REGISTRO DOI:10.69849/revistaft/th10249301110
Maria Tatiane Dias Moura1
Luciana Rocha Alves2
Fernanda Machado Nogueira Castro3
Thiago Soares Martins4
Fabio Bonadio Gonçalves5
Graziela Mendes de Castro6
Larissa Lopes Belline7
Barbara Bendzius Costa8
Anna Karolina da Silva Lourenço9
Lusiane da Silva Nascimento10
Alexia Rafaela da Conceição Silva11
Kelly Aparecida de Souza Alves12
Itamara Augusta Diniz13
Martha Evangelista Guedes14
Fernanda Graziela Costa Bezerra15
1. INTRODUÇÃO
A regeneração do tecido cardíaco após um infarto do miocárdio representa um desafio na medicina cardiovascular moderna. O infarto, causado pela interrupção do fluxo sanguíneo para o músculo cardíaco, resulta em necrose do tecido e subsequente formação de cicatrizes, comprometendo permanentemente a função cardíaca (Caño-Carrillo et al., 2023). As terapias convencionais, como medicamentos e intervenções cirúrgicas, visam limitar os danos e melhorar os sintomas, mas, muitas vezes, não conseguem reverter a perda estrutural do tecido cardíaco (Fernandes & Perin, 2007). Nesse contexto, a terapia com células-tronco surge como uma abordagem promissora para regenerar o tecido cardíaco danificado, trazendo novas esperanças para pacientes que sofrem de insuficiência cardíaca decorrente de um infarto (Moerkamp & Goumans, 2012).
O problema central da regeneração cardíaca pós-infarto reside na capacidade limitada do coração adulto de se auto-reparar. Diferente de outros tecidos, o músculo cardíaco apresenta uma baixa taxa de renovação celular, o que impede a recuperação completa após a lesão. As cicatrizes formadas após o infarto não possuem as propriedades funcionais do tecido original, resultando em comprometimento da capacidade de bombeamento do coração e, eventualmente, insuficiência cardíaca. Esse cenário motiva a busca por estratégias inovadoras que não apenas tratem os sintomas, mas que promovam a regeneração real do tecido miocárdico (Fernandes & Perin, 2007).
Nas últimas décadas, a terapia com células-tronco ganhou destaque como uma solução potencial para esse problema. Estudos pré-clínicos e clínicos iniciais demonstraram que a aplicação de células-tronco no tecido infartado pode estimular a regeneração celular e melhorar a função cardíaca (Rodrigues et al., 2018). Diversos tipos de células-tronco estão sendo investigados, incluindo células-tronco mesenquimais, células derivadas da medula óssea e células-tronco pluripotentes induzidas (Sanz & Jiménez‐Quevedo, 2007). No entanto, os resultados até agora têm sido mistos, com desafios como a baixa taxa de retenção celular no tecido cardíaco e a falta de diferenciação eficiente em células cardíacas funcionais (Fontes et al., 2023)
A relevância da pesquisa com células-tronco para regeneração cardíaca é indiscutível. O infarto do miocárdio continua a ser uma das principais causas de mortalidade e morbidade em todo o mundo (Rodrigues et al., 2018). A insuficiência cardíaca, que frequentemente se segue a um infarto, impõe uma carga substancial aos sistemas de saúde e afeta a qualidade de vida dos pacientes (Terzic & Pérez-Terzic, 2010). A terapia com células-tronco não apenas oferece uma nova abordagem para tratar esses pacientes, mas também contribui para o avanço do conhecimento em biologia celular e regeneração tecidual, áreas de extrema importância para a medicina moderna (Bertanha, 2016).
Diante desse cenário, o presente artigo tem como objetivo revisar os avanços recentes na terapia com células-tronco para regeneração do tecido cardíaco após infarto do miocárdio. A partir de uma revisão integrativa da literatura, serão discutidos os tipos de células-tronco investigados, os mecanismos envolvidos na regeneração cardíaca, os resultados dos estudos clínicos e pré-clínicos, e os desafios que ainda precisam ser superados para que essa abordagem possa se consolidar como uma opção viável na prática clínica.
2. METODOLOGIA
Foi realizada uma revisão integrativa de literatura para reunir informações sobre o tema. A pesquisa incluiu 11 artigos da base Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e SciELO. Para isso, foram utilizados os descritores selecionados na plataforma DeCS/MeSH – Descritores em Ciências da Saúde/Medical Subject Headings, sendo estes “Células-Tronco”, “Coração”, e “Infarto do Miocárdio” com o uso do operador booleano “AND” 2.818 artigos foram encontrados e selecionados conforme os critérios de inclusão adotados: artigos completos e de livre acesso, publicados nos últimos 17 anos (2007-2024) e em português, inglês ou espanhol. Foram excluídos artigos incompletos, sem livre acesso ou fora do período e idiomas especificados.
A seleção dos artigos foi conduzida a partir de uma identificação inicial com base na metodologia estabelecida. Primeiramente, foram considerados todos os artigos disponíveis após a aplicação dos filtros. Em seguida, iniciou-se o processo de triagem, que envolveu a exclusão de artigos que não atendiam ao tema do estudo após a leitura de seus títulos e resumos. Os artigos que passaram por essa primeira etapa foram então lidos e avaliados na íntegra para uma triagem mais detalhada. Somente aqueles que se adequaram completamente aos critérios de inclusão definidos foram selecionados para fazer parte da pesquisa.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados da revisão integrativa de literatura sobre a terapia com células-tronco para regeneração cardíaca pós-infarto do miocárdio revelam um campo de pesquisa em rápida evolução, com avanços significativos, mas também desafios consideráveis. Diversos estudos pré-clínicos e clínicos destacam o potencial das células-tronco em promover a regeneração do tecido cardíaco danificado. Entre os principais tipos de células-tronco investigados estão as células-tronco mesenquimais (CTMs), derivadas de diversas fontes, como medula óssea, tecido adiposo e cordão umbilical, e as células-tronco pluripotentes induzidas (iPSCs) (Fontes et al., 2023). Esses tipos celulares têm demonstrado a capacidade de secretar fatores pró-regenerativos e modular respostas inflamatórias, favorecendo um ambiente propício à reparação tecidual.
Nos estudos clínicos, as células-tronco mesenquimais emergem como uma das abordagens mais promissoras. Um dos principais achados é a capacidade dessas células de reduzir o tamanho das cicatrizes pós-infarto, melhorar a função ventricular e aumentar a perfusão miocárdica. Além disso, há evidências de que as CTMs promovem a formação de novos vasos sanguíneos (angiogênese), o que contribui para a recuperação da função cardíaca. No entanto, os ensaios clínicos em larga escala ainda apresentam resultados heterogêneos, com variações nos desfechos entre os estudos, dependendo de fatores como o tipo de célula utilizado, a via de administração, e o tempo decorrido desde o infarto até a intervenção (MONTEIRO et al., 2010).
Outro avanço importante envolve o uso de células-tronco pluripotentes induzidas (iPSCs). Esses estudos mostram que as iPSCs têm a capacidade de se diferenciar em células cardíacas funcionais (cardiomiócitos) in vitro e, quando transplantadas em modelos animais, podem contribuir para a regeneração do tecido infartado. No entanto, os resultados clínicos são ainda limitados e há preocupações sobre a segurança, especialmente em relação ao risco de formação de tumores e à rejeição imunológica. Além disso, os protocolos de diferenciação de iPSCs em células cardíacas ainda não são suficientemente eficientes para garantir uma aplicação clínica em larga escala (Fontes et al., 2023).
A discussão dos resultados revela que, apesar dos avanços consideráveis, ainda existem obstáculos importantes que limitam a aplicação generalizada da terapia com células-tronco para regeneração cardíaca. Um dos principais desafios é a baixa taxa de retenção e sobrevivência das células transplantadas no tecido cardíaco. Estudos sugerem que a maioria das células infundidas morre ou é eliminada pelo organismo nas primeiras semanas após a administração, limitando seus efeitos regenerativos a longo prazo (Fernandes & Perin, 2007). Pesquisas atuais estão investigando técnicas para melhorar a retenção celular, como o uso de biomateriais, scaffolds e técnicas de engenharia tecidual, que podem criar um ambiente mais favorável para a sobrevivência das células (Wang et al., 2018).
Outro aspecto relevante para a discussão é a necessidade de personalização do tratamento. A variabilidade nas respostas dos pacientes à terapia celular, em parte atribuída às diferenças genéticas, ao estado clínico e à gravidade da doença, sugere que a terapia com células-tronco pode ser mais eficaz se ajustada às características individuais de cada paciente. Essa abordagem personalizada pode maximizar os benefícios clínicos e minimizar os riscos, embora sua implementação em larga escala ainda dependa de avanços na farmacogenômica e na medicina de precisão (Pinho et al., 2014).
A questão ética e regulatória também emerge como um ponto crucial na discussão. O uso de células-tronco, especialmente células embrionárias e iPSCs, envolve considerações éticas significativas, e os regulamentos internacionais variam amplamente quanto à pesquisa e ao uso clínico dessas células. As questões de segurança a longo prazo, como o risco de formação de tumores e reações imunológicas, precisam ser cuidadosamente avaliadas antes que essas terapias possam ser amplamente adotadas. Em resumo, embora a terapia com células-tronco para regeneração cardíaca pós-infarto seja promissora, os desafios científicos, clínicos e éticos ainda precisam ser superados para que essa abordagem se consolide como uma alternativa viável e segura na prática clínica (Fontes et al., 2023).
4. CONCLUSÃO
Após a análise dos 11 artigos, com base nos resultados obtidos, foi possível constatar que a utilização de células-tronco mesenquimais (CTMs) e células pluripotentes induzidas (iPSCs) representam abordagens promissoras, com estudos clínicos e pré-clínicos apontando melhorias significativas na função cardíaca, perfusão miocárdica e regeneração tecidual. No entanto, os resultados demonstram que, embora o potencial dessas terapias seja evidente, a eficácia e a segurança a longo prazo ainda não foram completamente estabelecidas, especialmente em relação às iPSCs, que apresentam riscos de tumorigenicidade e rejeição imunológica (Fontes et al., 2023).
Apesar dos avanços observados, algumas lacunas persistem, dificultando a implementação dessas terapias em larga escala. Um dos principais desafios destacados foi a baixa taxa de retenção e sobrevivência das células transplantadas no tecido cardíaco, o que limita os efeitos regenerativos sustentáveis (Carotenuto et al., 2021). A falta de padronização nos protocolos de diferenciação das células, além da variabilidade nas respostas dos pacientes, também emergiu como um entrave. A personalização do tratamento e o desenvolvimento de estratégias que aumentem a eficiência da retenção celular são tópicos que demandam maior investigação científica para garantir o sucesso terapêutico.
Assim, conclue-se a necessidade urgente de mais pesquisas clínicas rigorosas, com foco em segurança a longo prazo e eficácia das terapias celulares em diferentes populações. A investigação sobre novas técnicas de engenharia tecidual, uso de biomateriais e personalização das terapias são aspectos fundamentais para o avanço da área. Além disso, questões éticas e regulatórias devem ser cuidadosamente abordadas para garantir a segurança e equidade no acesso às terapias. Em resumo, embora a terapia com células-tronco represente um futuro promissor para a regeneração cardíaca, ainda há um caminho a ser percorrido antes que essa tecnologia possa ser consolidada como uma prática clínica segura e eficaz.
REFERÊNCIAS
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1 Mestra em Ciências Farmacêuticas pela UFAL
2 Acadêmica de medicina pela Unifacid/Idomed
3 Acadêmica de Medicina pelo Centro Universitário Aparício Carvalho
4 Acadêmico de Medicina pela Universidade do Estado do Amazonas
5 Acadêmico de Medicina pelo Instituto Municipal de Ensino Superior de Assis
6 Acadêmica de Enfermagem pelo Centro Universitário do Distrito Federal
7 Graduada em Medicina pela Universidade de Cuiabá
8 Graduada em Medicina pela Universidade Cidade de São Paulo
9 Graduada em Enfermagem Centro universitário do Distrito Federal
10 Graduada em Enfermagem pelo Centro Universitário do Distrito Federal
11 Graduada em Enfermagem pelo Centro Universitário do Distrito Federal
12 Graduada em Enfermagem pelo Centro Universitário do Distrito Federal
13 Graduada em Enfermagem pelo Centro Universitário do Distrito Federal
14 Graduada em Enfermagem pelo Centro Universitário do Distrito Federal
15 Graduada em Enfermagem pelo Centro Universitário do Distrito Federal