THYROID AND ITS DISORDERS: A LITERATURE REVIEW
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ch10202507251337
Francielle Silva dos Santos1
Josefa Eleusa da Rocha2
Maria Isabel Gomes dos Santos3
Resumo
Este estudo apresenta uma revisão narrativa sobre os principais distúrbios da glândula tireoide, abordando aspectos anatômicos, fisiológicos e clínicos. São discutidos o hipotireoidismo, o hipertireoidismo, os nódulos tireoidianos e o câncer de tireoide, com atenção especial à prevalência em mulheres, às implicações durante a gravidez e à influência da alimentação sobre a função tireoidiana. A pesquisa foi realizada em bases de dados científicas com publicações entre 2019 e 2025. Os achados reforçam a importância do diagnóstico precoce, do acompanhamento clínico e de estratégias preventivas como a alimentação adequada. Conclui se que o cuidado integral com a saúde tireoidiana é essencial para o bem-estar geral e a qualidade de vida.
Palavras-chave: Tireoide, Distúrbios hormonais, Hipotireoidismo, Hipertireoidismo; Gravidez; Alimentação.
Abstract
This study presents a narrative review of the main disorders affecting the thyroid gland, addressing anatomical, physiological, and clinical aspects. It discusses hypothyroidism, hyperthyroidism, thyroid nodules, and thyroid cancer, with particular attention to their prevalence in women, implications during pregnancy, and the influence of diet on thyroid function. The research was conducted through scientific databases covering publications from 2019 to 2025. The findings highlight the importance of early diagnosis, clinical follow-up, and preventive strategies such as proper nutrition. It is concluded that comprehensive care of thyroid health is essential for general well-being and quality of life.
Keywords: Thyroid; Hormonal disorders; Hypothyroidism; Hyperthyroidism; Pregnancy; Nutrition.
1 INTRODUÇÃO
A tireoide é uma das maiores glândulas do sistema endócrino, na qual se encontra na região anterior do pescoço e é responsável por regular o metabolismo do corpo, bem como influenciar o funcionamento de diversos órgãos, como coração, cérebro, fígado e os rins (Rodrigues, Toledo & Nogueira, 2015 apud Soares et al., 2020). A glândula tireoide tem uma forma semelhante à letra “H” ou lembrando a forma de uma borboleta. A coloração da glândula é avermelhada pela vascularização abundante e sua massa é de 20 a 50 g. A tireoide é envolta por uma cápsula fibrosa que emite prolongamentos para o seu interior, dividindo-a em lóbulos, dois lobos laterais e uma porção central denominada de istmo (figura 1) (Nascimento-Júnior, 2020).
Figura 1: Localização da glândula tireoide.

Fonte: Leandro Mattos, 2019.
A tireoide controla o metabolismo basal de proteínas, carboidratos e gorduras. Quando o metabolismo basal é lento, o indivíduo mesmo ingerindo poucas calorias, engordará e se manterá com sobrepeso. Em contrapartida, o indivíduo com metabolismo basal acelerado, mesmo consumindo muitas calorias, terá dificuldades para aumentar de massa corporal, tudo isso graças a regulação feita pelos hormônios tireoidianos (Nascimento-Júnior, 2020).
Os hormônios da tireoide (HT), que incluem a 3,5,3’-triiodotironina (T3) e a 3,5,3’,5’- tetraiodotironina ou tiroxina (T4), requerem o elemento iodo para apresentar bioatividade.
Conforme já dito e descrito na literatura clássica de fisiologia humana, os hormônios tireoidianos, tiroxina (T4) e triiodotironina (T3), atuam produzindo elevação geral do metabolismo basal do organismo humano (Granner, 2003; Reed, 2002 apud Oliveira, 2022). A tireoide produz também a calcitonina, hormônio que contribui para o controle de cálcio (Ca2+) no organismo. A atividade secretória dessa glândula é controlada pelo hormônio estimulante da tireoide (TSH), que é secretado pela porção anterior da hipófise e estimulado pelo hipotálamo por meio do hormônio liberador de tireotrofina (TRH) (Campanari et al., 2022).
Quando os hormônios tireoidianos T3 e T4 se encontram em desregulação, podem provocar várias alterações do organismo, como o Hipotireoidismo e Hipertireoidismo (Almeida et al., 2019). No Hipotireoidismo, a produção dos hormônios torna-se abaixo do normal e induz o metabolismo lento, no qual provoca o surgimento de alguns sintomas como bradicardia e ganho de peso (Fernandes & Freitas, 2018; Pinheiro & Nunes, 2019). Enquanto que no Hipertireoidismo acontece o oposto, percebe-se a produção de hormônios acima do normal, na qual gera um aumento metabólico no organismo humano, resultando em sintomatologias como insônia, taquicardia e perda de peso (Callegaro; Viana, 2016 apud Soares et al., 2020).
Outros problemas na glândula tireoide como tireoidite de Hashimoto, nódulos da tireoide, câncer, bócio (das Neves Pulcino, 2024), doença de graves (Oliveira, de Oliveira, Araújo e de Sá, 2024) e adenoma (Soares et al., 2020) são distúrbios que também requerem atenção, levando em conta que são problemas frequentemente visto em pacientes, principalmente mulheres, afetando até mesmo seu período fértil e gravidez (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, 2005; Setan, 2007; Teng et al., 2013 apud Oliveira, de Oliveira, Araújo e de Sá, 2024). Desta forma, objetivou-se realizar um levantamento bibliográfico reunindo trabalhos referente aos distúrbios relacionados a tireoide.
2 METODOLOGIA
O método adotado foi a revisão bibliográfica do tipo narrativa, cujo objetivo é reunir informações e dados disponíveis sobre a tireoide e seus distúrbios, organizando-os de forma clara e coerente, resultando em um texto enriquecido com informações relevantes. Os trabalhos analisados datam de 2019 à 2025. Essa abordagem se caracteriza como uma revisão de literatura, metodologia empregada no estudo de das Neves Pulcino (2024) e de Oliveira, de Oliveira, Araújo e de Sá (2024). Para a pesquisa, foram consultadas bases de dados como Google Acadêmico, Scientific Electronic Library Online (SciELO), Medical Literature
Analysis and Retrieval System (MEDLINE/PubMed) e Periódicos Capes, buscando artigos e trabalhos indexados por meio de palavras-chave como: tireoide, patologias hormonais (isoladas ou combinadas), gravidez, câncer, nódulos e alimentação.
O estudo foi conduzido nos meses de outubro, novembro e dezembro de 2024 e janeiro de 2025, com base na leitura de artigos científicos e publicações acadêmicas de universidades e instituições de pesquisa, tanto nacionais quanto internacionais. Após a análise dos materiais disponíveis, foram pré-selecionados arquivos em português, inglês e espanhol que apresentassem relevância para o tema abordado, sendo posteriormente utilizados como base de dados para a redação da revisão. A seleção dos arquivos seguiu critérios como a data de publicação dentro do período estabelecido, prioridade para os mais recentes e relevantes, acesso livre à comunidade e alinhamento com o tema pesquisado. Para garantir os critérios de inclusão, os títulos e resumos dos artigos selecionados foram analisados. Quando os resumos não forneciam informações suficientes para determinar sua exclusão, os artigos foram avaliados em sua totalidade, conforme descrito por das Neves Pulcino (2024).
3 RESULTADOS E DISCUSSÕES
De acordo com a ATA (2019) citado por Maronezi (2024), as mulheres apresentam maior predisposição ao desenvolvimento de doenças da tireoide, especialmente entre jovens e mulheres de meia-idade. Fatores como gestação, histórico familiar de doenças autoimunes, relacionadas ou não à tireoide, e o tabagismo aumentam esse risco. Contudo, embora em menor proporção, os homens também podem ser afetados por essas condições. Por isso, é fundamental manter exames e consultas médicas de rotina sempre atualizados para um diagnóstico precoce e tratamento adequado.
3.1 Hipotireoidismo e Hipertireoidismo
O hipotireoidismo é mais comum em mulheres, idosos com mais de 65 anos e pessoas caucasianas. Ele frequentemente ocorre em pacientes com doenças autoimunes, como diabetes tipo 1 ou doença celíaca, podendo também estar relacionado a endocrinopatias múltiplas. Além disso, indivíduos com síndrome de Down ou síndrome de Turner apresentam maior probabilidade de desenvolver hipotireoidismo (Chaker et al., 2017 apud da Silva, 2021).
A produção dos hormônios tireoidianos pode apresentar falhas de diversas maneiras, incluindo a desregulação do mecanismo responsável por sua síntese, como ocorre em doenças autoimunes. O funcionamento da glândula tireoide é controlado pelo Hormônio Estimulante da Tireoide (TSH), produzido e liberado pela hipófise, localizada na base do cérebro. A hipófise, por sua vez, responde ao estímulo do hormônio liberador de tireotrofina (TRH), produzido pelo hipotálamo. O eixo hipotálamo-hipófise regula o mecanismo de feedback negativo da tireoide: quando as concentrações de TRH e TSH estão altas, inibem a liberação de hormônios tireoidianos (T3 e T4); já em concentrações baixas, estimulam a tireoide a produzir mais hormônios. Assim, uma redução nos níveis de hormônios tireoidianos resulta em maior secreção de TSH pela hipófise (Moura; Moura, 2004 apud da Silva, 2021).
O hipotireoidismo pode ser classificado em três tipos: primário, causado pela deficiência dos hormônios tireoidianos; secundário, relacionado à insuficiência de TSH; e terciário, decorrente da falta de TRH. Entre essas formas, o hipotireoidismo primário é o mais prevalente e geralmente tratado com reposição hormonal. Contudo, outras causas incluem doenças autoimunes, como Tireoidite de Hashimoto, remoção cirúrgica da tireoide, efeitos de medicamentos, entre outros (Chiovato; Magri; Carlé, 2019). As formas secundária e terciária são frequentemente agrupadas sob o termo “hipotireoidismo central” (da Silva, 2021).
As doenças autoimunes que acometem essa glândula tireoide constituem 30%, destacando-se a Tireoidite de Hashimoto (TH). A TH é uma doença caracterizada pela presença de autoanticorpos que destroem os tecidos tireoidianos. A suscetibilidade do desenvolvimento da TH está associada a fatores genéticos e ambientais. A TH caracteriza-se por vários graus de disfunção tireoidiana, anticorpos circulantes – antitireoglobulina e antiperoxidase tireoidiana – contra antígenos tireoidianos e infiltração da glândula por células mononucleares e fibrose. Os mecanismo de iniciação e progressão da destruição celular na TH são: alterações decorrentes de um processo infeccioso; participação ativa das células tireoidianas na apresentação de antígenos; atuação da imunidade humoral através de células B e produção de auto-anticorpos que além de induzirem citotoxicidade complemento mediada contra as células tireoidianas, participam da destruição tecidual via citotoxicidade anticorpo dependente; a imunidade celular via células T help e citotóxicas; e os mecanismos de apoptose celular (da Nóbrega; de Souza; Mandu, 2021).
O hipertireoidismo é uma condição clínica caracterizada pelo excesso de produção de hormônios tireoidianos pela glândula tireoide (Fellbrant et al., 2024). Suas causas podem variar, sendo as mais frequentes a Doença de Graves, o bócio multinodular tóxico e o adenoma tóxico. As principais complicações relacionadas ao hipertireoidismo são: crise cardiovascular, ósseas, crise tireotóxica, miopatia tireotóxica, hepáticas e oftalmopatia de Graves, além de impacto importante na saúde mental dos pacientes (Calzada et al., 2024).
A Doença de Graves, uma doença autoimune, é a principal responsável pelos casos de hipertireoidismo. Nessa condição, autoanticorpos chamados imunoglobulinas estimuladoras da tireoide (TSI) se ligam aos receptores do hormônio estimulador da tireoide (TSH) na tireoide, resultando na produção excessiva dos hormônios T3 e T4 (Lee; Pearce, 2023). Na Doença de Graves, além da produção excessiva de hormônios tireoidianos, pode surgir oftalmopatia, caracterizada por inflamação e edema dos tecidos orbitais, resultando em exoftalmia. Outro sinal típico é a dermopatia de Graves, que se apresenta como um espessamento cutâneo, especialmente nas regiões pré-tibiais (Calzada et al., 2024).
O bócio multinodular tóxico, por sua vez, é definido pela presença de múltiplos nódulos autônomos na tireoide, que produzem hormônios de forma independente da regulação pelo TSH. Já o adenoma tóxico corresponde a um tumor benigno único que secreta hormônios tireoidianos em excesso. Ambas as condições causam níveis elevados de T3 e T4, desencadeando os sintomas clássicos do hipertireoidismo (Calzada et al., 2024).
3.2 Nódulos e câncer de tireoide
Os nódulos tireoidianos (NT) são comuns, especialmente quando se utilizam métodos de imagem mais sensíveis. Embora a maioria dos pacientes não apresente sintomas, podem surgir manifestações compressivas relacionadas ao tamanho do nódulo, como dificuldade para engolir (disfagia), rouquidão, tosse e dificuldade para respirar (dispneia) (Forneiro et al., 2022).
Os NT representam uma condição comum na sociedade contemporânea. De acordo com estudos epidemiológicos, a prevalência de nódulos identificados por palpação cervical é aproximadamente 5% em mulheres e 1% em homens, considerando regiões com adequada distribuição de iodo. Um aspecto fundamental na avaliação clínica de um NT reside na necessidade de se excluir câncer de tireoide, que pode ocorrer em 7% a 15% dos nódulos, dependendo da idade, sexo, história prévia de exposição à radiação, história familiar de câncer de tireoide, dentre outros fatores (Haugen et al., 2016 apud Forneiro et al., 2022).
O câncer de tireoide é a neoplasia mais comum do sistema endócrino, sendo o terceiro tipo de tumor mais frequente em mulheres nas Regiões Sudeste e Nordeste do Brasil. A doença é mais prevalente em mulheres, com uma relação de 3:1 em comparação aos homens (INCA, 2023). Entre os tipos de neoplasias tireoidianas, os carcinomas bem diferenciados são os mais frequentes, com o carcinoma papilífero representando até 80% dos casos, o folicular cerca de 15%, enquanto os pouco diferenciados e anaplásicos somam menos de 5%, e o medular aproximadamente 5%. Os carcinomas bem diferenciados apresentam células tumorais mais semelhantes às do tecido original, resultando em um prognóstico favorável e taxas de sobrevivência superiores a 98% (Kumar, Abbas, Aster, 2024). Em contrapartida, os carcinomas pouco diferenciados e anaplásicos, apesar de menos frequentes, têm crescimento acelerado e maior propensão a metástases (Caparroz et al., 2024).
Nas últimas décadas, uma tendência preocupante no aumento da incidência do câncer de tireoide tem sido observada, e as projeções atuais indicam que esse tipo de neoplasia maligna conquistará o posto de quarta neoplasia mais comum em todo o mundo até o ano de 2030 (Shin et al., 2016 apud Junior; Pinotti, 2024). Tal aumento está intrinsecamente vinculado ao aprimoramento dos métodos de diagnóstico, particularmente com o advento da ultrassonografia (USG). A USG se estabeleceu como a modalidade de imagem de eleição para a avaliação de lesões nodulares e condições difusas da tireoide, beneficiando-se da topografia anatômica favorável dessa glândula para uma análise ultrassonográfica detalhada, além de ser uma opção acessível em termos de custo, segura, indolor e livre de exposição à radiação ionizante (Junior; Pinotti, 2024).
O sistema TIRADS (Thyroid Imaging Reporting and Data System), baseado em exames de imagem, classifica o risco de malignidade dos nódulos tireoidianos e a necessidade de realizar biópsia do tecido. Nódulos com tamanho igual ou superior a 1 cm devem ser submetidos à biópsia apenas se apresentarem características suspeitas, como bordas irregulares, hipoecogenicidade, aumento da vascularização, microcalcificações, entre outros sinais de malignidade. Assim, a biópsia aspirativa por agulha fina (PAAF) é um procedimento invasivo, frequentemente essencial para diagnosticar neoplasias por meio da análise citológica e orientar o tratamento. Em casos de resultados inconclusivos, podem ser realizados exames genéticos e moleculares como complementação (Caparroz et al., 2024).
Com base na biópsia, o Sistema Bethesda para Laudos Citopatológicos de Tireoide classifica as amostras em seis categorias: I (insatisfatória/não diagnóstica), II (benigna), III (indeterminada), IV (suspeita de neoplasia), V (suspeita de malignidade) e VI (maligno). De acordo com a Associação Brasileira de Câncer de Cabeça e Pescoço, as categorias III e V apresentam uma taxa considerável de incerteza diagnóstica, variando entre 20% e 30%, o que exige uma análise adicional para estimar o risco de malignidade. No entanto, esses métodos diagnósticos têm limitações, incluindo alta incidência de resultados inconclusivos e a possibilidade de falsos-positivos ou falsos-negativos. Isso pode levar a diagnósticos incorretos, cirurgias desnecessárias ou atrasos no tratamento de lesões malignas (Caparroz et al., 2024).
O tratamento de um nódulo tireoidiano se baseia na terapêutica da doença subjacente. Os nódulos em pacientes com tireoidite de Hashimoto ou outras causas de bócio associado a hipotireoidismo podem se estabilizar ou retroceder com a reposição de tiroxina em doses que tornam o paciente eutireoidiano. Para pequenos nódulos benignos não associados a hipotireoidismo, a supressão do TSH com tiroxina reduz de modo eficaz o nódulo em não mais que metade dos casos, e é raramente feita. A tiroxina não é usada para tratar os nódulos neoplásicos. O tamanho de grandes nódulos benignos que comprimem estruturas cervicais adjacentes pode diminuir após ablação por radiofrequência (das Neves Pulcino, 2024).
A tireoidectomia parcial ou completa é eficaz no tratamento de nódulos que continuam crescendo ou que causam sintomas compressivos. Pode-se tratar nódulos tóxicos com iodo radioativo para controlar o hipertireoidismo e reduzir seu tamanho. Nódulos que não são decorrentes de câncer de tireoide, não causam sintomas compressivos e não estão associados a hipotireoidismo ou hipertireoidismo podem ser acompanhados com segurança com exames físicos periódicos do pescoço e, se houver suspeita de crescimento dos nódulos, por repetição da avaliação ultrassonográfica (das Neves Pulcino, 2024).
3.3 Influências da tireoide na gravidez
Problemas na tireoide são frequentes em mulheres em idade reprodutiva e, por isso, aparecem com certa regularidade durante a gravidez. As doenças tireoidianas representam a segunda disfunção endocrinológica mais comum durante a gravidez, sendo as principais, no hipotireoidismo, a tireoidite autoimune crônica – doença de Hashimoto – e a deficiência de iodo e, no hipertireoidismo, a doença de Graves, que também é uma patologia autoimune, e o bócio multinodular tóxico (Singh; Sandhu, 2023).
Existe uma conexão íntima entre a tireoide da mãe e a do feto. A tireoide é a primeira glândula endócrina a ser formada no embrião, sendo que o início de seu desenvolvimento se dá 24 dias após a fecundação (Moore, 2016 apud dos Santos et al., 2023). Os hormônios tireoidianos são essenciais para o desenvolvimento normal do feto, principalmente para a formação adequada do sistema nervoso central (SNC). No entanto, durante as primeiras 16 semanas da gestação, o feto depende da oferta de hormônios tireoidianos maternos, uma vez que sua glândula ainda não se apresenta suficientemente funcional (Chen et al., 2022). Para garantir o suprimento adequado do feto, os hormônios tireoidianos maternos atravessam a barreira placentária antes e após o início da função tireoidiana fetal, sendo o T4 encontrado tanto no líquido celômico e amniótico, quanto no cérebro de fetos já com 5 e 6 semanas de gestação (Maciel; Magalhães, 2008; dos Santos et al., 2023).
Os tratamentos aplicados nas condições tireoidianas maternas podem impactar significativamente a tireoide fetal. A autoimunidade tireoidiana tem sido relacionada a complicações na gestação, assim como a tireotoxicose descontrolada e o hipotireoidismo não tratado. Durante a gestação, também pode ocorrer tireotoxicose transitória, que, em geral, não exige intervenção terapêutica. Além disso, a tireoidite pós-parto pode afetar a saúde materna (Couto; Cavichiolli, 2019). Os nódulos e o câncer de tireoide apresentam características específicas durante a gravidez, tanto em relação à sua progressão quanto ao tratamento. O hipotireoidismo afeta entre 0,2% e 1% das gestantes em regiões com ingestão adequada de iodo, enquanto o hipertireoidismo, frequentemente causado pela doença de Graves, ocorre em 0,05% a 0,2% das grávidas (Alexander et al., 2017 apud Couto; Cavichiolli, 2019).
O hipotireoidismo materno tem sido consistentemente associado a impactos negativos no desenvolvimento neurocognitivo do feto e a um maior risco de complicações na gestação, como parto prematuro, baixo peso ao nascer, perda gestacional e redução do QI no recém-nascido. Já o hipotireoidismo subclínico apresenta uma associação variável com desfechos gestacionais adversos. Por outro lado, o controle inadequado do hipertireoidismo materno foi relacionado a eventos como perda gestacional, hipertensão na gravidez, parto prematuro, baixo peso ao nascer, restrição do crescimento intrauterino, óbito fetal, tempestade tireotóxica e insuficiência cardíaca congestiva materna. Ademais, estudos indicam que a exposição do feto a níveis excessivos de hormônio tireoidiano materno pode predispor ao desenvolvimento de condições como convulsões e distúrbios neurocomportamentais no futuro (van den Boogaard et al., 2011; Andersen; Olsen; Laurberg, 2015 apud Couto; Cavichiolli, 2019).
O tratamento de mulheres grávidas com doenças da tireoide requer uma abordagem interprofissional, envolvendo endocrinologista, obstetra, médico primário, enfermeiro e farmacêutico. Essa equipe deve monitorar os testes de função tireoidiana e ajustar os medicamentos adequadamente, considerando os riscos de complicações na gravidez associadas ao hipotireoidismo e hipertireoidismo não tratados. Além disso, compreender a fisiologia tireoidiana normal na gestação é crucial para interpretar corretamente os exames e evitar erros no diagnóstico e tratamento (Singh; Sandhu, 2023).
O tratamento do hipotireoidismo na gravidez envolve o uso diário de Levotiroxina em jejum, para repor o déficit hormonal causado por anticorpos contra a enzima peroxidase tireoidiana (Solha et al., 2022). Já o hipertireoidismo é tratado com a menor dose possível de Propiltiouracil, que atravessa a placenta e inibe a síntese dos hormônios tireoidianos. Durante seu uso, é necessário monitorar regularmente os níveis hormonais para evitar prejuízos à produção tireoidiana do feto. Após o primeiro trimestre, o Propiltiouracil deve ser substituído por Metimazol devido à sua hepatotoxicidade, que pode causar danos graves ao fígado da mãe e do bebê (Bártholo et al., 2014 apud dos Santos, 2023). Em casos raros, pode ser indicada a ressecção parcial da tireoide, precedida pelo uso de iodeto para reduzir a vascularização. Essa cirurgia, se necessária, é preferencialmente realizada no segundo trimestre da gestação (Singh; Sandhu, 2023).
3.4 Tireoide e alimentação
Pesquisas epidemiológicas apontam que os hábitos alimentares podem ter um papel significativo na prevenção do câncer de tireoide. O iodo é frequentemente estudado devido à sua função essencial na produção de hormônios tireoidianos e no desenvolvimento de distúrbios da tireoide (Gonçalves; Mituuti; Haas, 2020).
De acordo com a literatura, formas eficazes de prevenir o câncer incluem uma alimentação saudável, prática regular de atividade física e manutenção do peso corporal adequado. Consumir alimentos de origem vegetal, como frutas, verduras, legumes, cereais integrais, feijões e outras leguminosas, e evitar alimentos ultraprocessados e bebidas açucaradas pode reduzir o risco de novos casos. Dietas ricas em vegetais, que contêm fitoquímicos bioativos, ajudam a prevenir doenças crônicas. Além disso, o aumento do consumo de peixes está associado a menor mortalidade e morbidade cardiovascular, com benefícios no metabolismo, coagulação, função endotelial e rigidez arterial (Scherr et al., 2014 apud Gonçalves; Mituuti; Haas, 2020).
Os dados encontrados a partir do trabalho de Gonçalves, Mituuti e Haas (2020), evidenciaram que um alto consumo de cálcio parece estar associado a um risco reduzido de câncer de tireoide. Além disso, os autores corroboram que a ingestão prolongada de ômega-3 parece ser protetora para o desenvolvimento de câncer de tireoide.
Estudos recentes destacam o papel relevante de nutrientes como vitamina D, selênio e glúten no desenvolvimento e manejo da Tireoidite de Hashimoto (TH) (de Oliveira; de Guimarães Barros, 2023). De acordo com Nodehi et al. (2019), a vitamina D atua como um micronutriente imunomodulador, ajudando a minimizar os danos às células da tireoide provocados por células imunes autorreativas. Uma pesquisa realizada no Irã com 48 mulheres entre 20 e 45 anos revelou que a suplementação com colecalciferol resultou em uma redução significativa na proporção de células T auxiliares 17 (Th17) em relação às células T-reguladoras do tipo 1 (Tr1), responsáveis por regular o sistema imunológico.
Zuo et al. (2021) destacaram que as selenoproteínas desempenham um papel essencial na manutenção do sistema imunológico da tireoide, no sistema antioxidante, na síntese hormonal e no metabolismo corporal. O selênio tem a capacidade de regular os níveis de anticorpos tireoidianos em pacientes com doenças autoimunes da tireoide (DAT) e contribui para a biossíntese dos hormônios tireoidianos, sendo sua suplementação útil para equilibrar as concentrações séricas de TSH, T3, T4, anti-TG e anti-TPO. O estudo de Hu et al. (2019) reforça a importância do selênio na proteção da tireoide por meio das selenoproteínas, que estão intimamente ligadas às concentrações de citocinas inflamatórias, como interleucina-1 beta (IL 1β), interleucina-6 (IL-6) e fator de necrose tumoral alfa (TNF-α), conhecidas por sua participação na patogênese da Tireoidite de Hashimoto (TH).
4 CONCLUSÃO
A saúde da tireoide é fundamental para o equilíbrio metabólico e o bem-estar geral, sendo essencial compreender os fatores que impactam essa glândula. Distúrbios da tireoide, como hipotireoidismo e hipertireoidismo, podem afetar diversas funções do organismo, enquanto a presença de nódulos e o câncer de tireoide demandam atenção médica específica para diagnóstico e tratamento precoce. Além disso, as influências da tireoide na gravidez são significativas, já que alterações hormonais podem impactar tanto a mãe quanto o desenvolvimento do feto. Por fim, a relação entre tireoide e alimentação reforça a importância de uma dieta equilibrada, rica em nutrientes como selênio e iodo, que contribuem para a síntese hormonal e a manutenção da função tireoidiana. Essas conexões destacam a necessidade de um cuidado integral para a prevenção e o manejo adequado de condições relacionadas à tireoide.
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1Discente do Curso Superior de Licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Estadual de Alagoas Campus I Arapiraca e-mail: francielle@alunos.uneal.edu.br
2Docente do Curso Superior Licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Estadual de Alagoas Campus I Arapiraca. Doutora em Educação (PPGEDU/UFRGS). e-mail: eleusa.rocha@uneal.edu.br
3Graduada em Ciências Biológicas, Pós-graduada em Gestão Escolar e Mestre em Proteção de Plantas, e-mail: isabelsantos.edu.prof@gmail.com