RIGHT TRISEGMENTECTOMY IN A PATIENT WITH HEPATIC METASTASIS OF SQUAMOCELLULAR CARCINOMA OF THE ANAL CANAL: CASE REPOR
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10819514
Tarso Buaiz Pereira Martins1*, Coautores: Daniel Tomich Netto Guterres Soares1, Mateus Mendes Santos Freire1, Carlos Eduardo Lopes Soares2, Auriane de Sousa Alencar³, Marcos Aurélio Pessoa Barros1, Orientador: José Huygens Parente Garcia1
RESUMO
Objetivo: Relatar o caso de uma paciente com carcinoma de células escamosas (CEC) do canal anal, submetida à hepatectomia direita por importante metástase no fígado, ocasionando sintomas compressivos nas regiões gástrica e torácica. Detalhamento do caso: paciente feminina, 64 anos, ex-tabagista, com mutação do gene P-16 e diagnóstico de carcinoma espinocelular de canal anal, estadiamento inicial 3B tendo realizado 45 sessões de radioterapia associada a quimioterapia. No seguimento identificada lesão expansiva e volumosa, com áreas de degeneração cística, ocupando o lobo direito, centrada nos segmentos VI e VII, medindo 22,5 x 13,2 x 18,8 cm. A equipe médica indicou abordagem cirúrgica. Em seguida, a paciente foi submetida à trissegmentectomia e adrenalectomia direitas. Durante o procedimento, não foram registradas intercorrências perioperatórias. A peça de ressecção apresentou 6,8 kg. O laudo anatomopatológico confirmou carcinoma de células escamosas moderadamente diferenciado, ceratinizante, com necrose e invasão linfovascular, sem invasão perineural e com margens livres de neoplasia. Conclusões finais: Este caso exemplifica benefício da ressecção cirúrgica para o controle de metástases hepáticas de CEC anal, com resolução das queixas clínicas após ressecção da lesão, garantindo menor morbidade da paciente.
Palavras-chave: Neoplasias do ânus. Carcinoma de células escamosas. Metástase. Hepatectomia.
ABSTRACT
Objective: To report the case of a patient with squamous cell carcinoma (SCC) of the anal canal, who underwent right hepatectomy due to significant metastasis in the liver, causing compressive symptoms in the gastric and thoracic regions. Case details: female patient, 64 years old, former smoker, with P-16 gene mutation and diagnosis of squamous cell carcinoma of the anal canal, initial stage 3B, having undergone 45 sessions of radiotherapy associated with chemotherapy. During follow-up, an expansive and voluminous lesion was identified, with areas of cystic degeneration, occupying the right lobe, centered on segments VI and VII, measuring 22.5 x 13.2 x 18.8 cm. The medical team recommended a surgical approach. The patient then underwent right trisegmentectomy and adrenalectomy. During the procedure, no perioperative complications were recorded. The resection piece weighed 6.8 kg. The anatomopathological report confirmed moderately differentiated squamous cell carcinoma, keratinizing, with necrosis and lymphovascular invasion, without perineural invasion and with margins free of neoplasia. Final conclusions: This case exemplifies the benefit of surgical resection for the control of liver metastases from anal SCC, with resolution of clinical complaints after resection of the lesion, ensuring lower patient morbidity.
Keywords: Neoplasms of the anus. Squamous cell carcinoma. Metastasis. Hepatectomy.
INTRODUÇÃO
Os cânceres da região anal são um grupo de neoplasias infrequentes, correspondendo a cerca de 2 a 4% dos tumores do trato gastrointestinal (TGI) baixo. Representam um grupo de doenças em ascensão nas últimas décadas, fato que pode estar relacionado com diversas variáveis, a citar: maior prevalência da infecção pelos vírus HPV e HIV, mudança nos hábitos de vida e de dieta, tabagismo, imunossupressão e intercurso sexual anal receptivo (RAO S, et al., 2021).
Quanto à topografia em que se localizam, podem ser divididos em tumores de canal ou de margem anal. Os tumores de canal anal possuem maior incidência em pacientes do sexo feminino a partir da quinta década de vida, enquanto os de margem anal atingem mais frequentemente homens entre a segunda e a quarta décadas de vida. Em relação à histopatologia, os carcinomas escamo ou espinocelulares (CECs) são os mais frequentes, cuja representatividade pode chegar a 65% do total de casos.( RAAB GT, et al., 2019).
O principal sintoma clínico relatado pelos pacientes é o sangramento evacuatório, em geral vermelho vivo. Além disso, também pode ser referida hiperalgesia anal e perianal, alterações de hábito, frequência e padrão intestinal, secreções locais, prurido e linfonodomegalias, principalmente (ROUSSEAU D., et al, 2004).
Exames de imagem buscam avaliar o tumor primário, complicações e/ou extrapélvicas, que são mais raras. O fígado é o principal alvo de metástase a distância e, quando presente, o prognóstico é ruim. A conduta a ser tomada depende do estadiamento TNM, determinante no estabelecimento do prognóstico. Os tratamentos modernos baseiam-se em uma associação entre radio e quimioterapia, estando a abordagem cirúrgica mais reservada para casos excepcionais (TANUM G, et al., 1991).
RELATO DO CASO:
Trata-se de relato de caso, construído a partir de metodologia descritiva, analítica, de caráter retrospectivo e com abordagem qualitativa. Este estudo foi realizado a partir da revisão de dados clínicos, laboratoriais, radiológicos e cirúrgicos registrados em prontuário médico, tendo sido aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) da instituição, sob o parecer de número 6.628.131 e CAAE de número 76813724.8.0000.5045.
Paciente feminina, 64 anos, ex-tabagjsta, com mutação do gene P16 e diagnóstico de carcinoma espinocelular (CEC) de canal anal, estadiamento inicial 3B, iniciou tratamento com 45 sessões de radioterapia associada à quimioterapia. Devido à presença de metástases linfonodais, progrediu com três novas linhas de tratamento quimioterápico.
Durante seguimento com a Oncologia Clínica, a paciente notou o surgimento de massa com crescimento progressivo em hipocôndrio direito (Figura 1), associada à plenitude gástrica precoce, dificuldade de expansão pulmonar e dor intensa, que cedia parcialmente com o uso de opióides. Devido a esse quadro, foi encaminhada para avaliação pela equipe de Cirurgia Digestiva em um hospital de referência.
Figura 1: massa tumoral proeminente no abdome da paciente. Fonte: acervo do autor.
Na avaliação cirúrgica, ocorrida no primeiro trimestre de 2022, realizou exames de TC e RM, os quais evidenciaram lesão expansiva e volumosa, com áreas de degeneração cística, ocupando o lobo direito, centrada nos segmentos VI e VII, medindo 22,5 x 13,2 x 18,8 cm (Figuras 2 e 3). Além disso, exames laboratoriais do mesmo período revelaram CEA de 1,3 (dentro do intervalo de referência) e CA19.9 de 58,2 (quase duas vezes acima do limite superior de normalidade).
Figuras 2 e 3: Imagens da Ressonância de abdome. Fonte: acervo do autor.
A equipe médica indicou abordagem cirúrgica. Em seguida, a paciente foi submetida à trissegmentectomia e adrenalectomia direitas. Durante o procedimento, não foram registradas intercorrências perioperatórias.
Figura 4: peça de ressecção cirúrgica. Fonte: acervo do autor.
A peça de ressecção apresentou 6,8 kg (Figura 4). O laudo anatomopatológico confirmou carcinoma de células escamosas moderadamente diferenciado, ceratinizante, com necrose e invasão linfovascular, sem invasão perineural e com margens livres de neoplasia. Macroscopicamente, a lesão tinha aspecto firme e compacto em periferia e cístico centralmente. A vesícula biliar, também excisada, apresentava colecistite crônica leve, sem evidências de neoplasia.
A paciente seguiu em acompanhamento com os serviços de Cirurgia Digestiva e Oncologia Clínica. Compareceu à consulta de retorno após 3 meses da cirurgia, relatando melhora importante da dor abdominal e resolução dos sintomas respiratórios. 1 ano após a cirurgia, foram detectados múltiplos novos focos metastáticos no fígado residual. A paciente evoluiu a óbito em seguida.
DISCUSSÃO
A paciente do caso relatado corresponde ao perfil epidemiológico esperado para o tipo de neoplasia em discussão, pois era do sexo feminino, tinha mais de 50 anos de idade e o tumor primário estava localizado no canal anal. Além disso, também possuía história de tabagismo prévio, hábito que configura um fator de risco.
Em geral, desde a década de 1970, a literatura apregoa que carcinomas de células escamosas, sejam de origem anal ou não, devem ser abordados com quimioterapia sistêmica, associada ou não à radioterapia concomitante. Esses tumores, na maioria das vezes, apresentam boa resposta ao tratamento proposto. A opção pelo tratamento clínico ocorre como tentativa de preservar ao máximo a função esfincteriana, que pode ser lesionada durante intervenção cirúrgica. Outra opção, restrita para tumores com estadiamento T1N0 menores que 1 cm, é a excisão local. Contudo, não existem dados na literatura que comparem esse tipo de abordagem com radioterapia ou quimiorradioterapia. Casos refratários ao tratamento clínico, nos quais o tumor primário persiste, recidiva ou metastatiza correspondem à minoria. Metástases extrapélvicas são mais raras. Nos ensaios do Comitê de Coordenação para Pesquisa do Câncer do Reino Unido e da Organização Europeia para a Pesquisa e Tratamento do Câncer, por exemplo, metástases à distância se desenvolveram após terapia de modalidade combinada em 10 e 17%, respectivamente. Outros estudos, descrevem metástases a distância em até 20% dos casos de CEC. O fígado, como já relatado, corresponde ao principal sítio de implantação. (BOMAN BM, et al., 1984); (PAWLIK, TM. et al., 2007).
Isto posto, o fato notável do caso relatado foi a importante metástase hepática apresentada pela paciente, a despeito do tratamento adjuvante já feito por ela. Nos casos de doença metastática, em geral, o prognóstico é mais reservado. Ressecções hepáticas possuem um papel bem definido no controle de metástases de câncer colorretal e de carcinomas neuroendócrinos, por exemplo. Porém, carecem de estudos quando se trata de metástases de CECs. Na prática, sabe-se que, nesses casos, a maioria dos tratamentos instituídos assume um papel puramente paliativo. Excisão das lesões ou ablação por radiofrequência ainda não possuem um papel no controle da doença bem definido pela literatura. Poucos dados publicados sugerem que pode haver um pequeno subconjunto de pacientes com metástases hepáticas isoladas que podem se beneficiar da ressecção ou de outros tratamentos regionais. Além disso, quando o tamanho da metástase hepática é maior que 5 cm e/ou quando margens cirúrgicas não são limpas, associa-se um risco duas vezes maior de recidiva. Nos casos de câncer anal metastático, Pawlik TM, et al. (2007). apresenta medianas da sobrevida livre de doença de 9,6 meses e da sobrevida global de 22,3 meses. A paciente do caso teve sobrevida global de 12 meses.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O caso apresentado é um exemplo do benefício da abordagem cirúrgica de metástases nesse tipo de neoplasia, em casos individualizados, com uma boa evolução pós-operatória e controle dos sintomas locais desencadeados por compressão física pelo tumor. A paciente do caso apresentou sobrevida de 1 ano após a cirurgia. Embora seja inferior à mediana global, é um tempo considerável por se tratar de um câncer avançado, já com disseminação metastática avançada.
REFERÊNCIAS
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¹Universidade Federal do Ceará (UFC), Fortaleza – Ceará.
* E-mail: tarsobuaiz@gmail.com
²Hospital e Maternidade José Martiniano de Alencar (HMJMA/SESA-CE), Fortaleza – CE.
³Universidade Estadual do Piauí (UESPI), Teresina – Piauí.