TÉCNICA CIRÚRGICA EM 1 ESTÁGIO EM ARTROPLASTIA TOTAL DE QUADRIL COM INFECÇÃO ADAPTADA À REALIDADE BRASILEIRA

SURGICAL TECHNIQUE IN ONE STAGE IN TOTAL HIP ARTHROPLASTY WITH INFECTION ADAPTED TO THE BRAZILIAN REALITY

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8117883


Mário Soares Ferreira Júnior


RESUMO

A infecção é uma das complicações potenciais da artroplastia total de quadril, onde chegam a ser de 25 a 30% dos casos de insucesso do procedimento cirúrgico. A prótese de quadril evoluiu significativamente ao longo das últimas duas décadas, no que concerne à melhoria do desempenho dos biomateriais que a compõem: tipo de cúpula de fricção articular, cimento ósseo, técnica cirúrgica usada para a sua fixação, implantação, biomecânica funcional e mobilidade. O presente estudo descreve a técnica cirúrgica em 1 estágio de artroplastia total de quadril que apresenta infecção bacteriana. Discute as indicações, contraindicações, cuidados pós-operatórios, bem como a adaptabilidade desta técnica para a realidade brasileira. Esta técnica cirúrgica é semelhante a uma ressecção tumoral, pois exige do cirurgião ortopedista uma rigorosidade no quesito visual e tátil para eliminar o foco da infecção na ferida. Esta acaba sendo um uma boa opção de tratamento pois apresenta o pós-operatório menos doloroso, recuperação rápida da infecção, bem como uma economia financeira pois evitará a realização de mais procedimentos cirúrgicos com taxas de sucesso melhores que a revisão em 2 estágios e o desbridamento da articulação do quadril com retenção do implante (DAIR).

Palavras-chaves: Quadril, Artroplastia Total de Quadril, Infecção, Cimento com Antibiótico.

ABSTRACT

Infection is one of the potential complications of total hip arthroplasty, where it accounts for 25 to 30% of cases of unsuccessful surgical procedure. The hip prosthesis has evolved significantly over the last two decades, about the improvement in the performance of the biomaterials that compose it, type of joint friction dome, bone cement, surgical technique used for its fixation, implantation and functional biomechanics and mobility which is very close to the anatomy of the unhealthy hip, among other aspects. The present study describes the surgical technique in a stage of total hip arthroplasty that presents bacterial infection and discusses the indications, contraindications, postoperative care, as well as the adaptability of this technique to the Brazilian reality. This surgical technique is like a tumor resection, as it requires the orthopedic surgeon to be rigorous in terms of visual and tactile aspects in order to eliminate the focus of infection in the wound. This ends up being a good treatment option as it presents a less painful postoperative period, quick recovery from the infection, as well as financial savings as it will avoid performing more surgical procedures.

Keywords: Hip, Total Hip Arthroplasty, Infection, Cement with Antibiotic

  1. INTRODUÇÃO

A artroplastia total de quadril (ATQ) representa uma das intervenções cirúrgicas de reconstrução articular de sucesso clínico satisfatório, proporcionando o alívio da dor e o restabelecimento da capacidade funcional a centenas de pacientes por todo mundo. Os cirurgiões ortopedistas dispõem de uma variedade de próteses articulares que incluem implantes cimentados, não cimentados, híbridos e de revestimento, e com diversas cúpulas de fricção articular, metal-metal, cerâmica-cerâmica, cerâmica-polietileno reticulado, metal-polietileno e metal-cerâmica. Os tipos de prótese de quadril apresentam um desenho muito próximo da anatomia do quadril saudável, permitindo alcançar um bom resultado clínico. (HARKNES, ET AL.,2008).

Nem todas as cirurgias de artroplastia do quadril apresentam sucesso. Várias complicações imediatas ao procedimento e a longo prazo podem comprometer o insucesso da técnica cirúrgica aplicada. A infecção bacteriana primária é desastrosa, podendo ocorrer numa porcentagem de até 5% dos casos. Representando uma das complicações mais temidas pelos cirurgiões ortopedistas, com o agravamento do crescente número de procedimentos cirúrgicos de prótese de quadril infectada. (AMMON E STOCKLEY, 2004; CALHOUN E MADER, 2003).

O tratamento de infecção é de longa duração, muitas vezes requer mais de um procedimento cirúrgico, levando a sofrimento e limitação e a elevação custos sociais e financeiros. Apesar deste índice a resolução do processo infeccioso com um novo procedimento cirúrgico de artroplastia de quadril é de 80% a 90% de sucesso, devido ao avanço tecnológico e de técnicas cirúrgicas (ZAHAR, GEHRKE,2016).

O tratamento de infecção em artroplastias de quadril pode ser irrigação e desbridamento com retenção de implantes para infecções agudas e a troca da prótese como um procedimento de 1 ou 2 estágios para infecções profundas e crônicas. Quando a cirurgia é realizada em 1 estágio, o paciente apresenta menos tempo de internação, melhoria de qualidade de vida, bem como o gasto financeiro reduzido, pois o procedimento acaba sendo ao mesmo tempo o tratamento da infecção e a troca da prótese. Também apresenta um tempo reduzido de utilização de antibióticos.

Já o procedimento realizado em 2 tempos não se sabe o intervalo entre o tratamento da infecção e a troca da prótese. Essa dúvida, ainda não resolvida pela ciência, gera mais tempo de internação, bem como aumento de gastos financeiros e compromete a qualidade de vida do paciente. Portanto este tipo de procedimento acaba tendo mais chances de falhas quando comparado com a cirurgia em 1 estágio (ZMISTOWSKI ET AL, 2017). Sem considerar que uma porcentagem de pacientes não converte para nova prótese, permanecendo com espaçador ou em Girdlestone de forma definitiva.

Portanto a procedimento cirúrgico em 1 estágio permite controle da infecção crônica com a remoção dos componentes da prótese, pois as bactérias aderem-se à superfície do implante e ao cimento ortopédico, formando um verdadeiro filme biológico a partir da produção de polissacarídeos (GRISTINA; KOLKIN, 1983). Nesta camada, os microrganismos se reproduzem e formam colônias que não são retiradas do material implantado, mesmo com lavagem mecânica (COSTERTON ET AL., 1987)

Atualmente, a troca da prótese de quadril em 2 estágios é o método mais utilizado no tratamento crônico de próteses de quadril com infecção. Porém a troca da prótese em 1 estágio tem por objetivo principal o controle da infecção em combinação com manutenção da funcionalidade da articulação do quadril. Sendo uma técnica cirúrgica viável, dependendo do estado de saúde geral do paciente, da experiência do cirurgião ortopedista e o planejamento hospitalar de tratamento. (ZAHAR, GEHRKE,2016).

Portanto neste estudo será apresentada a técnica cirúrgica de 1 estágio descrita por Zahar e Gehrke,2016, onde ela será adaptada para a realidade brasileira, tornando assim uma boa opção no hall de tratamento de próteses de quadril infectada. Na tabela 1 são apresentados os critérios de indicação e contraindicação da troca da prótese de quadril infectada.

Tabela 1: Critérios para indicação e contraindicação da troca da prótese infectada de quadril






INDICAÇÕES

1 artroplastia de quadril apresenta infecção comprovada com base no Grupo de Consenso Internacional sobre Infecção Articular Periprotética (Tendo o resultado em pontuação > ou igual a 6).
2 Apresentar infecção tardia ou crônica por um período superior a 30 dias após o procedimento cirúrgico ou apresentar infecção óssea hematogênica após este período.
3 Agente infeccioso conhecido com suscetibilidade conhecida com base em diagnóstico microbiológico.
4 Estoque ósseo adequado para receber cimento ou, em alguns casos, reconstrução não cimentada.
5 Possibilidade primária do fechamento da ferida.




CONTRAINDICAÇÕES

1 Infecção articular periprotética apresentar cultura negativa.
2 Falta de antibióticos apropriados.
3 Sepse sistêmica do paciente (necessidade de retirada urgente da prótese para evitar a morte do paciente)
4 Falha em 2 ou mais estágios anteriores de procedimentos.
5 Infecção envolvendo os feixes neurovasculares do nervo femoral, nervo ciático e vasos ilíacos.
6 Extenso envolvimento de partes moles que possam impedir o fechamento da ferida. (Fístula não é uma contraindicação desde que seja trabalhado com microcirurgia ou cirurgia plástica e ela seja coberta).
  1. TÉCNICA CIRÚRGICA

O resultado da troca da prótese de quadril em 1 estágio é dependente da técnica cirúrgica. Este procedimento depende em grande parte da eficiência com que o desbridamento e a redução da carga biológica é realizada. Portanto a seguir será apresentada a técnica cirúrgica em 1 estágio.

2.1 Planejamento Pré-Operatório

Em todos os casos, radiografias simples pré-operatórias (perfil e posicionamento anteroposterior) são realizadas (figura 1). Nos casos que apresentam perda óssea, a tomografia computadorizada pode ser solicitada. Através do Software MediCad (Hecte, Lanshut, Alemanha) é realizado a reconstrução do tamanho do membro, o deslocamento lateral (offset) e o centro de rotação do quadril, gerando assim a definição apropriada dos tamanhos dos implantes da prótese que serão utilizados.

Antes do procedimento cirúrgico deve-se realizar uma punção articular definir qual é a bactéria ou um exame de cultura aberta. Também pode ser realizado o teste de esterase leucocitária e da alfa-defensiva lateral flow (SYNOVASURE – ZIMMER…), que é uma enzima que está presente na maioria dos leucócitos (glóbulos brancos), quando este é positivo, pode indicar que há quadro infeccioso. Esses testes entram na pontuação conforme o consenso de infecção periprotética de 2018.

Fig. 1. Radiografia Pós-operatório AP de pelve após prótese de quadril.

Fonte: Autor,2023

Portanto este planejamento visa controlar a infecção e restabelecer de maneira mais adequada a anatomia do quadril, restaurando de maneira mais adequada biomecânica do quadril, restabelecendo o centro articular do quadril, o “offset”, equalizar os membros inferiores.

2.2 Preparação do Paciente

Os pacientes são posicionados em decúbito lateral com a pelve bem fixa e com uma almofada entre as pernas proporcionando um posicionamento estável com a perna envolvida movendo-se livremente em todas as direções. A pele é limpa quatro vezes com uma solução alcoólica e estéril. O tempo de limpeza deve ser de pelo menos 2 minutos. Se a pele estiver seca novamente após a desinfecção, é utilizada uma bandagem no quadril. O comprimento da incisão e a possível extensão da cirurgia tem que ser considerada para que o espaço seja todo desinfectado durante a preparação do paciente.

2.3 Procedimento Cirúrgico

Recomenda-se uma abordagem póstero-lateral do quadril infectado. Cicatrizes antigas, fístulas, drenos devem ser contemplados, se possível, no mesmo acesso. Desprendimento da fixação do músculo glúteo máximo permite um melhor acesso posterior da articulação e evita a lesão no nervo ciático; as forças rotacionais também serão reduzidas e, portanto, a fratura femoral periprotética pode ser evitada. Toda a cápsula sinovial e tecido infeccioso são extirpados.

A vantagem da abordagem posterior é amplo acesso a todas as partes do acetábulo e em todo o fêmur. Tanto endomedular quanto a preparação periosteal é facilmente realizada. A abordagem pode ser estendida em qualquer direção. Um acesso à parte distal do fêmur para ser alcançado pela preparação ao longo do septo intermuscular. Uma neurólise do nervo ciático pode ser executada, caso seja necessário.

Posicionamento de ambos os componentes: acetabular e femoral são mais seguros e confiáveis ao usar a abordagem póstero-lateral. A desvantagem desta abordagem é o suposto risco de deslocamento que podem ser evitados pelo posicionamento adequado do implante e uso de componente em dupla-mobilidade.

Etapa 1: Desbridamento e Retirada da Prótese Infectada

Esta etapa do procedimento cirúrgico é totalmente visual e tátil, onde o cirurgião tem que tocar e sentir os tecidos que estão infectados para que seja realizado o desbridamento de forma eficiente. Pois os tecidos moles apresentam uma cor arroxeada e uma textura “borrachuda”.

O desbridamento inicia-se extirpando o tecido prévio da cicatriz. Se apresentar fístula, deve ser integrada na incisão da pele e radicalmente extirpada. Portanto todo o saco que está englobado na cicatriz e na prótese necessita de ser retirado. Todos os tecidos moles sem sangramento e os ossos comprometidos que não sangram (sinal da páprica) e que não possuem periósteo precisam ser excisados. Um osso que apresenta sangramento e periósteo tem que ser preservado.

Portanto o desbridamento tem que ser bastante agressivo, onde tem que ser retirar ao máximo a área infectada, esta etapa tem que ser realizada da mesma forma de uma retirada de um tumor, onde quanto mais alcançar a área livre da infecção melhor será a resposta ao tratamento. Durante o desbridamento são retiradas muitas amostras de tecidos que são levadas posteriormente para a biópsia, figura 2 (10 amostras para microbiologia e 10 amostras para patologia).

Figura 2: Demarcação do local do Desbridamento e as amostras de tecidos retiradas para biópsia

Fonte: Autor, 2023

Para a remoção das hastes longas cimentadas, são utilizados instrumentos específicos como: cinzéis curvos, fórceps, instrumentos de curetagem, brocas longas, fresas rápidas e osteótomos de cimento são necessários. Nesta fase é bastante importante que a equipe cirúrgica tenha instrumentos que possam ser utilizados em diferentes modelos de prótese. Todos as partes da prótese e materiais estranhos são removidos. Os implantes femorais da prótese podem exigir (mas a técnica recomenda que não seja feita) uma osteotomia longitudinal ou, raramente, uma osteotomia trocantérica estendida, também são removidos todo cimento e os restritores. Geralmente, o desbridamento dos tecidos moles e osso são radicais pois devem incluir todas as áreas da perda óssea ou de osso comprometida. Ocasionalmente, a ressecção do trocânter maior ou parte proximal do fêmur se torna necessária. Essa situação exige, o uso de uma nova prótese totalmente cimentada, modular e com implantes longos que permitam a cimentação de pelo menos 10 centímetros distais da haste dentro do fêmur. Essa ressecção do fêmur proximal torna obrigatória a utilização de implantes acetabulares do tipo dupla-mobilidade com possibilidade de cimentação e/ou combinação de componente acetabular em metla trabecular e cimentação de um componente de dupla-mobilidade dentro do componente de metal trabecular. Em alguns casos, a ressecção do fêmur proximal é a escolha durante o desbridamento, devido a presença de infecção (Figura 3).

Portanto a retirada da fonte de infecção e todo material estranho permite as defesas endógenas, como a fixação do complemento, e o uso de terapias exógenas, como a antibioticoterapia (GRISTINA; KOLKIN, 1983 e GARVIN; HANSSEN, 1995).

Figura 3: Região do Fêmur pós desbridamento e ressecção

Fonte: Autor, 2023

Etapa 2: Irrigação com Antisséptico local

Recomenda-se uma lavagem com jatos em todo o procedimento, no entanto após o desbridamento e a remoção completa do implante, os canais intermedulares são preenchidos com policloridrato de policloridrato de biguanida mérica (polihexanida) embebidas em toalhas cirúrgicas por um período de 10 a 15 minutos, no Brasil, a substância utilizada é o Prontosan, uma substância para descontaminação da ferida (figura 4). Após a conclusão da ressecção, procede-se com a reorganização do campo cirúrgico, alteração da ponta de sucção e os cabos de luz. São trocadas também o capote cirúrgico e as luvas de toda equipe cirúrgica.

Figura 4: Área do Quadril limpa pós retirados da prótese infectada e realizada a desbridação

Fonte: Autor, 2023

Novos instrumentos são levados ao centro cirúrgico para a colocação da nova prótese. Uma nova preparação completa do paciente é impossível de realizar, pois a ferida está aberta, portanto são administrados antibióticos específicos neste momento de acordo com a recomendação do especialista, conforme a cultura prévia obtida na punção ou cultura aberta.

Etapa 3: Colocação da Nova Prótese

A colocação da nova prótese prossegue, assim como outros tipos de cirurgias de revisão, de forma própria. Não é recomendado utilizar aloenxerto, embora apresente resultados positivos, estes são enxertos que tem antibióticos impregnados neles.

Os defeitos são preenchidos com cimento ósseo de polimetil-metacrilato – PMMA (Copal, Heraeus Medical, Hanau, Alemanha) ou Tantalum Augments (Trabecular Metal, Zimmer Inc, Warsaw, IN, EUA). São utilizadas cunhas de metal trabecular e componentes acetabulares de metal trabecular para a reconstrução do estoque ósseo acetabular. De acordo com a situação do defeito ósseo durante a reconstrução é utilizado um anel de Burch-schneider, em combinação com cimento ósseo PMMA que está carregado com antibiótico. A reconstrução femoral deve ser levada em consideração a presença ou não de defeitos femorais. Se o fêmur apresentar defeitos, deve ser tratado com haste de fixação distal cimentada MP-Link. Por outro lado, se não apresentar defeitos ele é tratado com hastes cimentadas convencionais. Um aspecto muito importante quanto a reconstrução do fêmur, é a utilização de cimento enriquecido com antibióticos.

Enquanto isso, o cimento carregado com antibiótico é preparado de acordo com um protocolo restrito. Os cimentos ósseos carregados com antibióticos podem conter antibióticos solúveis em água e apresentar resistência ao calor em cristais forma de linha. O pó deve ser misturado com o pó do cimento ósseo PMMA antes de ser adicionado o polimerizador líquido. Em geral, cimentos ósseos são fabricados com antibióticos como Copal G+C (gentamicina e clindamicina) ou Copal G+V (gentamicina + vancomicina) (Heraeus Medical, Wertheim, Alemanha). Em procedimentos cirúrgicos no Brasil são utilizados os cimentos Palacos e Copal C+G, ambos possuem uma excelente eficácia no combate de bactérias (Figura 5). No entanto, de acordo com o planejamento pré-operatório e os achados microbiológicos podem indicar uma mistura antibiótica própria. Ao utilizar o cimento com antibióticos para a fixação definitiva de uma nova prótese, deve ser utilizado no máximo 10% de antibiótico adicionado ao cimento para manter suas propriedades biomecânicas de biomaterial. No entanto, deve-se tomar cuidado com a quantidade total de antibióticos utilizada no local da cirurgia para prevenir a toxicidade sistêmica. Embora raramente descritos, antibióticos tópicos podem ser nefrotóxicos e podem levar à insuficiência renal. É essencial que o antibiótico adicionado ao cimento tenha como ação principal o combate ao organismo infectante; estar em forma de pó, não líquido e ser bactericida. Recomenda-se colocar cimento com antibiótico ao redor da prótese reimplantada, na região desnuda de osso para otimizar a liberação de antibióticos no espaço morto e combater a reinfecção das bactérias pelo “princípio da corrida pela superfície”. (figura 5).

Figura 5: Cimentos, antibióticos utilizados e a prótese implantada

Fonte: Autor, 2023

Um detalhe muito importante é que na etapa de confecção da rolha femoral para limitação do cimento distalmente utilizamos Gelfoam e Surgicel para ocluir o canal femoral. Esses são materiais absorvíveis e que tornam uma eventual revisão muito mais facilitada.

Portanto para a colocação da nova prótese do quadril, é indicado que seja utilizado componente acetabular em dupla mobilidade, haste femoral de fixação distal, cimentada e modular. A recomendação é que use offset femoral lateralizado e distalizado. O componente acetabular em dupla-mobilidade deve ser fixado em metal trabecular ou cimentado dentro de um acetábulo em metal trabecular fixo com parafusos. Sua posição deve ser de < 40º de inclinação e 0º de anteversão em casos onde exista insuficiência do músculo glúteo médio ou em caso de resseccao do fêmur proximal.

Ao reduzir o quadril protético, o cirurgião irá realizar o teste de Ober com o objetivo de avaliar a tensão de partes moles do quadril. O desejável é um resultado levemente positivo.

  1. POSSÍVEIS COMPLICAÇÕES

A persistência ou recorrência da infecção permanente permanece a complicação mais relevante após a cirurgia de artroplastia total de quadril, a tabela 2 apresenta as possíveis complicações.

Tabela 2: Complicações e ações após intervenção cirurgica

ComplicaçãoSeveridadeAção
Problema de cicatrização de feridasLeveRevisão antecipada
LuxaçãoLeveRedução fechada
Luxação repetidaModeradaRedução aberta, revisão de componentes
Infecção persistenteGraveRevisão antecipada, troca de componentes modulares, desbridamento, recarga com antibióticos locais
Falha na revisão em 1 EstágioGraveTroca em revisão de 2 estágios com espaçador de antibiótico.
  1. ADMINISTRAÇÃO DE ANTIBIÓTICOS PÓS-OPERATÓRIO

No procedimento cirúrgico de 1 estágio, a administração de antibióticos geralmente é continuada por um período de 10 a 14 dias. Uma linha venosa central é utilizada durante este período. No caso de prótese de quadril infectada com Estreptococos, um período mais logo de antibioticoterapia pode ser indicado. Nas 2 primeiras semanas, é indicada a administração intravenosa, após a terapia pode ser continuada de forma oral dependendo do corpo ao organismo infectante e a disponibilidade do antibiótico em forma oral. O antibiótico terapêutico é determinado por um especialista e o organismo infectante, que é membro de uma equipe multidisciplinar do protocolo terapêutico do paciente. Não há necessidade de o paciente manter-se internado. Idealmente que ele faça medicamentos em day-clinic ou em home-care.

  1. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A revisão de artroplastia em 1 único estágio é uma opção razoável para o tratamento de infecção da articulação do quadril em circunstâncias nas quais os antibióticos efetivos estão disponíveis, exceto em pacientes com manifestações infecções bacterianas, nos quais pode ser necessária a artroplastia de
ressecção e a redução da carga microbiana. Pois existe boas taxas de controle de infecção, como mostra o estudo de Zahar et al 2016, onde realizaram a revisão de artroplastia em 1 único estágio em pacientes com infecção da articulação do joelho e o sucesso visto foi de 93% de todos os pacientes que realizaram este procedimento em um período de 10 anos.

Portanto, para que este procedimento cirúrgico apresente um resultado satisfatório, deve se seguir rigorosamente as etapas da técnica cirúrgica, desde a preparação pré-operatória, passando pelo desbridamento radical e agressivo, a utilização do cimento com antibiótico, até a recolocação da nova prótese. Lembrando que o ponto crucial desta é a fase de desbridamento, onde tem que se realizar uma limpeza agressiva da área como se estivesse realizando uma ressecção tumoral com margens livres. Esse é a etapa que exige maior rigor técnico e curva longa de aprendizado.

A maioria dos pacientes com prótese de quadril com infecção sofre um tratamento prolongado. Existe uma necessidade para tratamentos com melhoria para estes pacientes, e a artroplastia total de quadril com em infecção em 1 estágio acaba sendo essa opção.

  1. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Ortopedista especialista em infecção ortopédica
Especialista em Infecção de Próteses Articulares, ENDO-KLINIK, Hamburgo, Alemanha
Clínica Akhos – SEPS EQ 709/909 CONJUNTO B PARTE, SALA, 126 – Asa Sul, Brasília – DF, 70390-095
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