REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202501141416
Welton Martins Ribeiro1,
Orientador: Neudson Johnson Martinho2
RESUMO
Estudo descritivo, de abordagem qualitativa, objetiva compreender a percepção dos profissionais de Enfermagem quanto aos riscos para hipertensão arterial sistêmica a partir das diversas demandas do seu cotidiano de trabalho. Sua relevância se legitima tanto do ponto de vista clínico, social, como da Gestão de pessoas no universo profissional da Enfermagem, por possibilitar reflexões a cerca da prevenção desta patologia e/ou das complicações advindas desta. O mesmo foi realizado em uma Unidade Coronariana (UCO) do município de Cuiabá-MT, cuja coleta de dados ocorreu por meio de entrevista semi-estruturada realizada com quatorze (14) profissionais de enfermagem, e a análise dos resultados foi processada com base no método de análise temática. Consideramos que a HAS apresenta aspectos visíveis, porém, os invisíveis predominam quando se considera a percepção e atitude de cada profissional mesmo sabendo dos riscos a que estão sujeitos frente a esta possibilidade potencial de tornar-se hipertenso. A invisibilidade das coisas torna-se visível quando nos permitimos ir além do aparente, e mergulhamos nos sentidos e significados que permeiam a nossa existência humana, como parte dinâmica deste mundo que construímos a partir de nossas percepções e significados a ele atribuídos. É nesse mundo perceptível de significados e sentidos que se constrói a saúde em cada ser. A invisibilidade da hipertensão arterial é perceptível a partir do significado que o hipertenso dá a mesma, daí se muda as atitudes e estilos de vida, devendo o profissional da saúde buscar compreender e perceber esta invisibilidade ao implementar o cuidado nos níveis primários, secundário e terciário das ações em saúde.
Palavras – Chave: Enfermagem; Hipertensão; Fatores de risco.
ABSTRACT
Descriptive, qualitative approach aims to understand the perception of nursing professionals about the risks for hypertension from the various demands of their daily work. Its relevance is legitimized both the clinical point of view, social, and management of people in the professional world of nursing, for reflections about the possible prevention of this disease and / or complications there of. The same was done in a coronary care unit (CCU) of Cuiabá-MT, which data collection occurred through semi-structured interviews conducted with fourteen (14) nurses, and data analysis was performed based on the method thematic analysis. We believe that the SAH has visible aspects, however, the invisible predominate when considering the perception and attitude of each professional despite the risks they may face the face of this potential possibility of becoming hypertensive. The invisibility of things becomes visible when we allow ourselves to go beyond appearance, and plunged in the meanings that permeate our existence, as part of this dynamic world we build from our perceptions and meanings attributed to it. The invisibility of hypertension is evident from the meaning that gives the same hypertensive, hence changing the attitudes and lifestyles, the health professional should seek to understand and realize this invisibility when implementing care within the primary, secondary and tertiary health actions.
Keywords: Nursing; Hypertension; Risk factors.
RESUMEN
Enfoque descriptivo, cualitativo tiene como objetivo conocer la percepción de los profesionales de enfermería sobre los riesgos para la hipertensión a partir de las diversas demandas de su trabajo diario. Su relevancia se legitima tanto el punto de vista clínico, social, y la gestión de personas en el mundo profesional de la enfermería, para las reflexiones acerca de la posible prevención de esta enfermedad y / o complicaciones del mismo. Lo mismo se hizo en una unidad de cuidados coronarios (UCC) de Cuiabá-MT, que la recolección de datos ocurrió a través de entrevistas semi-estructuradas realizadas con catorce (14) enfermeras, y el análisis de los datos se realizó basado en el método análisis temático. Creemos que la HSA tiene aspectos visibles, sin embargo, predominan los invisibles cuando se considera la percepción y la actitud de cada profesional a pesar de los riesgos que pueden enfrentar el rostro de esta posibilidad potencial de convertirse en hipertensos. La invisibilidad de las cosas que se hace visible cuando nos permitimos ir más allá de la apariencia, y se sumergió en los significados que impregnan nuestra existencia, como parte de este mundo dinámico que construir a partir de nuestras percepciones y significados que se le atribuyen. Es notable en este mundo de significados y sentidos que se construye la salud en cada ser. La invisibilidad de la hipertensión es evidente por el significado que da a la hipertensión misma, por lo tanto, cambiar las actitudes y estilos de vida, el profesional de la salud deben tratar de entender y darse cuenta de esta invisibilidad en la aplicación de la atención en la educación primaria, secundaria y terciaria acciones de salud.
Palabras clave: Enfermería, hipertensión; factores de riesgo.
1 – INTRODUÇÃO
As Doenças Cardiovasculares (DCV) são hoje uma das maiores causas de morbidade e mortalidade no mundo ocidental, considerada uma patologia multifatorial, sendo também conhecidas como doenças crônicas não transmissíveis, representando à primeira causa de morte no Brasil. Apesar da tendência de redução dos riscos de mortalidade por DCV no País e no mundo, algumas projeções indicam o aumento de sua importância relativa em países de baixa e média renda (ISHITANI et al., 2006; RENNER, 2008).
Um dos principais fatores de risco para complicações cardiovasculares é a Hipertensão Arterial (explicitando) 40% das mortes por acidente vascular cerebral (AVC) e 25% daquelas por doença arterial coronariana (DAC), pois a Hipertensão Arterial atua diretamente na parede das artérias, podendo produzir lesões, na qual é responsável por alta freqüência de internações (BRASIL, 2002).
Conforme a VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial, são considerados hipertensos os adultos maiores de 18 anos cuja aferição da pressão arterial sistólica (PAS) atinge valores iguais ou superiores a 140 mmHg, e/ou cuja pressão arterial diastólica (PAD) seja igual ou maior que 90 mmHg, em pelo menos três ocasiões por medidas repetidas.
A Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) apresenta custos médicos e socioeconômicos elevados, decorrentes principalmente das suas complicações, caracterizando-se como um dos fatores de risco de maior magnitude e esta condição responde por grande parte da morbidade e da mortalidade cardiovasculares, sendo responsável pelo desenvolvimento da doença arterial coronariana (DAC) acidente vascular encefálico (AVE), insuficiência cardíaca (IC), insuficiência renal (IR) e doença arterial periférica (DAP), sendo considerado um problema de saúde pública por sua magnitude, risco e dificuldades no seu controle (BRANDÃO et al., 2003; MOLINA et al., 2003).
É importante ressaltar que a HAS representa grave problema de saúde no País com elevada prevalência entre a população adulta e idosa, atingindo cerca de 20% da população adulta e 60% a 80% dos idosos, sendo que a maioria dos casos desconhece-se a sua causa. Vários são os fatores que podem estar associados à elevação da pressão arterial como o sedentarismo, o estresse, o tabagismo, o envelhecimento, a história familiar, a raça, o gênero, o peso e os fatores dietéticos (MOLINA et al., 2003; SILVA & SOUZA, 2004; GAZONI et al., 2009).
Em pesquisa publicada pelo Ministério da Saúde, apontou que a proporção de brasileiros diagnosticados com Hipertensão Arterial aumentou nos últimos cinco anos, passando de 21,6%, em 2006, para 23,3%, em 2010, na qual a doença atinge mais de 50% das pessoas com 55 anos ou mais e alcançando 8% dos adultos entre 18 e 24 anos de idade. Em Cuiabá a pesquisa acima citada, aponta que o município possui 22% de hipertensos, sendo que da população pesquisada com 18 anos ou mais, 24,6% das mulheres foram diagnosticadas com hipertensão, enquanto que o índice entre os homens chega a 19,2%, dados estes que fazem parte da Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (BRASIL – MS, 2011).
Contextualizando a Hipertensão Arterial Sistêmica ao mundo produtivo social, esta se caracteriza como uma das principais causas de aposentadoria precoce por doença e tendo a conseqüente perda de anos de vida produtiva é a terceira causa de invalidez temporária, principalmente quando associada ao Diabetes Mellitus é também um dos principais motivos de absenteísmo ao trabalho (OLIVEIRA, 2008).
As demandas de atividades no cotidiano profissional da Enfermagem se revestem de caráter emocional e sobrecarga física, fenômenos estes que colocam os profissionais expostos a alguns fatores de riscos relacionados à hipertensão arterial. Nesta perspectiva, nos questionamos: Quais seriam os fatores de riscos objetivos e subjetivos para Hipertensão Arterial no cotidiano profissional da Enfermagem? Os profissionais conseguem perceber sua exposição a tais fatores de risco no exercício de suas atividades?
A partir destes dados elencados, sentimos a necessidade de desenvolver este estudo, na qual teve por objetivo Compreender a percepção dos profissionais de Enfermagem quanto aos riscos para hipertensão arterial sistêmica a partir das diversas demandas do seu cotidiano de trabalho em um Hospital no Município de Cuiabá-MT.
Frente a estes pressupostos supracitados, consideramos este estudo de importante relevância do ponto de vista clínico, social tanto para a Gestão de pessoas no universo profissional da Enfermagem, quanto para a sociedade em geral por possibilitar reflexões a cerca da prevenção da hipertensão e/ou das complicações advindas desta, possibilitando maior conhecimento sobre acerca da hipertensão entre profissionais de enfermagem, ao fato de haver poucos estudos sobre esta temática.
2 – MÉTODO
Foi realizado um estudo descritivo, de abordagem qualitativa. A escolha por esta abordagem está diretamente relacionada ao objeto de estudo, pois a abordagem qualitativa responde a realidades subjetivas, se aplicando ao estudo das relações, representações, crenças, percepções e das opiniões, produtos das interpretações que os humanos fazem a respeito de como vivem, constroem seus artefatos e a si mesmos, sentem e pensam (MINAYO, 2008).
O estudo foi realizado em um Hospital Privado, localizado no Município de Cuiabá- MT, em uma Unidade Coronariana (UCO) do referido lócus de estudo. Os sujeitos do estudo foram compostos por profissionais de enfermagem (enfermeiros, técnicos e/ou auxiliares de enfermagem), que trabalhavam na Unidade Coronariana (UCO) do Hospital estudado.
A participação dos sujeitos foi legitimada após a aceitabilidade e assinatura do Termo de Consentimento Livre-Esclarecido (Apêndice-I), o qual foi apresentado e explicado quanto aos objetivos da pesquisa, o sigilo da identificação dos participantes e o direito destes em sair da pesquisa no momento em que achar conveniente, sem que isso lhes cause danos morais ou materiais.
Os critérios de inclusão foram de Profissionais de Enfermagem (enfermeiros, técnicos e/ou auxiliares de enfermagem) que trabalhavam na Unidade Coronariana (UCO) do referido Hospital lócus do estudo, que estiveram de serviço durante o período da coleta e que aceitaram participar do estudo, independente de serem portadores de diagnóstico médico de Hipertensão Arterial Sistêmica. Já os de critérios de exclusão foram Profissionais de Enfermagem que não estavam lotados na UCO lócus do estudo, estivessem de férias ou de atestado médico; profissionais de outras categorias profissionais e aqueles que não aceitaram participar da pesquisa.
Os dados foram coletados por meio de entrevista semi-estruturada (Apêndice-II). Esta modalidade permite que o entrevistado tenha a possibilidade de discorrer sobre o assunto sem se prender à indagação formulada, visando apreender aspectos relacionados à invisibilidade (subjetividade) dos sujeitos quanto à temática em questão (MINAYO, 2008).
Conjuntamente a este método de coleta, realizamos técnicas objetivas caracterizadas por elementos do exame físico voltado para área cardiovascular, ou seja, aferição da pressão arterial, peso e altura dos sujeitos, para assim, contemplar os aspectos objetivos do estudo. O início da Coleta dos dados se deu somente após aprovação no Comitê de ética em Pesquisa (CEP).
As informações foram organizadas de acordo com a técnica de análise temática sistematizada por Minayo. Para a autora a análise temática comporta um feixe de relações podendo ser apresentada através de uma palavra, uma frase, um resumo e se divide em três etapas: pré-análise momento em que os pesquisadores realizam a leitura flutuante do material para a retomada das hipóteses e dos objetivos iniciais da pesquisa; exploração do material onde se opera a classificação em busca do tema/núcleo de compreensão dos dados e interpretação que consiste em colocar em relevo as informações obtidas (MINAYO, 2008).
A análise foi realizada com base no referencial teórico construído sobre o tema e demais autores que puderam contribuir para aprofundar a discussão dos dados. O projeto de Pesquisa foi encaminhado para o Comitê de Ética em Pesquisa em atendimento a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde que regulamenta a pesquisa envolvendo seres humanos 12. O projeto foi aprovado em 14 de Setembro de 2011 sob Protocolo de Nº061/CEP-HUJM/2011(em anexo).
3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1 – DESVELANDO A HIPERTENSÃO
3.1.1 – Aspectos Objetivos – caracterização dos sujeitos
Fizeram parte do estudo quatorze profissionais de enfermagem, sendo que cinco eram enfermeiros (dois do sexo masculino e três do sexo feminino) e nove técnicos de enfermagem (seis do sexo feminino e três do sexo masculino) que trabalhavam na Unidade Coronariana (UCO) em um Hospital Privado de Cuiabá – MT.
Com relação à idade e raça dos sujeitos da pesquisa os dados obtidos foram: a idade variou entre vinte e cinqüenta anos, sendo que a maioria se encontrava entre vinte e quarenta anos. Em relação à raça houve o predomino dos profissionais que disseram ser da raça branca.
Segundo Pessuto e Carvalho (1998) ao associar idade e sexo à Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS), esta ocorre com maior freqüência no sexo masculino, entretanto, devido às mudanças de hábitos das mulheres, essa freqüência tem diminuído e a HAS aumenta linearmente com a idade, sendo que os homens jovens têm pressão arterial mais elevada que as mulheres, porém após a meia idade esse quadro se inverte.
No que tange à raça verifica-se que os negros têm maiores níveis pressóricos, quando comparados entre si e com outras raças (BRANDÃO et al., 2003; CONVERSO & LEOCÁDIO, 2005).
De maneira geral, na aferição da pressão arterial se verificou que apenas três profissionais apresentaram alteração da pressão arterial, sendo dois do sexo feminino, e destas, uma delas relatou já ser portadora do diagnóstico médico de HAS. Quanto à raça, dois são negros com faixa etária entre trinta e um e quarenta anos, e um da raça branca com vinte sete anos e os outros onze se encontravam com níveis de PA considerados normais segundo os critérios adotados conforme a classificação da VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão (2010).
Em relação ao Índice de Massa Corporal (IMC), verificamos que seis profissionais foram classificados como obesos e outros seis estavam sobrepesos, bem como um com baixo peso e outro com adequado peso, seguindo os critérios adotados conforme a classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS, 1995).
Identificamos que apesar da maioria dos profissionais não apresentarem alteração na Pressão Arterial Sistêmica, grande parcela dos mesmos se encontravam com o peso alterado, o que os classifica como expostos a um dos fatores de risco, a obesidade.
É importante ressaltar que a obesidade está associada frequentemente ao sedentarismo, tornando-se assim um importante fator de risco para a Hipertensão Arterial e para doenças cardiovasculares. Assim como, o excesso de peso também se associa com maior prevalência de HAS desde idades jovens. Neste sentido, na vida adulta, mesmo entre indivíduos fisicamente ativos, incremento de 2,4 kg/m2 no índice de massa corporal (IMC) acarreta maior risco de desenvolver hipertensão arterial (OLIVEIRA, 2008; VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial, 2010).
3.1.2 – Aspectos Subjetivos – sentidos e significados atribuídos pelos sujeitos
Com relação à percepção dos sujeitos em relação aos fatores que poderiam levar alguém a se tornar portador de Hipertensão Arterial, verificamos que os profissionais de enfermagem, souberam apontar os principais fatores que poderiam levar ao indivíduo a se tornar hipertenso.
[…] a maioria das pessoas que já tem hipertensão é porque é hereditário, de família ou depois acaba adquirindo, pelo ritmo de vida né, você é só trabalha não faz exercício físico, alimentação péssima (E1).
Sedentarismo, é comidas com muito sódio, é bebida alcoólica, obesidade (E9).
A princípio é a obesidade né, a alimentação, falta de exercício físico, isso ai todos os brasileiros, todos nós temos consciência, principalmente a má alimentação (E10).
Obesidade, tabagismo, sedentarismo é uma má alimentação, estresse, são as coisas principais que podem estar levando a adquirir hipertensão (E13).
Os fatores de riscos para a Hipertensão Arterial podem ser classificados em modificáveis e não modificáveis. Os não modificáveis compreendem a idade, o sexo, a raça e a história familiar e os modificáveis são a ingesta excessiva de sal, gordura, uso de bebida alcoólica, tabagismo, estresse e sedentarismo (BRASIL, 2002; VI DIRETRIZ DE HIPERTENSÃO, 2010).
Em relação à percepção dos profissionais de enfermagem quantos aos riscos para hipertensão arterial a partir das diversas demandas do cotidiano de trabalho (relatos apresentados abaixo), podemos inferir que o estresse, foi o fator com maior significado referido pelos sujeitos no mundo do trabalho da enfermagem, como um contribuinte para o surgimento e/ou agravamento para a Hipertensão Arterial.
Porque é muito estressante né, aqui mexe com vida, isso vai se estressando às vezes faz aumentar a pressão por estresse (E1).
Porque é estressante, muita pressão do médico, do enfermeiro, é do enfermeiro chefe né do setor, da família, do paciente é estressante […] (E7).
[…] um setor estressante, setor que envolve muita perca de vida, muita emergência, urgência, então é um setor que trabalha muito com a mente com o psicológico dos profissionais, todos que estão aqui dentro estão dentro de uma câmara né de vida, qualquer momento, é percepção errada a gente pode tar perdendo vida aqui dentro então é um estresse momentâneo (E13).
É atividade prolongada de trabalho, também falta de descanso, é jornada de trabalho prolongada, porque você tem que descansar de um trabalho pra outro, também isso gera muito estresse né, que é modifica nosso sistema (E14).
O estresse está relacionado à enfermagem principalmente pelo fato de trabalhar com pessoas doentes em sofrimento físico e psíquico, o que requer grande demanda de atenção, compreensão e empatia, na qual o trabalho na enfermagem, por si só, constitui-se em fonte de estresse decorrente do sofrimento dos pacientes, principalmente dentro de uma Unidade de Terapia Intensiva, onde os mesmos necessitam de cuidados diretos e intensivos e estão sujeitos a mudanças súbitas no estado geral. O profissional de enfermagem lida ainda com situações desgastantes, críticas, além de acontecimentos inesperados, porém raramente recebe adequada atenção necessária para evitar acidentes e as doenças decorrentes de atividades estafantes (PRETO, 2008).
Desta maneira verificamos que os profissionais de enfermagem lotados na Unidade Coronariana (UCO) lócus desse estudo, estão mais expostos a situações de estresse, em conseqüência de lidarem diariamente com pessoas em situações de risco/ estado crítico, demandando maior atenção e cuidados, o que ocasiona nos profissionais vivências emocionais diversa, podendo estas contribuir para o desenvolvimento ou agravamento de doenças cardiovasculares, dentre estas, a HAS.
Nessa perspectiva, é comprovado que o sistema cardiovascular participa ativamente das adaptações ao estresse, estando sujeito às influências neuro-humorais nas quais as respostas cardiovasculares resultam principalmente em um aumento da freqüência cardíaca, da contratilidade, débito cardíaco e da pressão arterial (LOURES et al., 2002).
Dos sujeitos participantes desse estudo, a maioria não tinha diagnóstico médico de HAS, apenas três relataram ter e fazerem uso do tratamento medicamentoso como a única forma para o tratamento da Hipertensão, porém disseram que não faziam adesão ao uso dos medicamentos diariamente.
[…] a pressão altera devido à dor que sinto enxaqueca crônica assim a pressão altera e tenho que fazer uso da medicação, mas não são todos os dias só quando a pressão está alterada (E2).
Sim, eu já consultei com cardiologista, fiz exames tudo e tomo medicação para controlar.
Não eu só tomo medicação assim, quando eu vejo que eu tou ruim assim, que eu vou ao médico, mais é muito difícil não faço nenhum, nenhum (E8).
Sim eu faço uso somente medicamento, a eu acho um pouquinho sacrificante mais tem que usar né às vezes eu num acompanho, não às vezes é eu paro um dia e ai eu retorno de novo, mais e muito ruim né é muito ruim (E10).
É importante discorrer que controle da Hipertensão Arterial Sistêmica está diretamente relacionado ao grau de adesão do paciente ao regime terapêutico, sendo que o conhecimento e as crenças que os hipertensos têm sobre a doença constituem importantes antecedentes da “Adesão ao tratamento anti-hipertensivo”, sendo fundamental nesse processo a identificação da percepção que os pacientes têm acerca da doença (ARAÚJO & GARCIA, 2006).
É importante destacar que a não adesão ao tratamento de forma contínua, não é um fenômeno presente apenas entre pessoas leigas, pois nessa pesquisa verificamos que profissionais da saúde portadores de HAS, também podem não aderir satisfatoriamente ao tratamento medicamentoso. O que nos chamou atenção, que estes possuem conhecimentos que os tornariam seguidores incontestáveis da terapêutica medicamentosa ou não orientada pelos seus colegas da área da saúde. Portanto, a adesão ou não a terapêutica de controle da HAS pode está relacionada aos significados e sentidos que o hipertenso atribui à doença e seu tratamento.
3.2. VULNERÁVEIS À HIPERTENSÃO
3.2.1 – Tornar-se Hipertenso – visibilidade dos fatores determinantes para hipertensão arterial
Desvelando aspectos de vulnerabilidade à HAS a partir dos sujeitos dessa pesquisa, identificamos nos relatos (abaixo apresentados) que os mesmos em sua maioria se encontram vulneráveis, por referirem sedentarismo, caracterizado pela não realização de atividades físicas regulares e uso de bebida alcoólica rotineiramente.
No momento não realizo, mais pretendo realizar atividade física (E7).
[…] nenhum tipo de atividade física eu faço, eu sou obesa e eu não faço nenhum porque eu já sou obesa entendeu (E8).
Faço uso de bebida alcoólica quando saio e bastante, não sei a quantidade assim de ingestão, hum, caipirinha, cerveja e uísque (E2).
Faço uso de bebida é aos finais de semana, todo final de semana, cerveja somente. Inclusive a minha cardiologista me orientou de espécie nenhuma, só que assim eu sou teimosa, uma quantidade assim um pouco exagerada, né em minha opinião pra mim […] (E8).
O consumo de bebida alcoólica torna o indivíduo vulnerável às doenças cardiovasculares, pois está comprovada em diversos estudos científicos que, o uso de bebidas alcoólicas em excesso, além de comprometer o sistema cardiovascular, pode causar outras doenças como a cirrose hepática, gastrite, úlceras gástricas entre outras, na qual a ingestão de álcool por períodos prolongados de tempo pode aumentar a pressão arterial e a mortalidade cardiovascular em geral (OLIVEIRA, 2008; VI DIRETRIZES DE HIPERTENSÃO, 2010).
O sedentarismo é outro fator que torna o ser humano vulnerável a HAS, pois com a prática de exercício físico correto e bem orientado, o individuo pode ter sua PA controlada, cuja ausência desses exercícios associada à má alimentação pode contribuir para o surgimento da obesidade, a qual também torna a pessoa vulnerável para doenças cardiovasculares (MORILLO et al., 2006; OLIVEIRA, 2008).
A alimentação inadequada, ingestão de alimentos com muito sal e o tipo de gordura utilizado para preparar os alimentos, contribuem sobremaneira para tornar o sujeito vulnerável a HAS. Nessa pesquisa evidenciamos que dentre os profissionais de enfermagem estudados houve a predominância de ingestão inadequada de alimentos.
Ah, toda hora eu quero comer, mais assim eu tou me corrigindo bastante, pra tentar vê se eu consigo pelo menos em três em três horas (E5).
Assim, eu tomo café da manhã, almoço e geralmente eu não janto, mas como muito alimentos inadequados, mas também nesses intervalos também consumo outras coisas também, gosto muito de doces, salgados (E11).
Alimento umas dez vezes ao dia, doce é chocolate, nas refeições importantes eu sigo a média, toma o café da manhã, almoço, carne, arroz e feijão, verduras e na janta também, mas nesse intervalo eu como bastante doce (E12).
Depende, no hospital me alimento duas só e quando estou em casa alimento quatro cinco vezes diária. Hum á pão, né café da manha né com pão, fruta só um pouco mais comida né pão, arroz, feijão, comida normal mesmo brasileira (E13).
Quanto à ingestão excessiva de sal e gordura, evidencia-se que o alto consumo de sal, atualmente, é utilizado como preditor de doenças cardiovasculares. A população brasileira apresenta um padrão alimentar rico em sal, açúcar e gorduras e que uma alimentação mais pobre em frutas e hortaliças, baseada em alimentos industrializados, mais rica em gordura e sal, parece ser preditora de agravos à saúde, particularmente associada aos níveis pressóricos (MOLINA et al., 2003; VI DIRETRIZES DE HIPERTENSÃO, 2010).
3.2.2 Hipertensão e Família – uma relação preponderante e complicações orgânicas.
Um dos fatores envolvidos na fisiopatogênese da hipertensão arterial, na qual um terço deles pode ser atribuído a fatores genéticos, ou seja, determinantes familiares, sobre o qual se pode citar, por exemplo, o sistema regulador da pressão arterial e sensibilidade ao sal (BARRETO-FILHO & KRIEGER 2003). Na busca de identificar a relação entre fatores genéticos / familiares e os riscos para se tornar portador de HAS, verificamos que de todos os relatos obtidos dos sujeitos da pesquisa, apenas um relatou não ter conhecimento de casos de HAS entre seus familiares, os demais possuíam pelo menos um familiar portador. Destes familiares portadores de HAS, a principal complicação relacionada à Hipertensão apontada foi o Acidente Vascular Encefálico (AVE), conforme as falas abaixo:
Minha avó e meu pai e minha irmã tem hipertensão (E2).
[…] tem minha mãe tem, meu pai tem hipertensão, tanto é que meu pai teve um AVE, é devido dá pressão, tenho uma irmã que também tem pressão alta[…] (E4)
Então meu pai teve AVE, o meu pai foi devido à pressão alta, já foi a óbito, foi tanto pela pressão alta (E5).
Sim a minha mãe a minha mãe tem hipertensão arterial, ela teve um AVE no inicio de 2006 ai teve as seqüelas e depois de alguns anos ela continuou fazendo tratamento de fisioterapia né é e por um determinado tempo ela sofreu outro AVE até vir óbito (E10).
Meu avô sim teve AVE, porque ele não cuidava da pressão alta, há ele era alcoólatra e tomava remédio junto com o álcool (E12).
É importante discorrer que maior parte dos indivíduos com hipertensão arterial é assintomáticos, por isso é chamada de doença silenciosa ou doença muda e surda. Apesar da ausência de sintomas, níveis elevados da pressão arterial estão relacionados a uma maior incidência de eventos mórbidos manifestados por cardiopatia isquêmica, acidente cérebro-vascular e doença vascular renal e periférica (MASCARNHENHA & SOUZA, 2006).
4 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
Consideramos a partir deste estudo, a necessidade de elaboração estratégias efetivas que contribuam para o despertar da consciência dos profissionais de enfermagem quanto ao auto-cuidado, mudanças em seu estilo de vida e ações voltadas para a qualidade da própria vida. Sabemos que o cotidiano desta categoria profissional é marcado pela corrida em busca de uma sobrevivência melhor, marcada por vários empregos em conseqüência dos baixos salários, o que os torna vulneráveis a vários agravos a saúde por não conseguirem pensar e cuidar de si mesmos frente às demandas impostas pela precarização do trabalho na saúde.
Uma vida repleta de trabalho sem um momento e/ou espaço para um lazer, traz inúmeros danos a saúde não só física, como mental e como aponta esta pesquisa, as maiorias dos sujeitos tinham conhecimentos quanto aos fatores determinantes da hipertensão e como preveni-los. E então por que não se previnem? Sendo mais grave a não adesão ao tratamento por aqueles que já são hipertensos mesmo sabendo da importância do mesmo.
Não precisamos ir muito longe para obtermos respostas a essas indagações, elas estão visíveis e palpáveis nos diversos ambientes de trabalho na área da saúde, marcados pelo estresse entre os profissionais da Enfermagem, conseqüências da ausência de qualidade de vida no trabalho e busca constante por melhores rendimentos familiares, levando a trabalhar em vários lugares. Esse ritmo de vida comum a maioria dos profissionais da Enfermagem contribuem sobremaneira para o surgimento e agravamento dos fatores de risco para várias doenças e agravos à saúde, de modo específico, para a hipertensão arterial.
Nesta perspectiva, recomendamos aos cursos de graduação em Enfermagem que abordem na formação dos enfermeiros disciplinas voltadas para saúde do trabalhador e qualidade de vida no trabalho, e que a integração ensino-serviço realmente aconteça no sentido da saúde ocupacional com vistas a prevenir surgimento de doenças não só ocupacionais, mas, sobretudo cardiovasculares entre os profissionais.
E que os serviços de educação permanente e continuada de Enfermagem consigam através de parcerias com as universidades, implementar ações mobilizadoras que motivem os colaboradores da área da enfermagem (enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem) a se auto cuidarem através de mudanças nos seus estilos de vida e percepção do ambiente de trabalho, pois os conflitos interpessoais nos ambientes de trabalho também tem sido apontados como agravantes nas crises ou surgimento de hipertensão arterial sistêmica (HAS).
Este estudo não conclui toda a realidade inerente ao fenômeno investigado, até porque a existência humana é marcada e modificada pela visão de mundo do ser que é projeção desse mesmo mundo, observador que se insere nele como processo ativo, pois o mundo é o que pensamos e enxergamos dele, e sendo a saúde parte desse mundo, a construção da mesma vai variar de realidade e percepção de cada sujeito que a vivencia e como a percebe em sua existência factual. Portanto, novas pesquisas quanto a esta temática se fazem necessárias, para que o ser, sentir, perceber e agir no âmbito da saúde sejam desvelados entre os profissionais de Enfermagem, que muitas vezes apenas abstraem teorias sem conseguir transformá-las em prática na sua própria vida enquanto seres humanos, que são frágeis e vulneráveis com os demais.
A invisibilidade da hipertensão arterial é perceptível a partir do significado que o hipertenso dá a mesma, daí se muda as atitudes e estilos de vida, devendo o profissional da saúde buscar compreender e perceber esta invisibilidade ao implementar o cuidado nos níveis primários, secundário e terciário das ações em saúde.
5 – REFERÊNCIAS
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1Graduação em Enfermagem pela Universidade Federal de Mato Grosso. E-mail: weltonmari@hotmail.com
2Professor da Universidade Federal de Mato Grosso e Doutorado em Educação pela Universidade Federal de Mato Grosso. E-mail: neudsonjm@hotmail.com