TOMADA DE DECISÃO SOB RISCO E INCERTEZA: UMA ANÁLISE DAS HEURÍSTICAS E VIESES COGNITIVOS

DECISION MAKING UNDER RISK AND UNCERTAINTY: AN ANALYSIS OF HEURISTICS AND COGNITIVE BIASES

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11672220


Renan Vidal Esteves1


Resumo:

Este estudo, intitulado “Tomada de Decisão sob Risco e Incerteza: Uma Análise das Heurísticas e Vieses Cognitivos”, tem como objetivo compreender de forma abrangente como as pessoas tomam decisões em contextos de risco e incerteza, focando particularmente no papel das heurísticas e dos vieses cognitivos. O objetivo geral é explorar e analisar como as heurísticas e os vieses cognitivos influenciam a tomada de decisão sob condições de risco e incerteza. Este estudo emprega uma abordagem de Revisão Bibliográfica Narrativa, onde se realiza uma análise extensiva da literatura existente sobre tomada de decisão, heurísticas e vieses cognitivos. Este método permite uma exploração qualitativa e interpretativa dos temas, focando em estabelecer uma compreensão aprofundada e integrada dos conceitos chave e teorias relacionadas. Através desta revisão, o estudo busca fornecer insights valiosos sobre como as decisões são tomadas em cenários complexos e incertos, e como o entendimento dos vieses cognitivos pode contribuir para a melhoria da tomada de decisão. A análise abrangente da literatura fornece uma base sólida para compreender as nuances e os desafios enfrentados pelos indivíduos ao tomar decisões sob risco e incerteza.

Palavras-chave: Risco. Incerteza. Tomada. Decisão.

Abstract:

This study, titled “Decision Making Under Risk and Uncertainty: An Analysis of Heuristics and Cognitive Biases,” aims to comprehensively understand how people make decisions in contexts of risk and uncertainty, focusing particularly on the role of heuristics and cognitive biases. The general objective is to explore and analyze how heuristics and cognitive biases influence decision-making under conditions of risk and uncertainty. This study employs a Narrative Bibliographic Review approach, conducting an extensive analysis of the existing literature on decision making, heuristics, and cognitive biases. This method allows for a qualitative and interpretative exploration of the themes, focusing on establishing a deep and integrated understanding of key concepts and related theories. Through this review, the study seeks to provide valuable insights into how decisions are made in complex and uncertain scenarios, and how understanding cognitive biases can contribute to improving decision-making. The comprehensive literature analysis provides a solid foundation for understanding the nuances and challenges faced by individuals when making decisions under risk and uncertainty.

Keywords: Risk. Uncertainty. Decision Making

1 INTRODUÇÃO

A tomada de decisão é um processo fundamental na vida diária, onde indivíduos e organizações frequentemente enfrentam situações carregadas de risco e incerteza. Nestes contextos, a capacidade de fazer escolhas informadas e eficazes é crucial. O presente estudo procura mergulhar nas profundezas deste fenômeno complexo, examinando como as heurísticas e os vieses cognitivos moldam as decisões sob tais condições.

Nestas situações, os riscos são muitas vezes quantificáveis, mas a incerteza traz um elemento de imprevisibilidade que desafia os modelos tradicionais de racionalidade. A compreensão de como as pessoas navegam neste terreno incerto é não apenas de interesse acadêmico, mas também de significativa relevância prática. Com o avanço das ciências comportamentais, tornou-se evidente que as heurísticas – atalhos mentais que simplificam a tomada de decisão – desempenham um papel crucial, embora suas implicações nem sempre sejam precisas ou benéficas.

O objetivo geral deste estudo é explorar e analisar a influência das heurísticas e vieses cognitivos na tomada de decisão em ambientes de risco e incerteza. Este trabalho adota uma metodologia de Revisão Bibliográfica Narrativa, permitindo uma análise detalhada e interpretativa da literatura existente, com o intuito de fornecer uma compreensão integrada e aprofundada dos mecanismos subjacentes.

Ao examinar teorias como a Teoria da Utilidade Esperada e a Teoria do Prospecto, juntamente com a análise de vieses cognitivos específicos como o viés de confirmação e a aversão à perda, este estudo busca iluminar as complexidades da tomada de decisão humana. O entendimento desses aspectos é vital, pois possibilita o desenvolvimento de estratégias para melhorar a qualidade das decisões, especialmente em situações onde as apostas são altas e as consequências, significativas.

Este estudo, portanto, não apenas contribui para a literatura acadêmica, mas também oferece informações práticas para indivíduos e organizações que buscam otimizar suas tomadas de decisão em ambientes incertos e arriscados.

Através desta investigação, espera-se lançar luz sobre as nuances da psicologia humana em decisões complexas e, por extensão, fornecer orientações para práticas mais informadas e criteriosas.

2 DESENVOLVIMENTO

2.1 O processo de Tomada de Decisão

Podemos definir a tomada de decisões como uma opção ou escolha entre várias alternativas de curso de ação a que pareça, dentro dos limites de racionalidade adotados, a melhor para um determinado objetivo. Nesse sentido, administrar essencialmente significa tomar decisões, ou seja, pode-se dizer que a decisão é o núcleo da responsabilidade administrativa (CHIAVENATO, 2007). De acordo com Robbins (2010), a tomada de decisão acontece em reação a um problema, e tal problema existe sempre que há uma discrepância entre o estado atual das coisas e como se deseja que elas sejam.

De acordo com Hammond et al (2004), as tomadas de decisão, sejam feitas consciente ou inconscientemente, representam as principais ferramentas para lidar com oportunidades, desafios e incertezas de nosso dia a dia, e isso acaba por gerar consequências, sejam boas ou má.

Os estados da natureza, que são os aspectos ambientais, fora do controle do tomador de decisão, definidas abaixo como condições de certeza, risco, incerteza e turbulência. 6- As consequências, que representam o efeito direto da escolha do tomador de decisão. No âmbito gerencial, uma decisão possui ainda três níveis: decisões estratégicas (são mais amplas e genéricas, tomadas em níveis institucionais), decisões administrativas (tomadas no nível intermediário e referem-se a aspectos internos) e decisões operacionais (relacionadas ao dia a dia da empresa, tomadas em nível operacional) (CHIAVENATO, 2007).

Quanto à sua forma, as decisões podem ser classificadas em programáveis, que são tomadas de acordo com normas pré-estabelecidas para enfrentar situações do dia a dia; ou não-programáveis quando são tomadas diante de situações novas e não rotineiras (CHIAVENATO, 2007). Já de acordo com Stoner (1992), decisões programáveis servem para lidar tanto com questões simples como complexas, pois se um problema se repete, o mesmo pode ser 13 analisado e padrão similar de resolução pode ser utilizado.

 Para isso, no ambiente empresarial existem políticas, procedimentos, normas etc. Com relação às decisões não-programáveis, Stoner (1992) afirma que as mesmas referem-se à maioria dos problemas significativos que um gestor irá encontrar, e a capacidade de resolvê-los vai se tornando mais importante a medida que o gestor ascende na hierarquia da empresa. Na ciência da tomada de decisão, estuda-se não apenas a mecânica da decisão propriamente dita, mas as condições ambientais, as quais o tomador de decisão não tem controle e que influenciam decisivamente no seu comportamento de fato.

Fatores como tempo, pressão e falta de informações são condições para o produto final do processo decisório, isto é, a decisão em si (CHIAVENATO, 2007). Pode-se listar três condições ambientais básicas para tomada de decisão, conforme tabela a seguir:

 Chiavenato (2007) Stoner (1992) Oliveira et al (2009) Certeza O agente tomador de decisão possui pleno conhecimento das consequências de qualquer possível curso de ação. No ambiente gerencial esta costuma ser a exceção e não a regra. A certeza na tomada de decisão é quando o tomador da mesma possui as informações certas, precisas e confiáveis de que os resultados das alternativas consideradas serão os satisfatórios. Risco O tomador de decisão tem informação suficiente para prever as consequências dos possíveis cursos de ação, porém a qualidade dessas informações não permite uma clara atribuição de probabilidades e é passível de diferentes interpretações por diferentes gestores.

O risco acontece quando ficamos impossibilitados de prever o resultado de uma alternativa, porém temos informações suficientes para prever a probabilidade de que a escolha dessa alternativa vai nos levar ao resultado desejado. Oliveira et al (2009), ao citar Bernstein, diz que a palavra risco deriva do italiano risicare, que é derivado do baixo latim riscu, e que seu significado é “ousar”.

 Sendo assim, o risco trata-se de uma opção, ou seja, se remete às ações em que ousamos optar. Incerteza O agente tomador de decisão tem pouca ou nenhuma informação sobre como atribuir probabilidade a uma consequência futura de um curso de ação. Uma situação típica de um nível gerencial intermediário, que exige flexibilidade e variabilidade nas decisões

Sob situações de incerteza, sabemos muito pouco sobre os resultados, e a incerteza aparece quando o tomador de decisão enfrenta situações externas imprevisíveis ou não possui as informações necessárias para estabelecer a probabilidade para um evento. Turbulência Stoner (1992) acrescenta a condição de turbulência, que é quando o próprio ambiente é incerto, ou seja, está mudando rapidamente, e quando as metas não são claras. Tabela 1. 15 O conceito de Julgamento também é de extrema importância no estudo de tomada de decisão. Luppe & Angelo (2010), citando Hastie (2001) definem julgamento como sendo os componentes do processo de decisão que se ocupam da avaliação, estimação e dedução dos eventos que podem acontecer, e também das correspondentes reações do tomador de decisão quanto aos possíveis resultados dos eventos e dos aspectos cognitivos do processo.

Quando relacionamos Tomada de Decisão e Julgamento, Luppe & Angelo (2010) destacam que esses são aspectos cognitivos por meio das quais a pessoa avalia opções e pode escolher a alternativa mais adequada entre as várias opções disponíveis. No estudo do processo decisório uma das questões mais importantes que se põe é: o quão racional é uma decisão? As organizações esforçam-se para prover ferramentas que tornem a decisão o mais racional possível. Pressupõe-se que quanto mais lógica for uma decisão, melhor ela será (STONER 1992).

 Abaixo segue uma tabela onde são demonstrados os passos (fluxo estruturado) para uma tomada de decisão racional de acordo com Chiavenato, Bazerman e Clemen: 16 Chiavenato (2007) Bazerman (1994) Clemen (1995) Definição e diagnóstico do problema: constitui a fase de obtenção de dados do problema. Definir o problema: Entender corretamente qual é o problema separando as consequências do problema de suas causas, para que seu curso de ação não resolva um problema diferente por exemplo. Entendimento da situação da decisão e dos objetivos a serem alcançados com a sua solução.

Procura de soluções e alternativas mais promissoras: constitui a fase de busca pelo melhor curso de ação. Identificar os critérios: Muitas decisões buscam atender diversos objetivos. É importante definir quais os critérios relevantes para decisão em curso. Identificação de alternativas que possam solucionar o problema decisório. Análise e comparação das alternativas de solução. Avaliar os Critérios: Uma vez que os critérios estejam definidos, devese determinar quais são os critérios mais relevantes para a ação em curso, atribuindo-lhes um peso em forma de valor numérico.

Decomposição e modelagem do problema, passando pela sua estrutura, pelas incertezas envolvidas na situação da decisão, pelas preferências e tolerância ao risco por parte do decisor. Seleção e escolha da melhor alternativa como um plano de ação. Gerar alternativas: Buscar alternativas de curso de ação para situação em curso. Escolha da melhor alternativa, baseando-se nos objetivos traçados. Atribuir valores a cada alternativa: Definir quão bem cada alternativa vai atender os critérios de decisão atribuindo-lhe valores numéricos relativos.

Análise de sensibilidade, ou seja, verificação da alternativa escolhida frente a diferentes cenários, por exemplo, de probabilidade de ocorrência das incertezas e/ou dos resultados.

Bazerman (2004), ao analisar o processo de tomada de decisão, cita Simon, e afirma que as decisões são tomadas sem uma racionalidade plena, ou seja, são tomadas a partir de uma racionalidade limitada, devido a fatores conforme abaixo: (1) falta de informações importantes; (2) restrições de tempo e de custo; (3) limitação do decisor em reter informações em sua memória útil; (4) limitações de inteligência e percepções. Para Clemen (1995), uma boa decisão deve ser tomada através de um pensamento estruturado, já que essa análise das estruturas durante o processo decisório leva a melhores resultados. Esse pensamento estruturado é também abordado por Hammond et al (2004) e ambos os autores separam o processo decisório em partes, tratando assim a complexidade do processo de forma mais sistemática.

 Muitas são as teorias que buscam descrever ou modelar como uma decisão é ou deveria ser tomada. As primeiras modelagens que buscavam descrever como os seres humanos tomam suas decisões, prevalecia a perspectiva de um agente racional, capaz de eficazmente comparar cursos de ação e definir o curso de ação ótimo para uma determinada finalidade (BARON, 2000). Mais tarde, diversos autores apontaram falhas nessa abordagem, mostrando exemplos onde o comportamento humano contraria a escolha mais racional (KAHNEMAN; TVERSKY, 1979).

Um dos precursores das modelagens comportamentais foi Herbert Simon, (1957) com sua teoria da racionalidade limitada. Seu trabalho quebrou o paradigma das teorias econômicas clássicas e neoclássicas, influenciando toda uma geração de pesquisadores depois dele. Neste sentido, vários autores criaram classificações para os tipos de modelo de tomada de decisão, separando-os de acordo com estes aspectos, racionais e comportamentais. Busemeyer & Townsend (1993), por exemplo, separam os modelos de Tomada de Decisão em dois grandes grupos: os racionais (ou normativos) e os cognitivos (ou comportamentais).

Por racionais entenderemos os modelos estritamente mecânicos, lógico matemáticos que não levam em consideração as idiossincrasias humanas. Por modelos cognitivos entenderemos os modelos que levam em consideração, porém não tão somente, o comportamento humano como fator preponderante para a decisão em si.

Bazerman (1994) divide o estudo do processo de tomada de decisão em dois tipos de modelos: descritivos e prescritivos. O Autor define os modelos prescritivos como modelos racionais, de como uma decisão deveria ser tomada. Já os modelos descritivos efetivamente descrevem como uma decisão é tomada, em detrimento de como ela deveria ser tomada. Sua abordagem dá foco ao modelo descritivo, visto que o comportamento humano, como mostrou Simon, por vezes foge ao lógico, ao puramente racional, mesmo quando há informação suficiente a sua disposição. Baron (2000) afirma que podemos pensar a tomada de decisões em termos de três tipos de modelos: descritivos, normativos e prescritivos. Os modelos normativos estão geralmente relacionados à comparação das opções da tomada de decisão com um padrão, como por exemplo, o senso comum, valores e políticas de uma empresa, “inconsciente coletivo”, doutrinas religiosas, moral, ética, costumes ou lógica pura e simples.

Ainda segundo o autor, os modelos descritivos são baseados no empirismo e podem ser subdivididos em outros dois tipos: um é puramente lógico baseada em probabilidades, isto é, racional. O segundo tipo, dentre os descritivos, é o baseado em métodos heurísticos, comportamentais. Com relação aos modelos prescritivos, o autor os define como métodos e técnicas que prescrevem como uma decisão deve ser tomada. Porém o Autor vai além: ele define os modelos prescritivos em termos de design e filosofia.

Com efeito, os modelos prescritivos podem assumir a forma de estratégias de pensamento ou métodos heurísticos explícitos, que podem e devem ensinados nas escolas e universidades. Na sequência, serão apresentados e discutidos alguns dos modelos mais influentes de tomada de decisão: dois com enfoque mais racionais (modelo de racionalidade ilimitada e teoria da utilidade esperada) e três modelos com enfoques mais comportamentais (teoria da perspectiva, modelo da racionalidade limitada de Simon e o incrementalismo de Lindblom).

O resultado do embate entre esses pontos de vista, culmina na sequência com a discussão sobre o marco nas teorias de tomada de decisão, com a abordagem de Heurísticas e Vieses proposta por Daniel Kahneman e Amos Tversky, em seu artigo de 1974, e a análise dos vieses comportamentais propostos pelos autores no âmbito gerencial.

2.2  Outros Modelos de Tomada de Decisão

A Racionalidade se tornou um dos temas centrais nos estudos organizacionais. Também chamado de modelo decisório racional da economia clássica, ou teoria econômica tradicional, ou teoria da racionalidade absoluta, se propõe a maximização dos ganhos no processo decisório, elevando os objetivos da organização como um todo, levando em consideração as alternativas para que se atinjam esses objetivos (PEREIRA et al, 2010).

Os teóricos dos modelos de tomada de decisão, que focam nos aspectos cognitivos, geralmente iniciam seus pensamentos a partir de uma concepção do ser humano. Nesse sentido, várias perspectivas sobre a racionalidade são fortemente usadas nesses modelos. E no modelo que será abordado neste item da pesquisa (racionalidade ilimitada), a abordagem clássica econômica é a usada pelos teóricos, muito justificada pelo chamado “homem econômico”, onde alguns de seus princípios são: ele obedece fortemente à razão; ele é perfeitamente informado e tem conhecimento da totalidade das consequências e de todas as possibilidades de possíveis ações a serem tomadas (PEREIRA et al, 2010).

O processo de decisão racional é derivado da ciência econômica e estatística, e é baseado no modelo clássico de racionalidade, conforme já visto anteriormente, em que o tomador de decisão tem acesso a todo e qualquer tipo de informação e completa capacidade de tomar decisão que maximizará seus desejos e, também, o lucro da organização. Na visão dos economistas neoclássicos, o profissional podia tomar a decisão mais perfeita em busca de soluções ótimas e totalmente racionais, e a empresa sempre foi tida como um veículo para o empresário voltado completamente à maximização dos lucros.

O modelo em questão está associado ao “one best way” (o melhor jeito de fazer) de Taylor, onde este observou e cronometrou as atividades dos trabalhadores na metalúrgica Midvale Steel Company na Filadélfia, envolvendo desde as ferramentas até o treinamento dos operários. As etapas para a tomada de decisão no âmbito do modelo racional da economia clássica segundo Fernando Motta e Isabela Vasconcelos (2006), são: Identificação e definição dos problemas. Elaboração de várias soluções. Comparação exaustiva das alternativas. Implementação.

 Em suma, o modelo analisado neste item da pesquisa, pressupõe que o gerente terá acesso a todas as informações e que saberá escolher a melhor, ignorando ambiguidade, incerteza e conflito. No próximo item do trabalho, será analisar como esse modelo é desconstruído por Herbert Simon, através de sua teoria de que o homem possui racionalidade limitada na tomada de decisão, enfatizando que o homem possui um estoque limitado de informações e capacidade de processamento.

Modelo da Racionalidade Limitada Herbert Simon, economista Americano, foi um dos precursores da teoria das decisões, recebendo em 1978 o prêmio Nobel de Economia por sua “Teoria da Racionalidade Limitada”. Ele define o processo de tomada de decisão como um processo de análise e escolha das alternativas que uma pessoa poderá definir, sendo parte do processo administrativo (PEREIRA et al, 2010). A Teoria da Racionalidade Limitada, também conhecida como “Modelo Carnegie”, é caracterizada pelo critério de que não é possível conhecer todas as possibilidades para a tomada de decisão, como, por exemplo, por falta de recurso e informação delas.

Segundo Simon (1979) não existe uma racionalidade superior e as organizações são um sistema de decisões e cada indivíduo faz parte do processo de tomada dessas decisões. Ou seja, tal modelo utiliza as heurísticas para fazer inovações imediatas para atingir metas. A racionalidade é sempre relativa a quem toma decisão e nesse sentido, Simon sempre enxergava o homem de uma maneira mais realista e como um ator econômico com a necessidade de fazer escolhas e tomar decisões, sendo nesse sentido, seres imprevisíveis, incertos, com conflitos e interesses pessoais inerentes a ele mesmo (SIMON, 1979).

A Teoria da Racionalidade Limitada propõe que as soluções são apenas satisfatórias e aceitáveis, e não perfeitas. Ou seja, devido a uma certa limitação de tempo e de conhecimento, a pessoa procura pela decisão mais adequada pelas condições disponíveis, devido a impossibilidade de encontrar a decisão ótima.

March e Simon (1967) apresentaram exemplos de decisão satisfatória e decisão ótima: “Aos humanos não interessa encontrar a agulha mais pontuda em um palheiro para fazer uma costura, e sim uma agulha suficientemente pontuda que dê para efetuar tal costura” (PEREIRA et al., 2010).

Seguindo essa linha, há barreiras cognitivas ou físicas que impedem a tomada de decisão perfeita, como, por exemplo, a insuficiência de informações e opções, já que não temos acesso a todas essas; 21 não se pode medir todas as opções; não é sempre que se tem recursos e tempo para analisar e processar todas as informações. Outro aspecto que faz com que o comportamento real não alcance a realidade objetiva é a questão das consequências. A racionalidade humana requer um completo conhecimento das consequências resultantes das opções, mas tal conhecimento é sempre fragmentário.

A crítica proposta por Simon (1955) ao modelo da racionalidade ilimitada ou modelo neoclássico, incita que nenhum gestor detém de tanta informação para agir de maneira perfeita no processo decisório. Ou seja, as decisões são diferentes das escolhas que seriam economicamente ideais. Nesse sentido que a otimização do tempo proposta por tal teoria é algo ficcional, pressupondo um conhecimento absoluto de todas as opções de ação disponíveis, tendo os seres humanos como tomadores de decisão totalmente racionais. Herbert Simon indaga que sua teoria da racionalidade limitada chega a ser uma advertência aos economistas, já que estes não conseguem predizer o comportamento humano.

Ao mesmo tempo acusa os economistas clássicos modernos de acharem que podem criar teorias sobre tudo que se pode relacionar a questionamentos sobre como os seres humanos agem, e afirma que “o homem econômico é um mito”. O autor via o homem econômico como um ator que era bombardeado por escolhas e decisões, porém o número de informações e as capacidades de processamento são limitadas (PEREIRA et al., 2010).

Pereira et al (2010), citando Simon (1975), afirma que devido aos limites cognitivos do ser humano e à complexidade dos problemas que ele enfrenta, o processo de tomada de decisão requer simplificações, sendo esses aspectos simplificadores chamados de heurísticas, que afetam diretamente as escolhas dos tomador de decisões.

Será desenvolvido mais adiante, neste trabalho, o tema dessas heurísticas e como elas fazem parte do processo de tomada de decisão, através, também, da análise de seus vieses (PEREIRA et al., 2010). Em suma, a perspectiva central da racionalidade limitada de Simon é que no contexto organizacional, apesar do homem ser pretensamente racional, suas ações ficam restringidas por capacidades cognitivas limitadas e pela falta de informações completas.

O modelo de tomada de decisão incrementalista foi proposto por Lindblom em 1959, onde o processo decisório tem uma perspectiva política com suas limitações. Sendo uma ruptura radical com o modelo racional, a decisão é tomada sem nenhuma especificação prévia 22 de objetivos ou valores, ou seja, cada um atribui às ações os fins e valores da maneira como são percebidos pelo tomador de decisão. Nesse sentido, tal modelo propõe uma “política de pequenos passos” (PEREIRA et al., 2010), onde o tomador de decisão procura um resultado satisfatório e mais que do isso, aceitam que as ações tomadas possam ser revisadas continuamente. O Incrementalismo é caracterizado pela praticidade e pela proximidade à realidade e nos mostra que não há somente uma decisão correta, mas há várias que podem se tornar a melhor decisão através de análises e testes. Lindblom (1959) propõe uma abordagem adaptativa, onde o mesmo faz uma conexão entre o processo de tomada de decisão e a ciência política, evidenciando a natureza política do comportamento organizacional.

De acordo com Lindblom (1959), o tomador de decisão concentrará sua decisão em valores marginais, ou seja, os valores relevantes serão os incrementais do comportamento anterior, e não os de formulação geral. Assim, o importante são os valores marginais. Já ETZIONI (1967) estabelece uma crítica à idéia de Lindblom, afirmando que o autor minimiza a importância dos valores fundamentais ou de formulação geral, supervalorizando as decisões de natureza incremental, quando na verdade, as decisões incrementais são menos relevantes que as fundamentais.

Ou seja, uma vez que os processos marginais desenvolvem as decisões fundamentais ou de formulação geral, na falta desta última, o incrementalismo perde seu sentido. Quando o tomador de decisão concentra sua análise na esfera de variações incrementais, sua capacidade de compreensão se torna elevada, pois trabalha com um número menor de alternativas e as políticas passam a ser consideradas como uma aproximação em direção ao objetivo almejado (PEREIRA et al., 2010)

De acordo com o incrementalismo, o tomador de decisão se inclina a tomar decisões utilizando cursos de ação diferentes daqueles já utilizados, o que os permite evitar ou corrigir erros através de sucessivas mudanças incrementais, e isso pode levar a um curso de ação completamente novo. Ou seja, os objetivos da organização e as formas de chegar a eles podem mudar em um ritmo mais devagar e ações corretivas podem ser tomadas.

Nesse sentido, o tomador de decisão atua com calma e com muita cautela para que as suas chances de erro sejam diminuídas, já que ele é limitado por falta de informações. Todas as mudanças de curso de ação são pequenas e vão sendo implementadas aos poucos.

Em suma, o incrementalismo propõe que as pessoas não percorrem uma trajetória buscando uma solução ótima, e sim tomam decisões incrementais do comportamento anterior.

As mudanças incrementais têm um caráter fortemente prático, em relação às soluções oferecidas pelas grandes teorias e são extremamente úteis e bem mais sintonizado com a realidade que os tomadores de decisões estão inseridos. 3.2.4 Teoria Da Utilidade Esperada A teoria da utilidade esperada é até hoje um dos modelos mais influentes de tomada de decisão. Desde que foi proposta esta teoria já foi objeto de inúmeros estudos e modificações que visavam prever o comportamento humano na tomada de decisão.

Foi proposta em 1944 por JohnVon Neuman e Oskar Morgenstern, porém sua origem remonta o século XVII através de Bernoulli (KAHNEMAN, 2011). Na teoria econômica clássica, o preço de um bem era função de seu custo. Já na teoria econômica neoclássica a formação do preço levou em consideração a demanda definida subjetivamente por um conceito de satisfação ou utilidade, isto é, um valor subjetivo atribuído a um bem, aspecto ou evento. Assim, na teoria da utilidade esperada o valor atribuído a um bem não está relacionado ao seu preço, e sim na sua utilidade, que pode assumir valores positivos ou negativos (RAMALHO, 2013).

Para definir adequadamente o conceito de utilidade precisamos dos seguintes conceitos: Seja e um evento ou uma escolha que pode ter como possíveis resultados R1, R2, …Rn, com probabilidades P1, P2…Pn de ocorrerem respectivamente, onde os eventos Rn são mutuamente excludentes, e p1 + p2 + …+ pn=1. Ao conjunto de pares ordenados (Pn; Rn) define-se como aposta, perspectiva ou prospecto de e (KAHNEMAN; TVESRKY, 1979).

Define-se como E[e] o Valor Esperado ou expectativa de um prospecto de e, onde: E[e]= p1.R1 + p2.R2 + …+ pn .Rn Define-se como Utilidade a função que atribui a cada resultado Rn um valor numérico U(Rn), arbitrado pelo tomador de decisão do quão desejável o Resultado Rn é, de forma que U(Rk) > U(Rp) se, e somente, o resultado Rk é mais desejável que o resultado Rp. Define-se, portanto como Utilidade esperada de um evento e o valor esperado da utilidade das consequências: U[e]= P1.u(R1) + P2.u(R2) +…+Pn.u(Rn)

Além disso, a Teoria da Utilidade Esperada afirma que o tomador de decisão é indiferente a prospectos com resultados Rn intermediários, desde que o a utilidade do 24 Resultado não se altere; e que o tomador de decisão é naturalmente avesso a perdas (CUSINATO, 2003). O núcleo da Teoria da Utilidade Esperada é o Teorema de Von Neuman Morgenstern (KAHNEMAN 2011). Ele afirma que se, e somente se, um agente atende aos 4 “axiomas da racionalidade” (completude, transitividade, continuidade e independência), este agente é dito “racional”; e que o comportamento deste agente sempre será o de maximizar a função utilidade esperada de U, quando exposto a uma situação de tomada de decisão, isto é, o tomador de decisão é capaz ponderar as probabilidades, calcular o valor da perspectiva de cada curso de ação e selecionar a perspectiva de valor máximo (KAHNEMAN; TVESRKY, 1979).

A Teoria da Utilidade Esperada considera que o mercado é eficiente e que os consumidores são racionais, avessos ao risco, dispõem de todas as informações necessárias a decisão e buscam sempre maximizar a utilidade numa decisão de compra (KAHNEMAN; TVESRKY, 1979). Em outras palavras, a Teoria da Utilidade afirma que a conduta esperada do ser humano é ser “racional” numa situação de decisão sob risco ou incerteza, o que significa buscar o maior valor possível para a utilidade das consequências de suas decisões.

Com efeito, um ser humano tipicamente “racional” pesa e avalia meticulosamente as opções de decisão, as consequências de cada decisão, o valor subjetivo de cada consequência e as probabilidades de cada consequência, tomando a decisão de forma a obter o resultado de melhor compromisso entre essas 4 variáveis.

Teoria da Perspectiva ou do Prospecto Criada por Kahneman e Tversky (1979) a Teoria da Perspectiva nasceu da crítica da teoria da utilidade esperada. Os autores incluíram a presença do fator irracionalidade na Teoria da Utilidade Esperada e através dessa crítica sugeriram um novo modelo chamado de Teoria da Perspectiva ou Teoria do Prospecto (RAMALHO, 2013).

Em sua nova teoria, os autores mostram diversos exemplos onde os axiomas da teoria da utilidade esperada são negados, e apresentam uma série de efeitos de comportamento (vieses) que tomam o lugar da pretensa racionalidade da teoria da utilidade esperada.

A partir da análise empírica e diversos estudos, os autores concluíram que existem uma grande quantidade de situações onde o comportamento humano sistematicamente viola a teoria da utilidade esperada. Essas tendências de comportamento foram chamadas efeitos, a saber (KAHNEMAN; TVESRKY, 1979): Efeito Certeza: tendemos a valorizar eventos certos a eventos altamente prováveis. Por exemplo ganhar R$ 900 com certeza do que arriscar R$ 1000 com 95% de probabilidade Efeito Reflexão: Sentimos mais as perdas do que valorizamos os ganhos. Ao contrário do que afirma a Teoria da Utilidade esperada, temos Aversão a Perda, e não ao risco. Efeito Isolamento: Em situações que envolvem mais de um problema tendemos simplificar o problema ao invés de analisá-la de forma ampla. Assim, com esta série de contraexemplos, a teoria da perspectiva oferece uma alternativa mais próxima do comportamento humano, e ,com isso, se tornou um dos modelos mais influentes e discutidos sobre tomada de decisão nos anos posteriores a sua publicação.

O modelo das Heurísticas e Vieses O modelo das Heurísticas e Vieses nasceu no trabalho de 1974 de Daniel Khaneman e Amos Tversky, Judgment Under Uncertainty: Heuristics and Biases. Neste trabalho os autores afirmam que as pessoas quando em situação de risco ou incerteza tomam suas decisão baseadas em 3 estratégias de pensamento chamadas Heurísticas. Essas Heurísticas geram tendências de comportamento chamadas vieses.

As Heurísticas são uma fonte de respostas rápidas e fornecem repostas boas a maior parte do tempo. No entanto os Vieses oriundos dessas heurísticas levam a erros sistemáticos de julgamento, que prejudicam a tomada de decisão. Na sequência, vamos entrar mais a fundo no conceito de Heurística proposto pelos Autores supracitados.

Análise das Heurísticas Heurística ou heurética é uma palavra oriunda do grego antigo, εὑρίσκω (heuriskein) que significa “encontrar” ou “descobrir”, e compartilha o radical com a palavra εὕρηκα (heureca) (BARON, 2000). De acordo com Polya (1945), a Heurística ou ars inveniendi tratava-se de um ramo de estudo da Lógica, Filosofia e Psicologia não bem delimitado ou 26 sistematizado, que remonta a época da Grécia Antiga, passando por Euclides, Leibniz e Descartes. Hoje, no seu sentido mais amplo, denota qualquer regra ou método para resolução de problemas que simplifica o processo, não necessariamente obtendo com isso a melhor solução possível, mas uma solução boa o suficiente para a maioria das situações, método este utilizado por pessoas e máquinas (KAHNEMAN, 2011).

Em sua etimologia, a palavra heurística pertence a duas classes gramaticais: quando substantivo refere-se a processo de descoberta, a arte da descoberta ou ciência do descobrimento. Quando adjetivo, refere-se a processos, regras ou estratégias heurísticas, ou literalmente “o que serve para descobrir” (POLYA, 1945). No sentido mais estrito da Psicologia, as Heurísticas representam um conjunto de regras cognitivas cunhadas pelo desenvolvimento do cérebro humano, seja por evolução ou aprendizado, que agem de forma a tornar decisões complicadas sob condição de incerteza, num processo mais simples e rápido (KAHNEMAN, 2011).

Para Kahneman (2011) o núcleo desta simplificação se dá através de uma substituição: na impossibilidade de responder uma pergunta complexa, o cérebro opta por responder uma pergunta heurística mais simples, que substitui a pergunta original. Exemplos de heurísticas comuns são a de tentativa e erro, a regra do polegar, senso comum, dentre outras estratégias de pensamento ou resolução de problemas aplicadas no dia a dia. A pedra fundamental do conceito moderno de Heurística veio através do Matemático húngaro George Polya em seu livro de 1945 How to solve It .

Nesta obra ele mostrava de forma sistematizada os métodos de resolução de problemas de matemática como algo distinto de seu conteúdo, os quais chamou simplesmente de heurísticas. Mais tarde, o conceito de Heurística na forma em que comumente o conhecemos foi apresentado por Herbert Simon (1957) em seu modelo de racionalidade limitada.

No entanto, apenas em 1974 com o trabalho de Daniel Kahneman e Amos Tversky (Judgment under Uncertainty: heuristics and biases), é que o conceito foi propriamente desenvolvido. Neste artigo, verdadeiro marco para estudo da tomada de decisões, e, posteriormente, em 1982, com um livro de mesmo nome, Kahneman e Tversky sustentam que as pessoas tendem a tomar decisões embasadas em três tipos de Heurísticas: disponibilidade, ancoragem e representatividade.

De acordo com Kahneman e Tversky (1974) as heurísticas são extremamente úteis pois reduzem problemas complicados a questões mais simples, permitindo, com isso, decisões mais rápidas, boas a maior parte do tempo para a maioria das situações. No entanto, uma vez que as decisões são simplificadas, tomadas sem conhecimento prévio das consequências e sem toda a informação necessária, as heurísticas podem levar a erros sistemáticos de julgamento, chamados de vieses. Ainda segundo Kahenmam e Tversky, vieses são tendências de comportamento oriundas das heurísticas. O trabalho cita ainda, 20 vieses oriundos dessas heurísticas. Essa abordagem de tomada de decisão passou a ser chamada pelos próprios autores de heuristics and biases (heurísticas e vieses) . Para os gestores, claro, não é diferente: sendo pessoas pressionadas pelo tempo e obtenção resultados, as heurísticas são fonte de respostas rápidas.

O problema, contudo, é que para decisões capitais, que podem interferir decisivamente no destino de uma empresa ou de um país, os gestores podem tornar-se reféns desses vieses. Para Bazerman (1994) as Heurísticas produzem geralmente decisões corretas ou parcialmente corretas. Além disso é de se esperar que as pessoas utilizem alguma maneira de simplificar suas decisões.

 No entanto, como os seres humanos não possuem um “manual” a maioria dos gestores não está ciente dos vieses, que podem levar a desde erros de menor importância, como fazer um investimento errado até consequências mais graves, como falência, ineficiência governamental e injustiças sociais.

Para Stoner e Freeman (1992) as Heurísticas possuem dois pontos fortes: em geral produzem decisões razoáveis e geram uma economia de tempo tal que supera qualquer perda de qualidade na decisão. No entanto, os autores alertam que os vieses oriundos das heurísticas não são regras óbvias, tampouco voluntárias e, que nem sempre, percebemos quando elas estão em funcionamento.

Já Baron (2000) afirma que a questão que se põe é se podemos desenvolver heurísticas melhores ou se podemos desenvolver maneiras de superar os problemas causados pelos vieses. A seguir serão abordadas as principais heurísticas que afetam a decisão gerencial, de acordo com Kahenman, Tversky, Baron, Stoner e Bazerman. Em seguida serão discutidos os vieses oriundos dessas decisões. Cabe ressaltar que o trabalho original de Kahneman e Tversky incluía apenas 3 heurísticas (disponibilidade, representatividade, ancoragem e ajustamento) sendo que a Heurística de Ancoragem e Ajustamento foi revisada a posteriori pelos próprios autor sendo considerada um efeito de priming (KAHNEMAN, 2003).

O rol de heurísticas foi enriquecido a posteriori pelos autores originais e pelos autores que se seguiram, dentre as quais 28 adicionaremos ao rol original a heurística do Afeto citado em trabalhos posteriores dos autores (KAHNEMAN 2003).

As pessoas tendem avaliar a frequência, as probabilidades ou causas prováveis da ocorrência de um evento baseado na facilidade com que conseguem resgatar de sua memória eventos similares. Com efeito, eventos marcantes, vívidos, influenciam a tomada de decisão de forma determinante em detrimento da real frequência em que ocorrem.

Kahneman (2011) exemplificou que divórcios em Hollywood e escândalos sexuais entre políticos são muito noticiados, por isso teríamos a tendência a exagerar a frequência de divórcios em Hollywoood e escândalos sexuais entre políticos se fôssemos perguntados. Ele afirma ainda que eventos que atraiam muito atenção podem influenciar nossa percepção, como, por exemplo, um desastre aéreo exaustivamente noticiado pode alterar seus sentimentos sobre a segurança de voar. Ver um carro pegando fogo na estrada faria você acreditar, durante algum tempo, nas palavras do autor “que o mundo se tornou um lugar mais perigoso”. Mcraney (2012) afirma que graças a heurística da disponibilidade tomamos decisões baseados na informação que temos a mão, e ignoramos as informações que possam vir a existir.

Com efeito, nas palavras do autor, se muitos ataques de Tubarões são noticiados na mídia, pensamos que “os tubarões estão fora de controle”, quando a conclusão lógica seria “ que a imprensa está cobrindo muitos ataques de Tubarão”. Khanenam (2011) chama este efeito de What You See Is All There Is, literalmente, “o que você vê é tudo o que há”. No que diz respeito a tomada de decisão gerencial, Bazerman (1994) afirma que devido a heurística da disponibilidade um gestor pode ser mais crítico em sua avaliação com um subordinado que trabalha mais próximo pois seus erros estariam mais facilmente disponíveis na sua mente.

O Autor afirma ainda que a heurística da disponibilidade é bastante útil pois os eventos de ocorrência comprovadamente frequentes os quais o tomador de decisão esteja exposto são de fato muito mais disponíveis na memória que eventos raros, porém a disponibilidade desse evento pode ser afetada por diversos fatores, que não a frequência do evento em si.

Já Stoner (1992) alerta para o fato de que a memória humana é muito afetada pelo quão recente foi uma situação e que um gerente de riscos recentemente atingido por uma 29 enchente, por exemplo, poderia superestimar a importância e a frequência deste evento quando estiver fazendo um seguro para empresa.

A Heurística da Representatividade pode ser sumarizada em uma palavra: similaridade. Quando fazemos considerações a respeito de pessoas e eventos, nos concentramos na similaridade que este evento ou pessoa se parece com um estereótipo para definir a probabilidade dessas considerações serem verdadeiras. Com isso, informações como a taxa-base em que um evento ocorre ou o tamanho da amostra (fundamentais no cálculo de probabilidades), simplesmente não são consideradas.

A título de exemplo, pode-se considerar o experimento proposto por Kahneman e Tversky (1974). Consideremos um indivíduo chamado Steve, do qual sabe- se apenas o seguinte: “Steve é muito tímido e retraído, invariavelmente prestativo, mas com pouco interesse nas pessoas ou no mundo real. De índole dócil e organizada, tem necessidade de ordem e estrutura, e uma paixão pelo detalhe” Dadas estas características, como as pessoas ordenariam qual a probabilidade de Steve ser fazendeiro, vendedor, piloto comercial, bibliotecário ou médico? Devido a Heurística da representatividade, o resultado do experimento mostrou que a maioria das pessoas considerava que havia a maior probabilidade de Steve ser bibliotecário, dada sua similaridade com o estereótipo de um bibliotecário. Esse é um exemplo de viés oriundo dessa heurística, chamado de Insensibilidade a Probabilidade.

Nenhum dos participantes do estudo levou em consideração que, na época da pesquisa, havia muito mais fazendeiros que bibliotecários na população norte-americana. Mcraney (2012) afirma que graças a intuição representativa, o cérebro simplesmente ignora as estatísticas. Quanto maior o grau de similaridade dos eventos com nossos modelos mentais, mais prováveis eles parecem ser.

O Autor cita Tvesrky e Kahneman (1974) ao exemplificar com um experimento no qual os participantes liam a descrição abaixo: “Donald é um estudante universitário muito inteligente e vai bem em todas as aulas, mas falta criatividade. Ele é extraordinariamente organizado e sente-se compelido a ordenar todo aspecto de sua vida. Quando escreve, falta emoção, e seus textos estão cheios de referências à ficção científica. Ele não gosta de pessoas, mas possui altos padrões morais” 30 Os participantes são informados que este texto foi retirado de uma entrevista com um grupo de 70 advogados e 30 engenheiros. Perguntados se Donald seria mais provavelmente um engenheiro ou um advogado, a maioria respondeu que Donald seria um engenheiro, apesar de 70% da amostra ser composta de advogados. Gestores também estão sujeitos a heurística da representatividade. Segundo Bazerman (1994) um gestor pode considerar que um vendedor de sucesso é normalmente extrovertido, atlético ou bom em esportes e favorecer esse perfil num processo seletivo., ignorando que não exista relação de causa efeito entre ser um vendedor de sucesso e possuir essas características. Já Stoner (1992) alerta que gerentes quando do desenvolvimento de um novo produto podem se basear no desempenho de produtos similares para estimar seu desempenho. No entanto um produto novo é algo diferente, não é necessariamente um representante de uma classe e pode apresentar desempenho completamente diverso dos produtos similares.

3 CONSIDERAÇÕES

Este estudo, centrado na análise das heurísticas e dos vieses cognitivos na tomada de decisão sob risco e incerteza, revelou múltiplas facetas de como as decisões são moldadas em ambientes complexos. Através da Revisão Bibliográfica Narrativa, foi possível desvendar as sutilezas e implicações das heurísticas e dos vieses cognitivos no processo decisório.

As descobertas deste estudo sublinham que, embora as heurísticas sirvam como ferramentas úteis para simplificar a complexidade das decisões, elas podem também levar a julgamentos distorcidos e decisões subótimas. Vieses como o viés de confirmação, ancoragem, efeito de disponibilidade e aversão à perda demonstram como as preferências e percepções podem ser sistematicamente inclinadas, afetando a qualidade das decisões tomadas.

No entanto, o reconhecimento e a compreensão desses vieses oferecem uma oportunidade valiosa para a melhoria do processo decisório. A educação e a conscientização sobre esses vieses, combinadas com a implementação de estratégias mais objetivas e baseadas em dados, podem ajudar a mitigar suas influências negativas. Esta abordagem não apenas aprimora a capacidade individual de tomar decisões mais informadas, mas também tem implicações significativas para políticas e práticas organizacionais.

Além disso, este estudo enfatiza a necessidade de continuar explorando a interseção entre risco, incerteza, heurísticas e vieses cognitivos. A pesquisa futura pode expandir este trabalho, explorando como diferentes contextos e variáveis individuais influenciam a tomada de decisão e como as intervenções podem ser efetivamente desenhadas para apoiar melhores práticas decisórias em ambientes complexos.

Em conclusão, este estudo contribui para uma compreensão mais aprofundada da tomada de decisão sob risco e incerteza, destacando a importância de reconhecer e abordar as heurísticas e vieses cognitivos. Ao iluminar estas áreas, esperamos não apenas enriquecer o corpo de conhecimento existente, mas também fornecer orientações práticas para tomadores de decisão em uma variedade de campos e contexto

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1Graduado em Engenharia de Produção
Universidade Estácio de Sá – Rio de Janeiro
CREA/RJ 2023105423