VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA: UMA PRÁTICA VIOLADORA DOS DIREITOS HUMANOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7292923


Jacqueline Fonseca Arrais Mendes1
Prof. Me. Rosyvania Araújo Mendes.2


RESUMO

O presente artigo tem como objetivo analisar a violência obstétrica e sua incidência no Brasil, contrapondo-se aos direitos fundamentais da mulher consagrados na Constituição Federal de 1988 e na legislação infraconstitucional, frente aos atos atentatórios à integridade física e psíquica da mulher. A violência institucional obstétrica é uma forma de violência praticada em gestantes em unidades de saúde durante o ciclo gravídico puerperal, sendo um sério problema de saúde pública nas últimas décadas. A violência obstétrica é violência contra a mulher e atinge preceitos constitucionais, como o direito à integridade pessoal, liberdade pessoal e a proteção à honra e à dignidade da pessoa humana, sendo espécie de violência de gênero que é pouco discutida no Brasil, mas que está ganhando uma certa visibilidade por ser tão frequentemente praticada. Trata-se de um estudo qualitativo de cunho bibliográfico baseado em textos e artigos jurídicos, e traz em um tempo uma abordagem histórica da institucionalização do parto, destacando a evolução dos Direitos Fundamentais da Mulher após o 1988.
Na mesma linha , estabelece o estatuto e o tratamento jurídico da violência obstétrica e, ao final , propõe políticas públicas contra a violência obstétrica.

Palavras-chave: Violência. Obstétrica. Direitos. Constituição. Mulher.

ABSTRACT

This article aims to analyze obstetric violence and its incidence in Brazil, in opposition to the fundamental rights of women enshrined in the Federal Constitution of 1988 and in the infra-constitutional legislation, in the face of acts that threaten the physical and psychological integrity of women. Obstetric institutional violence is a form of violence practiced on pregnant women in health units during the pregnancy-puerperal cycle, being a serious public health problem in recent decades. Obstetric violence is violence against women and affects constitutional precepts, such as the right to personal integrity, personal freedom and the protection of the honor and dignity of the human person, being a type of gender violence that is little discussed in Brazil, but which is gaining a certain visibility for being so frequently practiced. This is a qualitative study of a bibliographic nature based on texts and legal articles, and brings a historical approach to the institutionalization of childbirth, highlighting the evolution of the Fundamental Rights of Women after 1988. In the same line, it establishes the statute and the legal treatment of obstetric violence and, at the end, proposes public policies against obstetric violence.

Keywords: Violence; Obstetrics; Rights; Constituion; Women.

1 INTRODUÇÃO

A violência obstétrica é cometida exclusivamente contra a mulher durante o período estacionar, no parto e no pós-parto, podendo ser exteriorizada de varias formas, as quais aso: verbal, física, moral, emocional, psicológica,ou sexual. É o uso de intervenções e procedimentos desnecessários e/ou sem evidências científicas. Xingamentos, humilhação, comentários desconsiderar, a proibição de uma acompanhante de escolha da gestante, a realização de toques em excesso e por mais de uma pessoa, entre outros. Isso afeta negativamente a qualidade de vida das mulheres, ocasionando abalos emocionais, traumas, depressão, dificuldades na vida sexual, entre outros. Alem do desrespeito a sua integridade física, mental, emocional, sua autonomia e ferindo sua dignidade, a qual esta acessugara na Constituição Federal, no inciso III do artigo 1º da carta Magna.

Infelizmente, o tema violência obstétrica não é muito discutido no Brasil, apesar de ter uma relevância social e jurídica muito grande, e com a carência dessa informação, muitas mulheres desconhecem essa violência e com isso se tornam mais suscetíveis a tal violência. E com isso, existe até mesmo uma carência normativa, não existe uma lei própria e efetiva para punir esses atos praticados por pessoas que deveriam assegurar que todas as mulheres tenham direito a um pré natal, parto e pós-parto humanizado.

BREVE HISTÓRICO SOBRE O PARTO

No passado, tradicionalmente os partos eram realizados por mulheres, as chamadas parteiras, as quais tinham experiencial na área e realizavam os partos nas casas das gestantes, além de acompanham durante a gestação e no pós parto e auxiliavam as mulheres em todos os aspetos relacionados.

Os médicos só eram chamados para intervir se houvessem graves complicações, que pudessem resultar em complicações para mãe ou para o bebe. Ainda, nessa época, a protagonista do parto era a mulher, ela detinha a liberdade para conduzir seu parto. Então, com o desenvolvimento da medicina, o parto tornou-se uma de suas atribuições, começando a ser realizada em salas de centro cirúrgicos e passando a só poder ser realizada por profissionais treinados e com conhecimento na área.

Uma vez que a violência obstétrica começa em todo o mundo, em 1950, por exemplo, uma revista chamada “Ladies Home Journal”, dos Estados Unidos, publicou um artigo intitulado “Crueldade nas maternidades” em que relatava casos tortura das mães durante o parto, que eram submetidas a uma combinação de drogas conhecida como “sono crepuscular”, onde eles combinam morfina com escopo lamina, que produz um efeito sedativo muito forte nas mães, faz com que ela sofra de agitação motora e alucinações. apesar disso, profissionais encarregados do parto, algemam a mulher, restringem seus pés para que ela não caia da cama, mas isso leva a o corpo é muitas vezes ferido e machucado. Como se isso não bastasse, eles relataram o uso quando a mulher está inconsciente, o fórceps é usado para acelerar o trabalho de parto.

Em 1958, aconteceu um movimento no Reino Unido, quando foi implementado uma Sociedade para Prevenção da Crueldade contra as Grávidas, muitas feministas reuniram-se e elaboraram textos expressando o seu descontentamento com os partos que as mulheres estavam vivendo, contribuindo assim para a formação de um racional diferenciado que pensasse e se importasse com as parturientes.

No Brasil, no final da década de 1980 já havia uma certa preocupação e com isso tentavam criar políticas de saúde. Um exemplo disso é o Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM), este identificava o tratamento banal e muitas vezes agressivo da atenção à saúde das gestantes e puérperas. A qual foi usado como base para a criação da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher – PNAISM foi elaborada em 2004. No entanto, ainda que o assunto estivesse em foco, ele foi relativamente negligenciado.

Como o assunto teve grande destaque, muitos estudos foram aparecendo e retratavam as discriminações e as ofensas desumanas que as mulheres sofriam durante seu parto, tanto nas instituições públicas e nas privadas. Com isso, muitas pesquisas foram sendo feitas e aprofundadas a partir de dados reais, ganhando a atenção até da grande media. No Brasil, os maiores níveis são as cesarianas, que ultrapassam limites razoáveis e aumentam a cada ano. Do total de procedimentos realizados no país, 55% são cesáreas, segundo dados do próprio Ministério da Saúde. Nos hospitais particulares, a taxa é maior, podendo chegar a 84%. Segundo a OMS, apenas 15% dos nascimentos podem ser pelo meio operatório, porém as mulheres continuam a serem submetidas a esse procedimento de grande risco sem que haja necessidade, os riscos de que venha a ocorrer uma hemorragia ou infeções na cesárea são rotineiros, além de que a recuperação é muito pior e bem mais dolorosa. Para os bebês, os problemas respiratórios, diabetes e aumento da pressão sanguínea, também podem ocorrer.

“As cesarianas são absolutamente essenciais para salvar vidas em situações em que partos vaginais representam riscos, portanto, todos os sistemas de saúde devem garantir o acesso oportuno para todas as mulheres quando necessário” “Mas nem todas as cesáreas feitas no momento são necessárias por motivos médicos. Procedimentos cirúrgicos desnecessários podem ser prejudiciais tanto para a mulher quanto para seu bebê.” (Ian Askew, diretor do Departamento de Saúde Sexual e Reprodutiva e Pesquisa da OMS e do programa conjunto da ONU, HRP.)

  1. REFERENCIAL TEORICO

2.3 VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA

O parto e o nascimento de um filho são eventos importantes na vida de todas as mulheres e, portanto, devem ser lembrados como um momento único e especial tanto para a mãe quanto para seus familiares. Mas, infelizmente, em tempos de dor, violência e experiências extremamente traumáticas, isso é frequentemente lembrado por mulheres que se sentiram psicologicamente ou fisicamente abusadas por aqueles que deveriam ter lhe dado todo apoio e ajuda possível. Essa violência é através de humilhações, gritos e agressões por equipes de parto em unidades de saúde públicas ou privadas, o que torna a mulher e seu corpo impotentes. A violência obstétrica é uma prática que coloca em questão os direitos garantidos pela Constituição Federal, os direitos humanos, os sexuais e reprodutivos das mulheres, o que caracteriza uma forte violência física, psicológica, emocional, sexual que vem se tornando cada vez mais comum e frequente nos serviços de saúde. A mulher deve ser protagonista de sua própria história e não deve ser limitada nas escolhas de seu corpo e liberdade de parto, o direito à saúde adequada e humana garantida pelo Estado, com especialistas capacitados e dedicados à fisiologia do parto, gravidez, parto e amamentação.

A Organização Mundial da Saúde (OMS, 2002) definiu violência como sendo qualquer ação que decorra do uso de força física ou privilégio de poder, ainda que apenas sob a forma de ameaça, contra si mesmo ou outras pessoas, que possa resultar em lesão, óbito, abalo psíquico, dificuldade de desenvolvimento ou limitação.

Uso intencional da força ou poder em uma forma de ameaça ou efetivamente, contra si mesmo, outra pessoa ou grupo ou comunidade, que ocasiona ou tem grandes probabilidades de ocasionar lesão, morte, dano psíquico, alterações do desenvolvimento ou privações. (OMS, 2002)

Á terminologia “violência obstétrica”, essa surgiu na Venezuela, país pioneiro, na América Latina, no tratamento dessa forma de violência. (PALHARINI, 2017)

3. FORMAS DE VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA

Como já salientado no tópico anterior, ela pode se dar de forma verbal, física, moral, emocional, psicológica, ou sexual. Podem ser evidentes ou não, deixando consequências físicas ou até mesmo psicológicas. Pode se dar durante o pré-natal, parto e pós-parto.

[…] violência cometida contra a mulher grávida, e sua família em serviços de saúde durante a assistência ao pré-natal, parto, pós-parto, cesárea e abortamento. Pode ser verbal, física, psicológica ou mesmo sexual e se expressa de diversas maneiras explícitas ou veladas. Como outras formas de violência contra a mulher, a violência obstétrica é fortemente condicionada por preconceitos de gênero. (PARTO DO PRINCÍPIO, 2014, p. 11).

3.1 VERBAL

A violência obstétrica verbal é um comportamento agressivo caracterizado por palavras nocivas destinadas a mulher durante seu período gravídico, com intenção de zombar, humilhar, manipular e/ou ameaçar. Assim como a violência física, esse tipo de agressão tem um impacto significativo na vítima e causa danos emocionais cruéis e irreparáveis. A violência obstétrica verbal anda de mãos dadas com o com a violência psicológica, uma vez que a violência psicológica é uma consequência da violência verbal.

3.2 FÍSICA

Por sua vez, a violência de caráter físico é toda atividade que afete o corpo da mulher que perturbem, causem dor ou lesão física (leve à grave) sem recomendação baseada em evidências científicas. Entre os exemplos de violência física estão os procedimentos evasivos, como manobra de Kristeller, impedir a movimentação da mulher, o uso de ocitocina rotineiramente e as cesárias eletiva que acontece sem a indicação clínica.

3.3 PSICOLÓGICA

A violência psicológica é caracterizada por qualquer ato verbal ou comportamental que cause à mulher sentimentos de inferioridade, vulnerabilidade, rejeição, instabilidade emocional, medo, intimidação, insegurança, intimidação, traição, alienação, perda de integridade, dignidade e prestígio. Exemplos: ameaças, mentiras, provocações, piadas, simpatia, grosseria, chantagem, insultos, omissão de informações, informações em linguagem incompreensível, desrespeito às normas culturais ou desrespeito.

3.6 SEXUAL

Entre muitas outras preocupações e incertezas em relação ao parto, ao bebê e as transformações que surgirão em suas vidas, as mulheres gestantes ainda precisam ter outros medos, entre todos os outros já mencionados no presente artigo, a violência sexual/ abuso sexual se tornou um grande medo das mulheres. Em um ambiente que deveria ser de cuidado e segurança, em um local onde o único sentimento deveria ser felicidades e comemorações de uma nova vida nascer, ficou também o espaço para o medo e incerteza se será bem cuidada.

A violência sexual é toda ação contra a mulher que violem sua intimidade ou pudor e afetem sua integridade sexual e reprodutiva, que tenha acesso ou não aos seus órgãos genitais e partes íntimas do corpo. Recentemente veio a publico o caso do anestesista que sedava a mulher durante o trabalho de parto e com isso introduzia suas partes intimas na boca da gestante em trabalho de parto. E com isso, mais um medo para as gestantes ao entrar na sala de parto.

3.7 NAO PERMITIR A PERMANENCIA DO ACOMPANHANTE

Na maternidade, estas mulheres experimentam sentimentos distintos e, por vezes, até contraditórios, como: a felicidade pela chegada do bebê e o medo de morrer; o desejo de cuidar do filho, mas também o de ser cuidada pela equipe; a confiança no hospital como o lugar mais seguro para se ter um filho, e a desconfiança de que se é maltratada impunemente nas maternidades públicas. (AGUIAR e D’OLIVEIRA, 2011)

Desde 1985 é uma recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) que as mulheres tenham um companheiro durante o parto. Benefícios relacionados a ter a presença do acompanhante incluem o tempo de trabalho de parto reduzido, sentimento de confiança, controle e comunicação, menores necessidade de medicação ou analgesia, menor necessidade de parto operatório ou instrumental, menores taxas de dor, pânico e exaustão, aumento dos índices de amamentação, melhor formação de vínculos mãe-bebê, maior satisfação da mulher, menos relatos de cansaço durante e após o parto. Em caso o nascimento seja por uma cesárea, os benefícios da presença do acompanhante incluem: diminuição do sentimento de ansiedade, diminuição do sentimento de solidão, diminuição do sentimento de preocupação com o estado de saúde do bebê, maior sentimento de prazer, auxílio na primeira mamada, maior duração do aleitamento materno. Ou seja, são vários os benefícios para a mãe e para o bebê, já que os sentimentos da mãe influenciam no bebê.

A privação do direito ao acompanhante durante a cesárea e após a cirurgia é tão recorrente em nosso país que pesquisas denominam a recuperação anestésica como o período de ficar “largada no cantinho” (SALGADO, 2012; LINO, 2010).

Nas instituições privadas, é bastante comum a elaboração de protocolos que segundo eles são melhores que a legislação vigente. Alguns órgãos governamentais ou órgãos filiados ao SUS alegam desconhecimento dos dispositivos, ou atribuem ao setor privado o direito a ter um acompanhante de sua escolha como uma espécie de “privilégio”. E com essa atitude, acabam infringindo os dispositivos da Lei Federal 11.108/05 que garante o direito ao acompanhante no pré-parto, parto e pós-parto imediato.

A negligência da livre escolha do parceiro da mulher antes do parto, parto e imediatamente após o parto se da de varias maneiras, que vão desde quando existe restrição da escolha da mulher, Exemplos: “só pode entrar se for uma mulher”, “só pode entrar se for o pai”, “só pode entrar se for da família”, “só pode entrar se for profissional da área médica” ou quando houve restrição do tempo de permanência do acompanhante. Exemplos: “só pode entrar no pré-parto”, “só pode entrar no momento do parto”, “só pode ficar durante o pós-parto”, “só pode ficar durante o horário de visitas”;

O direito a ter um acompanhante durante todas as etapas da gravidez ao pos parto é assegurado a gestante com a LEI Nº 11.108, DE 7 DE ABRIL DE 2005.

Art. 19-J. Os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde – SUA, da rede própria ou convencionada, ficam obrigados a permitir a presença, junto à parturiente, de 1 (um) acompanhante durante todo o período de trabalho de parto, parto e pós-parto imediato. § 1º O acompanhante de que trata o capuz deste artigo será indicado pela parturiente. LEI Na 11.108, DE 7 DE ABRIL DE 2005.

3.8 PROCEDIMENTOS EVASIVOS E DESNECESSÁRIOS

3.8.1 EPISTOLARIA

A epistolaria é uma pequena incisão cirúrgica feita na área entre a vagina e o ânus, ou peritonite, que pode ser feita no final do segundo estágio do trabalho de parto. O objetivo é alargar a abertura da vagina quando a cabeça do bebe começar a descer, o que facilita a saída do bebe e evita possíveis lesões graves no peritonite. Embora essa técnica tenha sido utilizada em quase todos os partos normais para evitar o rompimento da pele durante o parto, segundo a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia e OMS, a primeira opção é sempre não fazer a epistolaria, pois não há evidências científicas para a indicação desse procedimento.

O médico pode recomendar uma epistolaria, e a mulher deve concordar com o procedimento e assinar um termo de consentimento livre e esclarecido para um parto normal, no qual ela é informada de que uma epistolaria às vezes pode ser necessária e de possíveis complicações. No Brasil, a epistolaria é o único procedimento cirúrgico que é realizado sem o consentimento do paciente e sem ser informado sobre sua necessidade (indicações), riscos, possíveis benefícios e seus efeitos colaterais. A mulher também não é informada sobre opções alternativas de tratamento. Assim, a epistolaria contraria os preceitos da medicina baseada em evidências.

São muitos os possíveis efeitos colaterais, as principais complicações são: Lesões nos músculos da região íntima; Hemorragia ou sangramento no local do corte; Dor ou inchaço na cicatriz; Lesão na uretra ou incontinência urinária; Infecção no local do corte; Aumento do tempo de recuperação do pós-parto; Fístula reto vaginais; Lesão no esfíncter ou na mucosa anal; Incontinência fecal; Dor crônica; Prolapso de órgãos pélvicos.

3.8.2 MANOBRA DE STELLERITA

A manobra de Stellerita é uma técnica destinada a acelerar o parto, durante a qual é aplicada uma pressão externa ao útero da mulher com o objetivo de encurtar o período de ejeção. Apesar de esta técnica ser amplamente utilizada, não há evidências de sua utilidade e pode até colocar em risco tanto a mulher quanto a criança. Quando desenvolvido sem base científica, esse movimento era feito com as duas mãos, empurrando o abdômen da mulher em direção à pelve. Agora temos vários estudos mostrando as sérias complicações da prática desse procedimento, e ainda assim a manobra é frequentemente realizada com uma pessoa subindo no estômago da mulher ou pressionando o estômago com o peso do corpo com as mãos, braço, antebraço ou joelho.

Os riscos da manobra de Kristeller existem porque não há consenso quanto à sua prática e ao nível de força utilizado. Embora seja recomendado movimentar com as duas mãos, há relatos de profissionais movimentando as mãos, cotovelos e joelhos, aumentando assim a chance de complicações. Alguns dos riscos associados à manobra de Kristeller para uma mulher são: A possibilidade de fratura de costela; Aumento do risco de sangramento; Lágrimas graves no peritônio, que é a área que sustenta os órgãos pélvicos; placentas deslocadas; Dor abdominal após o parto; Ruptura de certos órgãos como baço, fígado e útero.

4. CONSTITUIÇÃO FEDERAL E OS DIREITOS HUMANOS

A constituição de 1988 foi um marco na conquista dos direitos das mulheres, com sua expressa igualdade de direitos e deveres entre homens e mulheres que até então, era inexistente no ordenamento jurídico brasileiro. A Constituição recebeu o movimento feminista, e com isso, as mulheres tiverão participação marcante ao apresentar um conjunto de reivindicações, bem como ao lutar pela inclusão dos direitos humanos para as mulheres.

A Constituição Federal de 1988 alterou drasticamente o cenário jurídico brasileiro ao trazer considerações hábeis a romper estigmas, especialmente no que tange à equidade de género e a proteção aos direitos da mulher. Nisso, vê-se o avanço da Constituição em desmistificar o legado discriminatório em relação à mulher, impulsionado, fundamentalmente, pela mobilização do movimento feminino (PIOVESAN, 2008, p. 142-146)

4.1 A VIOLAÇÃO DAS GARANTIAS FUNDAMENTAIS

O principio da dignidade da pessoa humana, expresso no inciso III do Art. 1º da constituição de 1988, asseguram às mulheres a garantia de que sejam tratadas de forma saudável e segura, livre de intervenções semelhantes à tortura e tratamento degradante. Nesse sentido o inciso III do art. O artigo 5º da constituição Federal dispõe que “Ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”, pois o direito à integridade física, psíquica e moral, que estão definido no art. 5º da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

A Constituição Federal de 1988 considera o direito à vida e à saúde como sendo princípio da dignidade da pessoa humana, que constitui um dos fundamento primordial do Estado. Dessa forma sendo, o direito à saúde é uma cláusula pétrea, pois está diretamente ligado ao direito à vida.

O nascimento deveria ser um momento permeado por cuidados, respeito, satisfação e segurança, tanto para mãe quanto para o feto, por representar o início de uma nova vida e toda a vida tem valor. Em nenhum tipo de atendimento na área de saúde as pessoas esperam ser humilhadas, no entanto, o parto é um momento de dor, de fragilidade e incapacidade da mulher de proteger-se de abusos diversos e, assim, há uma maior vulnerabilidade para a prática de ações que se configuram como violência obstétrica (PERERA et al, 2018, p. 2).

4.2A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

A Declaração Universal dos Direitos Humanos – DUDH foi promulgada em 1948 e ocorreram Convenções Internacionais com foco nos direitos humanos foram desenvolvidas, todas dando ênfase à dignidade e aos direitos humanos, que não podem ser reduzidos em função do sexo (BRASIL, 2005, p. 6).

A declaração de 1948 definiu os direitos reprodutivos como integrantes do rol de direitos humanos básicos, além de inserir esse ideal em leis internacionais de proteção aos seres humanos. No entanto, o que ocorre é que debates sobre questões sexuais costumam ser mantidos dentro das esferas da vida privada e, assim, ganham pouca valorização no âmbito público, onde deveriam ser amplamente debatidos para que a questão dos direitos sexuais e reprodutivos fossem conhecidos de modo mais abrangente (VENTURA, 2004, p. 21).

A partir da Declaração de 1948, começa a desenvolver o Direito Internacional dos Direitos Humanos, mediante adoção de inúmeros instrumentos internacionais de proteção. A Declaração de 1948 confere lastro axiológico e unidade valorativa a este campo do Direito, com ênfase na universalidade, indivisibilidade e interdependência dos direitos humanos. O processo de universalização dos direitos humanos permitiu a formação de um sistema internacional de proteção destes direitos. Este sistema é integrado por tratados internacionais de proteção que refletem, sobretudo, a consciência ética contemporânea compartilhada pelos Estados, na medida em que invocam o consenso internacional acerca de temas centrais aos direitos humanos, na busca da salvaguarda de parâmetros protetivos mínimos – do “mínimo ético irredutível” (PIOVESAN, 2010, p. 52-53).

Assim como os direitos humanos foram desenvolvidos e disseminados no mundo no perpassar dos anos, a percepção de que esses direitos englobam as mulheres na mesma proporção foi consolidada em um processo histórico e ainda nos dias atuais demanda de esforços para que siga se fortalecendo, tornando-se uma norma de convívio social, o respeito à mulher e aos seus direitos (PIOVESAN, 2012, p. 70-71).

A violência obstétrica atinge os direitos humanos e fundamentais assegurados às mulheres, ignorando que os direitos sexuais e reprodutivos não apenas foram reconhecidos e validados tanto na esfera internacional quanto nacional. As condutas adotadas antes, durante e depois do parto ou em casos de aborto precisam ser alteradas para se enquadrarem dentro de práticas humanizadas e de garantia de mães e filhos (SILVA et al, 2013, p. 1).

6. A OMISSÃO DE NORMA ESPECIFICA E A POSSIBILIDADE DE CRIAÇÃO DA MESMA

Infelizmente, ainda não temos uma legislação especifica federal que trata a respeito da violência obstétrica no Brasil, trazendo um tipo penal incriminador para cada ato lesivo decorrente da violência obstétrica, seja ele físico, verbal, sexual ou psicológico. No entanto, existe algumas normas estaduais, como a lei nº 17.097, de 17 de janeiro de 2017, do estado de Santa Catarina que foi uma das primeiras leis a dispor acerca de medidas de proteção a gestante e parturiente contra a violência obstétrica e a lei 23.175/18 do Estado de Minas Gerais que foi criada com base no projeto de lei 4.677/17 da deputada Geisa Teixeira, dispondo ainda acerca da garantia de atendimento humanizado no parto e sobre a violência assistida na obstetrícia, frisa-se a importância de criar uma norma especifica, mas não só com o intuito de trazer informações e orientar as mulheres, mas sim de penalizar na esfera penal esses profissionais. 

Tendo em vista que esse tipo de violência, infringe a autonomia da mulher, ainda há uma dificuldade em configurar um eventual crime, nos casos principalmente de uma violência psicológica, que poderá causar traumas que podem levar a uma depressão pós- parto, crises de stress pós-traumáticos, pesadelos, rejeição ao próprio corpo, medo de ter relações sexuais, os quais os relatos não conseguem ser elucidados com base nos dispositivos legais que dispõe a legislação brasileira, ou seja, não conseguimos trazer ainda uma punição a determinados tipos de conduta na obstetrícia. Com respaldo nesse aspeto, deve sim ser criado uma norma especifica para sanar essas dificuldades, possibilitando não só uma recriminação, mas sim uma prevenção para que a essa pratica ano aconteça ato rotineiramente. 

6.1 PROJETO DE LEI Na 2082 DE 2022

Atualmente, existe um projeto de lei que tramita no Senado onde torna crime a violência obstétrica e estabelece procedimentos para a prevenção da prática no Sistema Único de Saúde (SUS). O PL 2.082/2022, da senadora Leila Barros (PDT-DF), prevê pena de detenção que pode variar de três meses a um ano. Mas caso a vítima tenha idade inferior a 18 anos ou superior a 40 anos, faixas etárias em que o trauma físico e psicológico pode vir a ser maior para a mulher, a punição passará a ser agravada, podendo chegar a dois anos de prisão.

O texto do projeto de lei também faz alterações no Código Penal (Decreto-Lei 2.848, de 1940) para definir violência obstétrica como “qualquer conduta que seja direcionada à mulher durante o trabalho de parto, parto ou puerpério, praticada sem consentimento, desrespeitando sua autonomia ou feita em desacordo com procedimentos estabelecidos pelo Ministério da Saúde e que lhe cause dor, dano ou sofrimento desnecessário”.

A proposta adiciona à Lei do SUS (Lei 8.080, de 1990) a determinação para que o sistema realize ações e campanhas para combater a prática. 

4 CONCLUSÃO

Pouco é comentado e debatido sobre a violência obstétrica, não é ampara pelas leia brasileiras ainda. Diariamente vemos debates, leis e campanhas ativas sobre outras formas de violência contra a mulher, exemplo disso, a violência doméstica, amparada no ordenamento jurídico brasileiro pela lei maria da penha, que inclusive a própria sociedade tem o conhecimento sobre tal devido as campanhas de conscientização dos direitos das mulheres.

Já a violência obstétrica, que também possui o seu valor, a fim de que seja protegida, reconhecida a sua existência e que haja a punibilidade de quem a pratica. O seu desconhecimento começa pelas vítimas, que por desconhecerem as formas de violência obstétrica, acabam aceitando certos procedimentos e falas como se fosse normal.

Público alvo desta pesquisa são as mulheres, mais especificamente as que se encontram em estado de gravidez. Mas frisando que a importância do conhecimento sobre tais atos não devem ser exclusiva das mulheres, e sim da sociedade em geral, principalmente os profissionais de saúde.

A importância da discussão desse tema, demonstra que essa violência existe, e carrega com sigo o impacto de deixar sequelas irreversíveis como qualquer outra. Dessa forma, é necessário que o tema tenha maior visibilidade, para que ele se torne objeto de ações públicas voltadas ao combate contra a violência obstétrica institucional, garantindo os direitos e garantias fundamentais das mulheres, há muito tempo no espaço público. saúde e instituições privadas.

Além disso, é preciso ressaltar a importância da divulgação de informações, para que a mulher possa, dessa forma, independentemente do melhor procedimento para ela e para o bebê, contribuindo para a redução da violência obstétrica e da violência contra a mulher. É de suma importância frisar que o tema a ser explanado nesse trabalho poderá trazer conhecimento a muitas mulheres sobre mais uma forma de violência que elas possam ocasionalmente sofrer em algum momento de suas vidas, mais especificamente na gravidez e que nem sabem que existe.

REFERÊNCIAS

Sites de internet:

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VENTURA, Mirian. Direitos reprodutivos no Brasil. Fundo de População das Nações Unidas – UNFPA. 2004. Disponível em: < http://www.unfpa.org.br/Arquivos/direitos_reprodutivos.pdf Acesso em: 29. Out. 2022.

REFERÊNCIAS LEGISLATIVAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Organização do texto: Juarez de Oliveira. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1990. 168 p. (Série Legislação Brasileira).

Leis e Decretos

BRASIL. Lei n. 11.108, de 7 de abril de 2005. Dispoe sobre o direito ao acompanhamento durante o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato. Lex: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11108.htm

BRASIL. Lei Estadual nº 5.217/2018. dispõe sobre a implantação de medidas de informação e de proteção à gestante e à parturiente contra a violência obstétrica no Estado de Mato Grosso do Sul, e dá outras providências. Lex. http://www.naosecale.ms.gov.br/legislacao-estadual-leis/

BRASIL. Lei Estadual n. 11.450 de 20 de abril de 2021. Dispõe sobre a obrigação do medico da rede publica e privada a informar os direitos ao acompanhadeira durante o parto. Lex. https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=413230


1 Acadêmica do 10º período do curso de direito da Faculdade de Imperatriz – FACIMP.

2 Orientadora