TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA ASSOCIADO À DUPLA EXCEPCIONALIDADE

AUTISM SPECTRUM DISORDER ASSOCIATED WITH DUAL EXCEPTIONALITY

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8071586


Rhuana Yasmin Araújo Cavalcante Aranha¹
Elizabeth Cristina Ávila Araújo²
Geizebelk Domeneghini³
Gisele Megale Brandão Gurgel do Amaral4


Resumo

O presente estudo possui como tema principal o transtorno do espectro autista associado à dupla excepcionalidade. Onde o objetivo é abordar sobre o diagnóstico precoce, as dificuldades psíquicas, educacionais e sociais enfrentadas por esses indivíduos, somado a discussão dos tipos de tratamentos multidisciplinares indicados para esses indivíduos. A escolha desse tema surgiu pela escassez de estudos específicos para o TEA com dupla excepcionalidade e a dificuldade de diagnóstico precoce. Para a elaboração desse estudo bibliográfico, foram selecionados 14 artigos com base no tema abordado. A partir dessas informações obtidas, foi analisada, qualitativamente, a importância do diagnóstico precoce somado ao tratamento multidisciplinar para minimizar os desafios dessa condição.

Palavras-chave: Autismo Infantil, Transtorno do Espectro Autista, Tratamento Multidisciplinar, Transtorno do Espectro Autista com Dupla Excepcionalidade.

Abstract

The present study has as its main theme the autism spectrum disorder associated with dual exceptionality. Where the objective is to address the early diagnosis, the psychological, educational and social difficulties faced by these individuals, in addition to the discussion of the types of multidisciplinary treatments indicated for these individuals. The choice of this theme arose from the scarcity of specific studies for ASD with double exceptionality and the difficulty of early diagnosis. For the preparation of this bibliographical study, 14 articles were selected based on the topic addressed. Based on this information, the importance of early diagnosis and multidisciplinary treatment to minimize the challenges of this condition was analyzed qualitatively.

Keywords: Infantile Autism, Autism Spectrum Disorder, Multidisciplinary Treatment, Autism Spectrum Disorder with Dual Exceptionality.

1.  INTRODUÇÃO

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma patologia conhecida desde a segunda década do século XX, onde foi descrita como uma condição clínica com sintomatologia de déficit de interação social. Atualmente, entende-se que é uma patologia sem biomarcadores específicos mensuráveis, tendo, portanto, um diagnóstico inteiramente baseado na clínica de cada indivíduo com causas multifatoriais. Da mesma maneira, o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) é elucidado nas alterações comportamentais (FERREIRA, 2016).

Associado ao TEA e outros transtornos, pode haver uma condição denominada dupla excepcionalidade ou altas habilidades, que pode ser percebida por avaliações psicológicas comportamentais, neurológicas e fonoaudiólogas. Nesses casos, o indivíduo apresenta altas habilidades, na qual é estabelecida como um bom desempenho nos testes de inteligência padronizados ou por meio da Teoria dos Três Anéis, cujo diagnóstico é feito pela avaliação da tríade: criatividade, envolvimento com a tarefa e habilidades acima da média (REZENDE; FLEITH; ALENCAR, 2016).

2.  DISCUSSÃO

Semiologicamente, as características iniciais do TEA baseiam-se na dificuldade de interação social, de comunicação verbal e não verbal e no desenvolvimento comportamental, que podem apresentar-se concomitantes aos quadros de déficit intelectual, epilepsia, alterações sensoriais e comportamento disruptivo. Dessa forma, entende-se que o TEA possui um diagnóstico moroso, em virtude da necessidade de uma análise comportamental completa (FERREIRA; 2016).

Por outro lado, paradoxalmente, indivíduos diagnosticados com dupla excepcionalidade podem apresentar necessidades educativas especiais e outros transtornos psicológicos e comportamentais (OUROFINO, FLEITH; 2005). Mediante estudos comparativos, indivíduos que possuem essa condição associada a outros transtornos tendem a apresentar desempenho acima da média em linguagem, narrativa e memorização, porém com rendimento inferior no quesito atenção, comportamento inibitório, memória para faces e reconhecimento de emoções (ASSOULINE, 2009).

O indivíduo com TEA tem como principal prejuízo a interação e o comportamento social, que possuem como impacto a diminuição da capacidade de interpretação de sinais, da criatividade e da troca de experiências. Por conta disso, é importante que o tratamento tenha como objetivo principal: amenizar a ausência de relações sociais e, portanto, reintegrar o indivíduo em todos os aspectos sociais (LUCERO, VORCARO; 2015); (RIBEIRO, CARDOSO; 2014).

O prejuízo da linguagem, nos indivíduos com TEA, implicam em atraso do curso do desenvolvimento. Isso se deve ao fato da dificuldade em comunicação não-verbal, tais como imitações, objetos, símbolos e gestos. Esse prejuízo linguístico é bem evidenciado na infância, com atraso da fala e dificuldade no contato entre a criança e o cuidador (LAMPREIA; 2004).

Além do fator social, esses indivíduos apresentam como um fator limitante a dificuldade de compreensão mental de outros indivíduos e, por tanto, não conseguem demonstrar empatia e respostas emocionais adequadas para cada situação. Por tanto, o prejuízo da empatia corrobora para o prejuízo social do indivíduo, ainda que o indivíduo apresente dupla excepcionalidade. Assim como os outros prejuízos, a falta de empatia é evidenciada durante a infância como um menor interesse desses indivíduos em obter consolo e afeição (ROZA, GUIMARÃES; 2021); (LAMPREIA; 2004).

Diante disso, observa-se a importância do diagnóstico precoce dessa condição associada ao TEA, haja vista que esses indivíduos apresentam uma necessidade especial de acompanhamento educacional para que se obtenha um equilíbrio entre as atividades incentivadoras da superdotação e a diminuição das dificuldades apresentadas (REZENDE, FLEITH, ALENCAR; 2016).

             Para tanto, o modelo DIR (Developmental, Individual Difference Relationship-Based) é considerado eficaz para o objetivo principal do tratamento, considerando o seu espectro multidisciplinar. Esse modelo possui, basicamente, cinco blocos de desenvolvimento, sendo eles o social, emocional, cognitivo, integral e familiar. Ou seja, no âmbito social, o modelo DIR focaliza no desenvolvimento de habilidades coletivas; no emocional, o objetivo é adquirir novas competências emocionais e afetivas, como forma de intenção comunicativa; no cognitivo, a abordagem recai sobre o desenvolvimento da linguagem, cognitivo, motor e sócio emocional; no integral, o enfoque é o desenvolvimento de forma plena do indivíduo e, por último, o progresso junto à família como forma de continuidade do tratamento (RIBEIRO, CARDOSO; 2014).

Esse modelo possui como abordagem o chamado Floortime, que constitui a ideia de que a emoção é a base para o desenvolvimento cognitivo, pois é através dela que as interações entre indivíduo e meio ocorrem. Por isso, essa abordagem é eficaz para melhorar a linguagem, diminuir os comportamentos repetitivos, aumentar a criatividade, facilitar a compreensão e, por fim, aumentar a socialização. Por fim, essa abordagem se resume em tornar a criança capaz de se ver como interativa, com autonomia social e cognitiva (RIBEIRO, CARDOSO; 2014)

Sob uma outra linha, existe o manejo Teacch, que busca promover maior autonomia ao indivíduo com TEA, de modo a torná-lo independente socialmente. Para isso, esse modelo possui uma abordagem generalista e transdisciplinar, com envolvimento contínuo da família. Esse tratamento tem como estratégia individualizar a abordagem, sendo elas as áreas de acolhimento, aprendizado, lúdica, tecnológica e trabalho (CORREIA; 2012)

Com enfoque na criança, outro modelo de tratamento importante é o Son-Rise, onde o método de intervenção diferencial baseia-se num estudo individualizado, com o objetivo de tornar a área de interesse dessa criança na ferramenta de tratamento. Com base nisso, o objetivo desse método é estreitar o pensamento entre o indivíduo e a sociedade através do núcleo de interesse da criança. Porém, esse método necessita de maior participação dos pais no processo de desenvolvimento, visto que é através do estímulo familiar que a criança continuará o processo de desenvolvimento (CORREIA; 2012).

3.  RESULTADO

Com vista nos modelos citados e na importância do diagnóstico precoce, observou-se que há uma relação direta entre esses fatores e a eficácia do tratamento no âmbito do desenvolvimento cognitivo, social e educacional do indivíduo com TEA, bem como na perpetuação desses avanços ao longo da vida. Somado a isso, ambos os tipos de tratamento citados preconizam a necessidade e a importância familiar no processo de desenvolvimento, de modo a estimular o indivíduo com TEA, buscar maior adesão e, portanto, obter resultados significativos através da amenização dos prejuízos principais. Desse modo, além do desenvolvimento observado durante os diversos métodos de tratamento multidisciplinar, os progressos se perpetuam durante a vida do indivíduo (FERNANDES, MOLINI-AVEJONAS; 2005); (CORREIA; 2012); (RIBEIRO, CARDOSO; 2014).

Portanto, para alcançar essas práticas inclusivas e harmônicas , estudos apontam para a necessidade de uma correlação entre as entidades gestoras, educacionais, familiares e, em última instância, sociais (COUTINHO-SOUTO,FLEITH;2021).

4.  CONCLUSÃO

Nesse estudo, procuramos entender a relação entre o impacto do diagnóstico precoce somado ao tratamento multidisciplinar nas limitações psíquicas, educacionais e sociais dos indivíduos com TEA associado à dupla excepcionalidade. Com isso, foi possível perceber, a partir dos artigos selecionados, que há uma relação direta entre o tempo de início precoce dos tratamentos citados e o desenvolvimento social e psíquico desses indivíduos. Haja vista que há uma necessidade de interação entre profissional e paciente, conhecimento das áreas de interesse do indivíduo, tempo de acompanhamento escolar e, principalmente, familiar e social.

REFERÊNCIAS

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¹ Acadêmica de Medicina, Faculdade Metropolitana de Rondônia, Porto Velho, RO.
² Acadêmica de Medicina, Faculdade Metropolitana de Rondônia, Porto Velho, RO.
³ Acadêmica de Medicina, Faculdade Metropolitana de Rondônia, Porto Velho, RO. Pediatra e Psiquiatra. 4Professora do curso de Medicina da Faculdade Metropolitana de Rondônia, Porto Velho, RO.