REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7386081
Iris Rodrigues Rabelo
Kharoline Whithny Colares de Andrade*
Ginarajadaça Ferreira dos Santos Oliveira **
RESUMO: O artigo a partir de uma revisão de literatura propõe uma leitura especializada e crítica sobre a ação do profissional de Terapia Ocupacional junto a crianças com Transtorno de Espectro do Autismo (TEA). O campo de atuação do TO é constituído de uma área multidisciplinar valendo de uma série de elementos que variam de acordo com cada caso, cada diagnóstico estabelecido. No campo da TO, a integração sensorial pode ser entendida como a forma que o corpo do autista recebe as informações dos sentidos. Percebe-se, então, que o terapeuta ocupacional está apto para trabalhar atividades referentes a texturas, cheiros, gostos e integrar esses sentidos. Isso ajuda o autista a compreender que esses sinais precisam ser encarados como algo natural e normal, nesse sentido, as ações do Terapeuta Ocupacional devem ser inseridas de acordo com as necessidades da criança autista. O artigo está dividido em 5 seções: na primeira introduzimos focalizando no perfil do TO, na segunda, traçamos a metodologia da pesquisa, na terceira, apresentamos os desafios e as perspectivas para com crianças autistas, no quarto como o terapeuta ocupacional deve agir junto às crianças com TEA, no quinto as conclusões. O texto nesse sentido coloca-se como uma proposta para construção de ações sobre como lidar junto a isso, bem como revisar aquilo que já temos produzido sobre o assunto.
PALAVRAS-CHAVE: TEA; Autismo; Terapia Ocupacional; Crianças.
1. Introdução: o perfil do terapeuta ocupacional
Quando ouvimos falar em Terapia Ocupacional logo mentalizamos um grupo de pessoas, conduzidos por um profissional realizando uma atividade ergonômica ou dinâmica em prol de alguma melhoria a seu bem-estar. Nos últimos anos, terapeutas ocupacionais, cientistas ocupacionais têm apresentado a constante necessidade de discutir, pesquisar os acontecimentos relativos à ocupação, integrando para além dos condicionantes individuais, as relações e interações da sociedade. É importante, porém, questionar, investigar a influência e os contornos da experiência coletiva na superação de iniquidades sociais.
Em nosso país, as chamadas práticas coletivas da terapia ocupacional iniciaram-se pelos questionamentos éticos que terapeutas ocupacionais fizeram sobre suas ações, momento em que a questão social passou a integrar a profissão na década de 1970 (BARROS; GHIRARDI; LOPES, 2002). Em termos mais gerais, o profissional da área realizava, anteriormente, somente práticas voltadas para a assistência em saúde, pautadas pela clínica de reabilitação e por um paradigma institucionalizante. Após diferentes críticas pelo simplismo e dualismo dado a atuação dos profissionais da TO, uma série de reflexões foi aberta visando estabelecer uma melhor ação profissional tanto para aquelas feitas no interior das instituições quanto para as ações que transcendem a esses ambientes, apontado para a necessidade de ações técnicas e políticas de forma integrada (BARROS; GHIRARDI; LOPES, 2002). Nas últimas décadas, as questões sócio comunitárias que afetam as ocupações e o cotidiano das pessoas têm tido grande relevância na Terapia Ocupacional e Ciência Ocupacional (CORREIA; ACKERMAN, 2015; COSTA, 2012; FARIAS et al., 2016; FARIAS et al. 2017; FARIAS et al., 2018; GALHEIGO, 2011, OLIVER et al. 2003).
Ainda no caso brasileiro, as discussões em torno da participação social ligada totalmente às práticas do profissional da TO, conforme mostraram pesquisadores (SILVA e OLIVER, 2019) parece haver uma revisão sistemática da participação social em termos da terapia ocupacional. Silva e Oliver, 2019 apontam ainda que há uma necessidade de uma crítica às formas simplistas e reduzidas que pouco “problematizam a contextualização da vida das pessoas imersas em conflitos macrossociais, políticos e culturais”. Segundo as autoras, um exemplo de definição da participação social, frequentemente usada na terapia ocupacional, está presente nas ações com a reabilitação com ênfase no território (OLIVER et al., 2003). Faz-se necessário assim articular projetos que visem o desenvolvimento social e local, engajamento e participação comuns a comunidade estabelecida. Essa ação medida pode também ser entendida como:
“(…) uma estratégia para criar e implementar políticas públicas para esse segmento, contribuindo para a constituição de rede de referência de serviços de saúde, de reabilitação, educação ou de preparação para atividades de geração de renda e trabalho, com maior enraizamento no contexto sociocultural. (OLIVER et al., 2003, p 144)”.
A cultura e o âmbito cultural também coincidem com o engajamento das pessoas, moradores, comunidades e grupos coletivos que com as atividades de expressão artística e cultural, o que tem possibilitado processos de inclusão social, promovendo uma compreensão da singularidade das experiências para se afirmar a participação coletiva (CASTRO e SILVA, 2007).
A Terapia Ocupacional é um campo de conhecimento e intervenção em saúde, em educação e na área social, que reúne tecnologias orientadas para a emancipação e a autonomia de pessoas que, devido a problemáticas específicas (físicas, sensoriais, psicológicas, mentais ou sociais), apresentam dificuldades de inserção e participação na vida social temporária ou definitivamente (Barros e col., 2002, p. 366).
É notável o crescimento dessa profissão no campo da saúde, especialmente na última década. A ampliação da participação desses profissionais pode ser verificada através do incremento da oferta de cursos de graduação na área, principalmente em instituições públicas de ensino, e, também, pelo aumento do número de vagas e de convocações oferecidas pelos concursos públicos. (CARVALHO, 2012. p. 365.)
Concordamos com a referida autora e pensamos o campo e a abordagem do Terapeuta Ocupacional como sendo uma área de intervenção multidisciplinar que transita por diferentes meios e atua em diferentes esferas: pedagógica, social, cultural, de saúde e de tecnologia. O bem estar dos pacientes envolvidos nas intervenções do TO é de suma importância para seu melhor desenvolvimento seja social, cultural, psicomotor ou físico. Nesse sentido, é este profissional que estabelece um elo entre saúde e sociedade sendo seu público diversificado e incorporado em âmbitos que exalem qualidade de vida.
Assim, a Terapia Ocupacional é concebida como um campo de conhecimento que atua na intervenção em saúde, educação e na esfera social, combinando técnicas e tecnologias visando estabelecer a emancipação e autonomia das pessoas que lidam com alguma problemática seja física, sensorial, mental, psicológica, e ou social. A atividade na TO é de acordo com a Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto o “elemento centralizador e orientador na construção complexa e contextualizada do processo terapêutico”. (FMUSP, 2002)
O Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional, COFFITO, define da seguinte forma o profissional de TO:
O Terapeuta Ocupacional é um profissional da saúde, com formação acadêmica superior, capacitado para atuar em todos os níveis de atenção à saúde. Com formação generalista, humanista, ética, crítica e reflexiva, tem capacidade para atuar em conformidade com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde e do Sistema Único da Assistência Social, compreendendo as políticas sociais como direito de cidadania, de forma a garantir a integralidade da assistência em todos os seus níveis de complexidade. (COFFITO, 2009)
Pensar a atuação do TO é pensar a atuação diversificada que sua formação agrega. O TO é assim um profissional que tem um perfil de caráter múltiplo: ao mesmo tempo que se direciona para a saúde e qualidade de vida, promoção do bem-estar físico, social motor, sensório e social, se dirige para as relações interpessoais, para as emoções e sociabilidades, para as relações e interações culturais entre os grupos com quem lida. Nesse segmento, o profissional se capacita a dialogar com outros profissionais como pedagogos, professores, enfermeiros, fisioterapeutas, médicos, assistentes sociais e outros promovendo uma gama de afazeres, uma teia de interatividade profissional.
A formação acadêmica do terapeuta ocupacional, segundo a informação acima é, para a área de saúde, mas sua grade agrega um campo humanístico complexo e completo que envolve ética, crítica, reflexão e ação. Seu campo de abordagem então perpassa por diferentes áreas, dada a formação acadêmica. Esquematicamente podemos colocar o profissional da TO como no modelo a seguir:
O COFFITO, considera também que:
A característica essencial da Terapia Ocupacional é o envolvimento ativo das pessoas no processo terapêutico, pois é a ciência que estuda a atividade humana e a utiliza como recurso terapêutico para prevenir e tratar dificuldades físicas e/ou psicossociais que interfiram no desenvolvimento e na independência do cliente em relação às atividades de vida diária, estudo, trabalho e lazer. Seu interesse está relacionado ao desenvolvimento, educação, emoções, desejos, habilidades, organização de tempo, conhecimento do corpo em atividade, utilização de recursos tecnológicos e equipamentos urbanos, ambiência, facilitação e economia de energia nas atividades cotidianas e laborais, objetivando o maior grau de autonomia e independência possível, diminuindo ou corrigindo patologias, promovendo e mantendo a saúde. (COFFITO, 2009)
Uma das bases da profissão é a criatividade, com essa base os TO utilizam-se diferentes propriedades presentes no cotidiano das atividades humanas como “recurso terapêutico” para alcançar a autonomia do desenvolvimento, da restauração e da ampliação das capacidades funcionais e de relação das pessoas, em diferentes faixas etárias. Conforme o COFFITO, o TO tem como postura essencial o envolvimento ativo das pessoas nesse processo. Com isso, as pessoas tendem a alcançar sua autonomia, independência e fazer o melhor uso de suas potencialidades e interações físicas e sociais.
2. Metodologia da Pesquisa
A pesquisa desse texto resulta de uma revisão bibliográfica, uma revisão de formato integrativo, de caráter descritivo sobre a atuação do terapeuta ocupacional com crianças autistas. Para um primeiro tópico fizemos a leitura das fontes oficiais ligadas ao COFFITO e demais entidades. Entendemos a revisão integrativa como sendo a de uma abordagem significativa, metódica, referente a estudos, permitindo uma eficiente compreensão do estudo analisado. Para operacionalização dessa revisão foram adotadas as seguintes fases: elaboração do tema e pergunta norteadora; estabelecimento de critérios de inclusão e exclusão; coleta em bases científicas; seleção dos artigos e análise, e interpretação dos resultados (SOUZA, SILVA e CARVALHO; 2010).
A estratégia de pesquisa on-line dos artigos foi realizada nas bases de dados Literatura Latino-Americana em Ciências da Saúde (LILACS), Scientific Electronic Library Online (SciELO), Directory of Open Access Journals (DOAJ), Medline e Portal de Periódicos Capes, utilizando os descritores: “crianças autistas” priorizou-se artigos compostos por especialistas em saúde e ou educação uma vez entendemos o trabalho conjunto dessas duas áreas em prol do melhor entendimento sobre como lidar em situações características da criança com TEA.
A pergunta norteadora principal que foi respondida no último tópico foi: como o terapeuta ocupacional deve agir com crianças portadoras de TEA? Nesse sentido, após definir o perfil do Terapeuta Ocupacional de maneira geral, sua formação acadêmica, e, os desafios e perspectivas das crianças autistas, finalizamos respondendo a pergunta. Nesse sentido entendemos neste trabalho de revisão como o definido por Noronha e Ferreira (2000, p. 191) como sendo:
estudos que analisam a produção bibliográfica em determinada área temática, dentro de um recorte de tempo, fornecendo uma visão geral ou um relatório do estado-da arte sobre um tópico específico, evidenciando novas ideias, métodos, subtemas que têm recebido maior ou menor ênfase na literatura selecionada.
Assim, esse nosso texto procura reunir e discutir as informações sobre a área da Terapia Ocupacional, com áreas subjacentes como a Educação. Taylor e Procter (2001) definem revisão de literatura como uma tomada de contas sobre o que foi publicado acerca de um tópico específico.
3. Crianças autistas: desafios e perspectivas
Lidar com crianças autista não é um desafio, é uma situação que exige antes de tudo carisma e atenção. De acordo com o site Autismo e Realidade, ligado à Fundação José Luiz Egydio Setúbal, o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) reúne desordens do desenvolvimento neurológico presentes desde o nascimento ou começo da infância.
São elas: Autismo Infantil Precoce, Autismo Infantil, Autismo de Kanner, Autismo de Alto Funcionamento, Autismo Atípico, Transtorno Global do Desenvolvimento sem outra especificação, Transtorno Desintegrativo da Infância e a Síndrome de Asperger. (AUTISMO E REALIDADE, 2020). Continuando, lemos:
Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais DSM-5 (referência mundial de critérios para diagnósticos), pessoas dentro do espectro podem apresentar déficit na comunicação social ou interação social (como nas linguagens verbal ou não verbal e na reciprocidade socioemocional) e padrões restritos e repetitivos de comportamento, como movimentos contínuos, interesses fixos e hipo ou hipersensibilidade a estímulos sensoriais. Todos os pacientes com autismo partilham estas dificuldades, mas cada um deles será afetado em intensidades diferentes, resultando em situações bem particulares. Apesar de ainda ser chamado de autismo infantil, pelo diagnóstico ser comum em crianças e até bebês, os transtornos são condições permanentes que acompanham a pessoa por todas as etapas da vida. (AUTISMO E REALIDADE, 2020).
A convivência com crianças autistas requer sensibilidade. O cotidiano da pessoa com TEA pode ser repleto de desafios que parecem coisas simples para um adulto ou para outra criança. Diferentes profissionais atuam junto a esse público prevendo e cooperando com melhores condições para lidar com as possíveis situações que enfrentam. Familiares, amigos e cuidadores quando bem orientados podem ajudar o autista a lidar bem com suas limitações e dificuldades e construir uma vida saudável e funcional.
A fita da conscientização é um dos símbolos do autismo criado em 1999, sendo ainda hoje amplamente utilizado. Formada por peças do quebra-cabeça em cores vivas, destacando o azul, o vermelho e o amarelo. Representa a diversidade, a inclusão social, a esperança e a conscientização da sociedade como um todo. (TRILICO, 2022.)
O símbolo por si só já comunica e transmite uma mensagem a ser enfatizada pela sociedade civil como um todo. Ser autista, ter um filho, um irmão, um neto, um vizinho, um aluno, um paciente, não deve ser encarado como “tarefa impossível” ou problema. Mas como uma lida de construção, um sentido para nossa vivência cotidiana e um desafio de sensibilidade
Figura 01: Explicação do símbolo do autismo
Fonte: AUMA Autismo. Disponível em: https://auma.org.br/novidades/voce-sabe-o-que-significa-este simbolo/
Diferentes são as características comportamentais de uma criança autista desde a resistência a métodos “normais” de ensino, até a ausência de medo de perigos reais. Nesse sentido, as crianças autistas tendem a pouco se socializar e necessitam que os adultos as auxiliem em suas relações interpessoais.
O Transtorno do Espectro Autista se manifesta pela modificação na captação e organização sensorial dos 12 sentidos humanos (audição, visão, paladar, olfato, tato, sentido térmico, sentido orgânico, sentido sinestésico, sentido do equilíbrio, do pensamento, da fala e do eu), alterando o desenvolvimento das sete áreas do desenvolvimento infantil e humano (imitação, percepções, coordenação motora fina, coordenação motora global, integração viso motora, cognição e cognição verbal), na medida em que as desnivelada inter e intra-áreas, o que por sua vez é observável pela modificação da comunicação social e comportamento restrito e repetitivo. (MOTA, 2013)
Prosseguindo, o autor destaca que:
O transtorno desorganiza e desestrutura o desenvolvimento provocando em 75% dos casos, deficiência intelectual concomitante. Os dados estatísticos não são precisos e nem absolutos, podendo variar de 1 caso diagnosticado para cada 65 (sessenta e cinco) à 100 (cem) nascimentos. É um transtorno encontrado em todo mundo e em famílias de toda configuração racial, étnica e social. Não se conseguiu provar nenhuma causa psicológica no meio ambiente dessas crianças que podem causar autismo e o mesmo não tem prevenção. (MOTA, 2013)
Pensar mecanismos, atividades e formas de integrar a criança autista à convivência feliz e produtiva requer que diferentes profissionais estabeleçam contatos e estudos de casos específicos visando a melhor ação para cada caso. Cada uma das características citadas na figura anterior equivale a um procedimento específico, vale ressaltar que a ocorrência ou incidência de uma ou mais das características supracitadas se resolvidas de maneira equivocada faz com que a criança autista desenvolva outras características sendo que o medo e o afastamento social são quase sempre as principais respostas para essas crianças.
Os autistas assim possuem uma necessidade de atenção uma vez que suas características variam de acordo com sua personalidade diária. A figura seguinte apresenta as principais características de uma criança autista, vejamos:
Imagem 02: Características de uma criança autista.
Desenhos de Luis Boralli, 2007
Fonte: AUMA Autismo. Disponível em: https://auma.org.br/novidades/voce-sabe-o-que-significa-este simbolo/
Concordando com Camargo e Bosa (2009, p. 65), “o autismo se caracteriza pela presença de um desenvolvimento acentuado atípico na interação social e comunicação, assim como pelo repertório marcadamente restrito de atividades e interesses”.
Compreender o autismo é abrir caminhos para o entendimento do nosso desenvolvimento. Estudar autismo é ter nas mãos um “laboratório natural” de onde se vislumbra o impacto da privação das relações recíprocas desde cedo na vida. Conviver com o autismo é abdicar de uma só forma de ver o mundo – aquela que nos foi oportunizada desde a infância. É pensar de formas múltiplas e alternativas sem, contudo, perder o compromisso com a ciência (e a consciência!) – com a ética. É percorrer caminhos nem sempre equipados com um mapa nas mãos, é falar e ouvir uma linguagem, é criar oportunidades de troca e espaço para o nosso saber e ignorância […] (BOSA, 2002, p. 13).
Interessante a proposta da autora citada quando propõe que estudar o autismo é ter na mão um laboratório natural. Para diferentes profissionais, reiteramos, o cuidado e a participação nos cuidados com crianças autistas abrem uma série de discussões multidisciplinares nas quais a Terapia Ocupacional também pode participar.
Pensar mecanismos de ação para com autistas, requer dos profissionais plenos contatos com a família, e o entorno da criança, estabelecendo um elo comunicativo com o intuito de estabelecer um mapeamento do que pode ser feito em prol da melhor sociabilidade da criança. O centro é a criança, não um centro de olhares de “cima para baixo” ou de “normal para anormal”, mas um centro participativo; requer entender o universo que ele se enquadra.
Esquematicamente, podemos pensar a possibilidade de ação da seguinte maneira:
SmartArt elaborado pelas autoras para este artigo. A imagem do fundo é proveniente da internet
O conhecimento e o planejamento conversam entre si e estabelecem a forma de ação para com as crianças, e o centro disso tudo é a família. Sendo assim, a parceria com a família, escola é importante uma vez que o processo de desenvolvimento da criança ocorrerá de fato quando ocorrer a sensibilização dos profissionais e da família, posto que são eles quem costumam ter maior tempo de convivência com a criança e é importante que estimulem seus filhos nas atividades do cotidiano, buscando inseri-los no ambiente social. É importante ressaltar que a família não está preparada para cuidar de uma criança autista, pois é uma situação inesperada no contexto familiar. (CARVALHO. et. all, 2019. p. 692).
4. Terapia ocupacional frente a crianças autistas: como agir?
Atualmente, o termo Autismo está sendo paulatinamente substituído por Tratamento do Espectro do Autismo (TEA) podendo ser encontrada nas publicações técnico-científicas, consolidado no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V), encontra-se nele também os novos critérios diagnósticos de TEA. Sendo assim, o termo antigo de Transtornos Globais de Desenvolvimento (TGD) deixa de existir e passa a partir do DSM-V que constitui a Classificação Internacional adotada para os critérios de TEA (GATTINO, 2015).
A atuação do TO com crianças portadoras de TEA faz com que o profissional estabeleça atividades psicomotoras de acordo com a necessidade de cada paciente. GONÇALVES ET. ALL., 2019, estabeleceram que o objetivo geral do terapeuta ocupacional no tratamento do TEA é contribuir para a melhoria da qualidade de vida, seja no ambiente escolar ou no ambiente familiar, auxiliando no diagnóstico e construindo intervenções voltadas para as especificidades do sujeito. Assim, os TO propõem-se a auxiliar na introdução, favorecendo melhorias nas habilidades, para que indivíduos com TEA possam chegar a sua independência.
WHITIMAN, 2019, considerou que apontar precocemente o diagnóstico é útil para se preparar um prognóstico, isto é, para definir qual será o curso de desenvolvimento para uma pessoa com este diagnóstico. Pais cujos filhos receberam esse diagnóstico de autismo, pretendem saber o quanto seus filhos serão beneficiados com o plano de tratamento e programas educacionais que será oferecido a esse indivíduo, favorecendo no futuro da criança.
Tomchek et. all. (2017) ao tratarem da reabilitação de pessoas com TEA, criaram um mecanismo de perfil sensorial com a intenção de avaliar a sensibilidade sensorial e a evitação social. Através das práticas dos autores, foram destacadas as atividades no cliente, destacando os resultados positivos e mostrando as habilidades do paciente. Costa e Pfeifer (2016)
apresentam o processo de intervenção terapêutica ocupacional por meio da terapia de integração sensorial, evidenciando que o terapeuta organiza a oferta sensorial adequada ao perfil da criança, gerenciando um equilíbrio entre a demanda sensorial, liberdade de escolha e a necessidade individual, ajustando assim o desafio de modo a promover a resposta adaptativa, com o objetivo de atingir as suas necessidades específicas, destacando-se entre seus objetivos terapêuticos: o desempenho funcional, as capacidades de autorregulação e as habilidades sensório-perceptivo-motoras.
Giardinetto (2009, p. 07) apontou que para o trato com crianças portadoras de TEA temos uma variedade de interpretações e possibilidades de intervenção uma vez cada para cada característica que as crianças apresentem, surgem uma diversidade de metodologias diferentes, sempre angariando resultados positivos e melhorias em suas cognições, relações sociais, culturais e mentais.
Para Matsukura (1997, p. 06) são variadas as maneiras de intervenção utilizadas no tratamento do autismo, sendo que a procura por mecanismos que auxiliem as crianças a participarem de modo consciente em seu meio parecem ser o objetivo principal destas intervenções, embora estas estejam vinculadas a diferentes abordagens teóricas e técnicas. A autora cita algumas formas de intervenção que podem ser utilizadas junto a esta população e, dentre elas, destaca a Terapia Ocupacional.
Para Fernandes et. all. (2021, p. 06), ao estudarem a incidência de COVID-19 em crianças portadoras de TEA, destacaram que a organização da rotina de crianças e adolescentes com TEA, é necessária visando garantir uma maior previsibilidade das atividades cotidianas, é uma estratégia de cuidado essencial a ser adotada em tempos de pandemia e, além dela, também. Essa estruturação pode se dar por meio de diferentes ferramentas, como quadros, imagens/figuras, de forma que eles compreendam o momento de dormir e acordar, fazer as refeições e outras atividades de vida diária, e também pode estar relacionada com a garantia de momentos de lazer e brincadeiras, assim como atividades estruturadas que exigem mais atenção e concentração, como aquelas relacionadas aos conteúdos pedagógicos.
Destaca-se, entretanto, que é preciso contextualizar as diferentes realidades e especificidades presentes na vida de cada criança e adolescente, assim como as dificuldades já existentes e aquelas que emergiram a partir do cenário atual, de forma a amenizar sentimentos que possam gerar desorganização emocional (Laboratório de Terapia Ocupacional e Saúde Mental, 2020).
Dessa forma, a participação ativa da própria criança/adolescente e de sua família na proposição de tais rotinas é algo a ser fomentado pelos profissionais da saúde mental, visando garantir a subjetividade, tal como é proposto por Costa-Rosa (2000). (FERNANDES, et. all., 2021. p. 07)
O critério da especificidade de cada caso, do considerar as particularidades deve ser a maneira primordial da ação do Terapeuta Ocupacional junto às crianças com TEA, nisso o profissional da área deve seguir a proposta observação-comunicação-ação na qual o diálogo com a família se torna um fator essencial. É importante considerar a dinâmica da criança autista. Lembrando que quando se trata de pessoas neurotípicas, todas essas ocupações são desenvolvidas de forma orgânica, sem a necessidade de um acompanhamento mais sistematizado: elas aprendem a brincar imitando outros bebês, com os pais, na creche etc., até o ponto que aprendem e brincam sozinhas, inventam as próprias brincadeiras e jogos. (VICHESE, 2019). No caso de crianças autistas, as ocupações, apesar de básicas, precisam ser estimuladas e ensinadas de forma específica, considerando as potencialidades de cada uma delas e o diagnóstico realizado pela equipe multidisciplinar que as acompanha.
A terapeuta ocupacional Dinara Souza e a analista do comportamento Thais Priori Romano em entrevista à revista Nova Escola (VICHESE, 2019), quando perguntadas sobre como o terapeuta ocupacional atua na prática, responderam que “depende da perspectiva de trabalho que ele adota. É possível trabalhar escolhendo especialidades e abordagens específicas, como a Análise do Comportamento Aplicada (ABA), o modelo Denver, o modelo Floortime ou a Integração Sensorial. Também é possível combinar mais de uma ou não seguir nenhuma especificamente.” As especialistas, consideraram ainda que no Brasil, a Integração Sensorial é uma linha de atuação exclusiva da área da terapia ocupacional e uma das poucas com evidências científicas exclusivas para tratar problemas de processamento sensorial. Segundo essa metodologia de trabalho, o processamento sensorial é a habilidade do sistema nervoso central de absorver, processar e organizar as informações trazidas pelos sentidos e gerar respostas adequadas, seja em forma de comportamento ou aprendizagem.
Para as crianças, neurotípicas, foi apontado que:
Logo que nasce, o cérebro dela recebe informações sensoriais, organiza e dá sentido à elas, respondendo em forma de aprendizagem e comportamentos. O processamento sensorial de crianças autistas é afetado em 95% dos casos: nelas, o processamento das informações sensoriais ocorre de forma desordenada e insatisfatória, gerando respostas inadequadas e atraso nas habilidades em diferentes domínios do desenvolvimento e prejudicando o seu desempenho ocupacional. Vale destacar que os sentidos considerados vão além da visão, audição, olfato, paladar e tato. Existe também o sentido vestibular (responsável pelo equilíbrio) e o proprioceptivo (que responde pela consciência dos movimentos produzidos pelos membros de nosso corpo). (VICHESE, 2019)
A atuação do TO frente a crianças com TEA, se torna uma ação de produção e descobertas: produção de maneiras, atividades e ações específicas visando a melhor estabilidade do paciente, e descobertas dessas ações, reiteramos que não há um método universal, uma maneira estabelecida para lidar com as situações, porém, cada caso, cada característica apresentada pela criança autista deve levar o TO a propor atividades psicomotoras, de socialização em prol do seu paciente.
5. Conclusão
“Às vezes, não entendo o que os outros querem dizer e acabo me sentindo só, mesmo com outros ao meu redor.” Sam Gardner
A frase acima é do personagem Sam Gardner do seriado Norte Americano Atypical1 se enquadra perfeitamente na realidade de muitas crianças autistas: mesmo num ambiente repleto de pessoas e informações, elas se sentem só e se isolam em seu mundo. Pensar propostas de ação de Terapeutas Ocupacionais para com portadores de TEA na infância se torna um desafio aos profissionais da área, mas um desafio que ao mesmo tempo que introduz uma base de ação, produz uma série de informações que ao profissional são caras ao melhor conhecimento de seus pacientes e do cotidiano.
Ao profissional da TO que se propõe a auxiliar crianças com esse transtorno a atenção e percepção são elementos fundamentais para melhor conhecer onde e como deverá agir, e, o que propor. Aceitando que o terapeuta ocupacional prioriza medidas de prevenção com base no desenvolvimento de projetos terapêuticos específicos que são aplicados de acordo com a necessidade de cada indivíduo, é imprescindível que ao atuar com crianças autistas, o profissional estabeleça metas, planos e atividades que auxiliem cada caso em sua especificidade. Logo, esses profissionais avaliam as melhores alternativas e empregam diferentes atividades de trabalho com vistas à evolução do tratamento dos distúrbios físicos, mentais ou dos quadros associados a problemas sociais ou emocionais.
1 Série norte-americana criada por Robia Rashid que conta a história de Sam Gardner, um rapaz diagnosticado dentro do espectro do autismo. A série no Brasil é transmitida pela empresa Netflix, em sua plataforma.
6. Referências
1. BARROS, D. D.; GHIRARDI, M. I. G.; LOPES, R. E. Terapia ocupacional social. In: Revista de Terapia Ocupacional da USP, São Paulo, v. 13, n. 3, p. 95-103, set./ dez., 2002.
2. BOSA, Cleonice Alves. Autismo: atuais interpretações para antigas observações. In: BAPTISTA, Claudio; BOSA, Cleonice (org.). Autismo e educação: atuais desafios. Porto Alegre: Artmed, 2002.
3. CAMARGO, Pimentel Höher; BOSA, Cleonice Alves. Competência social, inclusão escolar e autismo: revisão crítica da literatura. Psicologia & Sociedade, v. 21, n. 1, p. 65-74, 2009. Disponível em:
<https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/20834/000718941.pdf?sequ ence=1>. Acesso em: 10 mar. 2021.
4. CARVALHO, C. R. A. A identidade profissional dos Terapeutas Ocupacionais: considerações a partir do conceito de estigma de Erving Goffman. Saúde Soc. São Paulo, v. 21, n. 2, 2012. p. 365. Disponível em: hromeextension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://www.scielo.br/j/sausoc/a/ wD6fGySkxdB7B5TwvKBffzP/?format=pdf&lang=pt.
5. CARVALHO, Fabio Luiz Oliveira de. et. all. Desenvolvimento da Criança com Autismo. Revista Saúde em Foco. Ed. nº 11, ano 2019. Disponível em: www.htps//efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://portal.unisepe.com.br/uni fia/wp-content/uploads/sites/10001/2019/06/060_DESENVOLVIMENTO-DA CRIANÇA-COM-AUTISMO_687_a_697.pdf
6. CASTRO, E. D. de; SILVA, D. de M. Atos e fatos de cultura: territórios das práticas, interdisciplinaridade e as ações na interface da arte e promoção da saúde. In: Revista de Terapia Ocupacional da Universidade de São Paulo, São Paulo, v.18, n. 3, p. 102-112, 2007.
7. CONVIVENDO COM O TEA. Autismo e Realidade, 2020. Disponível em: https://autismoerealidade.org.br/convivendo-com-o-tea/cartilhas/?utm_source=site&utm_medium=exit_intent&utm_campaign=test_ ab_exit_cartilhas
8. CORREIA, R. L., AKERMAN, M. Desenvolvimento local participativo, rede social de suporte e ocupação humana: relato de experiência em projeto de extensão. In: Revista de Terapia Ocupacional da Universidade de São Paulo. São Paulo, v. 26, n. 1, p.159-65, 2015.
9. COSTA, F. C. S.; PFEIFER, L. L. Intervención de integración sensorial en niños con trastorno del espectro autista. Revista Chilena de Terapia Ocupacional, [s. l.], v. 16, n. 1, p. 99-108, 2016. Disponível em: < https://revistaderechoeconomico.uchile.cl/index.php/RTO/article/view/41947> Acessado em:17/05/2022.
10. COSTA, S. L. Terapia Ocupacional Social: dilemas e possibilidades da atuação junto a Povos e Comunidades Tradicionais. In: Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional. São Carlos, v. 20, n.1, p. 43-54, 2012.
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* Acadêmicas do Curso de Terapia Ocupacional da Faculdade Martha Falcão – Wyden -Manaus, Am.
* * Professora do Curso de Terapia Ocupacional da Faculdade Martha Falcão – Wyden – Manaus, Am.