USO MEDICINAL DA CANNABIS SATIVA SSP

MEDICINAL USE OF CANNABIS SATIVA SSP.

REGISTRO DOI:10.69849/revistaft/th10249231658


Hermínio Oliveira Medeiros1
João Victor Cordeiro Dias2 


Resumo

Objetivo: Esse trabalho tem como objetivo apresentar uma planta muito conhecida que possui um importante efeito terapêutico, mas que, poucos conhecem. Possui importantes princípios ativos. A Cannabis possui muitos benefícios e malefícios de acordo de como e utilizada. Mostrar também a importância do seu uso em tratamentos de doenças, suas ações farmacológicas e efeitos adversos, e mostrar as propriedades, conhecimentos, espécies e origem dessa planta que pode compor vários medicamentos, para vários tipos de doenças. A Cannabis é popularmente conhecida como maconha e é uma planta que foi descoberta na china, e que hoje é muito utilizada como planta medicinal, ou para uso recreativo, ou seja, usado com muita frequência, e que causa vicio, é uma droga ilícita utilizada em todo o mundo, comparada com outras drogas ela só perde para o álcool e para o cigarro. Existe um grande preconceito com a maconha por ser uma droga de abuso (substância que modifica, aumenta, inibe ou reforça as funções fisiológicas, psicológicas ou imunológicas do organismo de maneira transitória ou permanente). Serão mostrados alguns dos medicamentos já existentes no comércio.

Método: Foram utilizados artigos identificados por meio dos bancos de dados da Scielo, ANVISA, AMA+ME, PubMed, The Green Hub e Google Acadêmico, o estudo foi baseado em uma pesquisa bibliográfica, com dados a partir do ano de 2014.

Resultados: O trabalho busca como resultado desmistificar o preconceito que está em torno da Cannabis, quando a discussões em torno desta planta ela é tratada como algo que só possui malefícios e é deixado seu lado medicinal de lado pela falta de conhecimento que as pessoas tem sobre ela. Já existem medicamentos que estão sendo utilizados no Brasil para tratamentos de crise convulsiva, em pacientes adolescentes e infantis, são medicamentos que vem apresentando resultados satisfatórios sem reações adversas.

Conclusão: A Cannabis é uma planta com muitos fins medicinais, sua gama de efeitos terapêuticos é gigante, tem um grande potencial, e ainda há muita coisa a ser descoberta através dessa planta. Contudo os meios de se conseguir medicamentos à base de Cannabis ainda são bem burocráticos.

Descritores: Cannabis, droga, substâncias, maconha, planta.

Abstract 

Objective: This work aims to present a well-known plant that has an important therapeutic effect, but which few people know about. It has important active ingredients. Cannabis has many benefits, also showing the importance of its use in disease treatments, its pharmacological actions and adverse effects, and showing the properties, knowledge, species and origin of this plant that can compose several medicines, for various types of diseases. Cannabis is popularly known as marijuana and is a plant that was discovered in China, and which today is widely used as a medicinal plant, or for recreational use, that is, used very often, and that causes addiction, it is an illicit drug used. Around the world, compared to other drugs, it is second only to alcohol and cigarettes. There is a great prejudice against marijuana for being a drug of abuse (a substance that modifies, increases, inhibits or reinforces the physiological, psychological or immunological functions of the organism in a transitory or permanent way). Some of the drugs already on the market will be shown.

Method: Articles identified through the databases of Scielo, ANVISA, AMA+ME, PubMed, The Green Hub and Google Scholar were used, the study was based on a literature search, with data from the year 2014.

Results: The work seeks as a result to demystify the prejudice that surrounds Cannabis, when discussions around this plant it is treated as something that only has harmful effects and its medicinal side is left aside due to the lack of knowledge that people have about it. Is it over there. There are already drugs that are being used in Brazil for the treatment of convulsive crises, in adolescent and child patients, they are drugs that have been showing satisfactory results without adverse reactions.

Conclusion: Cannabis is a plant with many medicinal purposes, its range of therapeutic effects is huge, it has great potential, and there is still much to be discovered through this plant. However, the means of obtaining Cannabis-based medicines are still very bureaucratic.

Keywords: Cannabis, drug, substances, marijuana, plant.

1 INTRODUÇÃO

A Cannabis é uma planta de origem asiática, muito cultivada na China e na Índia, pertence à família das Cannabaceae. É nativa da Ásia Central, porém é encontrada em todo o mundo, sendo utilizada para diversos fins, desde a raiz até suas folhas (BARRETO, 2002). Os asiáticos cultivaram Cannabis apenas para consumir as sementes oleosas das plantas e fazer roupas e cordas das fibras da Cannabis (ELSOHLY, 2007). Seu primeiro registro histórico foi a 2737 a.C, seu uso com fins medicinais foi atribuído ao imperador ShenNeng da China, que receitava chá de maconha para o tratamento de gota, reumatismo, malária, e até mesmo para memória fraca. Na Índia há registros do uso da planta a 1000 a. C., usada como hipnótico e ansiolítico, no tratamento de ansiedade, manias e histerias. Já no início do século XX, extratos de Cannabis eram comercializados na Inglaterra, Alemanha e Estados Unidos para o tratamento de desordens mentais, principalmente como hipnóticos e sedativos (MATOS, 2019). Em 1930, houve uma diminuição no uso da Cannabis para fins medicinais, causado pelo pouco conhecimento que existia sobre seus princípios ativos, ainda não isolados na época (ELISALDO, 2006). 

Existe uma gama de problemas que a Cannabis consegue tratar desde dores, mal de Parkinson, insônia, espasmos musculares, epilepsia, ansiedade, autismo, dor neuropática crônica, e outros. É por meio do sistema endocanabinoide (SEC) que os canabinoides encontrados na Cannabis agem em nosso corpo.

O isolamento do canabidiol ocorreu em 1940, porém, apenas em 1963 sua estrutura química foi elucidada pelo professor israelense Raphael Mechoulam que ficou popular como o “pai” da Cannabis medicinal e foi ele quem descobriu o importante sistema endocanabinoide em 1964, que é um sistema de sinalização celular complexo, composto por receptores encontrados em todo o corpo, desde em membranas celulares do cérebro, órgãos, tecidos conjuntivos, glândulas e células do sistema imunológico. Até hoje foram descobertos dois receptores canabinoides o CB1 e o CB2. O CB1 é encontrado no sistema nervoso, tecido conjuntivo, gônadas, glândulas e órgãos. Já os receptores CB2 são encontrados no sistema imunológico e suas estruturas.  Esses receptores reagem aos canabinoides vegetais para tratar inúmeras doenças que sofremos. Todos os seres vivos, exceto os insetos, possuem o sistema endocanabinoide (MECHOULAM, 1963). 

Antes de ir mais afundo sobre a Cannabis devemos saber que é uma planta bastante complexa, e há muito potencial de variação em meio às espécies. A Cannabis engloba três espécies mais conhecidas que são: Cannabis sativa, Cannabis ruderalis e Cannabis indica.

A Cannabis sativa é a mais notória, é uma planta herbácea, e utilizada nas versões cânhamo e maconha, elas se diferem de acordo com seu teor de uma substância psicoativa chamado de THC, geralmente o cânhamo não apresenta mais do que 0,3% de THC por peso seco. Ela é encontrada principalmente em climas quentes e secos, com longos dias de sol, isso incluí África, América Central, Sudeste Asiático e partes ocidentais da Ásia. As plantas sativas são altas e finas, com folhas longas e levam mais tempo para amadurecer. A sativa geralmente apresenta doses baixas de CBD e doses altas de THC. Seu uso é habitualmente associado há: antidepressivos, tratamento de dor crônica, ansiedade e para aumento da serotonina (um neurotransmissor na regulação da aprendizagem, humor, sono, ansiedade e apetite) (DR. CANNABIS, 2019).

A Cannabis ruderalis foi classificada em 1924 por um geobotânico russo chamado Dmitrij Erastovich Janischewsky, que notou diferenças aparentes na sua forma, tamanho e semente em comparação com a sativa, há debates, mas muitos acreditam que a planta se originou no próprio país do pesquisador, onde as temperaturas são extremas e os dias mais longos que as noites, elas crescem rapidamente, o que é ideal para os ambientes frios e com pouca luz solar, elas podem ir de sementes à colheita em pouco mais de um mês, são pequenas e possuem folhas compactas. A ruderalis é uma planta que, no entanto, não é amplamente utilizada, pois geralmente não produz efeitos potentes. A cepa possui pouco THC e quantidades maiores de CBD, mas não são suficientes para produzir algum efeito medicinal (MICHAEL, 2021).

Já a Cannabis indica é uma planta de origem do Afeganistão, Índia, Paquistão e

Turquia, as plantas se adaptaram ao clima severo, seco e turbulento das montanhas Hindu Kush. São plantas curtas e atarracadas (menores e mais volumosas), com vegetação espessa e folhas grossas que crescem largas, elas crescem mais rápido que a Cannabis sativa. Cepas de indica apresentam níveis mais altos de CBD e menos THC. Geralmente são usados para: Relaxamento mental aumentado, relaxamento muscular, diminui náuseas, diminuição da dor aguda, estimula o apetite e aumenta a dopamina (neurotransmissor que ajuda a controlar os centros de recompensa e prazer do cérebro) e no tratamento da epilepsia (DR. CANNABIS, 2019).

É muito comum confundir a maconha com o cânhamo, por serem da mesma família, mas vale lembrar, que além de parecidas, possuem algumas diferenças importantes, além disso, as leis que regulam as duas espécies são bastante distintas ao redor do mundo, visto que os óleos de cânhamo são legais em vários países, enquanto a maconha se mantém ilegal na maior parte do mundo. No Brasil tanto o cânhamo quanto a maconha são ilegais. Mas como distinguir o cânhamo da maconha? Na tabela 1 estão às diferenças das duas plantas:

Tabela 1 – Diferença entre cânhamo e maconha. 

 CânhamoMaconha
Nome CientíficoCannabis sativa ssp. sativa.Cannabis sativa ou Cannabis indica.
Padrões de CrescimentoUma planta alta, parecida com uma pequena arvore.Pode ser alta e fina, ou pequena e espessa.
Teor de CBDGeralmente muito alto (>10% em peso).Pode ser muito alto (> 20%) ou muito baixo (<1%).
Teor de THCMenor que 0,3% por peso seco.Maior que 0,3% por peso seco. Geralmente muito maior (10% a 25%).
UsosTêxtil, papel, biodiesel, sementes de cânhamo e suplementos nutricionais (óleos de CBD).Óleos de maconha e uso como droga recreativa.
Efeitos PsicoativosNenhum efeito psicoativo.Pode ter baixa ou alta psicoatividade.
LegalidadeLegal em todos os Estados Unidos e a maior parte do mundo.Ilegal na maior parte do mundo exceto por meio de programas médicos.

Fonte:  MICHAEL, 2021.

O que difere o cânhamo da maconha e seu teor de THC, quando menor que 0,3% por peso seco ela pode ser considerada cânhamo, quando igual ou maior a planta e considerada como maconha.

A Cannabis contém centenas de substâncias químicas em diferentes categorias, mas possui um grupo de substâncias que é encontrado unicamente nessa espécie, chamados de canabinoides, dentre eles estão: canabidiol (CBD), tetrahidrocanabinol (THC), canabinol (CBN), canabigerol (CBG), ácido tetrahidrocanabinol (THCA), tetrahidrocanabivarin (THCV), canabicromeno (CBC), cannabidivarin (CBDV), esses são oito dentre centenas de canabinoides encontrados na Cannabis (SONIA & MAURO, 2015).

O canabidiol é o principal componente não psicoativo da planta Cannabis sativa, o canabidiol atua no sistema nervoso central, e tem um grande potencial terapêutico para o tratamento de doenças psiquiátricas ou neurodegenerativas, como esclerose múltipla, esquizofrenia, mal de Parkinson, epilepsia refratária ou ansiedade. Estudos indicam melhora significativa contra crises convulsivas, e na maioria dos pacientes analisados houve uma melhora parcial ou total dos sintomas, outro ponto importante é que não houve ocorridos de efeitos tóxicos nos pacientes e seu uso por tempo prolongado não produz tolerância, nem dependência. O canabidiol é uma alternativa promissora, em casos que outros medicamentos não surgiram efeitos positivos no tratamento da epilepsia, sendo que ele pode impedir a ocorrência de danos cerebrais (MEMED, 2022). 

A epilepsia é uma condição médica em que por um determinado período de tempo, há um mau funcionamento do cérebro, causado pela emissão de sinais, descargas ou impulsos elétricos incorretos emitidos pelos neurônios, que são as células que fazem parte do cérebro. Essa condição é reversível e, após alguns períodos, a pessoa volta ao seu estado normal. É uma das doenças mais frequentes e com maior impacto na qualidade de vida, devido suas consequências físicas, cognitivas, psicológicas e sociais. Em uma pesquisa da OMS (Organização Mundial da Saúde) estima-se que a doença atinge cerca de 8 milhões de pessoas na América Latina. Existem dois tipos de epilepsia: a epilepsia parcial e a epilepsia total. Na epilepsia parcial, essa emissão incorreta de sinais fica limitada à apenas uma parte do cérebro, enquanto a epilepsia total afeta todo ele  (MEMED, 2022).

Quando uma pessoa tem epilepsia, ela apresenta crises variadas, que estão relacionadas à extensão das descargas incorretas. Os sintomas se diversificam bastante e tem pessoas que podem ter epilepsia com sintomas bem mais suaves. No geral, essa é uma condição bastante comum, afetando vários indivíduos. Ela também pode afetar crianças, na modalidade de epilepsia infantil. O diagnóstico de epilepsia é feito por meio de exames de imagem que fornecem detalhes do cérebro, como a ressonância magnética, além de testes como o eletroencefalograma. É uma doença caracterizada pela ocorrência de crises, algumas delas convulsivas e recorrentes, a epilepsia tem causas congênitas e pode ser descoberta ainda antes do parto, o indivíduo nasce com uma malformação cerebral que ocasiona o problema ou decorrentes de situações como trauma cerebral, AVC (acidente vascular cerebral), infecções como meningite e encefalite ou uso abusivo de drogas durante a gravidez, embora várias causas congênitas tenham sido descobertas em alguns casos ainda e comum deparar com casos sem razão definida (SONIA & MAURO, 2015).

A epilepsia pode ter várias causas, desde a complicações na hora do parto até outras doenças neurológicas mais complexas, como tumores no cérebro, mas vale lembrar que a epilepsia tem cura, e ela pode ser tratada por meio de uso de medicamentos específicos. A epilepsia refratária é um termo usado quando nem sempre os tratamentos com medicamentos estão controlando as convulsões, e acabam necessitando de medicamentos alternativos, um desses medicamentos alternativos é o uso do canabidiol. O canabidiol é um princípio ativo que dificilmente irá causar efeitos adversos, mas em alguns casos os principais efeitos adversos que o canabidiol pode causar são: sonolência, insônia, dor de cabeça, alteração do apetite, perda de peso, diarreia, irritabilidade e agitação. Esses efeitos são mais comuns no começo do tratamento. Além disso, o canabidiol também pode afetar o fígado, causando alterações em exames como elevação de enzimas hepáticas (MEMED, 2022).

O tetrahidrocanabinol é o principal causador dos efeitos alucinógenos da maconha, mas também é um importante princípio ativo que pode ser utilizado no tratamento de náuseas e vômitos. E um composto da família dos fenóis, pode ser encontrado em planta do gênero Cannabis sativa ou através de síntese em laboratório, ou seja, pode ser produzido em laboratório (ANA, 2019).

O canabinol é utilizado na redução dos efeitos colaterais e sintomas de condições neurológicas, epilepsia e rigidez muscular, também vem ganhando notoriedade pela sua capacidade de induzir o sono (SONIA & MAURO, 2015).

O ácido tetrahidrocanabinol é a forma ácida do THC, ela não causa efeitos psicoativos no individuo, seus benefícios vão desde a redução de inflamação causada por artrite e doenças autoimunes, mas também pode ajudar a reduzir sintomas de doenças neurológicas como doença de Parkinson, além de estimular o apetite em pacientes que sofrem de caquexia e anorexia nervosa (caquexia e a perda de tecido adiposo e musculo ósseo e anorexia nervosa e um distúrbio alimentar que provoca uma visão distorcida de seu próprio corpo) (THE GREEN HUB, 2021). 

O canabigerol está sobe estudos, mas vem ganhando popularidade graças aos seus efeitos antibacterianos, antimicrobianos e anti-inflamatórios, acredita-se que o canabigerol ajude a reduzir a ansiedade e os sintomas de transtorno obsessiva-compulsivo, transtorno de estresse pós-traumático e depressão (THE GREEN HUB, 2021). 

O tetrahidrocanabivarin é um composto da Cannabis bem semelhante ao THC em sua estrutura molecular e até mesmo nos efeitos psicoativos que ela causa na pessoa, mas ela também possui efeitos bem distantes do THC, entre os benefícios que ela pode exercer estão a inibição do apetite, que ao contrário do THC que provoca fome, o THCV pode diminuir a fome. Em algumas pesquisas também foi mostrado um bom resultado no tratamento da diabetes, conseguindo regular o nível de glicose no sangue e reduzindo a resistência à insulina. Também pode ajudar a controlar os ataques de ansiedade em pacientes com TEPT (transtorno de estresse pós-traumático) sem prejudicar o estado emocional. E no tratamento da Alzheimer, auxiliando nos sintomas como tremores, perda da coordenação motora e lesões cerebrais associadas a doença (THE GREEN HUB, 2021).

O canabicromeno é mais um dos canabinoides, não e tão conhecido como o THC e o CBD, porém possui efeitos terapêuticos que nem o THC nem o CBD possuem, é fungicida e

bactericida e possui efeito sedativo hipotensor e anti-inflamatório, novos estudos ainda indicam que é capaz de estimular o processo de neurogênese, ou seja, criação de novos neurônios (THE GREEN HUB, 2021).

O cannabidivarin é um canabinoide semelhante ao canabidiol. Como o canabidiol, o cannabidivarin não é intoxicante, quando usado de forma isolada, ele é encontrado em maior quantidade na Cannabis indica, as cepas que possui maior quantidade de CBD costumam ser abundantes em CBDV. Na maior parte das pesquisas tem se focado no efeito terapêutico que o CBDV tem sobre convulsões (THE GREEN HUB, 2021).

Segundo documento oficial do governo brasileiro (Ministério das relações exteriores, 1959): 

A planta teria sido introduzida em nosso país, a partir de 1949, pelos negros escravos, como alude Pedro Corrêa, e as sementes de cânhamo eram trazidas em bonecas de pano, amarradas nas pontas de tangas” (CARLINI, 2006, p.7). 

Na década de 70 a maconha como hoje é conhecida era chamada de fumo-de-angola, era uma palavra usada pela polícia e pelos hippies. A história da maconha no Brasil tem seu início com a própria descoberta do país. A maconha é uma planta exótica, ou seja, não é natural do Brasil. Daí surgiu sua denominação como fumo-de-angola. O seu uso disseminouse rapidamente entre os negros escravos e nossos índios, que passaram a cultivá-la. Séculos mais tarde, com a popularização da planta entre intelectuais franceses e médicos ingleses do exército imperial na Índia, ela passou a ser considerado em nosso meio um excelente medicamento indicado para muitos males. 

A demonização da maconha no Brasil iniciou-se na década de 1920 e, na II

Conferência Internacional do Ópio, em 1924, em Genebra, o delegado brasileiro Dr.

Pernambuco afirmou para as delegações de 45 outros países: “a maconha é mais perigosa que o ópio”. Apesar das tentativas anteriores, no século XIX e princípios do século XX, a perseguição policial aos usuários de maconha somente se fez constante e enérgica a partir da década de 1930, possivelmente como resultante da decisão da II Conferência Internacional do Ópio. O primeiro levantamento domiciliar brasileiro sobre consumo de psicotrópicos, realizado em 2001, mostrou que 6,7% da população consultada já havia experimentado maconha pelo menos uma vez na vida (lifetime use), o que significa dizer que alguns milhões de brasileiros poderiam ser acusados e condenados à prisão por tal ofensa à presente lei. No presente, um projeto de lei foi aprovado no Congresso Nacional propondo a transformação da pena de reclusão por uso/posse de drogas (inclusive maconha) em medidas administrativas.

(ELISALDO, 2005).

2 MÉTODO

O estudo foi baseado em uma pesquisa bibliográfica do tipo revisão da literatura integrativa. Os artigos utilizados para essa pesquisa foram identificados por meio dos bancos de dados da Scielo (Scientific Electronic Library Online), ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), AMA+ME (Associação Brasileira de Pacientes de Cannabis Medicinal),

PubMed e Google Acadêmico, compostos por revisões e estudos da literatura sobre o uso da

Cannabis na área farmacêutica, o foco da pesquisa foram artigos que abordam o uso da Cannabis na área medicinal, seus principais princípios ativos, seu potencial no tratamento de enfermidades, e seus benefícios e malefícios como medicamento. Este estudo se dá entre os anos de 2014 até os dias de hoje em 2022.

Os descritores utilizados para a pesquisa bibliográfica foram: Cannabis na área farmacêutica, uso terapêutico, medicamento, história da Cannabis, canabinoides, meios de extração, sistema endocanabinoide, resultados e efeitos adversos. Foram utilizados artigos em português (Brasil) e inglês.

A revisão integrativa é uma abordagem que permite a inclusão de diversas metodologias, seja ela experimental ou não experimental, desempenhar um papel maior na prática baseada em evidências para a saúde. A revisão integrativa contribui para a exibição de possibilidades variadas sobre um fenômeno preocupante e que tem tido como importante para a ciência e área da saúde (WHITTEMORE & KNAFL, 2005).

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO 

Para conseguir produtos derivados da Cannabis é necessário um documento emitido pela ANVISA, para que pessoas físicas possam importar, para o tratamento de saúde. É necessário um laudo médico comprovando a necessidade do medicamento. Os critérios estão na RDC n° 660/2020, a autorização vale por dois anos e, durante esse período, os pacientes ou seus representantes legais podem importar o produto autorizado. Para isso, basta apresentar a prescrição médica, indicando a quantidade importada, nos postos da ANVISA (nos aeroportos e áreas de fronteira). Lembrando sempre que a ANVISA não fornece os produtos, apenas autoriza a importação. No site da ANVISA é possível fazer o cadastro para emitir o documento necessário para importação, para isso os documentos necessários são: Formulário para importação e uso de produto derivado de Cannabis; Prescrição médica emitida por profissional legalmente habilitado, contendo obrigatoriamente: Nome do paciente, nome comercial do produto, posologia, data, assinatura, número do registro, e conselho de classe do profissional prescritor. Em média leva 20 dias para a prestação do serviço (BIASI & DESCHAMPS, 2009).

No Brasil a ANVISA criou uma categoria de medicamentos derivados da Cannabis que podem ser comercializados após aprovação da agência. Estes medicamentos estão indicados apenas em ocasiões em que outros tipos de medicamentos não tenham constatados resultados satisfatórios. Seu comércio também só e autorizado a partir da prescrição médica com receituário especial do tipo B (de cor azul), e a dispensação só pode ser feita por um farmacêutico (STEFFANI, 2003).

No Brasil a única empresa que se disponibilizou a fabricar medicamentos à base da Cannabis foi a Prati-Donaduzzi, mas há também interesse da empresa Entourage Phytolab que é um dos precursores na pesquisa e desenvolvimento da Cannabis medicinal no Brasil. No dia 12 de janeiro de 2021 ela fechou uma parceria de longo prazo com a multinacional colombiana Clever Leaves Holdings Inc, que é líder e produtora licenciada de produtos farmacêuticos canabinoides. No dia 18 de janeiro de 2022, a ANVISA publicou a autorização sanitária de mais um produto medicinal a base de Cannabis. Refere-se ao extrato de Cannabis sativa 79,14 mg/ml pelo laboratório Ease Labs. Com tudo já são 11 produtos aprovados pela ANVISA, conforme a RDC 327/2019 que são: Canabidiol Prati-Donaduzzi (20 mg/ml; 50 mg/ml e 200 mg/ml), Canabidiol NuNature (17,18 mg/ml), Canabidiol NuNature (34,36 mg/ml), Canabidiol Farmanguinhos (200 mg/ml), Canabidiol Verdemed (50 mg/ml), Extrato de Cannabis sativa Promediol (200 mg/ml), Extrato de Cannabis sativa Zion Medpharma (200 mg/ml), Canabidiol Verdemed (23,75 mg/ml), Extrato de Cannabis sativa Alafiamed (200 mg/ml), Extrato de Cannabis sativa Greencare (79,14 mg/ml) e Extrato de Cannabis sativa Ease Labs (79,14 mg/ml) (ANVISA, 2022) . O uso da Cannabis medicinal traz benefícios incríveis que outros medicamentos não trazem, porém deve ser sempre acompanhado de um profissional da saúde, pois a exemplo do canabidiol que não traz efeitos adversos, vale lembrar que ele pode intensificar efeitos adversos de outros medicamentos utilizados juntos na interação medicamentosa (BIASI & DESCHAMPS, 2009).

Temos sete meios mais utilizados para a extração dos canabinoides: hidrodestilação, destilação a vapor ou destilação por arraste de água de óleos essenciais, extração de compostos orgânicos por solvente orgânico, extração por gordura fria (enfleurage), maceração, extração por micro-ondas, extração assistida por ultrassom (STEFFANI, 2003).

A hidrodestilação é um método utilizado em vários laboratórios e consiste na utilização do sistema de Clevenger. Aonde se mergulha toda a matéria prima no solvente. A extração é feita em temperatura inferior a 100°C, o que a torna bem lenta, mas evita perda de compostos sensíveis a altas temperaturas, esse método necessita de uma manta aquecedora (BIASI & DESCHAMPS, 2009).

Já na destilação a vapor ou destilação por arraste de água de óleos essenciais, se usa vapor de água em substâncias imiscíveis, tendo em benefício o fato dá mistura entrar em ebulição em temperatura inferior a 100°C, esse método necessita de manta aquecedora e placa de aquecimento (STEFFANI, 2003).

Na extração de compostos orgânicos por solvente orgânico o solvente usado pode variar, por exemplo, pode ser o etanol ou o éter de petróleo, que é indicado para extração de óleos essenciais de flores, geralmente é usado um aparelho chamado extrator de Soxhlet, esse método necessita da manta aquecedora (FILIPPIS, 2001).

Extração por gordura fria, esse procedimento consiste em colocar camadas de flores sobre cera em uma placa de vidro, todo dia é trocado a camada de flores, é um método lento que extrai os componentes aromáticos, em seguida filtrados e destilados em baixa temperatura (PINHEIRO, 2003).

Na maceração utiliza a Cannabis seca em pó, e adiciona o solvente, que pode ser álcool, óleos vegetais e até água em alguns casos, a planta em contato com o solvente vai dissolver e liberar seus princípios ativos (ALVEZ, 2019).

A extração por micro-ondas são três etapas: Separação dos compostos nos sítios ativos, difusão do solvente através da matriz da amostra e pela dissipação dos solutos da matriz da amostra para solvente. Esse processo é bem parecido com a extração por Soxhlet usando temperatura e pressão do equipamento (ZACHOW, 2016).

E temos a técnica mais avançada, a extração assistida por ultrassom que é uma técnica rápida e eficaz para extrair os concentrados da Cannabis, com maior rendimento e rapidez. Esse processo melhora o processo de difusão ao acelerar a transferência de massa dentro dos materiais vegetais, fazendo com que as paredes celulares se rompam e liberem os compostos desejados (EUCLIDES, 2019). 

5 CONCLUSÃO

A ANVISA é muito rigorosa com os medicamentos à base de Cannabis, pois é um medicamento que pode trazer efeitos colaterais severos caso não haja fiscalização no comércio e na fabricação, seus medicamentos devem conter no máximo 0,2% de THC e seu uso sempre deve ser acompanhado por um profissional da saúde.

A Cannabis é uma planta muito complexa com muitos fins medicinais, sua gama de efeitos terapêuticos é gigante, tem um grande potencial, e ainda com novas pesquisas e estudos há muita coisa a ser descoberta através dessa planta. A cada ano são descobertas novas substâncias a partir desta planta. Hoje em dia o canabidiol e uma alternativa favorável a pacientes que não demostraram resultados a outros tratamentos disponíveis atualmente da epilepsia.

REFERÊNCIAS

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Farmacêutico, Doutor em Saúde Pública, Faculdade do Futuro, herminiofar@gmail.com
Farmacêutico Generalista, Faculdade do Futuro, joaovictorcordeirodias10@gmail.com