UMA REFLEXÃO SOBRE AS POLÍTICAS PÚBLICAS VOLTADAS PARA OS AUTORES DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA EM MANAUS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11187999


Adriane Letícia dos Santos Sales1,
Lídia Beatriz Almeida da Paz2,
Taysa Cavalcante Rodrigues3


RESUMO

Este artigo visa compreender a importância das políticas públicas voltadas para os autores de violência doméstica e de gênero. Com isto, o objetivo geral é analisar as publicações sobre políticas públicas voltadas para os autores de violência contra a mulher e os serviços de atendimento em vigência em Manaus,  utilizando como método o exploratório e técnica  bibliográfica, sendo os objetivos específicos: contextualizar acerca da violência de gênero apontando sobre os mecanismo de proteção preconizados na Lei Maria da Penha, destacar sobre as políticas voltadas para os autores de violência, compreender o trabalho do assistente social nas políticas e serviços de atendimento voltados os autores de violência doméstica.  Conclui-se, que há produções acadêmicas na temática, haja visto que existem pesquisas sobre políticas públicas voltadas aos autores de violência contra mulheres, além disso, é perceptível como o Estado e Municípios abrangem essa preocupação em suas legislações, onde a luta contra a violência requer o envolvimento de toda a sociedade, incluindo os autores de violência, para que juntos possamos construir uma sociedade mais justa e igualitária. Consequentemente, além da criação e efetivação é necessário fiscalizar se os serviços ofertados, bem como, a questão da ressocialização dos autores, pois a estes devem ser oferecidos recursos para reinserção na sociedade, quebrando essa tolerância enraizada. Com isso, a presente pesquisa permitiu conhecer também as particularidades das contribuições do Assistente Social nas políticas públicas, a partir das suas atribuições e competência geridas pela 8.662/93 e seu código de ética.

PALAVRAS-CHAVE: Violência de gênero; Lei Maria da Penha; Políticas Públicas; Autores de Violência Doméstica.

ABSTRACT

This article aims to understand the importance of public policies aimed at perpetrators of domestic and gender-based violence. The general objective is to analyze publications on public policies aimed at perpetrators of violence against women and the support services currently available in Manaus, using exploratory and bibliographic techniques as the method. The specific objectives are: to contextualize gender-based violence by pointing out the protective mechanisms outlined in the Maria da Penha Law, to highlight policies aimed at perpetrators of violence, and to understand the role of social workers in policies and services aimed at perpetrators of domestic violence. It is concluded that there are academic productions on the topic, as there is research on public policies aimed at perpetrators of violence against women. Additionally, it is evident how States and Municipalities address this concern in their legislation, where the fight against violence requires the involvement of the whole society, including perpetrators of violence, so that together we can build a fairer and more egalitarian society. Consequently, in addition to creation and implementation, it is necessary to monitor the services offered, as well as the issue of the reintegration of perpetrators, as they must be provided with resources for reintegration into society, breaking this ingrained tolerance. Thus, this research also allowed us to understand the particularities of the contributions of Social Workers to public policies, based on their duties and competencies governed by Law 8.662/93 and their code of ethics.

KEY WORDS: Gender violence; Maria da Penha Law; Public Policy; Perpetrators domestic violence.

1. INTRODUÇÃO

A 10ª edição da Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher, de 2023, mostra que 38% das mulheres da região norte, com especificação ao Estado do Amazonas, já sofreram algum tipo de violência doméstica ou familiar provocada por um homem, tal dado é superior se comparado ao que foi encontrado nas demais regiões do país sendo este (30%), mesmo considerando as margens de erro. Também é maior, no estado do Amazonas, o número de mulheres que afirmam ter uma amiga, familiar ou conhecida que já sofreu algum tipo de violência doméstica. Enquanto o índice nacional é de 68%, entre os amazonenses chega a 74% (Senado, 2023). Esse índice alto pode ser em virtude do machismo presente na nossa sociedade, em que, de acordo com Gimenez e Hahn (2018), é através da cultura patriarcal que a desigualdade de gênero perpassa pela estrutura social e familiar, sendo esta uma grande causadora de violência institucional, intrafamiliar, de gênero e doméstica.

A reflexão sobre a questão da violência cometida contra a mulher necessita ser realizada constantemente visando compor melhorias nos mecanismos de proteção existentes, pois é perceptível o quanto após a criação de ferramentas direcionadas à proteção da mulher, os casos de violência aumentam a cada ano, como visto na pesquisa acima. Diante disto, as redes de enfrentamento dizem respeito à articulação de serviços nas instituições governamentais e não governamentais juntamente com a comunidade, com propósito de desenvolver estratégias de prevenção e políticas que incentivem o empoderamento e a autonomia de mulheres (SEJUSC, 2022). Após a criação da lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, foi possível o surgimento de ferramentas direcionadas à proteção da mulher e a oposição a violência, como por exemplo os Juizados Especiais, Delegacias Especializadas de crimes contra a mulher, Serviços emergenciais ofertados, melhorias na Segurança Pública e na assistência à vítima.

No que diz respeito aos autores da violência, é preciso uma ação voltada à reflexão sobre a lei e suas penalidades, bem como projetos direcionados a estes, para que os horizontes sobre a questão da mulher sejam ampliados, de modo a obter políticas públicas que visem a quebra dessa perspectiva machista através do trabalho de responsabilização. Nesse contexto, Neves et. al. (2017) ressalta que as ferramentas em face do autor são capazes de proporcionar mudanças na compreensão, conduta, modos de lidar com os outros e consigo mesmo, e por fim os incentivar a desenvolver diálogos pautados no reconhecimento dos direitos de cada pessoa.

Este trabalho tem como objetivo geral, analisar as publicações sobre políticas públicas voltadas para os autores de violência contra a mulher e os serviços de atendimento em vigência em Manaus, sendo os objetivos específicos: contextualizar acerca da violência de gênero, apontando sobre os mecanismo de proteção preconizados na Lei Maria da Penha; compreender sobre as políticas voltadas para os autores de violência, e; destacar o trabalho do/a assistente social nas políticas e serviços de atendimento voltados os autores de violência doméstica, na cidade de Manaus.

No que se refere à metodologia deste trabalho, utilizamos a pesquisa exploratória, cujo propósito é proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses (Gil, 2017). Seu planejamento tende a ser bastante flexível, pois interessa considerar os mais variados aspectos relativos ao fato ou fenômeno estudado. Referente às técnicas de pesquisa, utilizamos a forma indireta por meio de pesquisa bibliográfica, que, conforme Marconi e Lakatos (2017, p. 200), esta técnica abrange toda a bibliografia já tornada pública em relação ao tema de estudo, desde publicações avulsas, boletins, jornais, revistas, livros, pesquisas, monografias, teses, artigos científicos impressos ou eletrônicos, entre outros, sua finalidade é colocar o pesquisador em contato direto com tudo o que foi escrito e dito.

Assim, este trabalho está dividido em tópicos que irão abordar no seu primeiro tópico, a questão de gênero, colocando pontos referentes à relação de homem e mulher na sociedade com viés voltado para a reflexão sobre a posição das partes nos contextos históricos.

Na primeira parte, fizemos uma breve análise das questões de gênero, onde é percebido a relação do homem com a mulher na sociedade, sendo esta submetida ao marido, filhos, família, igreja, etc. Onde, por muito tempo foram desvalorizados o trabalho e o papel da mulher sendo a violência doméstica colocada como um crime de menor potencial ofensivo.

No segundo momento abordaremos sobre a lei 11.340 de agosto de 2006, que visa coibir a violência doméstica e de gênero através da criação de mecanismos em defesa da mulher, bem como as alterações nas demais políticas públicas e legislações orçadas a partir da lei federal, lei esta que foi criada a partir de denúncias feitas pela sra. Maria da Penha Maia Fernandes em face de seu companheiro na época, que lhe causaram traumas psicológicos e físicos irreversíveis.

E para finalizar a discussão, no último tópico será abordado sobre o trabalho dos/as Assistentes Sociais junto aos autores de violência doméstica, com a finalidade de destacar uma reflexão acerca das políticas existentes em Manaus, diante do que preconiza as legislações no que se refere a criação de serviços ofertados para os autores de violência.

Com isso, este trabalho demonstra relevância acadêmica, com vista a importância de discutir esta temática tão presente em nossa sociedade, contribuindo com as produções relacionadas ao tema. Em relação ao viés social, este artigo agregará mais conhecimento nas discussões pertinentes sobre a reinserção dos autores na sociedade, baseadas nos estudos realizados a partir das legislações vigentes.

2. UM BREVE HISTÓRICO SOBRE A VIOLÊNCIA DE GÊNERO E SEUS DESDOBRAMENTOS

Sabe-se que o patriarcado ao longo do tempo esteve presente em diversas sociedades e teve uma contribuição para que o fenômeno da violência doméstica se perpetuasse até os dias atuais tendo uma criação baseada na desigualdade de atribuições dadas tanto para a mulher, como para o homem. Conforme autores clássicos como Bourdieu (1999) e Beauvoir (1967), e contemporâneos como Saffioti (2004), Gimenez e Hahn (2018), entre outros, o patriarcado nada mais é do que a diferenciação nas relações e papeis de um gênero sobre o outro, ou seja, basicamente se trata de um sistema que inferioriza o papel e a participação da mulher na sociedade, dando ênfase ao poder e dominação do homem, como o sexo mais forte e capaz. 

 Essa desigualdade de gênero fez com que muitos homens obtivessem uma visão destoante do amor e cuidado, agindo de forma incoerente com seus familiares, sendo mais déspota principalmente com a sua esposa, namorada ou com o gênero feminino em geral. Na visão de Saffioti (1987, p. 8)

A identidade social da mulher, assim como a do homem, é construída através da atribuição de distintos papéis, que a sociedade espera ver cumpridos pelas diferentes categorias de sexo. A sociedade delimita, com bastante precisão, os campos em que pode operar a mulher, da mesma forma como escolhe os terrenos em que pode atuar o homem.

Sendo assim, é notório que essa distinção de papéis acaba acirrando mais a diferença de gênero, oriundos desde o primórdio. Segundo Duby (1982, apud Percivaldi, 2018), as mulheres eram anjo do lar, geralmente submetida aos homens (seja ao pai, ao marido ou aos irmãos) e a Deus (dentro ou fora dos conventos), tinha pouquíssima autonomia e, além disso, era alvo das agruras de uma cultura difusa que a considerava a fonte de todo pecado, causa de tentação e de perdição.

O pensamento dessa época era voltado aos contextos vividos onde os reis detinham uma soberania inquestionável sobre os servos e a mentalidade misógina era recorrente, como se a mulher tivesse o seu lugar de submissão e nessa posição viveria, morreria sem qualquer avanço, sendo seu destino traçado pelos seus familiares diferente da modernidade de hoje no qual a mulher possui mais autonomia (Percivaldi, 2018).

Pode-se considerar que essas abordagens acima citadas, são formas de violação de direitos, pois demonstra o papel da mulher em posições restritas, sendo desvalorizada perante a sociedade no geral. Como menciona Machado (2015), fazendo referência à teorização de Yong (2002) apontando que o reconhecimento é em primeiro lugar um ponto de partida para a interação e a contestação pública.

 Esta abordagem leva ao entendimento de que as distinções de papéis, bem como, as violências de gênero seguem presentes na sociedade, pois dentro desse pensamento de soberania do homem em detrimento à mulher, pode-se considerar uma das formas de violação de direitos, na medida em que situa a mulher em posições de subordinação, desvalorização e falta de reconhecimento perante à sociedade no geral.

A história elucida eventos marcantes no mundo, como a revolução industrial, sendo um marco para a industrialização pelas mudanças implementadas na forma de produção, este contexto, de transformações possibilitaram uma reflexão do papel da mulher na sociedade, onde elas puderam reavaliar sua posição, não somente sendo mãe, mas também contribuir com o sustento da família, como caracteriza, Rodrigues et al. (2015, p.5),

O alto número de mulheres empregadas como operárias nas fábricas na França e Inglaterra ocorreu devido aos baixos salários masculinos, insuficientes para garantir as necessidades básicas da família, levando a mulher a “sair” de casa para trabalhar e assim complementar a renda, a fim de garantir a subsistência familiar.

Sobre a sua posição houve uma centelha de mudança na perspectiva, começaram a participar do círculo de trabalhadores, pode-se dizer que nesse período suas ideias foram estremecidas, visto que sua inserção no mercado de trabalho quebrou muitos paradigmas.  Segundo Beauvoir (1967, p. 694) “Foi pelo trabalho que a mulher cobriu em grande parte a distância que a separava do homem; só o trabalho pode assegurar-lhe uma liberdade concreta”. Com essa colocação, entende-se o quanto foi longo o processo de mudança, até chegar ao momento em que a mulher passou a ser mais ativa na sociedade, podendo ser a provedora e não somente o homem. Sendo posteriormente assegurada na constituição o comprometimento com a proteção da mulher, mas não havia lei específica que tratasse dessa questão e enquanto esse momento não chegava, diversas situações de desrespeito contra as mulheres aconteciam4.

As mulheres com o tempo estão ganhando espaço na sociedade e sendo reconhecidas como sujeitos de direito, deixando de ser vista somente como cuidadora do lar e podendo ser provedora da casa, não sendo especificação do homem apenas. Para ultrapassar as barreiras da desigualdade, em 2003 o Presidente na época Luiz Inácio Lula da Silva, através do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, efetivou a criação da Secretaria Especial de Públicas da Presidência da República (SPM/PR), cujo objetivo é trabalhar no enfrentamento da desigualdade entre homens e mulheres, estabelecendo, planejando, articulando e/ou promovendo políticas públicas para esta problemática. Ainda na presidência de Luiz Inácio em 2006, foi promulgada a Lei 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha, que estabelece e normatiza os mecanismos ao enfrentamento da violência doméstica e familiar, específica os crimes que já se faziam presentes na sociedade e eram normalizados antes de se tornarem públicos (Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, 2006).

Dessa forma, a lei representa uma grande proposta e mudança na esfera judicial, cultural e social, trazendo consigo um encorajamento ao Brasil para assumir seu compromisso a favor do público feminino, preservando e garantindo seus direitos diante de tantas demonstrações de desrespeito e violação e reconhecendo os delitos como crimes de fato, incentivando a criação de programas e mecanismos para o enfrentamento da violência doméstica, no qual abordaremos no seguinte subtópico.

2.1. A Lei Maria da Penha e os Mecanismos de Proteção às mulheres no Amazonas.

As legislações antigas não abrangiam a questão da mulher, os crimes cometidos em defesa da honra eram vistos como crimes de menor potencial ofensivo e em favor do homem, foi somente na ADPF 779, por unanimidade que a tese da legítima defesa da honra foi considerada inconstitucional, por contrariar os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, de modo a excluir a legítima defesa da honra do âmbito do instituto da legítima defesa (Brasil, 2023).

A criação de legislações e Políticas Públicas que atendam às diversas demandas existentes em nossa sociedade foram conquistadas através de movimentos em prol de justiça e igualdade (Abers, Silva e Tatagiba, 2018). Podemos destacar a lei 11.340/2006, que surgiu a partir da história de luta da Biofarmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, que sofreu duas tentativas de assassinato por parte de seu ex-companheiro, lhe ocasionando lesões irreversíveis, traumas e outras enfermidades. Em razão disto, Maria da Penha, mesmo após 15 anos de sofrimento, não vendo nenhuma movimentação em seu favor por parte da justiça, procurou apoio em instituições como organizações sociais (Observatório da Lei Maria da Penha, 2010).

E a partir desse momento seu caso foi enviado para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (OEA), momento em que, pela primeira vez, foi visto como grave violação de direito, sendo então o Brasil punido, por descaso e omissão dos casos de violência doméstica existente naquele período, mais especificamente o caso de Maria da Penha, que havia procurado ajuda nas esferas judiciais e não obteve nenhum suporte legal (Lopes e Pimentel, 2018).

Considerando que naquele momento, não havia uma legislação específica que amparasse os direitos da mulher, é válido mencionar, que a luz de nossa Carta Magna, a Constituição Federal de 1988, em seu Artigo 226 §8º, já legitimava o papel protetivo do estado onde afirma que “O estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações” (Brasil, 1988).

Portanto, importa ressaltar que Maria da Penha não foi vítima apenas da violência de seu agressor, como também, da negligência do arcabouço legal da justiça brasileira por não acolher as vezes em que Maria registrou as ocorrências.

Assim, com a promulgação da legislação foram criados mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, que dispõe sobre a tipificação dos tipos de violência, conforme o artigo 5º, a violência doméstica e familiar contra a mulher é qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial (Brasil, 2006).

Trazendo para o contexto do Amazonas, apesar da existência de suportes legais que foram criados na tentativa de coibir a violência, é relevante ressaltar que de acordo com o Centro Integrado de Acompanhamento de Projetos e Elaboração de Políticas em Segurança Pública- CIAESP, em 2023, o índice de mulheres que registraram boletim de ocorrência cujo crime é de ameaça, aumentou entre o período de Março a Novembro, enquanto por descumprimentos de Medidas Protetivas os períodos em que se mostram números elevados foram entre abril e outubro, esses dados revelam o aumento de casos de violência no Amazonas mesmo com a lei vigente.

Segundo a Secretaria Executiva de Política para as Mulheres (2022), as redes de enfrentamento dizem respeito à articulação de serviços nas instituições governamentais e não governamentais juntamente com a comunidade, com propósito de desenvolver estratégias de prevenção e políticas que incentivem o empoderamento e a autonomia das mulheres. Por isso, além da criação de mecanismos em prol da mulher, bem como menciona Santos e Moré (2011), é importante haver uma rede de apoio às mulheres em situação de violência na relação íntima de afeto, a partir do auxílio de familiares, amigos, colegas de trabalho, como também, profissionais especializados, para contribuir nesse processo de separação da mulher com o autor da violência com o intuito de que esta se sinta acolhida e não julgada, para ser possível romper com este ciclo da violência5.

A criação da Lei 11.340, ocasionou o surgimento de ferramentas direcionadas à proteção da mulher em situação de violência, onde começaram a ser adotadas medidas para melhor atender as vítimas de forma assertiva e acolhedora, através de suporte técnico, redes de apoio, equipes psicossociais, e treinamentos especializados visando a compreensão e a realização de um trabalho com técnicas adequadas (Carneiro e Fraga, 2012).

Preconizado na Lei Maria da Penha, no Amazonas foram criadas as delegacias especializadas de crimes contra a mulher, que fazem o atendimento de boletim de ocorrência, podendo ser pedida a medida protetiva, ambas localizadas nas zonas: Centro-sul, leste e sul de Manaus. Seguindo com os dispositivos, foram criados, a casa abrigo Antônia Nascimento Priante em localidade sigilosa para resguardar as mulheres que se encontram em situação de risco iminente, o Centro Estadual de Referência e Apoio à Mulher – CREAM e o Serviço de Apoio Emergencial à Mulher – SAPEM, que ofertam às vítimas acolhimento institucional, atendimentos psicossocial, bem como encaminhamentos para os órgãos competentes, considerando a especificidade da demanda, além de realizar junto à comunidade oficinas populares de prevenção à Violência Doméstica, ambos integram a rede de atenção em defesa dos direitos da mulher, objetivando o combate e enfrentamento à violência doméstica (SEJUSC, 2022).

Os Distritos Policiais – DIPs são considerados porta de entrada para acesso aos serviços da rede, onde é imprescindível o primeiro atendimento psicossocial da assistida através de cadastro no Sistema de Atendimento à Mulher – SAM, segundo o Diário Oficial do Estado do Amazonas (2024), o sistema consta informações dos procedimento realizados no atendimento da vítima, tramitação e encaminhamentos necessários a sua demanda, cadastro do seus dados, relato e evolução do seu caso, cadastro dos autores da violência e localidade ocorreu o fato, permitindo que as redes de atendimento se comuniquem com o Centros de Referência Especializado em Assistência Social – CREAS. A orientação jurídica conta com o Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher – NUDEM, dispositivo da defensoria pública, que conforme Mendonça (2021), abrange a questão de mulheres, vítimas de violência doméstica, ou famílias das vítimas de feminicídio que são encaminhadas pela rede de proteção e apoio para o suporte jurídico necessário.

Esses dispositivos corroboram para que seja necessário a escuta qualificada feita pelos profissionais a fim de prezar pelo contexto vivido da assistida, considerando suas necessidades, tendo em vista ainda, a importante comunicação em rede para a garantia de direito da mulher, criança e família. Além disso, é importante ressaltar a constante capacitação aos profissionais que trabalham nos atendimentos voltados para as mulheres em situação de violência, pois se trata de uma demanda complexa que faz parte da sociedade. E, seguindo com o pressuposto na própria lei, vale destacar a efetivação de políticas públicas voltadas aos autores da violência, como forma de coibir a violência doméstica. Sendo assim, esta temática será reforçada no tópico seguinte.

3. POLÍTICAS PÚBLICAS VOLTADAS PARA OS AUTORES DE VIOLÊNCIA NO AMAZONAS

Na sociedade para que haja mudanças e transformações nas expressões da questão      social, é importante que o Estado garanta políticas públicas voltadas para essas ações, através de mecanismos de defesa dos direitos humanos, legislações e outros esquemas de proteção social (Yazbek, 2008).

Quando tratamos de violência doméstica e familiar contra a mulher, é imprescindível que os órgãos públicos se organizem e criem formas de amparar à mulher vítima de violência.  Contudo, pouco se tem tratado na sociedade ações que sejam eficazes para que o homem autor de violência seja responsabilizado por seus atos; a estes devem ser oferecidos recursos para ir quebrando essa tolerância enraizada abordando acerca das mediações de políticas públicas para a reeducação do agressor, segundo Machado (2013), essas ocorrem às margens do sistema, mas um dia serão valorizadas e poderão ensinar algo ao sistema do direito atual.

A violência de gênero alcança grande visibilidade na sociedade a cada momento, e se torna um cenário de debates e pesquisas acerca das relações de gênero, levando em conta a multiplicação das desigualdades do sexo masculino em detrimento do sexo feminino.

Essa temática está relacionada à violência cometida contra as mulheres que em sua maioria demonstra ser realizada por homens. A educação é uma ferramenta a ser utilizadapara coibir a prática de ato, “É melhor prevenir os crimes do que puni-los, esta é a finalidade precípua de toda boa legislação” (Beccaria, 1999, p. 129).

Conforme apontam as pesquisas divulgadas no Instituto Patrícia Galvão Dados e Fontes do ano de 2023, acerca do perfil dos autores de violência contra a mulher, 27,6 milhões de mulheres brasileiras com 16 anos ou mais relataram terem sido vítimas de violência provocada por parceiro íntimo ao longo dos anos. Sendo que mais de 31% afirmaram que o responsável pela violência mais grave sofrida nos últimos 12 meses foram seus ex-cônjuges, ex-companheiros ou ex-namorados.

Ou seja, ainda é perceptível que em decorrência a cultura patriarcal a desigualdade de gênero perpassa diariamente em todos os âmbitos sociais, trazendo não só uma frustração no sentido de haver legislações, no entanto não serem operacionalizadas da forma como de fato está escrito, além de ser sempre presente a questão do homem ser superior a mulher (Jesus, 2021).

Pensando nas questões de violência contra a mulher, surgiram nos Estados Unidos, em meados de 1977, os grupos reflexivos, através das movimentações dos grupos feministas (Rodrigues, 2021). Dessa forma, já nesta época foi percebido que estes grupos são um passo importante e um grande investimento para a quebra do ciclo de violência, além disso, abranger essa questão também tem um olhar para os vínculos afetivos, principalmente em relação às proles. 

A ressocialização dos autores de violência doméstica deveria ter uma atenção efetiva dos nossos representantes, tendo em vista, que a educação é um instrumento que pode ser utilizado para a reflexão da violência doméstica, como entendimento da violação dos direitos humanos, desconstrução dessa visão machista, conscientização e responsabilização pela violência cometida.

Podemos verificar que os mecanismo de proteção são conjuntos interligados, podendo utilizar desse viés, com preventivo a violência e assim atuar de forma articulada com os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, promotorias especializadas, Casas-Abrigo, Centro de Referência da Mulher, Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher, Defensorias/Núcleos Especializados da Mulher, Centros de Referência Especializados de Assistência Social, serviços de saúde, etc, contribuindo para a prevenção e o combate à violência contra as mulheres nessas redes (Brasil, 2011).

Cumpre salientar que na Lei 11.340/2006, o artigo nº 35 direciona a criar ferramentas para os autores de violência, consta que

A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios poderão criar e promover, no limite das respectivas competências: I – centros de atendimento integral e multidisciplinar para mulheres e respectivos dependentes em situação de violência doméstica e familiar; II – casas-abrigos para mulheres e respectivos dependentes menores em situação de violência doméstica e familiar; III – delegacias, núcleos de defensoria pública, serviços de saúde e centros de perícia médico legal especializados no atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar; IV – programas e campanhas de enfrentamento da violência doméstica e familiar; V – centros de educação e de reabilitação para os agressores

Com a promulgação da lei, houve a alteração também na lei nº 7.210/1984 de Execução Penal, que tem por objetivo no artigo 1º, efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado (Brasil, 1984), ressaltando em seu parágrafo único do artigo n° 152 a questão do autor,

Nos casos de violência doméstica e familiar contra a criança, o adolescente e a mulher e de tratamento cruel ou degradante, ou de uso de formas violentas de educação, correção ou disciplina contra a criança e o adolescente, o juiz poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de         recuperação e reeducação.

Desse modo, é possível perceber que existem ferramentas e projetos propostos para o público de autores de violência doméstica, com o intuito de coibir e responsabilizar os mesmos, tendo em vista nesse processo trabalhar através de grupos reflexivos e ações. Ou seja, é importante destacar que os projetos para autores de violência doméstica devem ser parte de uma abordagem mais ampla e integrada para enfrentar o problema da violência de gênero, que inclui medidas de prevenção, proteção das vítimas e aplicação eficaz da lei.

3.1 Legislações para autores de violência contra a mulher no Amazonas

Como visto, as iniciativas relacionadas ao réu (chamados a responder processo), são realizadas em casos de processos em curso onde é encaminhado pelo juiz aos programas, Sobre essa questão e trazendo um olhar para o contexto do Amazonas, a Lei Estadual nº 5.603/2021 estabelece princípios e diretrizes para criação de programas reflexivos e responsabilizantes, pois a própria Lei Maria Penha direciona a importância de trabalhar com assistido na promoção de prevenir e erradicar tais condutas violentas, como consta no quadro abaixo:

Quadro 1:  Artigos 3º e 4º da lei.

Artigo 3º. Compõem os princípios norteadores para a criação de tal programa. Artigo 4º. Compõe a forma de organização.
I – a responsabilização do autor nos aspectos legal, cultural e social; II – a igualdade e o respeito à diversidade, bem como a promoção da igualdade de gênero; III – a observância e garantia dos direitos humanos, em especial dos documentos legais internacionais e nacionais referentes à prevenção e erradicação da violência contra a mulher; IV – a promoção e o fortalecimento da cidadania; V – o respeito aos direitos e deveres individuais e coletivos.  I – o caráter reflexivo e responsabilizante dos grupos, a serem coordenados por equipes multidisciplinares, preferencialmente com a presença de profissionais do Serviço Social, da Psicologia e do Direito; II – o funcionamento coordenado dos grupos com os demais serviços da rede de proteção, inclusa a rede de proteção à mulher vítima de violência, permeados pela criação de fluxos de trabalho que permitam o constante diálogo e troca de expertise entre o atendimento prestado à vítima e o atendimento prestado ao autor da violência, bem como a autonomia das equipes multidisciplinares em relação à escolha da fundamentação teórica, das dinâmicas de grupo utilizadas e da ordenação e seleção dos temas abordados.  
Fonte: Lei Estadual nº 5.603/2021

Ambos demonstram  já ter a preocupação do governo em relação aos autores, sendo através dos grupos reflexivos como uma forma de coibir a continuidade do ciclo de violência, investimento este favorável a sociedade com intuito trabalhar a reinserção deste cidadão a convivência harmônica com sociedade, em consonância com as legislações federais,  pois a violência de gênero é um fenômeno social complexo e multifacetado que requer a ação articulada de diferentes áreas: saúde, educação, justiça, segurança, assistência social, cultura, etc.

Ressalta-se que a punição deve ser colocada, porém com mais com a abertura  da reeducação, ponto colocado nos objetivos para a discussão da questão, salienta-se que esse trabalho não tem o intuito de justificar seus atos, e sim a reflexão de que o trabalho com os autores deveriam ter uma atenção maior, visto que pode quebrar muitos paradigmas, para que o homem venha compreender a violência como violação dos direitos humanos e desconstruir essa visão machista normalizada pela sociedade, com isto, a Secretaria de Estado de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania – SEJUSC, oferta o serviço de atendimento, responsabilização e educação ao agressor – SARE, essa porta de entrada é solicitada pelos juizados criminais conforme a necessidade. Mendonça (2021, p. 72), afirma que o SARE tem como finalidade,

A reeducação de agressores através de encontros quinzenais onde são discutidos temas como responsabilização, escolhas, masculinidade, violência, paternidade, álcool e drogas, problemas conjugais, saúde, legislação da violência doméstica e demais temas relacionados, atua também realizando palestras, seminários e encontros em comunidades

O dispositivo criado a partir da lei Maria da Penha, é empenhado em colocar em prática o inciso V, do artigo nº 35 já mencionado acima, sendo ofertado pelo estado onde conforme SEJUSC (2022), “Cabe também articular com o Centro Estadual de Referência e Apoio à Mulher – CREAM, Serviço de Apoio Emergencial à Mulher- SAPEM e o 1º, 2º e 3º Juizados Especializados no combate à violência doméstica e familiar contra a mulher”.

Sobre essa temática o Tribunal do Estado do Amazonas, coloca em seu planejamento estratégico de gestão – biênio 2021-2026, diversos projetos voltados a administração do órgão, assim, através do 2º Juizado Maria da Penha, é proposto o projeto denominado “Mude sua História”, que atende os requeridos e requerentes de processos relacionados a violência doméstica. Uma das suas finalidades é “sensibilizar para uma cultura de paz e para o desenvolvimento de uma comunicação não violenta, contribuindo para a ressignificação, fortalecimento e humanização das relações sociais”, esperando alcançar a “Promoção da prevenção da violência e do acesso à justiça e aos serviços públicos”. (Planejamento estratégico 2021-2024. p.51-50). Ainda sobre essa reflexão das políticas, no âmbito municipal a prefeitura de Manaus sancionou a Lei nº 3.034, de 18 de abril de 2023, que propõe sobre o Mês do Laço Branco– Homens pelo Fim da Violência contra Mulher, onde coloca em seu artigo 2º,

Neste mês, devem ser desenvolvidas as seguintes ações, entre outras, pelos gestores municipais e pelas Secretarias que aderirem à campanha:

I – Opcionalmente, iluminação dos prédios públicos com a cor branca;

II – Promoção de palestras, eventos e atividades educativas voltadas aos homens sobre o tema;

III – veiculação de campanhas na mídia e disponibilização à população de informações em banners, sites, folders e outros materiais com ilustrações e exemplos sobre a prevenção ao feminicídio, contemplando a generalidade do tema;

IV – Campanha de conscientização, nas escolas do município, sobre o fim da violência contra as mulheres.

As legislações acima são direcionadas a autores de violência, é perceptível que já existe um direcionamento do Estado à temática. Essas iniciativas devem ser interligadas às esferas do municipal, estadual e federal e podem ser implementados por organizações governamentais, não governamentais, compondo com profissionais que ajudem a executar essas políticas, como o assistente social, conforme dispõe o tópico seguinte.

4. O TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NAS POLÍTICAS PÚBLICAS

O serviço social tem todo um contexto histórico de lutas, de ruptura e de mudanças em seu direcionamento, diante de inúmeras mudanças na sociedade e de desigualdade, busca agir com ética nas mais variadas expressões da questão social, precisa-se atualizar e estar ciente das políticas e normas que regem a profissão. Para chegarmos à atual direção, foi preciso romper com o conservadorismo e promover o encontro da dimensão teórico-metodológica da profissão com o marxismo, este pavimentou o caminho para a construção do projeto ético-político que nos direciona (Chagas e Vale, 2021).

É considerado, que o trabalho profissional do assistente social é baseado a partir das expressões da questão social, da qual é existente através das desigualdades na sociedade advindas do capitalismo. A contar desta situação em específica, a atuação dessa profissão se dá mediante ao atendimento dessas questões comunitárias existentes em nosso cotidiano, onde se vê as variadas formas de atuação para garantir e efetivar a luta aos direitos humanos (Iamamoto, 2001).

Entende-se então que pelo trabalho do Serviço Social, na atuação diante de diversas demandas, que surgem na sociedade de um contexto sociocultural, precisa ser direcionada a recorrente busca por um diálogo crítico e construtivo ampliando seu conhecimento, baseados nas três dimensões apontadas por Iamamoto (2022), sendo elas: a competência ético-política, teórico-metodológica e técnico-operativa.

Diante da atuação do Assistente Social, profissão esta que foi regulamentada pela lei n° 8.662, de 7 de junho de 1993, no qual demonstra que o mesmo tem a competência de atuar na implementação de políticas públicas e programas entre outras especificações contribuindo com a garantia de direito dos cidadãos, conforme o artigo 4º da lei,

Artigo 4º Constituem competências do Assistente Social:

II – Elaborar, coordenar, executar e avaliar planos, programas e projetos que sejam do âmbito de atuação do Serviço Social com participação da sociedade civil;

III – encaminhar providências, e prestar orientação social a indivíduos, grupos e à população.

[…]

Evidencia que o profissional pode estar ativo nas políticas públicas, dentre elas as voltadas aos autores de violência doméstica de forma a contribuir com a execução dos programas, onde o mesmo pode utilizar de todo o seu arcabouço de conhecimento para implementação de ações levando em conta a atribuição contida no artigo 5º da lei 8.662/1993, com base na formação das dimensões investigativa e interventiva na relação teoria e realidade.

Segundo Silva (2019), o assistente social consegue identificar além do viés econômico a realidade do sujeito, com isso, no  sócio jurídico o Conselho Federal de Assistência Social (2014), faz uma reflexão sobre as áreas de atuação do assistente social em órgão como: Defensoria pública, Ministério público, Poder judiciário, na execução de medidas alternativas e Execução penal, no qual norteia aos procedimentos que podem ser adotados dentro da atribuição e competência do profissional com foco na defesa intransigente dos direitos.

No Tribunal de Justiça do Amazonas, Rodrigues, Nascimento e Viana (2020) pontuam o trabalho do assistente social em dois projetos em curso pelo 1º juizado da Maria da Penha, denominados:  Maria Acolhe e o Maria vai à Escola, ambos com operacionalização do trabalho multidisciplinar dentre assistente social, psicólogo e outros profissionais. Segundo as autoras, o Maria Acolhe tem por objetivo,

Orientar os jurisdicionados sobre os vários aspectos da tramitação processual. Desta forma, as partes processuais (vítimas e agressores) são convidadas a comparecer ao Juizado através da intimação das Medidas Protetivas de Urgência, notificação ou ligação telefônica, em dias diferentes para os jurisdicionados (terças e quintas), para obter orientações sobre a violência doméstica, assim como receber instruções acerca do andamento do processo, sendo orientados também a respeito das MPU’s (Rodrigues, Nascimento e Viana, 2020, p. 13376).

É visto que o tribunal coloca suas atividades práticas de forma isenta, orientando tanto as mulheres quanto os homens, se preocupando com a equidade nos atendimentos, onde o profissional assistente social se encontra. No projeto Maria vai à escola verifica-se a preocupação em discutir a questão nas escolas públicas estaduais e municipais de Manaus, no qual,

A intervenção é feita pelos profissionais que atuam no Juizado, no qual os encontros duram aproximadamente duas horas em cada escola, neste período são realizadas rodas de conversa, apresentação em vídeos, distribuição de material didático, informativos, folders e cartilhas, para melhor entendimento dos alunos sobre a Lei Maria da Penha (Rodrigues, Nascimento e Viana, 2020, p. 13377).

Em virtude disto, verifica-se que o assistente social se articula em trabalhar em serviços direcionado às mulheres vítimas de violência, bem com os autores de violência doméstica, como orienta a Secretaria de Políticas para as Mulheres (2011, p.70) “a prática interdisciplinar é indispensável, devendo orientar se, prioritariamente, para atividades pedagógicas e educativas com o agressor, a partir de uma abordagem responsabilizante e de uma perspectiva feminista de gênero”.

Com isso, o profissional tende a buscar seguir com essa orientação, como exemplifica Jesus (2021), ao conduzir a entrevista no ano de 2021, com uma assistente social responsável pela equipe do 2º Juizado de Violência Doméstica em Manaus, onde demonstra a importância do trabalho da equipe psicossocial, onde atua o psicólogo e o assistente social. Nesta entrevista a assistente social afirma que o serviço sempre é articulado em rede e discorre o seguinte:

“nosso trabalho sempre vai estar alinhado com as políticas públicas de amparo e de proteção e a gente desenvolve nossos trabalhos específicos que são projetos. A instituição tem uma expectativa de produção, de atendimento dos processos, uma expectativa mais objetiva, claro que tem a questão humanitária, de responsabilidade social, a gente também observa que a instituição traz isso, bem forte, mas o serviço social vai recriar aquela demanda para propor ações não só para natureza punitiva, mas também de ressocialização, trabalhando com vítimas e agressores que pode se estender à família, pois nós queremos propor uma nova cultura” (Jesus, 2021, p. 77).

Através desta fala, pode-se identificar que a partir das normas e diretrizes, no qual o profissional precisa se basear, existe o estudo de todo um contexto do autor e dos familiares, e que a partir de estudos de casos, observações e relatórios técnicos é possível o profissional se adaptar e trabalhar com a demanda dos autores, não eximindo da punição da violência cometida, porém com a intenção de refletir a violência em um novo horizonte de ressocialização. 

De acordo com o Código de Ética do Assistente Social, dentre um dos deveres do profissional em seu artigo 5º, refere-se a respeitar às decisões dos usuários, independente dos pensamentos individuais de cada profissional, ou seja, para a eficácia do trabalho, o profissional tem que ser isento de preconceitos e achismos. Ciente disso, o viés não seria obrigar o autor a participar de forma leviana, como orienta SPM (2011, p. 69), “Não cabe ao serviço a realização de atividades referentes ao atendimento psicológico e jurídico dos agressores, à mediação, à terapia de casal e/ou terapia familiar e ao atendimento à mulher em situação de violência”, o trabalho é mediar técnicas de reflexão a perspectiva do homem e da mulher, da violência cometida, da punição, transparecer as legislações em favor das mulheres, com intuito de coibir a violência e respeitar os direitos de cada um.

O fazer dos profissionais além de demandar organização nos planos a seguir, se baseiam na junção de sua fundamentação teórica e da relação que ocorre na dinâmica que constrói a sociedade (Martins, 2015). Com isso, pode-se destacar, a importância do trabalho desta profissão, na frente de tamanhas demandas que surgem no decorrer do tempo, tendo em vista seu objetivo central a garantia e efetivação dos direitos, sendo por conseguinte colocada em prática nos centros de ressocialização estaduais promulgados na Lei nº 11.340/2006, bem como nesta especificação, os estado são autônomos em direcionar e organizar a forma de proceder, como visto nas legislações citadas no tópico 3.1, o Amazonas já se preocupa com essa questão, visto que o estado e o município se articulam para promover formas de refletir e coibir a violência contra a mulher em ações, que podem ser organizadas em práticas nos órgãos pelos assistentes sociais e outros profissionais , em trabalho multidisciplinar visando a atribuição e competência da profissão, bem como a regulamentação regida pela Lei nº 8.662/93,  seguindo com a especificação no  código de ética  e orientações  do próprio Conselho Federal de Assistência Social.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A historicidade da cultura patriarcal compreendida nesta pesquisa, foi na intenção de demonstrar os efeitos de sua existência, que no decorrer das transformações na estrutura da sociedade, se mostrou cada vez mais presente, dando ênfase a ideia de que a mulher deveria estar submissa aos deveres de casa e ao seu marido. E não só na esfera familiar, mas no âmbito social, como no meio de trabalho que ainda nos dias atuais é possível ver que essa cultura ainda é por conta do gênero.

Sendo assim, este artigo inicialmente trouxe reflexões direcionadas a diferenciação e inversões de papéis existentes na sociedade, desde muito tempo, demonstrando seu processo, até chegar na tentativa de coibir essa desigualdade através de legislações marcantes, como a Lei 11.340/2006, criada a partir da história de luta de Maria da Penha Maia Fernandes,  que tem como objetivo coibir a violência contra a mulher, através da criação de projetos que visem esta problemática que perpassa em todas as esferas sociais.

 Nesse sentido, foi abordado acerca de alguns entre vários mecanismos existentes para as mulheres, bem como sobre a existência de legislações voltadas para a criação de mecanismos que abrangem os homens autores da violência doméstica no Amazonas.

Entende-se que para ser possível tratar a problemática da violência com eficácia, precisa ser trabalhado os pontos da Lei Maria da Penha para os requeridos (chamados a responder processo penal), a partir de projetos e ações que sejam com o intuito de reeducar os autores, assim como coibir a violência doméstica com práticas voltadas por quem realmente chega às vias de fato, bem como objetivo de reeducar, refletir esmiuçar com eles as consequências determinadas por lei.

Ainda nesse viés, possibilitar palestras com ênfase nas políticas públicas, onde deve-se abordar não apenas a punição dos autores de Violência, mas também a prevenção da violência de gênero, com a historicidade de sua existência, demonstrando não só as consequências, mas dando ênfase no que fato fazer para diferenciar essa criação enraizada.

 Além disso, é necessário incluir a educação sobre igualdade de gênero nas escolas, em órgãos privados e públicos com o intuito não só de alcançar aos autores da violência, mas também orientar ao público jovem, no que se refere a igualdade de gênero, autonomia e educação. Para que esse público mais novo, por mais que tenham vivenciando em suas residências algum episódio de violência, a partir de incentivos e orientações assertivas, sejam futuros multiplicadores de informação, para um mundo que luta por igualdade.

Para além disso, no que se refere às mulheres em situação de violência doméstica e de gênero, é primordial o fortalecimento da rede de proteção às vítimas através da autonomia, o incentivo à denúncia de casos de violência e um acompanhamento multidisciplinar, com objetivo garantir a estas mulheres mais proteção e oportunidades.

Conclui-se, que há produções acadêmicas na temática, haja visto que existem pesquisas voltadas à essa questão, verifica-se que há políticas públicas direcionadas aos autores no Amazonas, na ocasião tanto o Estado como o município abrange essa preocupação em suas legislações, que podem ajudar a prevenir e combater a violência de gênero, onde a luta contra a violência requer o envolvimento de toda a sociedade, imprescindível  com os autores de violência, para que juntos possamos construir uma sociedade mais justa e igualitária.

Consequentemente, além da criação e efetivação é necessário fiscalizar se os serviços ofertados estão alcançando a maior parte do público feminino que está ou esteve em situação de violência, se as políticas estão tendo resultado na questão da reeducação dos autores, pois a estes devem ser oferecidos recursos para reinserção na sociedade, quebrando essa tolerância enraizada de somente punir.

Por conseguinte, a presente pesquisa permitiu conhecer as diferentes particularidades das contribuições do Assistente Social nas políticas públicas, através do entendimento utilizando seu arcabouço teórico e técnico profissional, onde pode atuar nos órgãos de execução das políticas públicas.


4 Como pode ser citado o caso de Raul Fernando do Amaral Street, conhecido como Doca Street, o homem que assassinou sua namorada Ângela Diniz a época, em meados de 1970, em virtude de a referida não querer mais continuar com o relacionamento (Pereira,2007).

5 Demonstrado pelo Instituto Maria da Penha, o ciclo  é composto pelas fases: 1º aumento da tensão (o agressor mostra-se tenso e irritado por coisas insignificantes, chegando a ter acessos de raiva); 2º ato de violência (toda a tensão acumulada na Fase 1 se materializa em violência verbal, física, psicológica, moral ou patrimonial) e 3º “lua de mel”, fase do arrependimento e comportamento carinhoso (esta fase se caracteriza pelo arrependimento do agressor, que se torna amável para conseguir a reconciliação). Disponível em: https://www.institutomariadapenha.org.br/violencia-domestica/cicloda-violencia.html.


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1Acadêmica do 8º período do curso de Serviço Social do Centro Universitário Fametro.

2Acadêmica do 8º período do curso de Serviço Social do Centro Universitário Fametro.

3Assistente Social e docente do Centro Universitário Fametro, possui mestrado em Serviço Social e Sustentabilidade na Amazônia pela Universidade Federal do Amazonas.