UM CASO DE TRANSTORNO DE PERSONALIDADE BORDERLINE ATENDIDO EM TERAPIA COMPORTAMENTAL DIALÉTICA 

A CASE OF BORDERLINE PERSONALITY DISORDER TREATED WITH DIALECTICAL BEHAVIOR THERAPY

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10.5281/zenodo.8350090


Bruna Furlan Gauer


Resumo: Este é um caso de Transtorno de Personalidade Borderline encaminhado para uma clínica escola de Terapia Cognitivo Comportamental em Porto Alegre/RS. O objetivo estabelecido foi abordar os sintomas apresentados pela paciente, assim como os impactos negativos em suas relações interpessoais. A análise desse caso reforça a suposição de que pacientes com transtorno de personalidade borderline se beneficiam da Terapia Comportamental Dialética. A particularidade dessa abordagem terapêutica está relacionada à sua ênfase em habilidades de regulação emocional e na melhoria da tolerância ao mal estar. 

Palavras-chave: terapia comportamental dialética; transtorno de personalidade borderline. 

A Case of Borderline Personality Disorder Treated with Dialectical Behavior Therapy

Abstract: This is a case of Borderline Personality Disorder referred to a Cognitive Behavioral Therapy school clinic in Porto Alegre/RS. The established objective was to address the symptoms presented by the patient, as well as the negative impacts on their interpersonal relationships. The analysis of this case reinforces the assumption that patients with Borderline Personality Disorder benefit from Dialectical Behavioral Therapy.The particularity particularity of this therapeutic approach is related to its emphasis on emotional regulation skills and improvement in distress tolerance. 

Key words: dialectical behavior therapy; borderline personality disorder. 

INTRODUÇÃO

A desregulação emocional está relacionada a dificuldade no gerenciamento adequado das emoções, gerando experiências emocionais intensas e instáveis. De acordo com a teoria biossocial proposta por Linehan (2015), a desregulação emocional é resultado da combinação entre a vulnerabilidade emocional e a incapacidade de regular as emoções, tendo origem tanto na predisposição biológica quanto na interação com o ambiente. Segundo essa mesma teoria, algumas pessoas nascem com um temperamento emocionalmente intenso, sensível e reativo, sendo mais vulneráveis à desregulação emocional. No entanto, um ambiente invalidante, ou seja, que não valida a expressão emocional da criança, gera um ciclo de desregulação emocional que contribui para o desenvolvimento do Transtorno de Personalidade Borderline. 

De acordo com o DSM-5 (2014), o Transtorno de Personalidade Borderline é caracterizado por padrões persistentes de instabilidade emocional, relacionamentos interpessoais conturbados, impulsividade e uma frágil autoimagem, sendo frequentemente encontrado em configurações clínicas devido à sua complexidade e impacto significativo na vida dos indivíduos afetados. Na clínica, os profissionais de saúde mental enfrentam o desafio de lidar com a intensidade emocional desses pacientes, ao mesmo tempo em que procuram fornecer um ambiente terapêutico seguro e estabilizador. 

Linehan (2015) descreve a Terapia Comportamental Dialética (DBT) como uma abordagem terapêutica cognitivo-comportamental que foi originalmente desenvolvida para tratar indivíduos diagnosticados com Transtorno de Personalidade Borderline e que apresentam comportamento suicida crônico. A DBT destacou-se como a primeira psicoterapia a demonstrar eficácia por meio de ensaios clínicos controlados com esses pacientes. Os profissionais de saúde mental que adotam a DBT na clínica têm como objetivo principal ajudar os pacientes a desenvolverem habilidades de regulação emocional, tolerância ao desconforto emocional e manejo de comportamentos impulsivos. 

Este trabalho descreve o relato de caso de uma paciente diagnosticada com Transtorno de Personalidade Borderline (TPB), que recebe atendimento em uma clínica escola de Terapia Cognitivo Comportamental, situada em Porto Alegre, no estado do Rio Grande do Sul. São exploradas considerações relevantes acerca do manejo do caso e também dos principais desafios encontrados no tratamento da paciente. 

Relato do Caso 

Identificação da paciente

Alana (nome fictício), 27 anos, branca, brasileira, solteira, é formada em fotografia e está cursando o primeiro semestre de psicologia. A paciente apresenta uma constituição física magra e possui um estilo alternativo, caracterizado por tatuagens e piercings discretos em diferentes partes do corpo. 

Demanda e sintomas apresentados 

A paciente procura atendimento com o objetivo de organizar sua vida em relação a possíveis sintomas de TDAH. Ela relata ter dificuldade em manter o foco e frequentemente se perde em tarefas, demonstrando sinais de desatenção. Essa falta de atenção é agravada pela ansiedade que ela enfrenta, afetando seu desempenho em atividades relacionadas à sua formação em fotografia e o início do curso de psicologia. Alana busca acolhimento e orientação para tomar decisões em relação ao seu futuro, pois sente uma falta de satisfação em tudo o que faz. Além disso, Alana expressa uma sensação de vazio emocional e se descreve como alguém incapaz, comparando-se a um bebê que ainda precisa ser cuidado. Ela busca emoções intensas e revela ter uma inclinação pelo caos, pois sente que esse turbilhão de sentimentos preenche sua vida de alguma forma. 

No contexto de um relacionamento passado, Alana vivenciou solidão e medo de perder sua identidade e capacidade de realizar suas atividades. Isso a levou a buscar comportamentos impulsivos, como dirigir sua moto embriagada, como forma de lidar com sua intensidade emocional e buscar uma sensação de liberdade. Além disso, Alana também faz uso diário de maconha como uma estratégia para lidar com o tédio e buscar uma sensação de prazer e entretenimento. No entanto, ela reconhece a necessidade de avaliar os impactos desse uso em sua vida e está ciente dos possíveis prejuízos que possam surgir. Essas experiências refletem a busca de Alana por uma fuga do vazio emocional que ela enfrenta. 

Resumo de história pregressa e atual 

A história pregressa e atual de Alana revela um contexto familiar marcado por dinâmicas complexas e desafios emocionais significativos. Durante sua infância e adolescência, Alana vivenciou a preocupação constante com a segurança de seu pai, que era alcoolista. Ela assumia o papel de cuidadora, dedicando-se a garantir a integridade da casa e de seu pai. Por outro lado, sua relação com a mãe, que é enfermeira e trabalhava fora, foi caracterizada por uma percepção de ausência e falta de reconhecimento. Alana sentia que sua mãe cuidava de todos, exceto dela, e frequentemente experimentava críticas e cobranças em relação às suas tarefas domésticas. 

Essa dinâmica familiar contribuiu para a formação de padrões de comportamento em Alana. Ela relata que criou o hábito de não realizar as tarefas de casa como uma forma de provocar brigas com sua mãe, buscando, assim, chamar sua atenção. A relação entre elas era intensa, com a mãe colocando suas próprias emoções acima das necessidades de Alana. A autoimagem de Alana é influenciada por essa dinâmica, ela se vê como a “filhinha da mamãe” e acredita que não seria capaz de sobreviver no mundo sem sua mãe. 

Embora a relação com a mãe ainda seja desafiadora, houve uma melhora parcial quando Alana passou a morar sozinha durante a pandemia. No entanto, ela ainda é financeiramente dependente. Alana vivencia uma dualidade de sentimentos, alternando entre a culpa por ter tido privilégios materiais sem ter aproveitado adequadamente e o apreço por ser mimada e ter uma vida confortável. Ela expressa a preferência por permanecer nessa situação e afirma que, se sua mãe falecer, ela também deseja morrer, ressaltando a profunda fusão emocional entre elas. 

Alana relata ter enfrentado desafios significativos durante sua fase escolar, onde se sentia excluída e sofria bullying por não se encaixar nos padrões das outras meninas. Ela se descreve como mais “moleca” e relata ter se sentido burra em relação ao sistema educacional. Durante esse período, Alana teve apenas um amigo próximo, com quem mantém contato até hoje. Esse amigo desempenhou um papel importante em sua vida, servindo como uma porta de entrada para conhecer outras pessoas devido à sua natureza comunicativa. 

No entanto, Alana expressa uma profunda sensação de que as pessoas nunca estiveram verdadeiramente presentes para ela, mas sim para seu amigo. Ela repete frequentemente a crença de que ninguém se importa com ela e que as pessoas sempre acabam partindo. Essa percepção alimenta seu medo de se comportar de maneira inadequada nas relações e de ser julgada. Ela relata dificuldades em saber como se portar ou o que dizer, o que afeta sua capacidade de estabelecer relações íntimas e duradouras. 

Observa-se em Alana a presença de um falso self, onde ela reprime sua espontaneidade e autenticidade por medo de ser julgada e abandonada. Essa autocensura impede que ela se relacione de maneira plena e autêntica com os outros. Atualmente, a vida de Alana é marcada por estudar online e passar a maior parte do tempo em casa, fazendo uso de maconha como uma forma de lidar com a solidão e as dificuldades de se relacionar. Essa dualidade entre solidão e dificuldade de intimidade é uma fonte constante de desafios em sua vida. 

Avaliação Diagnóstica e Plano Terapêutico 

1. Hipótese Diagnóstica: Transtorno de Personalidade Borderline. A paciente Alana apresenta uma série de sintomas que estão alinhados com os critérios para esse transtorno, conforme descrito na quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5, 2014). Alguns desses sintomas incluem: 

− Esforços frenéticos para evitar um abandono real ou imaginado: vive um constante temor de ser rejeitada e se sente pouco valorizada ou indesejada pelos outros. 

− Padrão de relacionamentos interpessoais instáveis e intensos: Existe uma oscilação entre o desejo intenso de conexão e a repulsa em relação a relacionamentos próximos, o que gera conflitos internos. 

− Perturbação da identidade: Alana apresenta uma falta de clareza em relação a sua identidade, autoimagem e objetivos na vida. 

− Impulsividade em áreas potencialmente prejudiciais: Alana recorre a comportamentos impulsivos, como o uso excessivo de álcool e drogas, como forma de lidar com suas emoções intensas. 

− Instabilidade afetiva devido a reatividade do humor: Alana apresenta uma reatividade emocional intensa, resultando em flutuações de humor significativas. Sua ansiedade frequente é uma manifestação desse padrão de instabilidade afetiva. 

− Sentimentos crônicos de vazio: Alana descreve uma sensação de vazio existencial, monotonia e solidão persistente. 

2. Plano terapêutico: 

− Estabelecimento de vínculo terapêutico. 

− Validação emocional. 

− Treinamento de habilidades: regulação emocional, tolerância ao mal-estar, relacionamento interpessoal, resolução de problemas, mindfulness e aceitação radical. 

− Construção de autonomia, autoestima e senso de identidade. 

− Estruturação da rotina e estabelecimento de metas realistas. 

− Monitoramento e prevenção de comportamentos de risco. 

Evolução da paciente 

Alana iniciou seu atendimento terapêutico de forma online, demonstrando pontualidade e presença nas sessões. No entanto, desde o início, era evidente um certo distanciamento emocional. Vindo de um histórico de atendimento na abordagem psicanalítica, Alana apresentava resistência aos questionamentos diretos da terapeuta. 

Em algumas ocasiões, expressou hostilidade através de comentários como “O que vai fazer quando terminar todas essas perguntas?”. A postura inicial da paciente evidenciou a importância de estabelecer uma aliança terapêutica sólida. Para isso, a terapeuta reconheceu a ocorrência da contratransferência e as emoções despertadas pela paciente. Por meio da supervisão clínica, pôde expressar e explorar seus próprios sentimentos em relação ao caso, o que permitiu compreender e tolerar o comportamento de Alana durante as sessões. Essa compreensão possibilitou que a terapeuta continuasse oferecendo a ela um ambiente terapêutico empático e acolhedor. Em um segundo momento, Alana optou por migrar para o atendimento presencial, o que se revelou como um marco significativo do seu processo terapêutico. O formato presencial contribuiu para um vínculo mais próximo e autêntico entre ela e a terapeuta, uma vez que estar frente a frente possibilitou a expressão e reflexão mais profunda de suas emoções. 

Mesmo com o progresso alcançado, houve momentos em que Alana ainda demonstrava resistência e fazia comentários hostis durante as sessões. Quando questionada sobre seus sentimentos, respondia automaticamente que não sabia. Diante da dificuldade de nomear as próprias emoções, disse à terapeuta “te falta habilidade de pegar no ar o que eu estou dizendo”. De acordo com as explicações de Linehan (2009), as pessoas com transtorno de personalidade borderline frequentemente enfrentam dificuldades em reconhecer suas próprias emoções. Isso ocorre principalmente devido à rápida alternância de diferentes emoções. 

A intensidade da emoção sentida por Alana faz com que ela tenha dificuldade na expressão das suas emoções, impedindo que ela compreenda plenamente o que está sentindo. Nesse momento, a terapeuta trouxe uma interpretação para a paciente: “Tenho a impressão de que diante de tantas emoções que você está experimentando, pode ser difícil para você compreendê-las ou expressá-las verbalmente. Parece que você gostaria que eu adivinhasse o que está acontecendo dentro de você, mas infelizmente não tenho essa capacidade. O que posso fazer é me conectar com você e te ajudar a explorar e compreender essas emoções. No entanto, para que isso aconteça, é importante que você também assuma essa responsabilidade junto comigo”. 

A partir dessa intervenção, Alana assumiu gradualmente a responsabilidade de expressar o que estava sentindo, mesmo que não conseguisse nomear exatamente as emoções. Dessa forma, a terapeuta conseguiu estabelecer um limite saudável com a paciente, delineando que não era possível adivinhar seus sentimentos, mas que estaria ali para apoiá-la e ajudá-la nesse processo. Essa clareza contribuiu para o desenvolvimento de uma parceria colaborativa entre ambas. 

A terapeuta se concentrou em validar as emoções trazidas pela paciente. Para isso, utilizou dos seis níveis de validação propostos por Linehan (2015): 

1. Prestar atenção: Demonstrou interesse genuíno em relação ao que Alana compartilhava. 

2. Refletir sem julgar: Repetia as palavras de Alana para assegurar que compreendia corretamente o que estava sendo dito, sem fazer julgamentos. 

3. Ler mentes: Era sensível ao que não era expresso verbalmente, observando também a expressão facial e a linguagem corporal de Alana. 

4. Comunicar compreensão das causas: Expressava como as emoções e comportamentos de Alana faziam sentido diante de sua história pessoal e das situações atuais. 

5. Reconhecer o válido: Comunicava que as emoções, pensamentos e ações de Alana eram respostas válidas diante das circunstâncias em que ela se encontrava. 

6. Demonstrar igualdade: Mantinha uma postura autêntica, tratando Alana como uma igual, sem vê-la como frágil, inferior ou incompetente. 

Ao longo do desenvolvimento do caso e com base nos dados obtidos, foi confirmado o diagnóstico de Transtorno de Personalidade Borderline. O diagnóstico foi estabelecido por meio da psicoeducação sobre o transtorno e dos sintomas relatados pela paciente. A confirmação do diagnóstico foi recebida de maneira positiva por Alana, pois trouxe clareza e compreensão sobre suas experiências e desafios emocionais. Esse processo de diagnóstico permitiu que a terapeuta direcionasse sua intervenção terapêutica de forma mais precisa e adaptada às necessidades específicas da paciente. 

Ao compreender mais profundamente o caso, notou-se que a desorganização e a falta de prazer não estavam necessariamente ligadas a um possível Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), como a paciente suspeitava. Em vez disso, esses desafios estavam diretamente associados ao diagnóstico de Transtorno de Personalidade Borderline. O sentimento crônico de vazio e tédio experimentado por Alana contribuía para a falta de perspectiva e prazer em sua vida. Para compensar essas emoções negativas, recorria ao uso abusivo de maconha como uma estratégia de enfrentamento. 

Com base nessa compreensão, foi essencial realizar a psicoeducação com Alana sobre como o uso abusivo de maconha poderia estar intensificando os sintomas do Transtorno de Personalidade Borderline (TPB) e prejudicando o processo terapêutico. A terapeuta explicou os possíveis efeitos da substância no equilíbrio emocional e ressaltou a importância de buscar alternativas saudáveis para lidar com as emoções intensas. Alana concordou que o uso excessivo estava trazendo prejuízos e demonstrou interesse em reduzi-lo, passando a fazer uso somente aos finais de semana e não mais diariamente. A paciente foi encaminhada para o acompanhamento psiquiátrico, onde recebeu o diagnóstico adicional de dependência química (CID F19.2) e iniciou tratamento com lítio e escitalopram como parte do tratamento adequado para a sua condição. 

O trabalho terapêutico passou a ser direcionado para ajudar Alana a desenvolver estratégias saudáveis para lidar com o tédio e o vazio que ela enfrentava. Nesse contexto, começou-se a trabalhar a habilidade de tolerância ao mal-estar, que envolve a capacidade de aceitar, de forma não crítica, tanto a si mesma quanto a situação atual. Foi enfatizado o aspecto de experimentar o atual estado emocional sem tentar modificá-lo, entendendo que a aceitação da realidade não implica necessariamente em aprová-la (Linehan, 2015). 

Foram utilizadas as principais técnicas de sobrevivência a crises, sendo a mais empregada a técnica do STOP: parar (Stop), recuar um passo (Take a step back), Observar e Proceder com mindfulness. Essa abordagem permitiu que Alana interrompesse o ciclo de impulsividade e reagisse de forma mais consciente diante das situações desafiadoras. Além disso, foram explorados os prós e contras de agir por impulso, avaliando as consequências positivas e negativas, com o intuito de promover uma maior autoconsciência em relação às suas escolhas. 

Um dos principais desafios enfrentados residia no fato de Alana não participar de atividades fora de casa, estudava online e tinha apenas um amigo próximo. Essa falta de envolvimento social intensificava o sentimento de solidão e desconexão em sua vida. A terapeuta e a paciente trabalharam juntas para encontrar estratégias alternativas para lidar com esses sentimentos. Alana começou então a praticar yoga e a andar de bicicleta como forma de cuidar de si mesma. Inicialmente, o foco foi ajudar Alana a manter essas atividades na sua rotina diária. Posteriormente, reconhecendo a importância do senso de pertencimento para a paciente, a terapeuta sugeriu que Alana buscasse atividades fora de casa. Assim, ela passou a frequentar aulas em grupo de pole dance e roller. 

Apesar de estar engajada em suas atividades, a paciente continuava se sentindo solitária e enfrentava dificuldade para se relacionar com as pessoas ao seu redor. Tornou-se evidente que sua principal dificuldade estava em conseguir se relacionar de maneira espontânea. Quando questionada sobre essa dificuldade, a paciente expressava não saber como se portar ou o que dizer, manifestando um medo intenso de parecer idiota ou desinteressante, o que alimentava sua preocupação de ser abandonada pelas pessoas. 

Ao explorar os pensamentos e emoções da paciente, foi identificada uma crença central significativa de inadequação, na qual ela internalizou a ideia de que sua essência, sua verdadeira identidade, é intrinsecamente errada ou inadequada: “Eu não posso ser quem eu sou porque quem eu sou é errado”. Essa crença é compreensível à luz da história de vida de Alana, na qual seus sentimentos foram frequentemente negligenciados em favor dos de sua mãe, sendo repetidamente criticada e sentindo-se rejeitada enquanto passava a maior parte do tempo sozinha com um pai alcoolista. Além disso, ela enfrentou situações de bullying durante a infância e adolescência na escola. Essas experiências acumuladas contribuíram para a formação de uma autoimagem negativa e a sensação de que ela precisa esconder sua verdadeira identidade para ser aceita. 

De acordo com Linehan (2015), a formação do senso de self de uma pessoa é resultado da percepção de si mesma e das reações dos outros diante de suas ações. Portanto, quando uma pessoa é constantemente criticada ou reprimida, como ocorreu com Alana, isso pode contribuir para um senso de self inadequado ou até mesmo ausente. A falta de um senso de identidade forte e a dificuldade em se expressar emocionalmente de forma espontânea dificultam o estabelecimento de relacionamentos saudáveis. Em função dessa realidade, um dos focos atuais do tratamento da paciente é promover a construção de um senso de identidade que favoreça uma maior autoestima e autonomia. 

Perspectivas futuras 

Atualmente, Alana continua em terapia, e uma das principais dificuldades enfrentadas é sua tendência a ser passiva diante das dificuldades. Nesse contexto, a terapeuta tem utilizado a técnica da moldagem para auxiliá-la. A moldagem envolve quebrar o comportamento desejado em pequenos passos e ensinar esses passos de forma sequencial. O objetivo é extrair comportamentos adaptativos de Alana, reforçando cada pequeno avanço em direção ao objetivo comportamental. Assim, a terapeuta identifica comportamentos específicos que deseja ver na paciente e reforça esses comportamentos conforme eles ocorrem (Linehan, 2010). 

Através da moldagem, Alana é incentivada a desenvolver gradualmente habilidades e superar sua passividade, dando passos em direção aos seus objetivos e construindo uma vida que vale a pena ser vivida. 

Na Terapia Comportamental Dialética (DBT), uma vida que vale a pena ser vivida consiste em encontrar um equilíbrio no caminho do meio. Isso envolve aprender a lidar com as emoções intensas e a desregulação emocional, ao mesmo tempo em que se busca o desenvolvimento de habilidades de regulação emocional e construção de relacionamentos saudáveis. É através desse equilíbrio que Alana está sendo encorajada a criar uma vida que seja satisfatória para ela, cultivando uma maior autoconsciência, resiliência emocional e bem-estar. 

CONCLUSÃO 

O reconhecimento da desregulação emocional como um fator significativo no sofrimento psicológico tem levado os profissionais a uma maior atenção a esses casos, buscando intervenções terapêuticas eficazes para ajudar os pacientes a desenvolverem habilidades de regulação emocional. 

Em resumo, o Transtorno de Personalidade Borderline apresenta desafios significativos na clínica, mas com o uso de abordagens terapêuticas adequadas, como a DBT, e uma equipe multidisciplinar, é possível fornecer suporte e tratamento eficazes para esses indivíduos, ajudando-os a alcançar uma maior estabilidade emocional e uma melhor qualidade de vida. “A terapia tem me ajudado a nomear minhas emoções, sabe? Tudo fica mais concreto e eu consigo enxergar uma Alana que eu ainda não conhecia”, disse Alana, em um recente feedback. Essa fala ressalta como a terapia comportamental dialética tem sido benéfica para ela, proporcionando uma melhor compreensão e clareza em relação às suas emoções. 

A partir do caso de Alana foi possível constatar a viabilidade do atendimento de pacientes com Transtorno de Personalidade Borderline por meio da Terapia Comportamental Dialética (DBT). No decorrer do tratamento, diversos objetivos foram alcançados, incluindo: 1) o diagnóstico e a psicoeducação de Alana sobre seu transtorno, fornecendo maior compreensão e recursos para lidar com suas dificuldades; 2) a elaboração das emoções que antes estavam confusas, permitindo que ela ganhasse clareza sobre seus sentimentos; 3) a compreensão de aspectos importantes da sua história de vida, contribuindo para um maior entendimento de si mesma e das suas necessidades. 

Através desse processo terapêutico, Alana agora tem uma perspectiva mais sólida para o futuro, estabelecendo metas e planos que a direcionam para uma vida mais gratificante e autêntica. Esses resultados demonstram a eficácia da DBT e a importância de adaptar os objetivos terapêuticos de acordo com as necessidades individuais de cada paciente. 

REFERÊNCIAS 

American Psychiatric Association (APA). (2014). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais – DSM 5. M. I. C. Nascimento (Ed.). Porto Alegre: Editora Artmed. 

Linehan, M. M. (2010). Terapia cognitivo comportamental para transtorno da personalidade Borderline: guia do terapeuta. Porto Alegre: Artmed. 

Linehan M. M., (2018a) (2015). Treinamento de Habilidades em DBT: Manual de Terapia Comportamental Dialética para o Paciente. 2ed. Porto Alegre: Artmed Editora SA. 

Linehan M. M., (2018b) (2015). Treinamento de Habilidades em DBT: Manual de Terapia Comportamental Dialética para o Terapeuta. 2ed. Porto Alegre: Artmed Editora SA