RANCIDITY TEST OF OMEGA-3 PREPARATIONS SOLD IN CASCAVEL – PR
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102411251152
Laryssa Nicolao 1
Suzana Bender 2
Resumo
A rancidez causa alterações significativas nas características físico-químicas do ômega-3, comprometendo a qualidade e a segurança das formulações. Este estudo avaliou a presença de rancidez em cápsulas de ômega-3 comercializadas em Cascavel – PR. Três formulações foram analisadas quanto à rancidez hidrolítica, por meio do índice de acidez, e à oxidação lipídica, utilizando a reação de Kreiss, conforme as Normas Analíticas do Instituto Adolfo Lutz (2008). Os resultados indicaram ausência de rancidez hidrolítica ou mínima degradação das cadeias de ácidos graxos. No entanto, todas as amostras apresentaram produtos de oxidação lipídica, evidenciando a necessidade de maior controle no armazenamento dos produtos em farmácias e durante o transporte. Recomenda-se, ainda, que os fabricantes adotem medidas preventivas para prolongar a estabilidade das formulações, minimizando o risco de rancidez.
Palavras-chave: Suplementação Nutricional. Oxidação. Hidrólise.
Abstract
Rancidity causes significant changes in the physical and chemical characteristics of omega-3, compromising the quality and safety of the formulations. This study evaluated the presence of rancidity in omega-3 capsules sold in Cascavel, Paraná. Three formulations were analyzed for hydrolytic rancidity, using the acidity index, and lipid oxidation, using the Kreiss reaction, according to the Analytical Standards of the Adolfo Lutz Institute (2008). The results indicated no hydrolytic rancidity or minimal degradation of the fatty acid chains. However, all samples presented lipid oxidation products, highlighting the need for greater control in the storage of products in pharmacies and during transportation. It is also recommended that manufacturers adopt preventive measures to prolong the stability of the formulations, minimizing the risk of rancidity.
Keywords: Nutritional Supplementation. Chemical. Hydrolysis.
1 INTRODUÇÃO
Os ácidos graxos poli-insaturados ômega-3, representados principalmente pelo ácido alfa-linolênico (ALA), ácido eicosapentaenoico (EPA) e ácido docosahexaenóico (DHA), são essenciais para a saúde humana. O DHA, por exemplo, desempenha um papel crítico na neurotransmissão, neuroplasticidade e transdução de sinais no sistema nervoso central (DJURICIC e CALDER, 2021). Além disso, os ômega-3 apresentam propriedades anti- inflamatórias, sendo amplamente utilizados em doenças como artrite reumatoide, doença de Crohn e retocolite ulcerativa. Essas propriedades são atribuídas à sua capacidade de reduzir a produção de citocinas pró-inflamatórias, como o fator de necrose tumoral alfa (TNF-α), interleucina-1 (IL-1) e IL-6 (WEYLANDT et al., 2015).
O benefício mais amplamente estudado do ômega-3 é sua ação na proteção cardiovascular, reduzindo o risco de eventos como infarto agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral e dislipidemias (ELAGIZI et al., 2021). A suplementação de ômega-3 pode ser feita com doses diárias de EPA e DHA variando entre 150 mg e 4000 mg, dependendo das condições clínicas e do objetivo terapêutico (FIALKOW, 2016). No entanto, os ácidos graxos poli-insaturados são altamente suscetíveis à degradação, especialmente pela rancidez oxidativa, que pode comprometer tanto suas características organolépticas, como sabor e odor, quanto sua segurança e eficácia.
A rancidez lipídica ocorre pela degradação oxidativa ou hidrolítica das cadeias de ácidos graxos. No processo oxidativo, há a formação de hidroperóxidos e compostos voláteis de baixo peso molecular, que são responsáveis por alterações organolépticas e pela degradação de componentes importantes, como vitaminas (VIEIRA, MCCLEMENTS e DECKER, 2015). Já na rancidez hidrolítica, ocorre a liberação de ácidos graxos livres pela ação de lipases em condições de temperatura ou pH extremos (LI et al., 2016). Essas alterações, além de afetarem a qualidade do suplemento, podem causar efeitos adversos ao consumidor, como eructação, dispepsia e vômitos (SHERRATT et al., 2024).
Diante da alta suscetibilidade do ômega-3 à degradação, estratégias como armazenamento adequado, uso de antioxidantes e controle rigoroso na produção são fundamentais para garantir a qualidade do produto (BAO e PIGNITTER, 2023). Nesse contexto, este estudo teve como objetivo avaliar a presença de rancidez em cápsulas de ômega- 3 comercializadas na cidade de Cascavel – PR, utilizando o índice de acidez para determinar a rancidez hidrolítica e a reação de Kreiss para identificar produtos de oxidação lipídica.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Os ácidos graxos poli-insaturados de cadeia longa ômega-3, comumente chamados de ômega-3 apenas, são caracterizados pela presença de uma ligação dupla entre o terceiro e o quarto átomo de carbono na extremidade metila, e que apresentam uma cadeia longa com 14 a 18 átomos de carbono. Observa-se um isomerismo cis-trans, com dois átomos de carbono com hibridização sp2 unidos por uma ligação dupla, cada um ligado a um átomo de hidrogênio (CHOLEWSKI, TOMCZYKOWA e TOMCZYK, 2018).
Os principais tipos de ácidos graxos ômega-3 são o ácido alfa-linolênico (ALA), ácido eicosapentaenoico (EPA, 20:5n-3) e o ácido docosahexaenóico (DHA, 22:6n-3). O ALA pode ser obtido a partir de óleos vegetais obtidos de sementes de chia, linho, camelina e agrião de jardim, sementes de manjericão e noz inglesa. O EPA e o DHA são considerados ácidos graxos essenciais para os humanos, sendo o EPA encontrado em grandes quantidades em peixes arenque e sardinha selvagem, raramente em plantas, enquanto as principais fontes de DHA são as ovas de peixe-voador, arenque, pollock e salmão. Em geral, considera-se que as fontes dietéticas de EPA e DHA mais importantes são frutos do mar, microalgas e algas marinhas dos gêneros Schizochytriumm e Crypthecodium (SAINI et al., 2021).
Cada classe de ácidos graxos ômega-3 apresenta metabolismo e funções distintas. O ALA é usado pelo organismo para produção de energia, reciclagem do carbono para formação de novos ácidos graxos e bioconversão para outras classes de ômega-3. O EPA e o DHA são incorporados na membrana lipídica das células, onde exercem influência sobre a transdução de sinais, oxidação lipídica e têm função crítica na proteção celular pela inibição da propagação de radicais livres. EPA e DHA podem ser sintetizados a partir do ALA pela ação das enzimas desaturases e elongases, porém em humanos é um processo insuficiente, com taxa de conversão máxima de apenas 10-14%. As quantidades de ALA no organismo humano também são limitadas, o que torna a suplementação externa necessária para suprir as demandas fisiológicas (KOUSPAROU et al., 2023).
A biodisponibilidade é um conceito que se refere à velocidade de absorção e/ ou à quantidade de uma substância absorvida. A biodisponibilidade dos ácidos graxos ômega-3 pode ser mensurada a partir das concentrações no plasma, soro, células sanguíneas e linfa, sendo o índice ômega-3 a principal ferramenta utilizada. Ele representa a proporção em porcentagem de EPA e DHA no conteúdo total de ácidos graxos da membrana eritrocitária, indicando a biodisponibilidade do ômega-3 nos últimos 80 a 120 dias. Diversos fatores interferem nos valores do índice de ômega-3 e na biodisponibilidade da substância, como genética, tabagismo e exercícios físicos extenuantes, além do tipo de ligação química da estrutura lipídica administrada (TOCHER et al., 2019).
Os ácidos graxos são componentes da membrana da maior parte das células do organismo humano, onde possuem diversas funções essenciais. A deficiência de ácidos graxos essenciais é rara, mas a baixa ingestão é um fator de risco conhecido para numerosas doenças, incluindo dermatite, artrite, hipertensão arterial, doenças cardiovasculares, diabetes mellitus tipo 2 e depressão. O DHA participa da regulação do transporte ativo de aminoácidos pela membrana das células e da função dos canais de sódio, sendo o ácido graxo ômega-3 mais prevalente no sistema nervoso central, onde participa da neurotransmissão, neuroplasticidade e transdução de sinais. Também aumenta as concentrações de serotonina e acetilcolina no tecido nervoso e é um precursor de moléculas únicas (DJURICIC & CALDER, 2021).
Os ácidos graxos ômega-3 alteram processos cognitivos em seres humanos, porque aumentam a saturação de oxigênio e contagem de eritrócitos, o que melhora a circulação sanguínea no tecido nervoso. O DHA pode melhorar a memória, deficiências de aprendizagem e retardar o envelhecimento cognitivo, sendo fundamental para o crescimento neuronal, mas o EPA apresenta resultados mais significativos sobre as funções neurais e cognitivas (DIGHRIRI et al., 2022). Baixos níveis de DHA foram associados ao desenvolvimento de declínio cognitivo, demência, doença de Alzheimer em pesquisas preliminares (TROESCH et al., 2020). DHA e EPA apresentam funções anti-inflamatórias que podem ser exploradas em diversas doenças inflamatórias, como artrite reumatoide, doença de Crohn e retocolite ulcerativa. Eles diminuem a produção de eicosanoides derivados do ácido araquidônico porque limitam a sua incorporação na membrana celular. Realizam inibição da quimiotaxia dos leucócitos, da expressão de moléculas de adesão celular e da produção de citocinas pró- inflamatórias como o fator de necrose tumoral alfa, interleucina-1 (IL-1) e IL-6, aumentam a produção de citocinas anti-inflamatórias como as lipoxinas e as protectinas. Outro efeito importante é a redução da ativação do fator de transcrição pró-inflamatório NFkB, o que inibe as fases iniciais da sinalização inflamatória (WEYLANDT et al., 2015).
O campo mais explorado nas pesquisas com ômega-3 é o da medicina cardiovascular. EPA e DHA possuem efeito bem estabelecido na prevenção secundária de eventos arrítmicos e
cardiovasculares, como infarto agudo do miocárdio e acidente vascular cerebral, e doenças como síndrome metabólica e dislipidemias. Os mecanismos moleculares que explicam esses efeitos ainda não são bem elucidados, mas já se sabe do papel de metabólitos como a resolvina que limita o recrutamento leucocitário em inflamações e a produção de citocinas que participam da fisiopatologia das doenças cardiovasculares. É proposta também a inibição direta dos canais iônicos que estabiliza a atividade elétrica cardíaca e prolonga o período refratário relativo dos miócitos do coração (ELAGIZI et al., 2021).
Recentemente, os ácidos graxos ômega-3 passaram a ser investigados pelo possível efeito protetor para câncer devido à regulação metabólica e inflamatória, controle do estresse oxidativo e das vias de sinalização celular. Esses ácidos graxos exercem efeito regulatório de vários processos no desenvolvimento do câncer, incluindo a proliferação, sobrevivência, diferenciação e invasão celular. Outra explicação para o efeito anti-neoplásico do ômega-3, especialmente no câncer colorretal, de próstata e de mama, é a modulação da metilação de citosinas do DNA, da expressão de microRNA não codificante e modificações covalentes das histonas (SAHYE-PUDARUTH e MA, 2023).
Atualmente, a suplementação de ômega-3 para adultos com 18 anos ou mais de idade pode ser feita com cápsulas de ácidos graxos ômega-3 carboxílicos, éster etílico ou éster etil- icosapente de ácidos graxos ômega-3. Após a absorção, o metabolismo das moléculas de DHA e EPA formadas a nível intestinal é feito por beta-oxidação hepática. A maior biodisponibilidade é relacionada às refeições com alto teor de gordura, por isso os suplementos não devem ser ingeridos em jejum. Os efeitos adversos são incomuns porque as formulações aprovadas para comercialização são seguras, existindo raros relatos de eructação, dispepsia, vômitos, prurido, erupções cutâneas e artralgia. A toxicidade está associada à depressão imunológica e sangramentos por inibição da atividade plaquetária (SHERRATT et al., 2024).
Existem diversos protocolos de suplementação disponíveis, que variam de acordo com as formulações utilizadas, intenções terapêuticas e características individuais dos pacientes. De maneira geral, as doses recomendadas para suplementação com fórmulas de EPA e DHA variam de 150 mg a 4000 mg por dia, capazes de melhorar o índice de ômega-3 em cerca de 8% ao longo de seis semanas (DEMPSEY, ROCKWELL e WENTZ, 2023). Pode-se utilizar duas cápsulas de éster etil-icosapente de ácidos graxos ômega-3 (1 grama de EPA por unidade) com alimentos, duas cápsulas de éster etílico de ácidos graxos ômega-3 (cerca de 0,465 gramas de EPA e 0,375 gramas de DHA por unidade) com ou sem alimentos, e duas ou quatro cápsulas de ácidos graxos ômega-3 carboxílicos (cerca de 0,55 gramas de EPA e 0,20 gramas de DHA por unidade) com ou sem alimentos (FIALKOW, 2016).
Os suplementos dietéticos de óleo de peixe, óleo de algas ou óleos vegetais são produtos isentos de prescrição, sem aprovação das principais agências internacionais de regulamentação, que apresentam eficácia, qualidade e segurança consideráveis. Dessa forma, não são recomendados para tratamento ou prevenção de doenças, não são equivalentes e nem podem substituir as formulações de prescrição devidamente regulamentadas (FIALKOW, 2016).
Os lipídios são moléculas orgânicas insolúveis em água e solúveis em alguns solventes orgânicos (como álcool, éter e acetona), encontrados nos alimentos na forma de gorduras e óleos. As gorduras são sólidas em temperatura ambiente, com ponto de fusão mais alto e maior concentração de ácidos graxos do que os óleos. A maior parte dos lipídios alimentares é encontrada na forma de triglicerídeos que contém uma molécula de glicerol esterificada a três ácidos graxos, que possuem um ácido carboxílico e uma cadeia alifática com um número par de carbonos geralmente. Os ácidos graxos saturados são totalmente hidrogenados, enquanto os insaturados possuem ligações duplas entre moléculas de carbono na configuração cis, por isso possuem menos átomos de hidrogênio (VIEIRA, MCCLEMENTS e DECKER, 2015).
As moléculas de triglicerídeo são apolares e o estado físico é definido pelo cálculo da mudança de energia a partir do equilíbrio entre a entalpia, entropia e temperatura. A entalpia é determinada pelas forças de interação moleculares e predomina em baixas temperaturas favorecendo estados cristalinos, enquanto a entropia é definida pela organização da estrutura molecular e em altas temperaturas favorece o estado líquido. O ponto de fusão dos triglicerídeos é maior com o aumento do peso molecular dos triglicerídeos e nos ácidos graxos saturados pela conformação mais linear (VIEIRA, MCCLEMENTS e DECKER, 2015).
Várias ferramentas podem ser utilizadas para análise dos lipídios e parâmetros relacionados à rancidez. A lipidômica é uma tecnologia usada para avaliação do tipo, distribuição, função e alterações dinâmicas dos lipídios. A Headspace-Solid Phase Microextraction-Gas Chromatography-Olfactometry-Mass Spectrometry (HS-SPME-GC-O- MS) e a análise eletrônica E-nose são ferramentas que permitem a detecção de compostos voláteis aromatizantes, podendo ser utilizadas junto à tecnologia lipidômica para explorar todas as características da rancidez lipídica (YU et al., 2024).
A medição do índice de peróxido é um método que quantifica a deterioração oxidativa de lipídios porque os peróxidos são responsáveis por mudanças na coloração e aroma dos produtos diante da rancidez. Outras técnicas válidas nesse contexto são a medição do tempo de indução da oxidação, determinação dos fenóis totais por colorimetria de Folin Ciocalteu, a espectrometria de massas e a medição dos dienos e trienos conjugados (dois produtos da rancidez lipídica) a partir da absorbância espectrofotométrica com radiação ultravioleta (TARAPOULOUZI et al., 2022).
Diante de altas temperaturas em meios de pH extremo, enzimas como a lipase e a lipoxigenase (LOX) interagem com as moléculas lipídicas e convertem os triglicerídeos em ácidos graxos insaturados livres e glicerol. Esses ácidos graxos sofrem deterioração enzimática e dão origem aos hidroperóxidos, que se degradam em produtos secundários como aldeídos, cetonas e ácidos caracterizando o processo de rancidez hidrolítica (LI et al., 2016).
A rancidez oxidativa ocorre diante de uma reação em cadeia de radicais livres de gorduras insaturadas e moléculas de oxigênio. Os radicais livres dos lipídios apresentam elétrons livres que realizam reações de adição, transferência ou cisão, resultando na adição de oxigênio aos ácidos graxos com formação de um radical peroxil. Esse radical abstrai moléculas de hidrogênio dos ácidos graxos insaturados e as transfere para outros ácidos graxos, formando hidroperóxidos lipídicos. Por fim, os hidroperóxidos sofrem decomposição pela luz e metais, formando radicais alcóxil que realizam cisão de ácidos graxos em compostos voláteis de baixo peso molecular, que modificam os sabores e aromas dos lipídios (BAO e PIGNITTER, 2023). A maior parte dos produtos da rancidez lipídica excede os níveis do limiar sensorial e produzem odores indesejáveis, além de prejuízos adicionais na qualidade dos produtos, como a degradação de vitaminas, perda de funcionalidade proteica e aumento do potencial aterogênico dos lipídios. A suscetibilidade à rancidez é influenciada por diversos fatores, sendo a estrutura química dos ácidos graxos o principal. Os lipídios saturados são mais estáveis e menos suscetíveis à oxidação, enquanto o número crescente de ligações duplas entre as moléculas de carbono aumenta a suscetibilidade à oxidação (VIEIRA, MCCLEMENTS e DECKER, 2015).
Existem várias estratégias para controlar a rancidez lipídica e seus efeitos indesejados. Uma delas é a remoção do oxigênio com embalagens à vácuo, que diminui de maneira significativa as taxas de oxidação. O armazenamento em baixas temperaturas também exerce esse efeito, considerando que as taxas de oxidação aumentam em duas vezes a cada elevação de temperatura em 10º C (WANG et al., 2022). Enzimas pró-oxidantes como a lipoxigenase são importantes para o processo de rancidez hidrolítica (AHER et al., 2022).
A adição de antioxidantes também é uma opção, porque são compostos que eliminam radicais livres dos ácidos graxos, inibindo os processos de rancidez. Antioxidantes hidrofílicos (como galato de propilo e ácido ascórbico) são eficazes para óleos, enquanto antioxidantes hidrofóbicos (como hidroxitolueno butilado e ácido carnosico) são melhores nas emulsões de óleo em água, sendo a butil-hidroxiquinona terciária um dos antioxidantes mais eficazes por apresentar polaridade intermediária (CONDORI et al., 2020).
3 METODOLOGIA
3.1 Amostras
As amostras de ômega-3 testadas foram selecionadas de acordo com o histórico de vendas nos últimos seis meses em três grandes redes de drogarias com sede na cidade de Cascavel – PR.
Após identificar as cinco formulações de ômega-3 mais vendidas em cada estabelecimento, foi realizada uma seleção randomizada de três delas para assegurar a imparcialidade na escolha, bem como a integridade dos estabelecimentos que as comercializavam e seus respectivos fabricantes. Após a aquisição, as três amostras foram mantidas em suas embalagens originais, armazenadas conforme as recomendações dos fabricantes e nomeadas como A, B e C.
3.2 Índice de acidez
O índice de acidez é definido como a quantidade de hidróxido de potássio necessária para neutralizar os ácidos livres de 1 grama da amostra. O índice de acidez revela o estado de conservação do óleo. É o parâmetro mais utilizado para avaliação do grau de rancidez hidrolítica de preparações lipídicas. A decomposição dos glicerídeos é acelerada por aquecimento e luz, e a rancidez é acompanhada pela formação de ácido graxo livre. Pode ser expressa também em mL de solução normal por cento (v/p) ou em gramas de ácido oleico por cento (p/p).
O método utilizado para determinar o índice de acidez (IA) seguiu as orientações descritas nas Normas Analíticas do Instituto Adolfo Lutz (2008). Para cada formulação (A, B e C) de ômega-3, foram coletados 2 g de óleo e transferidos para frascos Erlenmeyer de 125 mL.
Em cada frasco, foram adicionados 25 mL de uma solução de álcool-éter (2:1) e a mistura foi mantida sob agitação até completa dissolução da amostra. Em seguida, adicionaram- se duas gotas de solução indicadora alcoólica de fenolftaleína a 1% em cada frasco. A titulação foi realizada com uma solução de hidróxido de sódio a 0,1 mol/L até que a coloração rósea se formasse e permanecesse estável por pelo menos 15 segundos, caracterizando o ponto de viragem.
A análise foi realizada em triplicata com repetição para cada formulação, garantindo maior confiabilidade nos resultados obtidos.
O índice de acidez foi calculado utilizando a fórmula descrita nas Normas Analíticas do Instituto Adolfo Lutz (2008): IA = [V x (M x f) x 282] / P
Onde:
- IA: índice de acidez (mg NaOH/g);
- V: volume (mL) de hidróxido de sódio gasto na titulação;
- M: concentração (mol/L) do hidróxido de sódio;
- f: fator de correção do hidróxido de sódio;
- P: peso (g) da amostra;
- 282: massa molecular do ácido oleico (C18:2).
3.2 Reação de Kreiss
O teste de Kreiss é a técnica colorimétrica utilizada para avaliar a rancidez oxidativa. Esse método permite identificar se os óleos das amostras apresentam sinais de degradação oxidativa. A floroglucina reage, em meio ácido, com triglicerídeos oxidados, promovendo uma coloração rósea-avermelhada cuja intensidade é proporcional ao nível de deterioração oxidativa dos lipídios, devido à formação de moléculas como aldeído malônico e aldeído epidrínico.
A análise foi realizada conforme a metodologia descrita nas Normas Analíticas do Instituto Adolfo Lutz (2008). Para cada análise, 2 g de óleo foram transferidos para tubos de ensaio com capacidade de 25 mL. Em cada tubo, foram adicionados 2 mL de ácido clorídrico, seguidos de 30 segundos de agitação. Posteriormente, foram adicionados 2 mL de solução de floroglucina a 0,1% em éter, e a mistura foi novamente agitada por 30 segundos. Os tubos foram então deixados em repouso por 10 minutos. As análises foram realizadas em triplicata com repetição para cada uma das formulações.
4 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS
A Tabela 1 representa o índice de acidez (IA) obtido em cada uma das três amostras (A, B e C) de ômega-3.
Tabela 1 – Resultado dos testes do índice de acidez
Amostras | A | B | C |
IA (mg KOH/g) | 0,68 ± 0,15 | 0,87 ± 0,21 | 0,90 ± 0,14 |
Fonte: elaboração autoral.
De acordo com a Instituição Normativa n°87 de 2021, os óleos e gorduras refinados têm um limite máximo de acidez de 0,6mg NaOH/g (ALVES et al.,2024). Dessa forma, em todas as amostras de ômega-3 a rancidez hidrolítica esteve ausente ou houve mínima degradação das cadeias de ácidos graxos presentes nas formulações. A amostra A apresentou o menor índice de acidez e, consequentemente, a menor taxa de degradação hidrolítica. As amostras B e C apresentaram resultados próximos e discretamente superiores aos da amostra A, portanto a taxa de degradação hidrolítica foi maior nessas amostras, mas ainda assim não ultrapassou o limite aceitável para prejudicar a qualidade das preparações de ômega-3 nesse parâmetro.
A Tabela 1 apresenta os resultados do índice de acidez (IA) obtidos para as amostras A, B e C de ômega-3. Todas as amostras apresentaram valores abaixo do limite máximo de 0,6 mg KOH/g estabelecido pela Instrução Normativa nº 87 de 2021 (ALVES et al., 2024), indicando que a rancidez hidrolítica esteve ausente ou foi mínima. A amostra A apresentou o menor índice de acidez, enquanto as amostras B e C, com valores discretamente superiores, ainda permaneceram dentro do limite aceitável para a qualidade das preparações.
Os resultados corroboram estudos anteriores, como o de Bellaver e Zanotto (2004), que também encontraram índices de acidez dentro dos valores de referência. No entanto, há inconsistências na literatura. Por exemplo, no estudo de Silva et al. (2020), os índices de acidez das cápsulas avaliadas variaram entre 0,11 e 1,23 mg KOH/g, com pelo menos uma das amostras ultrapassando o limite de 0,6 mg KOH/g. Esse fato destaca a necessidade de maior harmonização dos parâmetros de qualidade entre diferentes estudos e regulamentações.
A reação de Kreiss é um método colorimétrico para avaliação do grau de oxidação lipídica e índice de rancidez de um composto oleoso ou gorduroso como o ômega-3, mediante a isomerização e conjugação de lipídios compostos por ligação dupla. Diante do teste de Kreiss, todos os tubos de ensaio assumiram a coloração rósea, como demonstra a Figuras 1.
Figura 1 – Tubos de ensaio das amostras A (1), B (2) e C (3) após o teste de Kreiss
Fonte: Produção própria do autor.
O teste de Kreiss, uma técnica colorimétrica, foi utilizado para avaliar a oxidação lipídica nas amostras de ômega-3. Como apresentado na Figura 2, todos os tubos de ensaio (Amostras A, B e C) adquiriram uma coloração rósea após o teste, indicando a presença de oxidação lipídica em todas as amostras. A reação observada no teste ocorre devido à formação de aldeído malônico e aldeído epidrínico, compostos característicos da degradação oxidativa de lipídios. Isso sugere que fatores como armazenamento, transporte ou produção podem ter contribuído para a exposição dos lipídios a condições desfavoráveis, como luminosidade, oxigenação ou temperatura (BAO e PIGNITTER, 2023).
Embora o teste de Kreiss tenha indicado oxidação lipídica em todas as amostras, de acordo com as Normas Analíticas do Instituto Adolfo Lutz (2008), os resultados podem ser considerados satisfatórios desde que as características organolépticas permaneçam adequadas. Silva et al. (2020) também destacam que o teste de Kreiss, embora rápido e sensível, deve ser complementado por outros parâmetros para determinar a qualidade final dos produtos, como odor e sabor.
5 CONCLUSÃO
A partir das análises realizadas, conclui-se que as formulações de ômega-3 avaliadas apresentaram índices de acidez e rancidez hidrolítica adequados para o consumo humano. No entanto, todas as amostras continham produtos de oxidação lipídica, evidenciados pela reação de Kreiss, o que pode comprometer as propriedades organolépticas e a segurança do produto. Os resultados ressaltam a necessidade de controles rigorosos durante a produção, transporte e armazenamento, além da adoção de boas práticas de fabricação preconizadas no Brasil. Essas medidas são essenciais para garantir que os suplementos de ômega-3 atendam aos padrões de qualidade e cumpram seu propósito de contribuir para a saúde dos consumidores.
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1 Discente do Curso Superior de Farmácia do Centro Universitário Assis Gurgacz, Campus Cascavel, e-mail: laryssa.nicolao@outlook.com
2 Docente do Curso Superior de Farmácia do Centro Universitário Assis Gurgacz, Campus Cascavel. Mestre em Ciências Farmacêuticas pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), e-mail: suzanabender@hotmail.com