REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.12751584
Alexandra Lorenzi da Silva
Professor Doutor Marcelo Buzaglo Dantas
RESUMO
O presente trabalho dedica-se a explorar as múltiplas facetas da tutela do meio ambiente, englobando desde a sua proteção constitucional até as práticas da jurisdição constitucional ambiental, sublinhando a necessidade de uma abordagem abrangente que reconheça o meio ambiente como um bem de usufruto comum, fundamental para a sobrevivência e o bem-estar da coletividade. O debate sobre a legislação ambiental, embora extenso e complexo, destaca-se como um pilar vital na busca por um equilíbrio entre desenvolvimento e conservação, impondo ao Estado e à sociedade a responsabilidade compartilhada de proteger e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. O estudo evidenciou que, apesar dos avanços legislativos e da crescente conscientização sobre a importância da preservação ambiental, ainda existem lacunas significativas que demandam atenção. A percepção antropocêntrica predominante limita o escopo da proteção ambiental, enfatizando a necessidade de uma revisão conceitual que abrace uma visão mais integradora e ecocêntrica. Essa abordagem reconhece não apenas a interdependência entre os seres humanos e o meio ambiente, mas também a importância intrínseca das demais formas de vida e dos elementos naturais, independentemente de sua utilidade para a humanidade. A discussão sobre o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado ressalta a sua dualidade como um direito e dever, colocando em evidência o papel do Estado na implementação de políticas eficazes que assegurem a conservação ambiental enquanto promovem o desenvolvimento sustentável. A jurisprudência, por sua vez, desempenha um papel importante na concretização dessas políticas, garantindo a aplicabilidade das normas ambientais e o cumprimento das obrigações estabelecidas pela legislação.
Palavras-chave: Proteção constitucional ambiental. Jurisdição constitucional ambiental. Preservação ambiental.
ABSTRACT
This work is dedicated to exploring the multiple facets of environmental protection, ranging from its constitutional protection to the practices of environmental constitutional jurisdiction, highlighting the need for a comprehensive approach that recognizes the environment as a common good, fundamental for the survival and well-being of the community. The debate on environmental legislation, although extensive and complex, stands out as a vital pillar in the search for a balance between development and conservation, imposing on the State and society the shared responsibility of protecting and preserving the environment for present and future generations. The study showed that, despite legislative advances and growing awareness about the importance of environmental preservation, there are still significant gaps that demand attention. The predominant anthropocentric perception limits the scope of environmental protection, emphasizing the need for a conceptual review that embraces a more integrative and ecocentric vision. This approach recognizes not only the interdependence between human beings and the environment, but also the intrinsic importance of other forms of life and natural elements, regardless of their usefulness to humanity. The discussion on the fundamental right to an ecologically balanced environment highlights the duality of this as a right and duty, highlighting the role of the State in implementing effective policies that ensure environmental conservation while promoting sustainable development. Court precedent, in turn, plays an important role in implementing these policies, ensuring the applicability of environmental standards and compliance with obligations established by legislation.
Keywords: Constitutional environmental protection. Environmental constitutional jurisdiction. Environmental preservation.
1 INTRODUÇÃO
Na atualidade, a preocupação com a tutela do meio ambiente tem se intensificado, evidenciando a urgência de abordagens jurídicas que garantam a proteção e a conservação ambiental frente aos desafios impostos pelo desenvolvimento industrial e a exploração de recursos naturais. Nesse contexto, surge a questão problema deste trabalho: Como a proteção constitucional e a jurisdição constitucional ambiental podem efetivar a conservação do meio ambiente, considerando o equilíbrio necessário entre o desenvolvimento econômico e a sustentabilidade?
A hipótese central levantada propõe que a proteção constitucional do meio ambiente, aliada à atuação da jurisdição constitucional ambiental, representa um mecanismo eficaz na promoção de um desenvolvimento sustentável, capaz de assegurar a preservação dos recursos naturais para as presentes e futuras gerações. O objetivo geral deste estudo é analisar o papel da proteção constitucional e da jurisdição constitucional ambiental na tutela do meio ambiente, explorando suas potencialidades e limitações. Para alcançar tal objetivo, propõem-se os seguintes objetivos específicos: investigar o arcabouço jurídico constitucional voltado à proteção ambiental; examinar a atuação da jurisdição constitucional no enfrentamento das questões ambientais; e identificar as práticas jurídicas que contribuem para a efetivação do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
A justificativa para o desenvolvimento deste trabalho reside na crescente necessidade de se compreender as dimensões legais que envolvem a proteção ambiental, em face dos desafios impostos pelas mudanças climáticas e pela degradação dos recursos naturais. A relevância da temática é amplificada pela essencialidade do meio ambiente para a qualidade de vida humana e pela responsabilidade intergeracional de sua preservação.
Quanto à metodologia, este estudo adotará uma abordagem qualitativa, por meio da análise de legislação, doutrina e jurisprudência relacionadas à proteção constitucional do meio ambiente e à jurisdição constitucional ambiental. Será empregado um método dedutivo, partindo do marco teórico geral sobre os direitos ambientais para a análise específica das práticas jurídicas adotadas no Brasil. Este trabalho busca, portanto, contribuir para o debate acadêmico e jurídico acerca da tutela ambiental, destacando o papel fundamental da proteção constitucional e da jurisprudência na construção de uma sociedade mais sustentável e justa.
2 CONCEITO LEGAL DE MEIO AMBIENTE
A questão ambiental foi solidamente incorporada à legislação e obteve reconhecimento constitucional em decorrência da crescente interação no habitat natural global, consequência da atividade industrial e do crescimento demográfico. A definição legal de meio ambiente é importante por fornecer delineamentos mais precisos e por ser um ponto central em debates teóricos, além de definir claramente o objeto do Direito Ambiental. No contexto jurídico brasileiro, o meio ambiente é definido pela Lei 6.938/1981 (Política Nacional do Meio Ambiente) como o conjunto de condições, leis, influências e interações de natureza física, química e biológica, que suporta, hospeda e ordena a vida em todas as suas manifestações (Farias, 2021).
A Constituição Federal de 1988, no artigo 225, estabelece que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito comum, essencial para a saúde e qualidade de vida, impondo ao Poder Público e à sociedade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as gerações atuais e futuras. Essa norma ressalta o caráter patrimonial do meio ambiente e parte de uma visão que fundamenta a conceituação sobre o equilíbrio ecológico e a saúde de qualidade de vida (Brasil, 1988).
Marcelo Abelha Rodrigues (2002) enfatiza que a legislação ambiental deve proteger tanto os componentes bióticos quanto os abióticos, assim como as interações entre eles, a fim de preservar o meio ambiente equilibrado, que é vital para a conservação de todas as formas de vida. A identificação correta do meio ambiente ecologicamente equilibrado é fundamental, pois ele é considerado um bem autônomo e legalmente protegido, de usufruto comum. Assim, danos ao meio ambiente representam um ataque a esse equilíbrio e qualquer reparação deve considerar a restauração dessa harmonia.
O debate central gira em torno da percepção antropocêntrica arraigada no pensamento ocidental que atribui valor ao mundo natural, principalmente na medida em que ele serve aos interesses humanos. Marcelo Abelha (2002) argumenta que há uma preocupação patente do legislador com o ser humano no momento da definição de atividade poluidora. Tal definição, de cunho antropocêntrico, considera como poluente qualquer ação que possa afetar o bem-estar, a segurança e as atividades socioeconômicas da população. Essa definição coloca em relevo o propósito finalístico de proteger o meio ambiente visando a preservação da vida humana, reservando a proteção ambiental a um cenário artificialmente construído, numa perspectiva inegavelmente antropocêntrica.
Observa-se, contudo, que tanto a Lei 6.938/1981 quanto a Lei Maior falham em reconhecer que o ser humano, seja como indivíduo ou como coletividade, constitui uma parte inseparável do mundo natural. Essa lacuna legislativa pode levar ao equívoco de considerar o ambiente algo separado e externo à sociedade, confundindo-o com seus elementos físicos, bióticos e abióticos, bem como com recursos naturais e ecossistemas. Esse erro conceitual perpetuou-se, propagando-se para as Constituições Estaduais e, subsequentemente, para as Leis Orgânicas de muitos municípios, uma falha que merece ser corrigida. Assim, a legislação ambiental foi concebida com o objetivo específico de servir como ferramenta para atender às necessidades sociais. Contudo, a redação das leis nem sempre é capaz de capturar definições e distinções rigorosas. Esse parece ser o caso na atual conceituação de meio ambiente que está sendo discutida.
É fundamental que as prescrições legais sejam respeitadas e observadas, mas incumbe ao Poder Público e à sociedade gerir o meio ambiente dentro do espírito da lei, transcendendo a letra da legislação e sondando seu contexto histórico. Especificamente no caso da legislação brasileira, que tem sido alvo de várias considerações, destaca-se a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente. Tanto ela quanto as disposições constitucionais pertinentes foram elaboradas em uma época em que a preocupação com a qualidade e a quantidade dos recursos naturais era preeminente. No entanto, a evolução do conceito de meio ambiente em termos científicos, filosóficos e sociais não alcançou a maturidade esperada até o final dos anos 90, ou seja, no término do século XX (Milaré, 2021).
O paradigma antropocêntrico subjacente à legislação é criticado por restringir a titularidade de direitos e obrigações unicamente aos seres humanos. Na definição jurídica de um evento, as demais entidades naturais, tanto vivas quanto não vivas, são consideradas em relação ao ser humano. Dessa forma, o ambiente natural, reconhecido como patrimônio da comunidade e sob proteção legal e administrativa, também é visto como merecedor do cuidado social. A jurisprudência não concede, nem poderia conceder autonomia às entidades não racionais, no entanto, ocupa-se de sua proteção e da administração de suas condições favoráveis e uso adequado. Assim, indiretamente, legisla sobre a salvaguarda do planeta Terra.
A legislação vigente aplica-se, portanto, aos “direitos” dos outros seres, particularmente os vivos, com o intuito de assegurar a harmonia e a coexistência pacífica no âmbito planetário. Além disso, o conhecimento jurídico deve ser informado e enriquecido por outras áreas de conhecimento para promover o respeito à natureza e limitar comportamentos antropocêntricos prejudiciais ao equilíbrio ecológico. A concepção de meio ambiente expressa na Lei 6.938/1981 destaca as intenções específicas desse instrumento legal sem interferir em outros propósitos ou interpretações filosóficas ou científicas (Brasil, 1981).
O artigo 3º da referida lei define o meio ambiente da seguinte forma:
Art 3º – Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por: I – meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas; II – degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das características do meio ambiente; III – poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos; IV – poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental; V – recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora (Brasil, 1981).
Esse amplo escopo de aplicação reconhecido pela legislação brasileira abre espaço para uma discussão mais aprofundada sobre os limites e possibilidades da proteção ambiental dentro do marco legal. A abrangência do conceito de meio ambiente adotado pelo Brasil, ao incluir a complexidade das relações entre os seres vivos e o ambiente físico, químico e biológico, oferece uma base sólida para a construção de políticas públicas e práticas de gestão ambiental que sejam ao mesmo tempo inclusivas e eficazes. A evolução do conceito legal de meio ambiente, contudo, não deve estagnar na compreensão atual.
Em face dos desafios emergentes, como as mudanças climáticas, a perda de biodiversidade, a poluição em escala global e os problemas socioambientais decorrentes da exploração desenfreada de recursos naturais, torna-se imperativo revisitar e, possivelmente, expandir essa definição. Isso pode incluir a incorporação de conceitos mais recentes da ecologia, economia ecológica e da justiça ambiental, promovendo uma visão que reconheça não apenas a interdependência entre seres humanos e natureza, mas também a indispensabilidade de uma gestão que priorize a sustentabilidade e a resiliência ecológica. Além disso, a participação ativa da sociedade civil na formulação, implementação e monitoramento de políticas ambientais é fundamental.
A democratização do acesso à informação ambiental, a educação para a sustentabilidade e a inclusão social e econômica são aspectos que devem ser fortalecidos na legislação ambiental, possibilitando uma atuação mais consciente e responsável de todos os segmentos da sociedade. Outro ponto de relevância é a integração do Direito Ambiental com outras áreas do direito, como o Direito Econômico, o Direito Urbanístico e o Direito Internacional, para garantir uma abordagem ampla e efetiva na proteção do meio ambiente.
A interdisciplinaridade é chave para entender as nuances do meio ambiente e para a construção de um direito ambiental que seja capaz de responder às complexidades dos problemas atuais. Por fim, o desafio do Direito Ambiental brasileiro e global é adaptar-se continuamente às novas realidades e aos novos conhecimentos sobre o meio ambiente, garantindo que a proteção legal esteja em harmonia com a necessidade urgente de preservar a vida na Terra para as presentes e futuras gerações. Isso implica reconhecer a importância de uma ética ambiental que transcenda o antropocentrismo, valorizando todas as formas de vida e a integridade dos ecossistemas como essenciais para a sustentabilidade do planeta.
3 IMPORTÂNCIA DO DIREITO INTERNACIONAL DO MEIO AMBIENTE
A conscientização crescente de uma parcela significativa da humanidade sobre a fragilidade e o perigo que nosso planeta enfrenta destaca-se como um dos fenômenos mais marcantes das últimas décadas. Tal perigo advém primordialmente do acelerado desequilíbrio ecológico, provocado em grande medida pelas atividades humanas. Indubitavelmente, a crise ambiental representa um dos sintomas mais alarmantes da crise de civilização que assola nosso mundo, antecipando um possível novo capítulo na história da humanidade. A parcela mais abastada da população, que notoriamente tem sido a força motriz da História, adota critérios predominantemente quantitativos em seu modo de vida (Antunes, 2020).
A incessante busca pela produção e a veneração pelo consumo constituem duas faces da mesma moeda, resultando em uma industrialização desregrada que, após mais de dois séculos de exploração dos recursos naturais como se fossem inesgotáveis e sem a devida atenção às consequências residuais (ou seja, os resíduos gerados pela produção e consumo), culmina na degradação ambiental do nosso planeta. Desde a década de 1960, os valores anteriormente incontestáveis nas sociedades industrializadas, tanto socialistas quanto capitalistas, começaram a ser cada vez mais questionados. Após satisfazerem suas necessidades básicas – alimentação, vestuário, habitação, saúde, educação – e adentrarem em uma era de abundância, essas sociedades começaram a valorizar um aspecto ainda mais importante: a qualidade de vida (Neto, 2019).
Após várias décadas do início da conscientização sobre os perigos enfrentados pelo meio ambiente, são dignos de nota o súbito surgimento e a expansão global do movimento ecológico e a sua rápida integração à pauta internacional. A influência do grupo de pressão em prol da conservação ambiental foi notável, uma vez que sua base não era simplesmente uma tendência passageira promovida por indivíduos descontentes em sociedades desenvolvidas, mas sim um reflexo das demandas de uma classe média bem-informada, que entrava em conflito com poderosos interesses econômicos.
Essa conscientização levou os governos a responderem ao apelo e a implementarem ações legislativas e executivas com o intuito de atender a essas exigências por uma qualidade de vida melhor. É interessante observar que a conscientização acerca dos problemas ambientais gerou uma onda de solidariedade sem precedentes. Enquanto atualmente a degradação ambiental é reconhecida como uma questão que impacta toda a humanidade, na década de 1960 esse tema ainda era pouco explorado. Pela primeira vez, a comunidade internacional começou a agir como uma verdadeira ‘comunidade internacional’ no sentido sociológico, ou seja, compartilhando uma identidade comum de propósitos e ideais, especialmente no que se refere à preservação da natureza, não mais motivada por razões estéticas, econômicas ou antropocêntricas, mas sim com o objetivo de proteger a integridade de todos os seres vivos diante do risco real de extinção (Neto, 2019).
O debate em torno das mudanças climáticas tem ganhado destaque nos fóruns internacionais, especialmente naqueles promovidos pelas Nações Unidas, onde o consenso sobre a necessidade de uma ação conjunta e imediata para enfrentar esse desafio global se fortalece. Esse cenário emergencial coloca em relevo a responsabilidade compartilhada entre os países, independentemente de seu nível de desenvolvimento ou riqueza. A adoção de políticas ambientais sustentáveis não é apenas uma opção, mas uma exigência para assegurar a saúde do planeta. Dessa forma,
O avanço das mudanças climáticas está inserido nas preocupações das Nações Unidas e exigem medidas urgentes por parte de todos os Estados que integram a Comunidade internacional. O tema da sustentabilidade ambiental está presente nos tratados de Direito Ambiental Internacional aprovados sob os auspícios da ONU. Trata-se de uma questão que envolve o compromisso ético de manter a qualidade ambiental e de legar para as gerações futuras o acesso a um ambiente hígido, o que impõe às atuais gerações adotar um padrão de segurança ambiental e medidas para proteger o meio ambiente – que é direito fundamental difuso, a todos pertencente indivisivelmente. As mudanças climáticas são resultado da acumulação de Gases de Efeito Estufa (GEE) na atmosfera, tais como gás carbônico, metano, hidróxido de enxofre, dentre outros, emitidos, por atividades humanas, sobretudo pelas atividades industriais, pelas atividades pecuárias no mundo todo (Sbaraine et al., 2023, s.p).
O tema da sustentabilidade ambiental está presente nos tratados de Direito Ambiental Internacional aprovados sob o comando da ONU. Trata-se de uma questão que envolve o compromisso ético de manter a qualidade ambiental e de assegurar para as gerações futuras o acesso a um ambiente saudável, o que impõe à atual sociedade adotar um padrão de segurança ambiental e medidas para proteger o meio ambiente – que é direito fundamental difuso, a todos pertencente indivisivelmente. A complexidade das mudanças climáticas exige uma resposta multifacetada que aborde não apenas a redução dos gases de efeito estufa mas também a adaptação às novas realidades climáticas. Políticas voltadas para a economia verde, energias renováveis, eficiência energética e práticas agrícolas sustentáveis são fundamentais para mitigar os efeitos adversos e caminhar em direção a um futuro mais seguro e sustentável para todos.
Outrossim, existe agora um entendimento de que os componentes do meio ambiente, como a atmosfera, as águas doces, os oceanos e as diversas formas de vida, são interdependentes e que a poluição não reconhece fronteiras políticas ou geográficas, pois questões como a contaminação radioativa, por exemplo, podem afetar múltiplos continentes. Desde a década de 1960, os Estados têm enfrentado dilemas complexos: deveriam favorecer a produção industrial com custos econômicos menores à custa do meio ambiente ou deveriam aumentar esses custos para preservá-lo? Essa situação os colocou perante o desafio de decidir entre tornar suas indústrias menos competitivas devido a regulamentos ambientais mais rigorosos, arriscando-se a perder fábricas e receita fiscal em virtude de migrações para jurisdições com legislações mais lenientes, ou permitir o aumento da poluição.
A importância do direito internacional do meio ambiente se insere justamente nesse contexto de dilemas e desafios que transcendem as fronteiras nacionais, exigindo uma cooperação global para enfrentar a crise ecológica. Diante da natureza global dos problemas ambientais, nenhum país pode resolver sozinho questões como a mudança climática, a perda de biodiversidade, a degradação do solo e a poluição dos oceanos. Isso torna o direito internacional do meio ambiente um campo vital para a coordenação de esforços e a implementação de soluções compartilhadas. Os tratados internacionais sobre o meio ambiente, como o Acordo de Paris sobre mudança climática, a Convenção sobre a Diversidade Biológica e a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, exemplificam como a comunidade internacional pode se unir para estabelecer metas e compromissos comuns.
Através desses instrumentos, os países concordam em adotar práticas que visem a mitigação dos impactos ambientais negativos e a promoção do desenvolvimento sustentável. Adicionalmente, o direito internacional do meio ambiente oferece mecanismos para a resolução de disputas que possam surgir entre os Estados no que diz respeito à implementação e interpretação de compromissos ambientais, além de estabelecer sistemas de monitoramento e relatórios para assegurar a transparência e o cumprimento dos acordos. Esses mecanismos são fundamentais para construir confiança mútua entre as nações e garantir que as ações prometidas sejam efetivamente realizadas.
Entretanto, a eficácia do direito internacional do meio ambiente depende da vontade política dos Estados para implementar as disposições dos tratados internacionais em suas legislações nacionais, assim como da capacidade destes em mobilizar recursos para a ação ambiental. A cooperação internacional é igualmente essencial para apoiar os países em desenvolvimento, que muitas vezes enfrentam maiores desafios para cumprir com os padrões ambientais internacionais devido a limitações econômicas. Por fim, a sociedade civil desempenha um papel essencial no direito internacional do meio ambiente, tanto na pressão sobre os governos para a adoção de políticas ambientais mais robustas quanto na fiscalização do cumprimento dos compromissos assumidos.
Organizações não governamentais, grupos de ativistas e cidadãos engajados contribuem significativamente para a conscientização sobre os problemas ambientais e para a mobilização de esforços coletivos na busca de soluções sustentáveis. Em resumo, o direito internacional do meio ambiente é uma ferramenta indispensável na luta contra a degradação ambiental global, promovendo a cooperação entre os Estados, o engajamento da sociedade civil e o desenvolvimento de políticas e práticas sustentáveis que asseguram a proteção do planeta para as gerações presentes e futuras.
4 DIREITO FUNDAMENTAL AO MEIO AMBIENTE: PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE COMO TAREFA DO ESTADO
A concepção do meio ambiente como um objetivo estatal sugere a imposição de obrigações jurídicas ao Estado e às autoridades públicas. A decisão sobre a proteção ambiental não é facultativa ao poder estatal, visto que é uma exigência constitucional. Essa exigência inclui, por exemplo, a possibilidade de solicitação de um mandado de injunção ambiental, caso haja omissão estatal na criação de normativas essenciais à salvaguarda do ambiente enquanto bem constitucional (Trennepohl; Farias, 2019).
A garantia fundamental ao ambiente, conforme estipulado no artigo 225 da Constituição Federal, demanda que o meio ambiente seja reconhecido como um bem jurídico independente, sem que sua proteção seja diluída na defesa de outros direitos constitucionais de relevância. Assim, direitos fundamentais que possuem relevância ambiental, tais como a vida, a integridade física, a propriedade e a saúde, muitas vezes não alcançam uma proteção específica e abrangente. Embora a inclusão da proteção ambiental como uma responsabilidade dos poderes públicos no texto constitucional possa atribuir deveres ecológicos ao Estado, essa medida não se mostra suficientemente eficaz para delinear um marco normativo que assegure direitos individuais subjetivos relacionados ao meio ambiente (Canotilho, 2004).
A concepção do direito a um ambiente ecologicamente equilibrado como uma prerrogativa subjetiva pode ser delineada em duas dimensões principais: a) os direitos ambientais procedimentais, que englobam o acesso à informação, a participação na tomada de decisões e a capacidade de buscar reparação judicial, exemplificada pela via da ação popular, conforme estabelecido no artigo 5º, LXXIII, da Constituição Federal; b) o direito à preservação ambiental, que subentende o dever estatal de mitigar ameaças ao meio ambiente, visando salvaguardar direitos fundamentais intrinsecamente ligados, tais como o direito à vida e à saúde (Canotilho, 2004).
A atuação do Ministério Público na esfera civil e em processos de ação pública é essencial para o funcionamento da democracia, permitindo soluções tanto no âmbito administrativo quanto judicial para a proteção de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos. A responsabilidade pela condução do inquérito civil reside essencialmente na atuação do Ministério Público, que deve coletar provas de autoria e materialidade para que o Promotor de Justiça possa, se apropriado, instaurar uma ação civil pública de maneira objetiva e fundamentada, sem influências políticas ou ideológicas. É imperativo que o Ministério Público finalize o inquérito civil em um período justificado e racional, evitando qualquer extensão arbitrária que possa prejudicar os investigados. É necessário que o inquérito civil permita o contraditório, uma garantia constitucional, assegurando a participação dos envolvidos em todos os procedimentos, incluindo a coleta de provas e perícias (Trennepohl; Farias, 2019).
Na ausência de provas suficientes para estabelecer autoria ou materialidade, o inquérito civil deve ser arquivado, visto que sua existência prévia serve justamente para a coleta desses elementos. A instauração de uma ação civil pública sem tais elementos pode resultar em um constrangimento ilegal, passível de correção pelos meios constitucionais, como o mandado de segurança. Sob a ótica da garantia constitucional de isonomia e considerando o CPC de 2015, aquele que for derrotado em uma ação civil pública deve arcar com as despesas processuais, incluindo custas e honorários advocatícios, de acordo com o estabelecido no art. 85 do CPC. É viável também a sanção por litigância de má-fé, aplicável inclusive ao Ministério Público, que tem o dever constitucional de exercer a ação civil pública de maneira responsável e desvinculada de posicionamentos político-ideológicos (Brasil, 2015).
A execução de sentenças provenientes de ações civis públicas, assim como a execução por título extrajudicial em questões de direito difuso, coletivo ou individual homogêneo, estão sujeitas às normas de sucumbência. No exercício da ação civil pública, o ordenamento jurídico brasileiro confere ao Ministério Público Federal e Estadual, cada um em sua respectiva esfera de competência, a prerrogativa institucional para a instauração da ação.
Além disso, entidades expressamente nomeadas pelo art. 82 do CDC e pelo art. 5º da Lei de Ação Civil Pública, como associações civis, sindicatos, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), autarquias e órgãos públicos como o Banco Central do Brasil, CADE, CETESB, podem iniciar ações civis públicas. Isso se aplica também a entidades governamentais (União Federal, governos estaduais e municipais), operando no âmbito da administração descentralizada. Uma ação civil pública, por ser de interesse social, legitima o Ministério Público a promovê-la, independentemente do direito material em discussão, seja ele difuso, coletivo ou individual homogêneo. Portanto, o Ministério Público tem sempre a prerrogativa para iniciar a ação civil pública na defesa desses direitos (Trennepohl; Farias, 2019).
A implementação equilibrada dos mecanismos jurídicos extraordinários destinados à proteção ambiental é essencial para preservar os valores ambientais sem cair nos excessos do denominado ‘fundamentalismo ambientalista’. Essas ações integram o objetivo da Constituição Federal e o compromisso com a preservação dos valores ambientais, ecológicos e do Estado de Direito Ambiental.
O conceito de bem ambiental é delineado pelo caput do artigo 225 da Constituição Federal, enfatizando sua função como um ativo comum e fundamental para a qualidade de vida da população. Observa-se que a natureza do bem ambiental é difusa, podendo ser tangível ou intangível, e caracteriza-se pela indefinição de seus titulares, bem como pela sua utilização como meio para estabelecer relações jurídicas pertinentes à esfera ambiental. Dada a sua classificação como difuso, o bem ambiental é reconhecido como uma nova categoria de bens, posicionando-se ao lado dos bens públicos e dos bens privados. Sob a denominação de ‘bem de uso comum do povo’, conforme disposto no artigo 225, caput, da Constituição Federal, o estatuto legal do bem ambiental é identificado como de direito público subjetivo (Brasil, 1988).
A garantia fundamental ao ambiente demanda que o meio ambiente seja reconhecido como um bem jurídico independente, cuja proteção não deve ser diluída na defesa de outros direitos constitucionais. Direitos fundamentais com relevância ambiental, como a vida, a integridade física, a propriedade e a saúde, muitas vezes não alcançam uma proteção específica e abrangente. A inclusão da proteção ambiental como uma responsabilidade dos poderes públicos na Constituição pode atribuir deveres ecológicos ao Estado, mas essa medida por si só não é suficientemente eficaz para delinear um marco normativo que assegure direitos individuais subjetivos relacionados ao meio ambiente.
A concepção do direito a um ambiente ecologicamente equilibrado como uma prerrogativa subjetiva se manifesta através dos direitos ambientais procedimentais, que englobam o acesso à informação, a participação na tomada de decisões e a capacidade de buscar reparação judicial. O direito à preservação ambiental subentende o dever estatal de mitigar ameaças ao meio ambiente, visando salvaguardar direitos fundamentais intrinsecamente ligados a ele, como o direito à vida e à saúde.
5 JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL
A execução das funções constitucionais, tanto legislativas quanto executivas, no âmbito ambiental, ao observar as delimitações político-legais de cada entidade federativa, deve visar à concretização da meta constitucional delineada no artigo 225 da Constituição Federal de 1988. Isso inclui a implementação de um dever de cooperação intergovernamental para a eficácia dos encargos de conservação ambiental. Tal abordagem demanda que as competências constitucionais voltadas ao meio ambiente sejam adaptadas ao princípio da subsidiariedade. Este, embora não explicitado, é inerente ao nosso arcabouço constitucional e fomenta a descentralização do espectro de competências, além de ampliar a autonomia das entidades federativas de menor escala (ou mais distantes do centro de poder) sempre que isso resulte no reforço dos instrumentos de salvaguarda ambiental e dos mecanismos de engajamento político, com base no marco do federalismo cooperativo ecológico inscrito na Constituição (Brasil, 1988).
A Lei Complementar 140/2011, que regulamenta a competência executiva em assuntos ambientais, conforme estabelecido no artigo 24, incisos VI, VII e VIII, da Constituição Federal de 1988, estipula em seu artigo 3º os objetivos essenciais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios como: a proteção, defesa e conservação do meio ambiente, assegurando uma gestão que seja ao mesmo tempo descentralizada, democrática e eficaz (inciso I); o asseguramento de um desenvolvimento socioeconômico equilibrado com a proteção ambiental, levando em consideração a dignidade humana, a erradicação da pobreza e a atenuação das disparidades sociais e regionais (inciso II); a coordenação de políticas e ações administrativas para prevenir sobreposições e conflitos entre diferentes níveis de governo, garantindo uma administração eficiente (inciso III); e a garantia de consistência na política ambiental em todo o território nacional, respeitando-se as particularidades regionais e locais (inciso IV).
Nesse contexto, destaca-se a importância basilar de uma atuação conjunta e articulada entre os poderes Executivo e Legislativo na formulação e implementação de políticas públicas voltadas à proteção ambiental. Essa abordagem colaborativa é essencial, especialmente quando considerada sob a perspectiva do Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), estabelecido pela Lei nº 6.938 de 1981, referente à Política Nacional do Meio Ambiente. Esse sistema enfatiza a necessidade de sinergia entre as diversas esferas de governo, no cumprimento de seus objetivos e responsabilidades compartilhados de preservar, melhorar e assegurar a integridade ambiental para o bem-estar público. Portanto, observa-se tanto na esfera constitucional quanto na infraconstitucional a construção de um arcabouço normativo que promove um modelo de federalismo cooperativo, delineando as competências legislativas e executivas no campo ambiental (Zavascki, 2017).
A discussão também abarca a questão da restrição da discricionariedade estatal, compreendendo os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, sob a perspectiva das competências legislativas e executivas na esfera ambiental. Essa discussão se ancora no preceito normativo de direito-dever fundamental ao meio ambiente consagrado na Constituição Federal de 1988 (art. 225 e art. 5º, § 2º), que destaca as obrigações de proteção ecológica impostas ao Estado no contexto de um Estado Democrático, Social e Ecológico de Direito.
A partir dessa premissa, o desempenho das competências constitucionais em questões ambientais por parte do Estado-Legislativo e do Estado-Administrador deve seguir rigorosamente o marco constitucional ecológico estipulado pela lei. Fica evidente, assim, a existência de um pacto federativo ecológico, com o claro propósito de não apenas oficializar direitos e deveres, mas também assegurar sua efetivação, o que é essencial e deve ser constantemente perseguido na execução das competências legislativas e executivas em matéria ambiental. Esse processo inclui o cumprimento de um dever estatal de precaução e prevenção em face da degradação ambiental, almejando também a proteção dos interesses e direitos das gerações futuras, conforme explicitado no caput do art. 225 da CF/1988 (Brasil, 1988).
A jurisprudência brasileira dispõe de mecanismos constitucionalmente reconhecidos para a salvaguarda jurídica do meio ambiente, destacando-se dentre eles a ação civil pública e a ação popular. A regulação da ação civil pública é estabelecida pela Lei nº 7.347/1985, a qual estipula como partes legítimas para a sua proposição o Ministério Público, a Defensoria Pública, a União, os Estados federativos, o Distrito Federal, os Municípios, autarquias, empresas públicas, fundações ou sociedades de economia mista, e associações que tenham ao menos um ano de existência e que incluam em suas finalidades institucionais a defesa do meio ambiente, do consumidor, da ordem econômica, da livre concorrência ou da preservação do patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. Já a ação popular é normatizada pela Lei nº 4.717/1985 (Zavascki, 2017).
Adicionalmente, menciona-se o mandado de segurança coletivo, instituído pela Lei nº 12.016/2009, embora haja incertezas quanto à sua eficácia na proteção de direitos difusos, não sendo essa limitação explicitamente derivada da Constituição (Zavascki, 2017).
Poluição, por sua vez, é definida como a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que prejudiquem diretamente ou indiretamente a saúde, segurança e o bem-estar da população, criem condições adversas às atividades sociais e econômicas, afetem negativamente a biota, prejudiquem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente ou liberem materiais ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos. Por fim, o termo poluidor é atribuído a qualquer pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável direta ou indiretamente por atividade causadora de degradação ambiental. Recursos ambientais, por fim, incluem a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo e os elementos da biosfera, a fauna e a flora.
Em contrapartida aos direitos absolutos, que são individuais e disponíveis a todos, os direitos difusos não concedem uma reivindicação individualizada. Tais direitos impõem um dever erga omnes, e o interesse correspondente é coletivo, pertencendo a ‘todos’, o que inclui indivíduos indeterminados e indetermináveis. Trata-se de um direito atribuível a diversos estratos da população, desde o local ao global, abarcando a humanidade como um todo. A infração de normativas ambientais pode resultar em danos individuais e, consequentemente, em litígios individuais.
No entanto, também se admite a possibilidade de litígios coletivos, ou seja, demandas judiciais movidas em defesa do coletivo lesado. Questiona-se, porém, quem tem a capacidade para iniciar tais demandas. Em contextos de direitos individuais, é lógico atribuir a legitimidade ativa ao indivíduo proprietário do direito violado ou em risco. Contudo, no que concerne aos direitos difusos, tal lógica não é aplicável devido à natureza indeterminada dos sujeitos titulares dos direitos. Portanto, a alegação de que se trata de um direito difuso nada informa sobre a legitimidade ativa. Isso rompe a conexão entre a titularidade do direito e a legitimação ativa, sendo esta última conferida por legislação específica, independentemente de quem detém o direito.
A inexistência de legislação definindo normas sobre a legitimação ativa para a causa foi um obstáculo para a defesa dos direitos difusos antes da implementação da Lei nº 7.347 de 1985. No ordenamento jurídico brasileiro contemporâneo, a legitimidade ativa para a causa é conferida a qualquer cidadão para a ação popular, bem como a pessoas jurídicas e entidades governamentais especificadas em lei para a ação civil pública (Zavascki, 2017).
A legitimidade para a instauração de uma ação civil pública ou uma ação popular não está confinada a um grupo restrito de indivíduos, estando ao alcance de qualquer pessoa. Compreende-se assim que essas duas formas de ação jurídica diferem uma da outra em termos de objeto; sendo que a ação civil pública possui um escopo mais amplo, enquanto a ação popular destina-se especificamente a contestar atos do poder público. Segundo Mancuso (1988), em relação à ação popular, o pedido que se faz de forma imediata é de uma natureza desconstitutiva-condenatória, enquanto o objetivo a longo prazo é a eliminação da atividade prejudicial aos interesses difusos, conforme expresso na Lei.
Por sua vez, Pizzol (2020) comenta que a ação popular é entendida, juntamente com outros mecanismos de índole coletiva, como uma forma de supervisão das funções públicas. De acordo com a perspectiva de Hely Lopes Meirelles (1989), a ação popular é erigida como uma ferramenta constitucional disponível a qualquer cidadão, possibilitando-lhe solicitar a anulação de atos ou contratos administrativos, ou os equivalentes, considerados ilegais e danosos ao patrimônio das esferas federal, estadual e municipal, bem como das autarquias, entidades paraestatais e pessoas jurídicas que recebam financiamento do setor público.
Da mesma forma, é também um mecanismo para desafiar ações que prejudicam o patrimônio público em um sentido abrangente. José Afonso da Silva (2000) descreve esse mecanismo como um ‘remédio constitucional’ que confere a todo cidadão a autoridade para questionar a legitimidade daqueles que detêm o poder, sendo essencialmente uma forma de fiscalização política. Esse princípio é visto como uma extensão direta da soberania popular, conforme positivado no parágrafo único do artigo 1º da Constituição Federal de 1988 (Brasil, 1988).
A abordagem integrada entre os diversos níveis de governo e a sociedade, no que diz respeito à jurisdição constitucional ambiental, evidencia um modelo de gestão ambiental compartilhada, que transcende as tradicionais barreiras de competência para abraçar um regime de cooperação federativa. Esse modelo é fundamental não só para a efetividade das políticas ambientais, mas também para assegurar a responsabilidade compartilhada pela proteção e conservação do meio ambiente.
Nessa linha, o papel do Poder Judiciário emerge como peça-chave na garantia dos direitos ambientais, atuando tanto na esfera preventiva quanto na corretiva, mediante o controle de legalidade dos atos administrativos e a imposição de medidas para reparação de danos ao meio ambiente. A capacidade do Judiciário de intervir em questões ambientais reflete o princípio da inafastabilidade da jurisdição, assegurando que nenhuma lesão ou ameaça a direito seja excluída da apreciação judicial.
A interpretação e aplicação dos princípios constitucionais ambientais pelo Judiciário são essenciais para promover a harmonização das atividades humanas com a preservação do meio ambiente. Isso inclui a aplicação do princípio do poluidor-pagador, pelo qual aqueles que causam dano ambiental devem ser responsabilizados pela sua reparação, e o princípio da precaução, que impõe medidas de proteção diante de riscos potenciais ao meio ambiente, mesmo na ausência de certeza científica absoluta.
A jurisprudência brasileira tem demonstrado progresso no reconhecimento e na tutela dos direitos difusos ao meio ambiente, com decisões judiciais que refletem a importância da preservação ambiental para a qualidade de vida e para a saúde pública. Isso inclui o reconhecimento da capacidade processual de grupos e entidades na defesa de interesses coletivos, ampliando o espectro de ações judiciais possíveis para a proteção ambiental. Entretanto, a eficácia da jurisdição constitucional ambiental não se limita apenas à atuação reativa do sistema judicial. Há, também, a necessidade de políticas públicas proativas e bem estruturadas, baseadas em ciência e tecnologia, para o monitoramento e a conservação do meio ambiente. Isso requer uma integração efetiva entre os esforços judiciais e administrativos, em um contexto de governança ambiental que envolva ativamente os cidadãos e as comunidades.
Assim, a jurisdição constitucional ambiental no Brasil representa um desafio contínuo e uma oportunidade para a construção de uma sociedade mais justa e sustentável. Ela requer o comprometimento de todos os poderes do Estado e da sociedade para a implementação de um modelo de desenvolvimento que transcenda a visão antropocêntrica, respeite os limites dos ecossistemas e assegure o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
As considerações finais deste trabalho permitem refletir sobre a magnitude e a complexidade da tutela do meio ambiente sob a ótica da proteção constitucional e da jurisdição constitucional ambiental, aspectos essenciais na promoção de um desenvolvimento sustentável e na garantia de uma qualidade de vida adequada para os seres vivos. A análise realizada evidencia que a Constituição Federal de 1988, juntamente com a legislação infraconstitucional pertinente, constitui um marco jurídico avançado e abrangente para a proteção ambiental no Brasil. No entanto, a eficácia desse arcabouço legal não depende apenas da sua existência formal, mas, sobretudo, da atuação concreta e coordenada dos poderes públicos e da sociedade civil.
A jurisprudência constitucional ambiental tem desempenhado um papel essencial na interpretação e na aplicação das normas ambientais, contribuindo para a conformação de um direito ambiental que seja verdadeiramente efetivo e capaz de responder aos desafios contemporâneos da crise ecológica global. O reconhecimento do meio ambiente ecologicamente equilibrado como um direito fundamental implica na necessidade de uma proteção jurídica robusta, que garanta não apenas a preservação dos recursos naturais, mas também a promoção de um desenvolvimento que seja verdadeiramente sustentável.
O trabalho também ressalta a importância do direito internacional do meio ambiente, enfatizando a interdependência global e a necessidade de ações conjuntas e coordenadas para enfrentar os problemas ambientais que ultrapassam as fronteiras nacionais. A cooperação internacional emerge, assim, como um pilar fundamental para a efetivação dos direitos ambientais, refletindo a compreensão de que a proteção do meio ambiente é uma responsabilidade comum da humanidade. Contudo, apesar dos avanços legislativos e jurisprudenciais, o Brasil ainda enfrenta significativos desafios na implementação efetiva das políticas ambientais.
A constante pressão sobre os recursos naturais, exacerbada por interesses econômicos muitas vezes em conflito com a proteção ambiental, exige uma vigilância constante e ações eficazes por parte de todos os setores da sociedade. Portanto, este estudo reitera a necessidade de um compromisso renovado com a tutela do meio ambiente, enfatizando a importância da educação ambiental, da conscientização cívica e do engajamento político como instrumentos essenciais para a promoção de uma ética de responsabilidade ambiental.
O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, garantido pelo arcabouço jurídico, deve ser entendido como um direito de todos e para todos, cuja realização depende da construção de uma sociedade verdadeiramente comprometida com os valores da sustentabilidade, da justiça e da solidariedade intergeracional.
REFERÊNCIAS
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito internacional do meio ambiente: particularidades. Veredas do Direito, v. 17, n. 37, p. 263-294, 2020.
BRASIL. Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015. Disponível em:https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 10 fev. 2024.
BRASIL. Lei n. 6.938, de 31 de agosto de 1981. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6938.htm. Acesso em: 10 fev. 2024.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estudos sobre direitos fundamentais. Coimbra: Coimbra Editora, 2004.
FARIAS, Talden; TRENNEPOHL, Terence. Meio Ambiente Urbano. In: FARIAS, Talden; TRENNEPOHL, Terence. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2021.
MANCUSO, Rodolfo de. Ação popular. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988.
MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança, ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, habeas data. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989.
MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2021. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/direito-do-ambiente/1188256948. Acesso em: 24 de Março de 2024.
NETO, José. Capítulo 4. Direito Internacional do Meio Ambiente. In: NETO, José. Direito Internacional Público. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2019.
PIZZOL, Patricia. Tutela Coletiva: Processo Coletivo e Técnicas de Padronização das Decisões. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2020.
RODRIGUES, Marcelo Abelha. Instituições de direito ambiental. São Paulo: Max Limonad, 2002.
SBARAINE, Adriano, et al. Direito internacional do meio ambiente e os objetivos de desenvolvimento sustentável. Brasil, Arraes Editores, 2023.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.
TRENNEPOHL, Terence; FARIAS, Talden. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2019.
ZAVASCKI, Teori. 1. Jurisdição Constitucional. In: ZAVASCKI, Teori. Eficácia das sentenças na jurisdição constitucional. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2017.