USE OF KETAMINE FOR OROTRACHEAL INTUBATION IN THE EMERGENCY: INTEGRATIVE REVIEW
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th10249122023
Pedro Henrique Menezes Vaz de Melo1
Ariany Oliveira Silva²
Dalton de Lima Siqueira³
Resumo
INTRODUÇÃO: A cetamina (CT) é um anestésico que foi criado para fins militares e que rapidamente se difundiu para todo o mundo. Apresenta efeitos como aumento da pressão arterial, sendo uma ótima escolha para pacientes com instabilidade hemodinâmica. Entretanto, quando utilizada em intubação orotraqueal, de forma individual, não apresentou bons resultados. Além disso, foi descrito seu uso em pacientes com delírio e agitação, e sua comparação durante a intubação quando comparada com outras drogas. OBJETIVO: Avaliar o uso da Cetamina em intubações orotraqueais de emergência. METODOLOGIA: Trata-se de uma revisão integrativa na base de dados PUBMED utilizando os descritores “INTUBATION AND KETAMINE AND EMERGENCY” para artigos publicados entre 2019 e 2024. RESULTADOS: A incidência do uso da Cetamina na intubação orotraqueal (IOT) aumentou de 5% para 28%. Ao se comparar o uso exclusivo da CT na IOT observa-se um maior número de complicações, contudo, em casos em que a sequência de intubação rápida não pode ser utilizada ela é uma boa alternativa. Pacientes com tendências à hipotensão devem ser medicados com CT, contudo, seu uso pode indicar maior dificuldade na IOT quando comparado a outros medicamentos. Uma contraindicação ao uso de CT é o tratamento de agitação e/ou delírio, estudos prospectivos descritivos relacionaram seu uso à posterior necessidade de intubação. CONCLUSÃO: A cetamina demonstrou ser um medicamento de boa escolha para pacientes traumatizados e com instabilidade hemodinâmica. Entretanto, quando utilizada em pacientes com agitação e delirium, mostrou maiores taxas de IOT. Além disso, foi o fármaco com menor sucesso durante IOT e apresentou maiores complicações quando utilizada de forma isolada.
Palavras-chave: Intubação; Cetamina; Orotraqueal; Emergência
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1 INTRODUÇÃO
A cetamina ou também conhecida como quetamina, é um anestésico que foi descoberto na década de 60 para uso em conflitos militares e rapidamente disseminou-se pelo mundo. A cetamina é um agente simpatomimético que atua através do bloqueio não competitivo dos receptores N-Metil-D-Aspartato (NMDA). Entre seus efeitos, a cetamina é muito conhecida por causar aumento da pressão arterial por estímulos simpáticos, vasoconstrição, broncodilatação e aumento da frequência cardíaca. Até recentemente, seu uso estava limitado em alguns prontos socorros, devido à preocupação quanto ao seu suposto efeito de aumento da pressão intracraniana. Entretanto, atualmente estudos mostraram que essas preocupações estavam equivocadas (BREINDAHL et al., 2021; FARRELL et al., 2020).
Dentre os usos da cetamina na emergência, sua utilização durante procedimentos de intubação orotraqueal apresentou um crescimento, e isso deve-se as suas propriedades hemodinâmicas que oferecem vantagens de segurança aos pacientes em relação a outros anestésicos também utilizados em procedimentos de intubação de sequência rápida (RSI). Dessa maneira, esse fármaco anestésico é capaz de, em doses menores, desconectar o paciente de estímulos externos sem que ele perca a capacidade funcional do tronco cerebral, de modo que o paciente não perca o tônus cardiorrespiratório durante procedimentos dolorosos e angustiantes (MERELMAN et al., 2019).
Quanto à disseminação do uso da cetamina nos departamentos de emergências, um estudo de coorte retrospectivo realizado na Flórida (EUA) mostrou o aumento do uso da cetamina em pacientes violentos, combativos e agitados, que às vezes apresentam riscos tanto para eles mesmos quanto para a equipe de trabalho no hospital. Tal fato deve-se a capacidade da cetamina causar rápida contenção do paciente excitado, mantendo o impulso respiratório e possibilitando seu uso para procedimentos de intubação (PARQUES et al., 2020).
Quando comparada com outros anestésicos como o Propofol, a cetamina foi o anestésico de primeira escolha na maioria dos casos de pacientes traumatizados, apresentando-se como uma boa alternativa. Entretanto, vale ressaltar que cada um desses fármacos apresenta efeitos específicos e casos em que podem ser melhores quando comparado a outros. Nesse sentido, um estudo utilizando dados do National Emergency Airway Registry também avaliou a eficácia do uso da cetamina como único fármaco, e mostrou o insucesso da CT quando utilizada individualmente. Dessa maneira, o sucesso da CT também foi contestado em um artigo dinamarquês, onde a CT obteve a menor taxa de sucesso de IOT entre as drogas utilizadas (DRIVER et al., 2021; FARRELL et al., 2020).
Portanto, objetiva-se avaliar o uso da Cetamina na intubação orotraqueal de emergência, bem como entender as indicações de manejo e os fatores de risco associados.
2 METODOLOGIA
Trata-se de uma revisão integrativa da literatura realizada por meio do levantamento de artigos científicos obtidos a partir de pesquisa eletrônica na base de dados PUBMED.
A seleção dos descritores foi realizada a partir dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), e realizado o cruzamento dos descritores controlados utilizando operadores booleanos de acordo a intenção de resultados dos artigos: “INTUBATION AND KETAMINE AND EMERGENCY”. Foram critérios de inclusão: artigos científicos que abordassem métodos anestésicos em pacientes com traumas faciais e o manejo de vias aéreas difíceis no período de 2019 e 2024 em bases de dados eletrônicos de acesso público, disponíveis online no formato de texto completo, escritos em português, inglês e espanhol. Foram excluídos artigos duplicados, dissertações, teses, artigos debates editoriais e artigos incompletos. Os títulos e os resumos de todos os artigos foram identificados e revisados na busca eletrônica para inclusão ou exclusão do produto no estudo. Foi realizada análise descritiva, com levantamento das informações que contemplavam o tema e que fossem relacionadas às variáveis.
3 RESULTADOS E DISCUSSÕES OU ANÁLISE DOS DADOS
Na pesquisa identificou-se 152 artigos de acordo com os descritores da busca. Após a leitura de títulos, resumos e palavras chaves e aplicação dos critérios de inclusão foram selecionados 9 artigos que contemplavam o tema e estavam disponíveis completos online de forma gratuita.
A partir dos registros de vias aéreas de atendimentos em Sydney foi realizado um estudo descritivo do uso da Cetamina (CT) na sequência de intubação rápida (RSI). Entre os anos de 2010 e 2015 a incidência anual do uso de CT aumentou de 5% para 28%. A CT foi utilizada com menos frequência em centros de trauma quando comparados aos atendimentos em centros comuns (21% vs 27%), mas com mais frequência em pacientes traumatizados que foram atendidos em todos os hospitais analisados (29% vs 21%). Foi observado que a presença de um médico de emergência como líder da equipe é um preditor para o uso da droga, aumentando em 1,83x a chance do seu uso. No geral, a CT foi a droga escolhida em 21% dos hospitais de referência e 38% nos hospitais rurais (FERGUSON et al., 2019).
No que tange ao sucesso e às complicações do uso da CT como único medicamento de escolha na intubação, um estudo observacional foi realizado a partir dos dados do National Emergency Airway Registry. Foram analisadas 19.071 intubações, dessas apenas 0,8% foram realizadas apenas com a CT, 98,5% foram submetidos à RSI e 0,6% tiveram intubação facilitada por anestesia tópica. A hipoxemia (saturação de oxigênio <90%) ocorreu em 16% das intubações com CT exclusivas e pelo menos um evento adverso ocorreu em 32% dos procedimentos. Ao comparar o uso exclusivo da CT aos outros grupos, observa-se um menor sucesso e maiores complicações. O uso de anestesia tópica foi favorecido tanto em relação à eventos adversos (14% vs 31% e/ou 19%), quanto na incidência de hipoxemia durante o procedimento (8% vs 16% e/ou 13%) (DRIVER et al., 2021).
Ainda em relação ao uso exclusivo da CT em procedimentos de intubação orotraqueal (IOT), Merelman; Perlmutter; Strayer, (2019) afirmam em sua revisão de literatura que quando a RSI não é a estratégia ideal, a farmacologia exclusiva de CT pode ser utilizada. Em casos graves de hipóxia, intoxicação ou agitação que impedem a preparação adequada pra a IOT, a realização de RSI pode aumentar significativamente a morbidade e mortalidade. Este aumento está associado à ausência de uma pré-oxigenação adequada, porém ao utilizar uma dose dissociativa de CT é possível deixar o paciente inconsciente, sem que ele perca o tônus circulatório e os movimentos respiratórios. O uso de 1–2 miligramas por quilograma (mg/kg) por via intravenosa (IV) ou 4–6 mg/kg por via intramuscular permite que a pré-oxigenação adequada seja realizada, posteriormente uma dose paralítica usual deve ser administrada e o procedimento pode prosseguir normalmente, de forma segura. Vale salientar que o uso da CT também é preditor de menores taxas de desenvolvimento de hipotensão pós-intubação em comparação ao uso de outros hipnóticos (15% vs 29%) (ISHIMARU et al., 2019).
Além de ser um dos medicamentos de escolha em casos de tendências à hipotensão, como relatado no estudo prospectivo multicêntrico observacional de Ishimaru et al, (2019), o uso de CT é comumente utilizado como tratamento para agitação e delirium. Contudo, os resultados encontrados por Parks et al, (2020) em seu estudo prospectivo apresentam relação entre seu uso e indicação posterior à IOT nesses casos. Dos 86 pacientes que passaram pelo tratamento, 14 necessitaram do procedimento (16,3%). Pacientes com temperatura maior e escore de coma de Glasgow menores tiveram maiores probabilidades de serem intubados. Da mesma forma, outro estudo observacional com dados coletados durante 28 meses na Flórida, inferiu também, que o uso da CT como tratamento para o delírium pode ser um preditor para posterior intubação, apresentando valores mais exuberantes. Dos pacientes tratados com CT para delirium, 63% necessitaram de intubação e destes, os intoxicados por cocaína tiveram 5,75 mais chances de necessitarem de IOT. Ambos os estudos relataram a necessidade de ensaios randomizados para comparar o uso de CT e de outros sedativos no tratamento de delirium, evitando possíveis vieses (SOLANO et al., 2021).
Em comparação a outras drogas, a CT se apresenta como uma boa alternativa. Breindahl et al, (2021) compara o uso da CT e do Propofol para indução de sequência rápida em seu estudo prospectivo, realizado na Dinamarca. Os 548 pacientes foram divididos em dois grupos: 228 receberam CT (grupo 1) e 320 receberam Propofol (grupo 2). A mortalidade em 30 dias não apresentou significância estatística (20, 2% para o grupo 1 e de 22,8% para o grupo 2), o tempo de internação hospitalar e/ou duração da ventilação mecânica não foram associadas significativamente ao agente de indução. Já um estudo observacional realizado em Boston comparou o uso do etomidato (ET) com a CT. A IOT foi bem sucedida em 74,5% e 55,6% dos grupos ET e CT, respectivamente. Foram realizadas pelo menos 3 tentativas em 22,2% no grupo CT, inferindo que o ET pode reduzir a necessidade de 3 ou mais tentativas (FARRELL et al., 2020).
4 CONCLUSÃO/CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base nas análises, a cetamina está entre as drogas de primeira escolha, sendo utilizada principalmente em pacientes traumatizados, com destaque para sua ação contra instabilidade hemodinâmica. Quando utilizada de forma individual durante procedimentos de RSI, a CT apresentou maiores taxas de complicação e de insucesso. Apesar de sua taxa de insucesso, a CT foi descrita como benéfica em RSI com ausência de pré-oxigenação e hipóxia, uma vez que ela evita que o paciente perca o tônus respiratório mesmo inconsciente. A CT foi descrita também, como um importante tratamento para agitação e delirium, porém pode levar esses pacientes a maiores taxas de necessidade de intubação orotraqueal. Apesar de ser uma boa alternativa, a CT apresentou menores taxas de sucesso de IOT quando comparada com outras drogas como o ET.
REFERÊNCIAS
BREINDAHL, N. et al. Ketamine versus propofol for rapid sequence induction in trauma patients: a retrospective study. Scandinavian Journal of Trauma, Resuscitation and Emergency Medicine, v. 29, n. 1, p. 136, 15 dez. 2021. DOI: 10.1186/s13049-021-00948-5
DRIVER, B. E. et al. Success and Complications of the Ketamine-Only Intubation Method in the Emergency Department. The Journal of Emergency Medicine, v. 60, n. 3, p. 265–272, mar. 2021. DOI: 10.1016/j.jemermed.2020.10.042
FARRELL, N. M. et al. A Comparison of Etomidate, Ketamine, and Methohexital in Emergency Department Rapid Sequence Intubation. The Journal of Emergency Medicine, v. 59, n. 4, p. 508–514, out. 2020. DOI: 10.1016/j.jemermed.2020.06.054
FERGUSON, I. et al. Ketamine use for rapid sequence intubation in Australian and New Zealand emergency departments from 2010 to 2015: A registry study. Emergency Medicine Australasia, v. 31, n. 2, p. 205–210, 11 abr. 2019. DOI: 10.1111/1742-6723.13114
ISHIMARU, T. et al. Association of ketamine use with lower risks of post-intubation hypotension in hemodynamically-unstable patients in the emergency department. Scientific Reports, v. 9, n. 1, p. 17230, 21 nov. 2019. DOI: 10.1038/s41598-019-53360-6
MERELMAN, A.; PERLMUTTER, M.; STRAYER, R. Alternatives to Rapid Sequence Intubation: Contemporary Airway Management with Ketamine. Western Journal of Emergency Medicine, v. 20, n. 3, p. 466–471, 26 abr. 2019. DOI: 10.5811/westjem.2019.4.42753
PARKS, D. J. et al. Rescue Intubation in the Emergency Department After Prehospital Ketamine Administration for Agitation. Prehospital and Disaster Medicine, v. 35, n. 6, p. 651–655, 14 dez. 2020. DOI: 10.1017/S1049023X20001168
SOLANO, J. J. et al. Prehospital Ketamine Administration for Excited Delirium with Illicit Substance Co-Ingestion and Subsequent Intubation in the Emergency Department. Prehospital and Disaster Medicine, v. 36, n. 6, p. 697–701, 23 dez. 2021. DOI: 10.1017/S1049023X21000935
1 Residente de Anestesiologia do Hospital Universitário Alzira Velano, Alfenas – MG
pedrohmvmelo@live.com
2 Residente de Cirurgia Geral do Hospital Universitário Alzira Velano, Alfenas – MG
oliveiraariany08@gmail.com
3 Médico Anestesiologista do Hospital Universitário Alzira Velano, Alfenas – MG
daltonlsiqueira@gmail.com