REFERENCE FLOW FOR WATER USE RIGHTS GRANTING IN THE RIO NEGRO
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.12190689
Jéssica Almeida Cabral da Cunha¹; Andréia Vieira Lima²; Wallison do Nascimento dos Santos³; Yasmin dos Santos Neves4; Joecila Santos da Silva5.
Resumo
Os temas relacionados aos recursos hídricos podem ser analisados sob diversas perspectivas, incluindo estudos que comprovam que a água passou a ser dotada de valor econômico devido às suas múltiplas utilizações para fins humanos. Este bem natural, sendo não renovável e de disponibilidade finita, demanda uma gestão cuidadosa. Uma forma de avaliar a disponibilidade hídrica entre os usuários é por meio da análise da vazão de referência em um corpo d’água específico. O presente artigo tem como objetivo reunir dados sobre vazões mínimas, máximas e a vazão de referência da sub-bacia do Rio Negro, utilizando informações da Estação Fluviométrica Serrinha, nos períodos de cheias e vazantes do rio. Os registros utilizados abrangem um intervalo de 30 anos, de 1978 a 2019, e foram empregados para compor o hidrograma das vazões máximas e mínimas e elaborar a curva de permanência. Sob este parâmetro, os valores de vazão variam entre 28.124,52 m³/s em junho e 11.444,56 m³/s em fevereiro. A partir da curva de permanência, que é um recurso importante para fins de outorga, observou-se que a disponibilidade hídrica do Rio Negro se mantém em 7.266,01 m³/s em 95% do tempo. Com base nos resultados obtidos, infere-se que esta sub-bacia possui grande potencial de disponibilidade hídrica.
Palavras-chave: Outorga de Uso. Recurso Hídrico. Vazão.
1 INTRODUÇÃO
A relação existente entre a água e o processo de construção da população amazonense ocorreu de forma interligada e isto é identificado quando se observa que estes povos se desenvolveram as margens de corpos hídricos importantes, como o rio Negro e seus respectivos afluentes. No âmbito atual, são identificadas diversas instalações, sejam comerciais ou de moradias, nos leitos e bordas dos rios, o que reitera a teoria da dinâmica diária entre o homem amazônida e os usos da água. Entretanto, a utilização constante da água para atendimento as necessidades humanas, atrelado ao crescimento populacional, desencadeou problemas ambientais visíveis, tais como uso e ocupação do solo, contaminação de mananciais superficiais, assim como os corpos hídricos subterrâneos. Nelson (2017) afirma que devido estas ocorrências, a utilização da água passou a ser visualizada como um recurso natural finito, não renovável e limitado, sendo dotada de valor econômico.
Devido a tamanha relevância dos recursos hídricos para a manutenção da vida das populações existentes no Amazonas, está sendo elaborado o Plano Estadual de Recursos Hídricos (PERH/AM) que tratará do estabelecimento de critérios de uso das águas do estado partindo das diretrizes dispostas na Lei Federal Nº 9.433/97, popularmente conhecida como Lei das Águas, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos e que prevê como um de seus 06 (seis) instrumentos de gestão a outorga dos direitos de uso da água (Brasil, 1997).
A Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) afirma que a outorga é uma exigência que ocorre para aqueles que fazem uso ou pretendem se beneficiar dos recursos hídricos, seja para captação de águas, superficiais ou subterrâneas, seja para lançamento de efluentes, seja para qualquer ação que interfira no regime hídrico existente, além do uso de potenciais hidrelétricos. Haja vista as frequentes mudanças nos cursos dos rios, houve a necessidade de estabelecer estudos matemáticos e estatísticos que averiguem a informações provenientes das Estações Fluviométricas.
Assim que coletados, os dados geram hidrogramas, no qual tem como produto um gráfico com as vazões médias diárias ao longo de todos os anos, a fim de apresentar os limites das vazões ao longo da série histórica. Ainda, possibilita a geração do gráfico de curva de máximos e mínimos, que insere os dados obtidos em um gráfico temporal os valores das vazões máximas e mínimas anuais durante todo o período em que o rio começou a ser medido e a curva de permanência.
Com base no exposto, neste estudo busca-se gerar a curva de permanência do rio Negro, bem como o hidrograma e a curva de máximos e mínimos, por meio de dados obtidos no banco de dados da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), Portal Hidroweb, a fim de analisar o comportamento do rio ao longo dos anos e estabelecer uma vazão de referência. Desta maneira, dar subsídio a devida gestão dos recursos hídricos no estado do Amazonas.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A gestão dos recursos hídricos é um tema de grande relevância para o desenvolvimento sustentável, especialmente em regiões com vasta rede hidrográfica, como a Bacia Amazônica. A outorga de direitos de uso de recursos hídricos é um instrumento fundamental para garantir a utilização racional e sustentável das águas, assegurando que as necessidades atuais sejam atendidas sem comprometer a disponibilidade futura. A vazão de referência é um parâmetro crucial nesse processo, pois estabelece limites para a retirada de água, assegurando a manutenção dos usos múltiplos e a preservação dos ecossistemas aquáticos.
Destaca-se ainda que os recursos hídricos são essenciais para diversas atividades humanas, incluindo abastecimento urbano, agricultura, indústria e geração de energia. No entanto, a utilização inadequada e excessiva pode levar à degradação dos corpos d’água, comprometendo a qualidade e a quantidade de água disponível. A gestão sustentável dos recursos hídricos busca equilibrar as demandas humanas com a necessidade de conservar os ecossistemas aquáticos (ANA, 2021).
No presente contexto, a outorga de direitos de uso de recursos hídricos é um mecanismo legal que regula a utilização das águas, autorizando, limitando ou condicionando a retirada e o lançamento de efluentes nos corpos d’água. Este instrumento visa controlar o uso quantitativo e qualitativo da água, prevenindo conflitos entre usuários e protegendo o meio ambiente. No Brasil, a outorga é regulamentada pela Lei nº 9.433/1997, conhecida como a Política Nacional de Recursos Hídricos (Brasil, 1997). Ademais, a vazão de referência é o fluxo de água em um corpo hídrico utilizado como base para a concessão de outorgas. Este parâmetro é essencial para garantir que a retirada de água não comprometa os usos múltiplos, como abastecimento humano, diluição de efluentes, navegação e preservação da biodiversidade. Diversos métodos podem ser empregados para definir a vazão de referência, incluindo análises hidrológicas e ecológicas (Tucci, 2009).
No que se refere ao Rio Negro, um dos maiores afluentes do Rio Amazonas, este apresenta características hidrológicas únicas. Com uma vazão média significativa e uma grande variação sazonal, o Rio Negro possui um regime hidrológico que influencia diretamente os ecossistemas aquáticos e as comunidades humanas que dependem de suas águas. A definição de uma vazão de referência adequada é crucial para a gestão sustentável dos recursos hídricos nessa bacia (Junk et al., 2011).
A região do Rio Negro enfrenta desafios particulares na gestão de seus recursos hídricos, como a influência das mudanças climáticas, a pressão das atividades econômicas e a necessidade de preservar as áreas protegidas e as comunidades tradicionais. A definição da vazão de referência deve considerar esses fatores, garantindo que as outorgas de uso de água não prejudiquem a integridade ambiental e os direitos das populações locais (IPCC, 2014).
A análise hidrológica envolve o estudo das séries históricas de vazão, identificando padrões e tendências que possam informar a definição da vazão de referência. Métodos como a análise de frequência, a modelagem hidrológica e a avaliação de cenários futuros são frequentemente utilizados para essa finalidade (Tucci, 2009). Além da análise hidrológica, é fundamental incorporar considerações ecológicas na definição da vazão de referência. Isso inclui a avaliação das necessidades de fluxo para a manutenção dos habitats aquáticos, a proteção das espécies dependentes dos corpos d’água e a garantia dos serviços ecossistêmicos fornecidos pelos rios e suas margens (Poff et al., 1997).
Portanto, a vazão de referência para a outorga de direitos de uso de recursos hídricos é um componente essencial da gestão sustentável das águas, especialmente em regiões de grande importância ecológica e socioeconômica, como o Rio Negro. A aplicação rigorosa de análises hidrológicas e ecológicas pode contribuir significativamente para a sustentabilidade e a resiliência dos sistemas hídricos na Bacia do Rio Negro.
3 MATERIAL E MÉTODOS
Área de Estudo
O presente estudo trata do curso hídrico denominado rio Negro, localizado em sua maior porção na região norte brasileira. De acordo com Zeidemann (2001), desde a nascente (pré-andina colombiana, onde nasce sob o nome de rio Guainía) até a sua foz, o rio Negro percorre cerca de 1.700 quilômetros e é responsável por aproximadamente 15% da contribuição de água recebida pelo oceano Atlântico. De forma específica, o rio Negro drena uma área correspondente a 10% dos sete milhões de quilômetros quadrados da Bacia Amazônica.
Conforme a definição do Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH, 2003), uma região hidrográfica é caracterizada por uma área de terra e mar, composta por uma ou mais bacias hidrográficas contíguas e pelas águas subterrâneas e costeiras que lhe estão associadas. Portanto, a região hidrográfica é uma divisão administrativa, constituindo-se como a unidade principal de planejamento e gestão das águas, sendo base a bacia hidrográfica. Nesse contexto, em 15 de outubro de 2003, o Conselho Nacional de Recursos Hídricos, instituiu através da resolução n° 32 (Publicado no DOU em 17/12/2003), a Divisão Hidrográfica Nacional, em Regiões Hidrográficas, com a finalidade de orientar, fundamentar e implementar o Plano Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) em todo o território brasileiro. Desta forma, o rio Negro enquadrou-se como responsável pela formação da sub-bacia 14, pertencente à Bacia Amazônica, denominada Bacia 1.
No âmbito da região local, ressalta-se que o estado do Amazonas detém a maior parte da bacia hidrográfica do rio Negro (região da sub-bacia 14 brasileira), ademais, no referido estado, observa-se a grande importância da Unidade de Planejamento Hídrico (UPH) do Baixo Negro (Figura 1), responsável por cerca de 54% da demanda hídrica (m³/s) do total do estado (SEMA, 2019).
Figura 1 – Unidades de Planejamento Hídrico no estado do Amazonas.
Dados
A escolha da estação considerou dois critérios principais: proximidade da foz do rio a ser analisado e quantidade de dados de vazão disponíveis pela estação. Desta forma, para o rio Negro, verificaram-se cerca de 27 estações disponíveis na sub-bacia (14). Para a presente análise, foram verificadas as estações mais próximas à foz do curso hídrico e o número de anos de dados de vazões disponíveis, optando-se pela mais representativa para o presente estudo (adotou-se como parâmetro mínimo a série de dados de 30 anos).
Destarte, elencaram-se na Tabela 1, a seguir, as estações fluviométricas disponíveis e mais próximas à foz do rio Negro até a verificação da série de dados representativa a ser adotada. Em relação às demais estações pertencentes à sub-bacia 14, estas foram descartadas tendo em vista a distância elevada em relação à foz do curso hídrico.
Após a supracitada análise, adotou-se, para o desenvolvimento deste trabalho os dados de vazão da estação SERRINHA, cadastrada no banco de dados da ANA sob o código 14420000, obtida a partir do Portal Hidroweb (http://www.snirh.gov.br/hidroweb/publico/medicoes_historicas_abas.jsf), pertencente ao Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos (SNIRH), e que disponibiliza uma gama de dados hidrológicos coletados pela Rede Hidrometeorológica Nacional (RHN).
Tabela 1 – Estações fluviométricas disponíveis – Sub-bacia 14 (Rio Negro).
Estação Fluviométrica | Código | Distância à foz do Rio Negro (km) | Série de dados disponíveis | ||
Início | Fim | Total (anos) | |||
Manaus | 14990004 | 13,5 | Sem dados de vazão disponíveis | ||
Ponta Pelada | 14910900 | 23,2 | |||
Paricatuba | 14910000 | 40,3 | |||
Manacapuru | 14100000 | 41,8 | 1992 | 2020 | 28 |
Estação Intermediária | 14900150 | 42,6 | Sem dados de vazão disponíveis | ||
Rio Cuieiras | 14941000 | 70,1 | |||
Fazenda Recreio | 14235200 | 100,1 | |||
Novo Airão | 14900050 | 127,5 | |||
Rio Negro | 14901000 | 128,4 | |||
Anamã | 14050000 | 161,4 | |||
Baruri | 14880000 | 180,4 | |||
Seringalzinho | 14876000 | 241,5 | |||
Moura | 14840000 | 266,5 | |||
Umanapana | 14855000 | 316,9 | |||
Santa Maria do Boiaçu | 14790000 | 359,1 | |||
Barcelos | 14480000 | 416,1 | |||
Samauma | 14452000 | 416,8 | |||
Vila Conceição – montante | 14428000 | 585,9 | 2000 | 2019 | 19 |
Posto Ajuricaba | 14440000 | 590,2 | 1982 | 2020 | 38 |
Missão Catrimani | 14750000 | 596,7 | Sem dados de vazão disponíveis | ||
Serrinha | 14420000 | 629,6 | 1977 | 2020 | 43 |
Mucajaí | 14690000 | 630,1 | 1995 | 2019 | 24 |
Açariquara | 14422000 | 631,4 | Sem dados de vazão disponíveis | ||
Bacuri | 14421000 | 657,6 | |||
Posto Funai | 14650000 | 830,7 | |||
Curicuriari | 14330000 | 847,2 | |||
São Gabriel da Cachoeira | 14320000 | 879,9 |
A estação Serrinha dispôs de uma série de dados iniciada em 1977 e com a última coleta obtida em janeiro de 2020, não atualizada para o corrente ano, tendo em vista o fato de força maior do atual cenário mundial, ocasionado pela pandêmica da Covid-19.
Apesar da série dispor de 43 anos de dados contínuos, descartaram-se os anos onde ocorreram falhas ou onde verificaram-se dados incompletos, tais como 2020 e 1977. Apresenta-se, portanto, na Figura 2, a localização da estação fluviométrica adotada no presente estudo (Serrinha – 14420000).
Métodos
A partir dos dados de vazão disponíveis da estação escolhida, procedeu-se com elaboração de três ferramentas gráficas: a curva de permanência, o hidrograma e o gráfico de máximas e mínimas. Para o desenvolvimento destas foi utilizado o software Excel, desenvolvido pela Microsoft, como apoio na organização dos dados e geração das curvas.
Figura 1 – Localização da estação fluviométrica Serrinha – 14420000.
Hidrograma
Este gráfico foi obtido a partir da ordenação, no Excel, dos dados de vazão de forma que cada coluna representasse um ano e cada linha dessa coluna, um dia. Sendo assim, uma matriz de 366 linhas (considerando o dia 29/fev para anos bissextos) e Na (42) colunas foi formada. De cada linha foi retirado seu valor médio, representando, assim, a vazão média daquele dia considerando todos os anos registrados, conforme equação 1.
O gráfico foi elaborado colocando no eixo das abscissas os dias equivalentes ao período de um ano inteiro, do dia 01/jan ao dia 31/dez, porém, no eixo das ordenadas foram distribuídas as vazões médias diárias considerando todos os anos.
Máximas e Mínimas
Utilizando-se da mesma organização dos dados para o hidrograma, realizou-se a obtenção dos valores máximos e mínimos, entretanto, feita a partir dos dados de cada ano, separadamente; nestes, extraíram-se os valores máximos e mínimos anuais e, para fins de otimização do potencial de análise, foram inseridas as linhas representativas da média de cada grupo (média das máximas e média das mínimas), conforme equações 2 e 3.
Curva de Permanência
A elaboração desta curva ordenou-se as vazões de forma crescente, e atribuiu-se, a cada vazão, uma discriminação correspondente à sua posição na sequência, sendo 1 para a menor vazão registrada e para a maior vazão do conjunto. Sendo assim, calculou-se a frequência acumulada de cada vazão segundo as equações 4 e 6.
Finalmente, partiu-se para a determinação da permanência das vazões, conforme equação 8.
4 RESULTADOS E DISCUSSÕES
Para o período da série de dados analisada (1978 a 2019), conforme hidrograma das vazões médias diárias, da estação de Serrinha, (Figura 3), observam-se dois períodos hidrológicos bem definidos ao longo do ano, denotando claramente as características sazonais do rio Negro.
De acordo com Souza Pinto (1976), na seção do curso de água, onde se está registrando a vazão, verifica-se que após o início da precipitação, decorrido certo intervalo de tempo, o nível da água começa a elevar-se. A vazão cresce desde o instante correspondente ao ponto início do ponto de mínima até o instante correspondente ao ponto de máxima do respectivo gráfico. Desta forma, no período de fevereiro, observa-se o início da ascensão do Hidrograma, ou do escoamento superficial direto, findado a partir do mês de outubro, onde inicia-se o escoamento de base, conforme a definição de Tucci (1993).
A inundação desenvolve-se sobre vários meses e permanece em sua superfície máxima durante algumas semanas, dando origem a um hidrograma multimodal assimétrico, com ascensão acelerada e recessão lenta, resultante do regime equatorial alterado (Rodier, 1964 e Molinier et al., 1997), sendo quantro meses de cheias e oito de vazantes. As cheias ocorrem entre os meses de marco a junho, onde a vazão média máxima é 28.124,52 m³/s, em junho. O período de estiagem estende-se durante os meses de julho a fevereiro, quando a vazão média mínima é de 11.444,56 m³/s, no mês de fevereiro, apresentando um ou mais picos de magnitude inferior à máxima.
Figura 2 – Hidrograma de vazões médias diárias do Rio Negro – Estação Fluviométrica de Serrinha 14420000.
A figura 4 representa a amplitude dos eventos de máximas e mínimas anuais, observadas ao longo da série histórica estudada na estação de Serrinha (14420000). Na dispersão superior de tonalidade escura, apresentam-se os valores de vazões máximas e abaixo desta, os valores de mínimas em m³/s por ano. As linhas tracejadas de parâmetros de média superior e inferior, representam respectivamente, as vazões médias das máximas e das mínimas.
A vazão máxima histórica de 37.100,77 m³/s, ocorreu em 2002 e a mínima dentre as vazões máximas, do mesmo período histórico, tem o registro de 24.327,15 m³/s, em 1978. A média das vazões máximas equivale a 31.009,99 m³/s. A mínima histórica apresentada na série temporal é de 1.410,31 m³/s, em 1980 e a máxima dentre as vazões mínimas é de 10.596,04 m³/s. A média das vazões mínimas corresponde a 6.496,60 m³/s. A amplitude entre a vazão máxima e mínima, na série histórica, de 35.690,46 m³/s, mostra quão extremo é o regime de cheias e vazantes do rio Negro.
Figura 3 – Vazões máximas e mínimas anuais médias do Rio Negro – Estação Fluviométrica de Serrinha 14420000.
Segundo Porto (2012) as vazões dos rios estão sempre associadas a uma certa probabilidade de serem igualadas ou excedidas ou, em outras palavras, a uma permanência no tempo. Estas informações são sintetizadas nas chamadas curvas de permanência ou curvas de duração. Estas curvas constituem o principal fundamento hidrológico para uma série de estudos e decisões a respeito do aproveitamento e gerenciamento de recursos hídricos como, por exemplo, produção de energia em uma usina hidrelétrica, navegação fluvial, enquadramento dos cursos de água segundo suas classes de uso, outorgas de direito de uso de recursos hídricos, licenciamento ambiental e outras. Observa-se na Figura 5, a curva de permanência do rio Negro, elaborada com os dados da estação fluviométrica adotada (Serrinha – 14420000), elencou-se nesta a escala completa de 0 a 100% de permanência das vazões observadas no período da série de dados de 1978 a 2019.
Porto (2012) também descreve que usualmente os órgãos gestores brasileiros não utilizam todas as informações fornecidas pelas curvas permanência e adotam um só valor de vazão como base para seus estudos e decisões. Trata-se da chamada vazão de referência, que na Resolução CONAMA 357 de 17/03/2005 é definida como segue:
“Vazão do corpo hídrico utilizada como base para o processo de gestão, tendo em vista o uso múltiplo das águas e a necessária articulação das instâncias do Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA e do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos – SINGRH”.
A vazão de referência Q95 observada, corresponde a 7.266,01 m³/s. Neste âmbito, salienta-se que o Conselho Estadual de Recursos Hídricos do Amazonas estabelece a vazão outorgável para uso das águas superficiais em 75% da Q95, de acordo com CERH-AM (2016); por conseguinte, no rio Negro, o limite para vazão explorada é de até 5.449,51 m³/s, valor restritivo. Verificou-se ainda, que em 50% do período de permanência da série histórica (Q50), as vazões anuais são iguais ou maiores que 16.428,83 m³/s.
Porto (2012) ainda destaca que, quaisquer que sejam as vazões adotadas, sempre existem probabilidades de falhas. Os riscos associados a estas probabilidades dependem de fatores econômicos, ambientais e sociais e são de difícil quantificação. Os valores adotados no Brasil refletem políticas cautelosas dos órgãos gestores, que procuram prevenir a degradação de nossos recursos. Em algumas regiões, entretanto, os critérios gerais implícitos nas vazões de referência podem não atender ao aproveitamento mais racional e sustentável dos recursos da bacia. Neste caso, medidas adicionais de gestão devem ser adotadas.
Figura 4 – Curva de Permanência do Rio Negro – Estação Fluviométrica de Serrinha 14420000.
5 CONCLUSÃO/CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir das análises dos dados provenientes da estação Serrinha, em um período de 42 anos, por meio das curvas de permanência, curva de máximos e mínimos e do histograma, foi possível caracterizar o regime hidrológico do rio Negro, bem como determinar o potencial hídrico do mesmo. Através da análise gráfica, verificou-se que a vazão de referência adotada pelo CERH-AM para fins de outorga, correspondente a 75% da Q95, equivale a 7.266,01 m³/s, além da verificação do comportamento assimétrico dos períodos de ascensão e recessão das vazões do corpo hídrico estudado. Os valores de vazão destacados variam entre 28.124,52 m³/s em junho e 11.444,56 m³/s, no mês de fevereiro.
Isto posto, os resultados conquistados mostram grande potencial hídrico do rio Negro servindo, então, como suporte para a gestão dos recursos hídricos, tendo em vista que através destes entende-se com maior clareza as características do regime hidrológico desse importante rio.
REFERÊNCIAS
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1Mestre em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos pela Universidade do Estado do Amazonas – ProfÁGUA/UEA, Escola Normal Superior – ENS, Avenida Djalma Batista, 2470, Chapada, CEP 69050-010, Manaus/AM – Brasil: jacc.mgr21@uea.edu.br;
2Mestre em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos pela Universidade do Estado do Amazonas – ProfÁGUA/UEA, Escola Normal Superior – ENS, Avenida Djalma Batista, 2470, Chapada, CEP 69050-010, Manaus/AM – Brasil: avl.mgr21@uea.edu.br.
3Graduado em Engenharia Civil pelo Centro Universitário do Norte; wallison.n.santos@gmail.com.
4Graduada em Engenharia Civil pelo Universidade Federal do Amazonas – UFAM; yasminneves.ufam@gmail.com.
5Doutora em Hidrologia, Hidroquímica, Solos e Meio Ambiente e docente na Universidade do Estado do Amazonas – UEA, Escola Superior de Tecnologia – EST, Avenida Darcy Vargas, 1200, Parque 10, CEP: 69050-020, Manaus/AM, Brasil, jsdsilva@uea.edu.br