REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8000250
David Wallas de Souza Cunha;
Priscila Pinto Brandão de Araujo;
Carlos Eduarde Bezerra Pascoal;
José Onofre Alves Meira Rocha;
Fabíola Brasil Roberto;
Geórgia Coelho da Cunha.
RESUMO
A Classe II associada à sobremordida exagerada é causada por uma combinação de características esqueléticas, dentárias e neuromusculares que produzem uma quantidade excessiva de trespasse vertical e horizontal na região anterior dos maxilares. É considerada na maioria das vezes como uma má oclusão de difícil correção por gerar dificuldade na compreensão e diagnóstico, entretanto a mordida profunda deve ser o primeiro passo a ser corrigido para se prosseguir no tratamento da má oclusão de Classe II, principalmente quando ela não permite a colagem de acessórios no arco inferior. O presente trabalho tem como objetivo relatar um caso clínico de tratamento de Classe II com sobremordida exagerada, onde a conduta terapêutica escolhida foi a instalação de uma placa de levante fixa com botão de Nance anterior, que possibilitou a aceleração da montagem do aparelho fixo inferior, favorecendo o alinhamento dentário de ambas as arcadas logo no início do tratamento e a correção da sobremordida.
Palavras chave: Ortodontia Corretiva, Sobremordida, Classe II de Angle Divisão 1.
ABSTRACT
Class II associated with exaggerated overbite is caused by a combination of skeletal, dental and neuromuscular characteristics that produces an excessive amount of vertical and horizontal overlap in the anterior region of the jaws. It is considered most of the time as a malocclusion that is difficult to correct because it generates difficulty in understanding and diagnosis, however the deep bite should be the first step to be corrected to proceed with the treatment of Class II malocclusion, especially when it does not allow gluing accessories on the lower arch. The present work aims to report a clinical case of Class II treatment with exaggerated overbite, where the therapeutic approach chosen was the installation of a fixed lift plate with an anterior Nance button, which made it possible to accelerate the assembly of the lower fixed appliance, favoring the dental alignment of both arches at the beginning of the treatment and the correction of the overbite.
Keywords: Corrective Orthodontics, Overbite, Class II of Angle Division 1.
INTRODUÇÃO
A Classe II é definida como uma má oclusão em que a maxila e a mandíbula estão em uma posição incorreta por razões esqueléticas, dentárias ou associação de ambas. A Classe II dentária, consiste num retroposicionamento da mandíbula em relação à maxila, no qual todos os dentes inferiores ocluem distalmente originando uma acentuada desarmonia na região dos incisivos e das linhas faciais. Quando a má oclusão é de origem esquelética, verifica-se uma discrepância ântero-posterior refletindo a má relação entre a maxila e a mandíbula e além disso, esta é acompanhada por uma discrepância vertical, ou seja, a presença de um perfil facial curto ou alongado (BISHARA, 2006).
Pode ser classificada de 2 formas: Divisão 1 e 2. A divisão 1 é identificada quando os incisivos superiores estão vestibularizados, alongados e em lábioversão e pode ou não estar acompanhada de atresia maxilar. Já a divisão 2, é compreendida quando os incisivos centrais superiores estão verticalizados ou ligeiramente em línguoversão, enquanto os incisivos laterais se encontram vestibularizados ou inclinados para a mesial (BARBOSA, 2013), e geralmente vem associada a sobremordida apresentando curva de Spee acentuada no arco inferior e/ou curva reversa no arco superior (JANSON & PITHON, 2008).
Embora a sobremordida seja mais comum na divisão 2, é possível encontrar na literatura alguns relatos de casos de pacientes que apresentam má oclusão de Classe II, divisão 1 associada a mordida profunda, tratados com ortopedia e/ou ortodontia. Henriques et al., 1997, relata um caso tratado ortopedicamente com auxilio de aparelho extrabucal AEB. Brito et al., 2009 e Arruda et al., 2017, descreveram casos em que ambos realizaram o tratamento dessa má oclusão em duas fases, sendo utilizado primeiramente o aparelho extrabucal AEB e posteriormente aparelho ortodôntico fixo.
Nos casos de Classe II associada à mordida profunda, sabe-se que ela é uma má oclusão vertical que tem etiologia multifatorial, necessitando de um diagnóstico diferencial específico e bem elaborado. Esse tipo de má oclusão é na maioria das vezes a menos compreendida e a mais difícil de obter sucesso e estabilidade no tratamento (SILVA et al, 2014) podendo estar relacionada com a retrusão mandibular, desgaste de dentes posteriores, comprimento dos incisivos superiores e inferiores,
perda dentária posterior (MAIA et al, 2008), alterações na função de lábios e língua e de crescimento da mandíbula e/ou maxila (NIELSEN, 1991).
O tratamento da Classe II pode ser realizado sem extrações ou com extrações de dois pré-molares do arco superior, ou quatro pré-molares (dois superiores e dois inferiores) e podem apresentar excelentes resultados oclusais independente do Padrão facial e da relação maxilo-mandibular. Mas, na maioria dos casos, o sucesso do tratamento tem sido maior com extrações de dois pré-molares superiores (SIMÃO, 2011), nos casos de tratamentos sem extração, pode-se utilizar ancoragem extrabucal, aparelhos ortopédicos funcionais, elásticos de Classe II associados à aparelhos fixos ou, mais recentemente, os distalizadores intrabucais (JANSON et al., 2009), podendo ser tratada em uma única fase com aparelhagem fixa ou duas fases, com aparelho ortopédico e fixo (ARRUDA et al., 2017).
Moro & Santos (2017), sugerem como alternativa de tratamento para má oclusão de Classe II associada à mordida profunda, a extrusão de dentes posteriores, intrusão e inclinação de dentes anteriores, e para tal, existem várias mecânicas disponíveis para conseguir realizá-las com eficiência. Para Brito et al. (2009), tanto aparelhos ortopédicos como ortodônticos podem ser usados para o tratamento, sendo possível, caso seja necessário, a combinação de mais de um tipo de mecânica aplicadas ao mesmo tempo, devido à grande dificuldade no tratamento dessa má oclusão.
Essas alterações na oclusão podem comprometer a harmonia facial, com isso o tratamento ortodôntico tem sido uma importante ferramenta para a mudança e melhora da autoestima do paciente e a ressocialização (ARRUDA et al., 2017). A visão da aparência, principalmente da região da face, afeta psicologicamente as pessoas e o comportamento social também, com implicações significativas na vida afetiva bem como nas áreas da educação, profissional e social (GRABER & VANARSDALL, 2000).
O objetivo desse trabalho é apresentar o relato de caso clínico de um paciente portador de má oclusão de Classe II, divisão 1 e sobremordida exagerada, tratado com intrusão dos dentes anteriores inferiores e extrusão dos dentes posteriores através de um batente anterior/placa de levante de mordida, arcos de curva reversa, elásticos intermaxilares e/ou avanço de mandíbula com propulsor mandibular.
RELATO DE CASO
Paciente MFAS, braquifacial, 17 anos de idade, gênero masculino, sem histórico de doenças graves ou crônicas e sem traumatismo, boas condições de saúde geral e bucal, procurou o curso de Especialização em Ortodontia da Ceproeducar com a queixa principal de “aparência bicuda e dor ao fechar a boca, pois ficava machucando no céu da boca”.
Ao exame extraoral, paciente com perfil convexo, selamento labial, assimétrico, sem alterações na dicção e respiração, com terços faciais proporcionais (Figura 1 A-C).
Figura 1. Fotografias Extraorais: A) Perfil Direito, B) Frontal, C) Sorriso
No exame intraoral, a má oclusão observada foi de Classe II, divisão 1, leve apinhamento na região ântero-inferior, com alguns dentes levemente girovertidos em ambas as arcadas, curva de Spee acentuada no arco inferior com sobremordida exagerada, em MIH os incisivos inferiores tocam no palato, trespasse horizontal de aproximadamente 10mm e vertical de 9mm. A linha média dentária superior e inferior coincidente (Figura 2 A-E).
Figura 2. Fotografias Intraorais: A) Oclusão lado direito, B) Oclusão lado esquerdo, C) Oclusão frontal, D) Oclusal superior e E) Oclusal Inferior
Na radiografia panorâmica, constata-se a presença de todos os dentes permanentes, incluindo terceiros molares que estavam inclusos e raízes dos dentes sem alterações e/ou dilacerações que comprometesse o tratamento ortodôntico (Figura 3).
Figura 3. Radiografia Panorâmica Inicial
A Telerradiografia em norma lateral (figura 4) e a cefalograma (figura 5), evidenciam o padrão esquelético de Classe II com maxila bem posicionada em relação à base do crânio, mandíbula retruída em relação à base do crânio, incisivos superiores e inferiores projetados e protruídos, padrão de crescimento horizontal (tabela 1).
Figura 4. Telerradiografia Inicial Figura 5. Cefalograma
Tabela 1- Medidas Cefalométricas Iniciais
OBJETIVOS DO TRATAMENTO
Os objetivos do tratamento foram: 1) Realizar o alinhamento e nivelamento dentário, 2) Promover níveis de sobremordida e sobressaliência adequados, 3) Correção da chave de oclusão de canino e molar, 4) Reestabelecer a função mastigatória normal, 5) Promover estética facial.
PLANO DE TRATAMENTO
- Alinhamento e Nivelamento com Aparelho Fixo de prescrição Roth (slot 0,022”) com fios de NiTi do 0,012” ao 0,020’; fios de aço redondo 0,018” e 0,020”;
- Placa de levante de mordida com botão de Nance anterior;
- Intrusão dos incisivos inferiores com arco de curva reversa ou arco de ricketts;
- Extrusão dos pré-molares e molares inferiores;
- Arco retangular de aço 0,017”x0,025” e 0,019”x0,025” (finalizações);
- Propulsor mandibular e/ou Elásticos Intermaxilares para correção da Classe II e para Intercuspidação;
- Remoção do aparelho ortodôntico e Contenções Ortodônticas: Superior – Placa de Hawley (reavaliar no final do tratamento ortodôntico) e inferior 3×3 fixa.
TRATAMENTO E EVOLUÇÃO
Iniciamos os preparos para a confecção da placa de levante de mordida fixa com a seleção das bandas e soldagem dos tubos para os dentes 16 e 26, depois realizamos a moldagem de transferência e encaminhamos ao laboratório para a confecção da mesma (Figura 6).
Figura 7. Moldagem de Transferência
Em seguida realizamos a instalação da aparelhagem fixa superior (prescrição Roth, slot 0,022”, metálico) no arco superior, dando início à fase de alinhamento e nivelamento com os fios 0,012”, 0,014”, 0,016”, 0,018” e 0,020” de Níquel Titânio, seguida pelos fios de aço 0,018’ e 0,020” e finalizando com fios retangulares 0,017×0,025” e 0,019”x0,025” (figura 7).
Figura 7. Instalação de aparelho ortodôntico fixo (arco superior)
Após a confecção e instalação da placa de levante de mordida, aguardamos 30 dias para a instalação do aparelho inferior, liberando os dentes posteriores para a extrusão e auxiliando a intrusão dos dentes anteriores inferiores (figura 8 A-C).
Figura 8. Instalação da placa de levante de mordida: A) Placa para levante de mordida com botão de Nance anterior, B) Vista oclusal após a instalação, C) Vista frontal após a instalação.
O próximo passo, foi a instalação do aparelho fixo no arco inferior, nos primeiros molares (dentes 36 e 46) foram colados tubos e, iniciamos a fase de alinhamento e nivelamento da arcada inferior seguindo a mesma sequência de fios utilizado no arco superior, sendo os fios 014” e 016” (Níquel Titânio de Curva Reversa) para juntamente com a ação da placa de levante de mordida, realizar a intrusão dos dentes anteriores inferiores e extrusão dos dentes posteriores, fios 0,018” e 0,020” aço e fios retangular 0,017’x0,025’ e 0,019’x0,025” para finalizações (figura 9 A-C).
Figura 9. Instalação de aparelho ortodôntico fixo (arco inferior): A) Oclusão lateral direita, B) Oclusão lateral esquerda, C) Oclusão frontal
A placa para levante de mordida foi utilizada por um período de 7 meses onde após uma reavaliação, verificamos uma correção satisfatória da sobremordida e da curva de Spee, com a intrusão dos incisivos inferiores e extrusão dos dentes posteriores (figura 10 A-F).
FIGURA 10. Resultado após 3 meses de uso da Placa. Fotografias: A) Lateral Direita, B) Lateral Esquerda, C) Frontal e após 7 meses (placa removida). Fotografias: D) Lateral Direita, E) Lateral Esquerda e F) Frontal
Em seguida, iniciamos a mecânica com elásticos de Classe II para a correção do trespasse horizontal, utilizando elástico 3/16 médio por 30 dias (trocas diárias), 24h por dia, removendo-os apenas para alimentação e higienização. No mês seguinte, trocamos para o elástico 3/16 pesado, seguindo o mesmo protocolo.
FIGURA 11. Mecânica com elástico de Classe II para correção do trespasse horizontal. Fotografia: A) Lateral Direita, B) Lateral Esquerda, C) Frontal e D) Movimento de abertura.
Após aproximadamente 12 meses de tratamento o paciente encontra-se com bons resultados quanto à correção da sobremordida exagerada, curva de Spee, plano oclusal (Figura 12 A-I) e (Tabela 2).
Figura 12. Imagens comparativas (Iniciais e Finais): A) Perfil Direito, B) Frontal, C) Sorriso D) Oclusão lado direito, E) Oclusão lado esquerdo, F) Oclusão frontal, G) Radiografia Panorâmica, H) Telerradiografia e I) Cefalograma.
Tabela 2. Análise Cefalométrica Inicial e Parcial (paciente ainda está em tratamento)
Caso clínico realizado parcialmente em função da conclusão do curso. O paciente será encaminhado para dar continuidade ao tratamento com os alunos das turmas da especialização que se encontram em andamento.
DISCUSSÃO
Bishara (2006), Janson & Pithon (2008) e Barbosa (2013) concordam que a mordida profunda e overjet reduzido são mais frequentes em má oclusão de Classe II, divisão 2. Em 1970, Sassouni, descreveu que nesse tipo de má oclusão existe a possibilidade de apresentar sobremordida exagerada, em que a borda incisal encontra-se ocluindo no palato do paciente. O caso descrito mostra um paciente que apresenta má oclusão de Classe II, divisão 1, exatamente com os aspectos mencionados pelos autores acima, evidenciando assim, que essas características podem abranger as duas divisões.
A má oclusão de Classe II, principalmente associada à sobremordida exagerada, pode afetar a harmonia facial em vários graus, podendo comprometer a imagem e autoestima do paciente (MARTINS, 1997; ARRUDA et al., 2017; GRABER & VANARSDALL, 2000). A preocupação com a saúde e a estética facial e dentária se modifica de acordo com a idade e com as condições sociais e culturais (Stenvik et al., 1996). Isso justifica a queixa principal do paciente, que demonstrava incômodo com o seu perfil facial devido a retrusão mandibular e vestibularização dos incisivos superiores, onde ele se sentia com a aparência bicuda e sem queixo, levando-o à uma baixa autoestima.
A Classe II quando vem acompanhada de mordida profunda é sempre considerada uma má oclusão de difícil correção, no entanto deve ser o primeiro passo a ser resolvido para poder dar seguimento ao tratamento ortodôntico, principalmente quando ela dificulta a instalação do aparelho fixo inferior e acessórios (COGORNI et al., 2013) ou pode provocar uma colagem posicionando os braquetes mais para cervical provocando modificações no torque em aparelhos pré-ajustados e inflamações gengivais (JANSON & PITHON, 2008; SILVA et al., 2014). No referido caso, para acelerar a colagem da aparelhagem fixa inferior, utilizamos a placa de levante de mordida fixa afim de iniciarmos a mecânica de correção da curva de Spee e trespasse vertical, não necessitando de uma colagem mais cervical evitando alterar a angulação dos braquetes, porém ainda assim observamos hiperplasia gengival na região dos incisivos inferiores. Além disso, a placa dispõe de outras vantagens como: não necessidade da colaboração do paciente, fácil instalação e bom custo/benefício.
A sobremordida exagerada pode ser causada por vários fatores como a irrupção exagerada dos incisivos superiores e/ou inferiores, aumento do ângulo inter-incisal, altura do ramo mandibular, padrão facial e infraoclusão dos molares (OLIVEIRA et al., 2008; SILVA et al., 2014), perda dentária posterior, retrusão mandibular, desgaste de dentes posteriores, modificação nas funções de lábio e língua e crescimento da maxila e/ou mandíbula (NIELSEN, 1991, MAIA et al., 2008). No caso clínico apresentado, a causa da mordida profunda se dá pela deficiência mandibular e inclinação axial dos incisivos superiores que se encontravam vestibularizados.
Brito et al. (2009), sugere a extrusão de dentes posteriores como opção de tratamento, com aparelho extrabucal cervical, elásticos intermaxilares ou mecânicas extrusivas com o próprio aparelho fixo e fios com curva reversa. Pode-se usar também a placa com batente anterior e aparelhos funcionais que promovam desoclusão posterior. É indicado para pacientes braquifaciais onde o aumento da altura facial inferior, abertura do plano mandibular e aumento da convexidade facial são desejados (PINTO et al., 2004). Por outro lado, quando o paciente tem padrão dólicofacial ou face longa, a extrusão posterior é contra-indicada, pois poderia causar uma rotação horária da mandíbula, acarretando na piora do perfil e altura facial do paciente (LINDAUER et al., 2005). A extrusão dos dentes posteriores tem indicação para o tratamento do caso relatado devido à acentuada curva de Spee no arco inferior e tem padrão de crescimento horizontal, configurando um paciente braquifacial, além desse efeito melhorar o perfil e altura facial do paciente, concordando com Brito et al., 2009.
Outra opção de tratamento é realizando a intrusão de dentes anteriores superiores, que além de corrigir a sobremordida, o sorriso gengival e selamento labial, também proporciona melhora da estética facial em casos de pacientes com perfil de crescimento vertical (SILVA et al., 2014). No entanto, alguns autores atentam que para uma estética ideal, a relação entre incisivo superior e lábio superior necessita de 3 mm, ou seja, devem aparecer, apenas, 2-3mm de incisivo superior abaixo do lábio superior quando se encontram em sua posição normal de repouso (MOURA et al., 2008, SILVA et al., 2014). Nos casos que mostram esta relação ideal com a presença de mordida profunda, deve-se optar pela intrusão dos dentes anteriores inferiores através de placa de levante, bite guide, arcos de curva reversa,
arco base de Ricketts (PINTO et al., 2004; BRITO et al., 2009) ou arco segmentado (MAIA et al., 2008). A placa para levante de mordida associada ao arco de curva reversa demonstraram efeitos satisfatórios na intrusão dos incisivos inferiores que melhorou o relacionamento oclusal no paciente do caso relatado, corroborando com as indicações de Pinto, 2004 e Brito et al., 2009.
Brito et al. (2009), ainda cita que pode existir a necessidade da combinação de extrusão de dentes posteriores e intrusão de dentes anteriores e/ou correção da inclinação axial, podendo ser utilizadas forças mais simples. Isso irá depender das características clínicas e esqueléticas de cada paciente. No caso clínico apresentado, foi escolhido realizar o tratamento da mordida profunda com a combinação das duas mecânicas, além de corrigir a inclinação axial dos incisivos superiores, pois o paciente apresentava curva de Spee alterada no arco inferior, dois planos oclusais nos arcos superior e inferior, além de ser braquifacial, obedecendo as indicações desta mecânica de tratamento.
A placa de levante de mordida é o aparelho mais utilizado para a correção da sobremordida e seus principais efeitos são a extrusão dos dentes posteriores. E para acelerar esse movimento, pode-se ainda utilizar os elásticos intermaxilares na região posterior (PINTO et al., 2005), a intrusão dos incisivos inferiores, crescimento do osso alveolar na região posterior e aumento do terço inferior da face (LIMA et al., 2002). O bite guide é outra opção para se levantar a mordida. Este dispositivo é instalado na palatina dos incisivos centrais superiores, concentrando ali toda força de oclusão. A desvantagem desse acessório é que atrasa a instalação do aparelho inferior, uma vez que só pode ser utilizado quando o arco superior estiver alinhado e com o fio 0,019”x0,025” de aço inoxidável para evitar efeitos colaterais indesejáveis (COGORNI et al., 2013). Como pode ser visto no relato do caso, a instalação da placa de levante de mordida com botão de Nance logo no início do tratamento acelerou a fase de alinhamento e nivelamento em ambas as arcadas, assim como seus efeitos extrusivos e intrusivos auxiliaram na correção da mordida profunda satisfatoriamente, sendo removida após 7 meses de uso para dar início à mecânica com elásticos para a correção da Classe II. Isso justifica porque esse dispositivo se destaca na escolha para o tratamento da sobremordida, corroborando com os estudos de Pinto et al., 2005.
O protocolo de tratamento para Classe II varia de acordo com a idade e comprometimento estético-oclusal do paciente. Pode ser realizado com extração de dois pré-molares no arco superior ou quatro pré-molares, sendo 2 no arco superior e 2 no inferior (STRANG, 1950; CLEALL & BEGOLE, 1982). No entanto, a extração de apenas dois pré-molares superiores tem trazido resultados mais satisfatórios e menor tempo de tratamento, do que com extração de 4 pré-molares (BRAMBILLA, 2002; FREITAS et al., 2004; SIMÃO, 2011) ou sem extrações (JANSON & PITHON, 2008). Para o caso clínico relatado, optou-se pelo tratamento da Classe II de forma conservadora, sem realizar extrações, uma vez que essa mecânica tem ganhado cada vez mais espaço na Ortodontia de acordo com Janson et al., 2009.
Em casos tratados sem extração, a literatura menciona diversos aparelhos e mecânicas para o tratamento, no entanto, a eficácia de cada um depende da idade e maturidade esquelética do paciente (JAKOBSONE et al., 2013; MILLETT et al., 2012; Vu et al., 2012). Para os pacientes em fase de crescimento, a Ortopedia Facial se destaca com a utilização dos aparelhos ortopédicos funcionais (removíveis), como o Fränkel, o Bionator e outros (JANSON et al., 2009; FARIA et al., 2008; HENRIQUES et al., 1997) e o APM (Aparelho de Protrusão Mandibular), que é um aparelho ortopédico funcional fixo, podendo ser utilizado tanto na dentadura mista como na permanente segundo Costa & Suguino (2006). Após a fase de crescimento, as mecânicas visam primariamente a compensação dento-alveolar através de aparelho ortodôntico fixo associado à elásticos de Classe II (JANSON et al., 2013), distalizadores ou propulsor mandibular (PEREIRA et al., 2014). A terapêutica escolhida para a correção do trespasse horizontal do paciente deste caso foi a utilização de elásticos de Classe II, pois o paciente se mostrou colaborador desde o inicio do tratamento, tem resultados satisfatórios, custo/benefício vantajoso e é mais confortável do que os propulsores, corroborando com Pereira et al., 2014.
A época ideal para iniciar o tratamento da má oclusão de Classe II é um tema ainda hoje bastante controverso (CANÇADO et al., 2009). Bass (1983) relata que os melhores resultados e uma estabilidade maior, são alcançados quando o tratamento da Classe II é realizado em duas fases. Entretanto, essa afirmativa é motivo de frequente controvérsia, uma vez que a influência da fase ortopédica nos resultados clínicos finais é praticamente inexistente (KING et al, 2003). Cançado et al., 2009, realizaram um estudo retrospectivo com uma amostra de 139 pacientes, para
comparar resultados oclusais e a eficiência dos protocolos de tratamento em uma e duas fases, da má Oclusão de Classe II, onde concluiu que os tratamentos realizados em uma única fase têm resultados mais eficientes, discordando de Bass. No caso citado, o paciente está sendo tratado em uma única fase, uma vez que a idade do paciente, já na dentadura permanente, contra-indica o uso de aparelhos ortopédicos removíveis.
Pereira (2009) afirma que resultados satisfatórios e com longevidade na correção da Classe II com mordida profunda estão diretamente ligados a seleção adequada da mecânica a ser executada e de sua previsibilidade e destaca que por esse motivo, autores têm estudado e apresentado diferentes métodos para alcançá-lo.
CONCLUSÃO
O tratamento da Classe II associada a mordida profunda, com extrusão de dentes posteriores e intrusão de dentes anteriores inferiores associado ao uso de placa de levante de mordida com botão de Nance anterior, quando bem indicado, obtém o sucesso clínico intervindo de maneira positiva no tratamento, facilitando a instalação precoce do aparelho ortodôntico fixo no arco inferior e tornando a correção da curva de Spee mais rápida, corrigindo a mordida profunda e permitindo a evolução do tratamento para a fase de correção da Classe II com os elásticos intermaxilares.
Como pode ser observada nesse relato, a terapêutica foi efetiva e resultou na melhora do relacionamento oclusal, no entanto, a estética dentária e facial será melhor visualizada quando a Classe II for totalmente corrigida, mas o paciente já se mostra com a autoestima muito melhor.
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Pinto ADS. Pergunte a um Expert: Considerando-se que a sobremordida profunda pode também ser corrigida pela extrusão dos dentes posteriores, qual(is) a(s) mecânica(s) que o Sr. utiliza? R Clín Ortodon Dental Press, v. 3, n. 6, p. 9-16, 2005.
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David Wallas de Souza Cunha – Especialista em Ortodontia.
Priscila Pinto Brandão de Araujo – Doutora em Ortodontia.
Carlos Eduarde Bezerra Pascoal – Especilista em Ortodontia.
José Onofre Alves Meira Rocha – Especialista em Ortodontia.
Fabíola Brasil Roberto – Mestre em Ortodontia.
Geórgia Coelho da Cunha – Mestre em Ortodontia.