TUMOR OCULTO DA PRÓSTATA COM METÁSTASE RETAL MIMETIZANDO TUMOR PRIMÁRIO DE RETO: UM RELATO DE CASO

OCCULT PROSTATE TUMOR WITH RECTAL METASTASIS MIMICKING PRIMARY RECTUM TUMOR: A CASE REPORT

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/dt10202502102230


Gabriela Massadar Moreira Martinez1
Gustavo de Castro Assed Bastos Manhães2
Orientadora e coordenadora: Magda Conceição Gomes3


RESUMO: 

O câncer de próstata é a neoplasia maligna mais comum entre homens, com mais de 1,4 milhão de casos e 375 mil mortes anuais no mundo. Embora muitos casos evoluam lentamente e permaneçam sem diagnóstico, em estágios avançados o tumor pode invadir o reto, simulando neoplasia colorretal primária. A relação anatômica entre próstata e reto é crucial para o diagnóstico diferencial de neoplasias, dado que ambas as estruturas compartilham proximidade e funções complementares nos sistemas urinário e digestivo. Outro fator de relevância associado a neoplasia prostática, está relacionado a raça negra, que tem maior risco de apresentar doenças mais agressivas, com evoluções desfavoráveis e com diagnóstico muitas vezes mais difíceis, necessitando de maior investigação laboratorial, radiológica e patológica. O câncer de próstata, comumente assintomático em estágios iniciais, requer métodos avançados de imagem, como PET/PSMA e ressonância magnética, para estadiamento preciso, especialmente em casos de risco intermediário ou alto. Estratégias multimodais, combinando radioterapia, terapia hormonal e abordagens neoadjuvantes, demonstram eficácia no tratamento de casos localmente avançados. Estudos recentes sugerem benefícios com antiandrogênios de segunda geração e controle local rigoroso, destacando a importância de terapias personalizadas para melhorar a sobrevida global. Este relato aborda um caso raro de câncer oculto de próstata, inicialmente suspeito como tumor de retossigmoide primário devido a achados em ressonância magnética, destacando a importância do diagnóstico diferencial para adequado manejo clínico.

Palavras-chave: Câncer de próstata. Câncer de reto. Oncologia. Tumor oculto

ABSTRACT: 

Prostate cancer is the most common malignant neoplasm among men, with more than 1.4 million cases and 375,000 deaths annually worldwide. Although many cases evolve slowly and remain undiagnosed, in advanced stages the tumor can invade the rectum, simulating primary colorectal neoplasia. The anatomical relationship between the prostate and rectum is crucial for the differential diagnosis of neoplasia, given that both structures share proximity and complementary functions in the urinary and digestive systems. Another relevant factor associated with prostate neoplasia is related to the black race, which has a higher risk of presenting more aggressive diseases, with unfavorable evolutions and often more difficult diagnosis, requiring more laboratory, radiological and pathological investigation. Prostate cancer, commonly asymptomatic in the early stages, requires advanced imaging methods, such as PET/PSMA and magnetic resonance imaging, for accurate staging, especially in intermediate or high-risk cases. Multimodal strategies, combining radiotherapy, hormonal therapy and neoadjuvant approaches, demonstrate efficacy in the treatment of locally advanced cases. Recent studies suggest benefits with second-generation antiandrogens and rigorous local control, highlighting the importance of personalized therapies to improve overall survival. This report addresses a rare case of occult prostate cancer, initially suspected as a primary rectosigmoid tumor due to magnetic resonance imaging findings, highlighting the importance of differential diagnosis for adequate clinical management.

Keywords: Prostate cancer. Rectal cancer. Oncology. Occult tumor.

1 INTRODUÇÃO: 

A neoplasia maligna da próstata é o tipo de câncer mais comum entre os homens, excluindo tumores de pele não melanoma.1 Segundo estimativas do Instituto Nacional do Câncer (INCA), o Brasil deverá registrar aproximadamente 215 mil novos casos entre 2023 e 2025. Mundialmente, o câncer de próstata é responsável por mais de 1,4 milhão de novos casos e por cerca de 375 mil mortes anualmente.2

A etnia está relacionada diretamente com a apresentação precoce e mais agressiva, com maior índice de mortalidade. Homens negros tem 2,2 vezes mais risco de morte, com apresentação em média 2 anos antes e são diagnosticados com doença mais agressiva em estágios mais avançados do que homens brancos. Em geral, tem situação socioeconômica menos favorecida, tendo menos acesso a atendimento para diagnóstico e tratamento, contribuindo desfavoravelmente ao prognóstico.3 Sem o rastreamento adequado, muitos casos de câncer de próstata permanecem sem diagnóstico. Evidências sugerem que o carcinoma da próstata geralmente cresce de forma tão lenta que a maioria dos homens afetados morrem de outras causas.4

Em alguns casos avançados, o câncer de próstata pode invadir por contiguidade o reto, apresentando sintomas intestinais como dor, sangramento, constipação ou mesmo tenesmo, simulando um tumor primário colorretal.5 Assim, destacamos a importância do diagnóstico diferencial entre a origem desses dois tumores, considerando que o prognóstico e tratamento são distintos.

Relatamos a seguir, o caso atípico de câncer oculto de próstata em paciente com ressonância magnética apresentando volumosa formação expansiva em retossigmoide sugestiva de lesão primária com acometimento linfonodal e próstata normal.  

2 RELATO DE CASO: 

Paciente do sexo masculino, 61 anos, negro, casado, natural de Niterói, residente de São Gonçalo, 2º grau completo, trabalha como pedreiro e mecânico, evangélico. Nega comorbidades, tabagismo e etilismo. Relata que desde março de 2022 vem apresentando dor em região anal associada a constipação intestinal, hematoquezia e perda ponderal de 17 Kg em 6 meses. Procurou atendimento com proctologista em janeiro de 2023, com exame clínico apresentando na anuscopia e toque retal uma lesão volumosa em reto inferior a cerca de 4 a 5 cm da margem anal, com predomínio anterior, não estenosante. Exame laboratorial sem anemia e antígeno carcinoembrionário (CEA) dentro da normalidade. 

Realizou colonoscopia fora da instituição atual, que identificou lesão em reto inferior, com biópsia evidenciando neoplasia maligna pouco diferenciada, com atipias, não determinando com precisão tipo histológico e origem primária. 

Após regulação pelo sistema único de saúde, foi avaliado pela proctologia da atual instituição e solicitado tomografia computadorizada de estadiamento em 15/03/2023, demonstrando extensa lesão vegetante e estenosante, com densidade de partes moles e realce heterogêneo pelo meio de contraste, acometendo reto médio/alto e se insinuando ao sigmoide, medindo até 1,1 cm à esquerda e densificação da gordura mesorretal, de aspecto compatível com doença neoplásica. Ainda complementado estadiamento com ressonância magnética de pelve em abril de 2023, com relato de volumosa formação expansiva do retossigmoide sugestiva de lesão primária, com estadiamento radiológico T3c N2, com envolvimento da fáscia messoretal. Próstata com dimensões normais, contorno bem definido e sinal preservado. (FIGURA 1).

Encaminhado à oncologia clínica com diagnóstico de tumor de reto médio/inferior para avaliação de tratamento neoadjuvante. 

Realizada revisão de lâminas da biópsia de reto dentro da instituição em 17/05/2023, descrevendo mucosa colônica ulcerada, com um único grupamento de células atípicas de natureza indeterminada pelo estudo imunohistoquímico (avaliados anticorpos anti-CDX2, AML, CD34, DOG1, CK5 e ki-67 – todos negativos; AE1/AE3 inconclusivo). 

Não havendo critérios suficientes para malignidade na amostra, foi orientado necessidade de prosseguir investigação com nova biópsia, sendo o paciente submetido a retossigmoidoscopia flexível em maio de 2023, descrevendo a 5 cm da margem anal, lesão vegetante, ulcerada, friável, ocupando toda a circunferência do órgão, impedindo a progressão do aparelho de 9,8 mm. O laudo histopatológico concluiu que havia escassa representação de neoplasia maligna pouco diferenciada, ulcerada, com abundante necrose, com perfil imunohistoquímico sugerindo adenocarcinoma, porém não foi possível caracterizar o sítio primário.  

Após a confirmação de malignidade com exame clínico e de imagem compatíveis com lesão neoplásica em reto, foi traçado plano terapêutico com terapia neoadjuvante total (quimioterapia seguida de radioterapia e cirurgia). O paciente realizou três infusões do protocolo de XELOX (capecitabina + oxaliplatina) no período entre 23/06/2023 até 15/08/2023. Sem atingir a resposta esperada ou alívio de sintomas, e por se tratar de um caso de difícil caracterização histopatológica, realizamos discussão multidisciplinar (oncologia, proctologia e patologia) com o objetivo de avaliar possíveis diagnósticos diferenciais. Em decorrência da limitação de exames específicos na instituição, como instabilidade de microssatélite, pesquisa mutacional (BRAF, HER2, KRAS/NRAS, BRCA) e exames de imagem (PET-SCAN), foi definido a realização de pesquisa de antígeno prostático específico (PSA), no sangue, o qual encontrava-se muito elevado (668 – valor de referência da instituição até 4,0 ng/ml) e realização de revisão de lâmina da última amostra de biópsia para pesquisa de PSA tecidual por imunohistoquímica, que demonstrou positividade no componente neoplásico, favorecendo carcinoma de origem prostática.

Assim, a conduta terapêutica foi mudada, sendo instituído hormonioterapia iniciando com bloqueador periférico por 15 dias, seguido de análogo de LHRH (Gosserrelina) 10,8 mg subcutâneo trimestralmente associado a radioterapia local na próstata, pelve e na lesão do reto. O estadiamento foi acrescentado de cintilografia óssea, que não evidenciou implantes ósseos secundários.

O paciente evoluiu com melhora clínica e laboratorial importante (TABELA 1), com última dosagem de PSA de 0,29 em 12/07/2024, após quatro aplicações de gosserrelina e finalização da radioterapia radical em próstata, pelve e reto.

FIGURA 1: Imagens de cortes sagital e coronal, respectivamente, da ressonância magnética da pelve com presença de lesão em reto e com próstata de contornos e dimensões dentro da normalidade.

Fonte: Elaborado pelos autores

TABELA 1: Datas e evolução do valor do antígeno prostático específico (PSA) após início da terapia hormonal, indicando resposta satisfatória ao tratamento.

3 DISCUSSÃO: 

Podemos iniciar nossa discussão entendendo que a invasão do reto por uma neoplasia de próstata é uma manifestação incomum, tendo sua incidência estimada entre 1% e 11% dos casos. A relação entre esses órgãos se faz de uma forma muito próxima diante a anatomia masculina, já que a próstata fica logo à frente do reto. No entanto, essa difícil apresentação, se deve pela presença da fáscia de Denonvillier, que se constitui por uma cápsula espessa que separa o reto da próstata. “No caso em que o câncer de próstata invade o reto, ele tende a se insinuar entre as duas camadas da fáscia de Denonvillier, resultando em envolvimento circunferencial ao redor do reto e, finalmente, penetração da fáscia e mucosa”.6 Sintomas como dor abdominal, sangramento retal, constipação e outro hábitos intestinais podem ser encontrados ou relatados por pacientes durante avaliação clínica diagnóstica. 

Uma hipótese levantada durante o decorrer do caso em questão foi com relação a presença de tecido prostático ectópico, que dentro do sistema gastrointestinal inferior é um achado extremamente raro, segundo a literatura, se originando dentro da submucosa ou em pólipo intestinal. Trata-se de lesões, na maior parte, benignas, ou de tumores neuroendócrinos, que podem ser confundidos com tumores retais primários ou carcinomas prostáticos invasores.7 Porém, após avaliação histopatológica e discussão, descartamos tal diagnóstico.  

Levando em consideração que a progressão do câncer de próstata e de reto podem se dar através de mecanismos similares, através de crescimento por contiguidade para estruturas pélvicas, disseminação linfática e vascular, faz-se necessário anamnese e exame físico direcionados, exames laboratoriais e de imagem específicos e definição histopatológica, principalmente, para determinar com precisão o diagnóstico diferencial das neoplasias em questão. 

O paciente relatado não apresentava história familiar positiva para qualquer tipo de neoplasia, porém, por ser da raça negra, é esperado uma manifestação precoce e mais agressiva da doença prostática, com maior índice de mortalidade, além de estágios mais avançados ao diagnóstico, como vimos no caso.

Os sintomas referidos pelo paciente são típicos de doença intestinal obstrutiva baixa (dor em região anal associada a constipação intestinal, hematoquezia e perda ponderal) associado a uma imagem com lesão extensa, vegetante, ulcerada, estenosante em retossigmoide, com próstata completamente dentro da normalidade. Quando associamos esses dados ao histopatológico de malignidade (adenocarcinoma), mesmo com sítio primário indefinido, em paciente extremamente sintomático, nosso impulso é realizar o tratamento o mais breve possível. Porém, na falta de resposta ao tratamento e já apresentando dificuldade na caracterização histopatológica, se faz de suma importância a discussão multidisciplinar do caso. 

Uma equipe multidisciplinar constituída por profissionais qualificados, experientes e dedicados a se aprofundar no diagnóstico de rara apresentação, desempenhará um papel crucial em sua condução, permitindo um manejo mais eficaz e individualizado para o paciente. Essa integração envolve vários especialistas, onde cada um contribui com sua expertise em momentos chave do diagnóstico e tratamento. 

Avaliação de marcadores sorológicos também são métodos diagnósticos que podem auxiliar. Antígeno prostático específico (PSA) é amplamente usado devido a sua associação com neoplasia prostática. A especificidade do PSA sérico em populações rastreadas é relativamente baixa devido à sua incapacidade de discernir causas benignas de elevação do PSA de malignidade oculta. Uma melhor compreensão deste teste sérico amplamente disponível e a disponibilidade de novas modalidades de exames podem permitir a detecção precoce e o tratamento do câncer ou evitar biópsias repetitivas desnecessárias da próstata em homens com condições benignas.8 Vale a pena ressaltar que, por outro lado, estima-se que em torno de 25% de pacientes com câncer de próstata tem PSA normal devido a lesões de pequeno volume tumoral e baixo grau de malignidade.9 

O estudo histopatológico é o exame definitivo para esclarecimento diagnóstico e classificação prognóstica (escore de Gleason, extensão do envolvimento tumoral e a presença de características de risco). Em situações que a avaliação histopatológica não é suficiente para determinação da malignidade ou mesmo sítio primário patológico, está indicado a realização de estudos específicos de imunohistoquímica. A coloração imunohistoquímica de PSA é valiosa na confirmação do carcinoma metastático como sendo de origem prostática e deve sempre ser utilizada na avaliação diagnóstica de adenocarcinoma metastático de origem primária desconhecida em homens, como realizado no caso relatado.10 

O estudo de instabilidade de microssatélite/MMR pode ajudar a selecionar pacientes para triagem genética e uso de terapia específica como imunoterapia.11 Exames de pesquisa mutacionais também podem contribuir para definição terapêutica e prognóstica. A mutação de BRCA1 está relacionada a um risco três vezes maior de desenvolver câncer de próstata e a mutação de BRCA 2, chega a oito vezes. Eles funcionam como opção terapêutica (olaparibe) em casos de doença com resistência a castração.12,13

A radiologia determina o estadiamento, a conduta terapêutica e o monitoramento da evolução da doença neoplásica. Exames como a ressonância magnética multiparamétrica da próstata, quando disponíveis, ajudam a identificar áreas suspeitas, guiar biópsias e avaliar a extensão da doença. Em casos mais avançados, exames como PET-CT com PSMA oferecem informações mais detalhadas sobre presença de comprometimento metastático.14 Já a cintilografia óssea e a ressonância magnética de corpo inteiro contribuem para determinação de envolvimento ósseo secundário, principalmente em pacientes com PSA mais elevado. 15,16 No nosso caso, por não ser a primeira hipótese diagnóstica, a ressonância multiparamétrica da próstata foi substituída pela ressonância magnética da pelve, mas que conseguiu evidenciar sem dificuldades uma próstata completamente normal, principalmente após a discussão com o especialista da radiologia. O acesso a exames mais sofisticados é limitado, no entanto, conseguimos fazer uso da cintilografia óssea como complementação do estadiamento, que é parte fundamental para conduta terapêutica, que mesmo com PSA extremamente elevado, não evidenciou doença óssea secundária. 

O tratamento para neoplasia prostática avançada tem como objetivo controle da doença, paliação de sintomas, melhora da qualidade de vida e aumento da expectativa de sobrevida. 

A combinação de terapia sistêmica hormonal e terapia local com radioterapia de alta intensidade é uma estratégia que controla o volume de doença mensurável e micrometástase, prevenindo complicações locais do tumor primário.17

O uso de radioterapia em tumores localmente avançados e oligometastáticos, se mostrou benéfico conforme revisão sistemática da revista Radiation Oncology, que demonstrou altas taxas de controle local e uma proporção pequena, mas relevante, de pacientes sem doença progressiva após 2 anos, quando associados a bloqueio hormonal, tanto no cenário de doença sensíveis a hormônios quanto resistentes à castração.18 Diante disso, no tratamento do paciente relatado, optou-se por tratamento radioterápico radical na próstata, pelve para englobar linfonodos e na lesão metastática retal já que consideramos doença oligometastática. 

No câncer de próstata hormônio sensível metastático, existem vários trabalhos evidenciando benefícios clínicos de associação de bloqueio antiandrogênico com e sem quimioterapia. A terapia de deprivação antiandrogênica contínua é o pilar terapêutico no tratamento desses pacientes, promovendo redução dos níveis de PSA, melhora clínica e redução tumoral na maior parte dos casos. Podemos utilizar, também, de forma equivalente, orquiectomia bilateral, análogos de LHRH e uso de agonistas ou antagonistas LHRH, individualizando cada caso e cenário. Nas situações com PSA bastante elevado e alto volume de doença, visando prevenir aumento dos níveis de testosterona (efeito flare) e a piora dos sintomas clínicos, iniciamos o tratamento com antagonistas do receptor de andrógeno 15 dias antes do início do uso de agonistas LHRH, medida realizada no caso.19

No estudo PEACE-1, o uso de análogo LHRH a abiraterona e prednisona associada a quimioterapia com docetaxel demonstrou aumento de resposta radiológica, intervalo livre de doença e sobrevida global em pacientes com alto volume de doença.20 Resultado semelhante, também foi evidenciado no estudo ARASENS com associação de darolutamida a terapia antiandrogênica e quimioterapia.21

Como o paciente em questão apresentava um tumor oculto da próstata com comprometimento linfonodal e metástase única em reto, optou-se por tratamento medicamentoso com terapia antiandrogênica, possibilitando mais possibilidades terapêuticas no futuro na condição de progressão de doença. 

No cenário de resistência à castração, o estudo PROfound mostrou ganho significativo de sobrevida global no uso de inibidor de PARP (olaparibe) comparado com segunda linha de terapia antiandrogênica, predominantemente em homens com mutação de BRCA.22 

No estudo CARD, pacientes previamente tratados com docetaxel tiveram ganho de sobrevida livre de doença e global com uso de segunda linha de quimioterapia com cabazitaxel.23

No estudo VISION, o uso de lutécio-177, também evidenciou ganho de sobrevida global e intervalo livre de doença quando comparado ao melhor suporte possível em paciente previamente tratados com outras linhas hormonais e/ou quimioterapia.24

No caso em questão, nos deparamos com uma tumoração de reto com diagnóstico de adenocarcinoma sem envolvimento de outras estruturas, sendo instituída terapia para neoplasia primária de reto localmente avançada com quimioterapia neoadjuvante. Após discussão multidisciplinar, foram realizados estudos de imunohistoquímica e dosagem sérica de PSA, que determinaram um novo e raro diagnóstico de tumor oculto de próstata mimetizando neoplasia de reto. Foi instituído terapia local com radioterapia no reto, próstata e pelve em dosagem curativa. Além disso, foi associada à terapia hormonal com análogo LHRH, obtendo ótima resposta clínica e laboratorial.

4 CONCLUSÃO: 

A relação anatômica íntima entre próstata e reto podem representar um desafio diagnóstico significativo, especialmente em neoplasias que podem compartilhar características clínicas, laboratoriais, histopatológicas, genéticas e radiológicas semelhantes. A diferenciação precisa entre o câncer de próstata e o câncer de reto é essencial, dado que os prognósticos e tratamentos diferem amplamente. Exames específicos como marcadores tumorais sorológicos, PET/PSMA, ressonância magnética, técnicas de patologia e pesquisa genética, são ferramentas indispensáveis para o diagnóstico, estadiamento, tratamento e prognóstico. Fatores epidemiológicos como idade, raça, nível socioeconômico, além de acesso rápido a atendimento especializado, principalmente com recursos técnicos, é fundamental para que pacientes e instituições de tratamento possam ter o melhor resultado no menor tempo possível, aumentando a chance de cura, controle dos sintomas e mesmo dignidade. 

O manejo do câncer de próstata localmente avançado ou de alto risco evoluiu com a integração de terapias multimodais, incluindo combinações de radioterapia, privação androgênica e agentes antiandrogênicos de segunda geração. Essas estratégias têm demonstrado melhorias significativas na sobrevida global, reforçando a necessidade de personalização do tratamento com base no estadiamento preciso e em biomarcadores. A evidência crescente de que o controle local rigoroso reduz o risco de metástases e melhora os desfechos oncológicos reforçam a importância de uma abordagem integrada e individualizada para pacientes com tumores avançados, evitando a rápida progressão da doença e a necessidade de tratamentos paliativos mais agressivos como quimioterapia. Este caso em especial, revela a dificuldade de acesso especializado de uma manifestação rara, em uma doença com prognóstico desfavorável, numa população de baixo nível socioeconômico, com baixo conhecimento e pouco acesso aos recursos necessários. Consideramos essencial fazer esse relato, dado a raridade, dificuldade e importância do diagnóstico diferencial entre a origem do câncer de próstata e do câncer de reto, podendo auxiliar os profissionais de saúde das especialidades em questão a determinar a melhor conduta terapêutica para obter o melhor resultado e dignidade para essa população. 

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1Universidade Federal Fluminense
Niterói – Rio de Janeiro – Brasil
gabimassadar@yahoo.com.br

2Universidade Federal Fluminense
Niterói – Rio de Janeiro – Brasil
gustavoassed@hotmail.com

3Universidade Federal Fluminense
Niterói – Rio de Janeiro – Brasil
maggomes1512@gmail.com