores ou de cargos de liderança que possuem uma hierarquia acima dela. Hirigoyen (2011, p.114) descreve a situação da seguinte forma:

Quando alguém é vista como um bode expiatório por um superior ou pelos colegas, essa percepção se espalha rapidamente por toda a equipe. A pessoa é considerada responsável por todos os problemas que surgem. Rapidamente, ela se torna insuportável para os outros, e mesmo que alguns não compartilham dessa visão, poucos se atrevem a desafiar a opinião predominante.

Assim, qualquer trabalhador, independentemente de sua colocação na estrutura hierárquica da instituição pode sofrer assédio moral.

 4. SURGIMENTO DO ASSÉDIO MORAL NO ÂMBITO DO TRABALHO

Ao primeiro olhar, canaliza-se aos apontamentos que Barreto (2000) acentua para o fenômeno do assédio moral, no qual para autora a novidade reside na intensificação, gravidade, amplitude e banalização do fenômeno e na abordagem que tenta estabelecer o nexo-causal com a organização do trabalho e tratá-lo como não inerente ao trabalho.

Corroborando, o assédio moral no trabalho não é um fato isolado, ele se baseia na repetição ao longo do tempo de práticas vexatórias e constrangedoras, explicitando a degradação deliberada das condições de trabalho num contexto de desemprego, dessindicalização e aumento da pobreza urbana. A batalha para recuperar a dignidade, a identidade, o respeito no trabalho e a autoestima. (Fonte:https://www.sina.org.br/)

Somando-se as ideias dos autores acima, Almeida (2012, p. 392) traz que indubitavelmente, poder-se-ia dizer que, o Assédio Moral ou a Violência no Trabalho, apesar de não se tratar de um fenômeno novo nas sociedades, ele é tão antigo quanto o próprio Trabalho.

E Jorge Monteiro Lacerda (2021) fecha a conceituação como sendo o assédio moral e o social fazem parte do poder perverso nas organizações e está ligado a um esforço repetitivo de desqualificação de uma pessoa por outra.

Ainda há uma distinção de gênero quanto aos fatores de assédio. Estas manifestações, segundo o sexo direciona para as mulheres como os controles são diversificados e visam intimidar, submeter, proibir a fala, interditar a fisiologia, controlando tempo e frequência de permanência nos banheiros. Relacionam atestados médicos e faltas a suspensão de cestas básicas ou promoções. Já para os homens, o fenômeno atinge a sua virilidade, preferencialmente.

Neste sentido, o forte impacto causado no ambiente de trabalho, não só para a vítima do fenômeno, mas como também para os próprios colaboradores que a rodeiam e, neste mesmo viés, Barreto (2000) ainda traz que:

Caracteriza-se pela degradação deliberada das condições de trabalho em que prevalecem atitudes e condutas negativas dos chefes em relação a seus subordinados, constituindo uma experiência subjetiva que acarreta prejuízos práticos e emocionais para o trabalhador e a organização. A vítima escolhida é isolada do grupo sem explicações, passando a ser hostilizada, ridicularizada, inferiorizada, culpabilizada e desacreditada diante dos pares. Estes, por medo do desemprego e a vergonha de serem também humilhados associados ao estímulo constante à competitividade, rompem os laços afetivos com a vítima e, frequentemente, reproduzem e reatualizam ações e atos do agressor no ambiente de trabalho, instaurando o ’pacto da tolerância e do silêncio’ no coletivo, enquanto a vítima vai gradativamente se desestabilizando e fragilizando, ’perdendo’ sua autoestima.

5. CONSEQUÊNCIAS DO ASSÉDIO A SAÚDE FÍSICA E MENTAL DA VÍTIMA

Segundo Freitas (2001), o assédio moral pode trazer sérios danos à saúde física e mental do trabalhador, manifestando-se em condições como depressão, ansiedade, nervosismo, fobia social, ataques de pânico, baixa autoestima, melancolia, apatia, dificuldades de concentração, cansaço, distúrbios digestivos e enxaquecas.

A depressão e o transtorno de estresse pós-traumático destacam-se como os principais problemas em vítimas de assédio moral, conforme indicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS, 2004). No Reino Unido, uma pesquisa realizada com 5.200 trabalhadores revelou que aqueles que sofreram assédio moral apresentavam níveis de estresse mais elevados em comparação com os que não passaram por essa experiência (Hoel & Cooper, 2000). Niedhammer, David, Degioanni, Drummond e Philip (2009) identificaram uma forte relação entre assédio moral e distúrbios do sono em um estudo com 7.697 pessoas do sudoeste da França. Além disso, Emadad, Alipour, Hagberg e Jensen (2013) conduziram uma investigação com 2.563 funcionários de quatro grandes indústrias na Suécia, com o objetivo de identificar sintomas depressivos decorrentes de testemunhar situações de assédio envolvendo colegas de trabalho.

Outro agravante no assédio moral é relativo ao processo de humilhação no qual o colaborador sofre dentro de um local de trabalho. Barreto (2000) expõe claramente que a humilhação repetitiva e de longa duração interfere na vida do trabalhador e trabalhadora de modo direto, comprometendo sua identidade, dignidade e relações afetivas e sociais, ocasionando graves danos à saúde física e mental, que podem evoluir para a incapacidade laborativa, desemprego ou mesmo a morte, constituindo um risco invisível, porém concreto, nas relações e condições de trabalho.

6. A LEGISLAÇÃO APLICADA NO COMBATE AO ASSÉDIO MORAL  

A Constituição Federal coloca a dignidade da pessoa humana como um dos pilares da República Federativa do Brasil e como objetivo essencial da ordem econômica. Essa visão é expressa no artigo 1º, que afirma:

“Art. 1º A República Federativa do Brasil, constituída pela união indissolúvel dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, forma-se como um Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: 

 III – a dignidade da pessoa humana;

 IV – Os valores sociais do trabalho e da vida

Adicionalmente, nos artigos 170 e 193, a Constituição sublinha o valor do trabalho como um princípio central, conforme indicado: 

O art. 170 da Constituição Federal define que a ordem econômica, baseada na valorização do trabalho humano e na iniciativa livre, busca garantir uma existência digna para todos, de acordo com os princípios da justiça social. Esse artigo estabelece que a ordem econômica deve seguir determinados princípios, priorizando o bem-estar da população.

No art. 193, a Constituição dispõe que a ordem social é fundamentada no primado do trabalho e tem como propósito o bem-estar e a justiça social. Esses artigos destacam o papel do trabalho e da justiça social como pilares fundamentais na promoção da dignidade e do desenvolvimento humano.

Ingo Wolfgang Sarlet (2012, p. 37) define a dignidade da pessoa humana como “uma qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada indivíduo, que o torna merecedor de igual respeito e consideração por parte do Estado e da sociedade”. Para Sarlet, a dignidade implica um conjunto de direitos e deveres fundamentais que protegem a pessoa contra atos degradantes e desumanos, garantindo-lhe também as condições mínimas de existência para uma vida saudável e incentivando sua participação ativa e responsável nos rumores da própria vida e na na convivência em harmonia com saúde.

Segundo o artigo 146 do Decreto-Lei 2.848 de 1940, o Código Penal Brasileiro, é crime: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda” (BRASIL, 1940).

7. O ASSÉDIO MORAL E A PROTEÇÃO LEGISLATIVA DO TRABALHADOR

Ao ferir o seu prestígio profissional, atingindo seu amor próprio e sua dignidade, tal conduta do empregador é passível de indenização, tendo em vista o dano moral causado ao empregado, nos termos do art. 5º, X, da Constituição Federal de 1988, combinado com o art. 159 do Código Civil.

A teoria do assédio moral está fundamentada nos princípios constitucionais, especialmente na dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), no direito à saúde, incluindo a saúde mental (art. 6º), e no direito à honra (art. 5º, X). O assédio moral, ao atingir esses princípios, configura uma violação aos direitos fundamentais, gerando danos morais e patrimoniais, conforme aponta Gamonal. 

Para Alkimim, essa prática fere valores como boa-fé, respeito e não discriminação, afetando a personalidade do trabalhador e podendo levar a graves consequências, como doenças, desemprego e até suicídio. A análise do assédio moral sob a ótica constitucional é essencial, pois ele afronta o valor do trabalho humano e a dignidade da pessoa.

Hemérito destaca que, na sociedade pós-industrial, o Direito do Trabalho busca proteger os direitos fundamentais dos trabalhadores, limitando o poder do empregador e evitando a precarização das condições laborais. Assim, o Direito do Trabalho tem o dever de garantir o bem-estar físico e mental do trabalhador.

Há um projeto de lei na esfera penal, que tem como objetivo tipificar criminalmente a conduta de quem pratica o assédio moral no ambiente de trabalho. Trata-se do projeto de lei federal nº. 4.742/01 de autoria do deputado Marcos de Jesus do PL/PE.

Após a E.C 45/04 passou a ser reservado à Justiça do Trabalho solucionar os casos de assédio moral e dano moral que era uma questão muito controversa. 

Segundo Delgado (2008), alguns Magistrados têm justificado suas sentenças segundo princípios constitucionais e da CLT que se seguem: 

Princípio da razoabilidade ou proporcionalidade 

O princípio da razoabilidade visa a um equilíbrio na relação entre o empregado e empregador. Busca a proporcionalidade entre o superior hierárquico e o empregado. 

Assim a indenização que venha reparar o dano causado à vítima deve ser proporcional ao mal causado.

Princípio da boa-fé contratual 

Significa que ambas as partes devem cumprir as obrigações de acordo com o contrato, sempre de forma leal, ética e honesta. Sendo que o empregado deve cumprir seu papel na empresa, bem como estipula o contrato de trabalho, empenhando-se em suas tarefas para ter direito à sua contraprestação que é o salário. Em contrapartida o empregador deve fazer a sua parte, ou seja, zelar pela saúde e segurança de seus funcionários dentro do ambiente de trabalho, além de tratá-lo com respeito e dignidade (DELGADO,2008, p.285). 

Princípio da realidade sobre a forma 

O Princípio da realidade sobre a forma defende a realidade dos fatos. No Direito do Trabalho se busca a aferição da realidade dos fatos sendo esta mais importante do que qualquer documento. 

Este princípio garante que mesmo que esteja com documento escrito cabe prova em contrário” juris tantum”. 

Princípio da proteção 

Este princípio se refere a uma teia de proteção à parte hipossuficiente na relação empregatícia, visando retificar, no plano jurídico, o desequilíbrio entre patrão e empregado. 

Assim deve ser aplicada a condição mais benéfica ao trabalhador. As vantagens já conquistadas prevalecem sobre as novas leis.

8. CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO ASSÉDIO MORAL

O assédio moral no ambiente de trabalho por sua vez, se torna um crime previsto na Consolidação de Leis Trabalhistas (CLT), ganhando um destaque em artigos que prevê que algumas maneiras de assédio moral são causas justificantes que autorizam o trabalhador a sair do emprego por meio de rescisão indireta do contrato de trabalho. Na reforma trabalhista houve uma mudança em relação aos valores de indenização por danos morais causados ao empregado com disposto no Art. 223-G § 1º – Se julgar procedente o pedido, o juízo fixará a indenização a ser paga, a cada um dos ofendidos, em um dos seguintes parâmetros, vedada a acumulação: 

I – Ofensa de natureza leve, até três vezes o último salário contratual do ofendido; 

II – Ofensa de natureza média, até cinco vezes o último salário contratual do ofendido;

III – ofensa de natureza grave, até vinte vezes o último salário contratual do ofendido; 

IV – Ofensa de natureza gravíssima, até cinquenta vezes o último salário contratual do ofendido. Nenhum trabalhador pode ser obrigado a trabalhar em um ambiente que não respeite sua dignidade, dito isso vale salientar que o trabalhador que por sua vez veio a sofrer ou esteja sofrendo ofensa moral decorrente de assédio ou discriminação pode deixar a empresa e deve receber todos os direitos rescisórios como se tivesse sido dispensado sem justa causa, o artigo a seguir diz; Art. 483. O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:

e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama. 

Contudo, podemos ver que na Consolidação de Leis Trabalhistas existem várias maneiras que resguardam o trabalhador em relação ao assédio moral sofrido, e que com a criação de leis, eles são protegidos em questões diversas, e no meio delas o assédio moral. Além disso, fornecer conhecimento global sobre direitos trabalhistas para todas as partes interessadas, principalmente empregados e empregadores é outro ponto relevante que a Consolidação de Leis Trabalhistas traz.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo teve como objetivo central desvendar as complexidades do assédio moral no ambiente de trabalho, sob uma perspectiva social. Ao analisar a literatura sobre o tema, constatamos que o assédio moral, além de causar sofrimento psicológico, possui repercussões significativas na saúde física dos indivíduos envolvidos. As relações de poder desiguais, a cultura organizacional tóxica e a falta de mecanismos de proteção eficazes são fatores que perpetuam esse tipo de violência no mundo do trabalho.

Ao direcionar o olhar para as consequências fisiológicas do assédio moral, evidenciamos a necessidade de uma abordagem multidisciplinar para o enfrentamento desse problema. A saúde mental e física dos trabalhadores está intrinsecamente ligada, e o assédio moral pode desencadear uma série de doenças, como depressão, ansiedade e distúrbios do sono.

Diante do exposto, torna-se evidente que o combate ao assédio moral no ambiente de trabalho deve ser uma prioridade tanto para as organizações quanto para a sociedade em geral. Para reduzir a incidência dessas características, é essencial que as empresas adotem políticas preventivas robustas, promovam um ambiente de trabalho ético e fortaleçam canais de denúncia seguros e eficazes. A atuação conjunta de profissionais da saúde, juristas e especialistas em gestão organizacional pode contribuir para a criação de um ambiente mais saudável, onde o bem-estar do trabalhador seja valioso.

Além disso, reforça-se a importância de campanhas de conscientização para desmistificar o assédio moral e sensibilizar gestores e colaboradores quanto aos impactos dessa prática. A cultura organizacional deve evoluir para ser mais inclusiva e respeitosa, de modo a prevenir abusos e promover relações de trabalho pautadas pelo respeito e pela equidade. Criar um ambiente onde todos se sintam seguros e valorizados contribua não apenas para o bem-estar individual, mas também para o desempenho e a saúde coletiva do órgão.

Assim, espera-se que o presente artigo contribua para a compreensão das graves consequências do assédio moral e inspire futuras pesquisas e ações direcionadas ao desenvolvimento de ambientes laborais mais saudáveis ​​e humanizados. A criação de políticas públicas e regulamentações que protejam os trabalhadores contra essa forma de violência, bem como a implementação de programas de apoio psicológico e social, são passos fundamentais para uma mudança efetiva.

REFERÊNCIAS

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