SOFRIMENTO PSÍQUICO E REDES SOCIAIS: RELAÇÕES COM A DEPRESSÃO E O  USO DA TECNOLOGIA NA ADOLESCÊNCIA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202411300849


Andressa Sales de Oliveira1,
Orientadora: Amanda Faedo2


RESUMO

Segundo a Organização Mundial da Saúde, o Brasil é o primeiro em prevalência de transtornos de ansiedade, e o segundo país com maior número de depressivos nas Américas, ficando atrás apenas dos Estados Unidos. Neste trabalho analisa-se o estado depressivo , e as influências que a tecnologia pode exercer sobre o aparecimento deste sofrimento psíquico em especial no público jovem, utilizando alguns autores da psicanálise para compreender a melancolia e a depressão e sua relação com a tecnologia.  Construímos uma relação entre a melancolia e depressão enquanto patologias, diante do avanço tecnológico e seu uso. Diante das preocupações suscitadas pela dificuldade que o sujeito enfrenta com a existência do sofrimento, propomos colaborar de forma acadêmica para levar a quem interesse o tema, questionamentos e reflexões sobre a problemática. O trabalho de pesquisa buscou verificar a relação da tecnologia com o estado de sofrimento depressivo no contexto social atual, através de análises bibliográficas nas plataformas LILACS, MEDLINE, Pubmed, Scielo e Google Acadêmico, obtendo-se a conclusão parcial de que o uso sem um pensamento crítico das redes, pode intensificar sofrimentos existentes ou mediar seu surgimento.

Palavras-chave: Psicanálise, Ansiedade, Sofrimento psíquico, Melancolia.

ABSTRACT

According to the World Health Organization, Brazil ranks first in the prevalence of anxiety disorders and second among the countries with the highest number of cases of depression in the Americas, second only to the United States. This study analyzes the depressive state and the influences that technology may exert on the emergence of this psychological suffering, utilizing psychoanalytic authors to understand melancholy and depression and their relationship with technology. We establish a connection between melancholy and depression as pathologies in the context of technological advancements and their usage. Considering the concerns raised by the challenges individuals face in dealing with psychological suffering, we aim to contribute academically by providing reflections and questions on the topic for those interested in this subject. This research sought to examine the relationship between technology and depressive suffering in the current social context through bibliographic analyses on platforms such as LILACS, MEDLINE, PubMed, SciELO, and Google Scholar. It reached the preliminary conclusion that uncritical use of digital platforms may intensify existing suffering or mediate its emergence.

Keywords: Psychoanalytic, anxiety, psychological suffering, melancholy

1 INTRODUÇÃO

Segundo a American Psychiatric Association, (2014) através do Manual do Diagnóstico Estatístico dos Transtornos Mentais DSM-5 a depressão é caracterizada por um estado severamente deprimido, perda de interesse em atividades que costumavam trazer prazer, onde o indivíduo se encontra em um quadro de tristeza exacerbada, desânimo e apresenta desinteresse por aspectos da vida cotidiana, tendo também sintomas como irritabilidade, inapetência, insônia, sentimento de vazio, e esgotamento. Pode estar atribuída também a falta de autoestima e a presença de anedonia, que por sua vez normalmente apresenta também a perda do significado atribuído à vida (American Psychiatric Association, 2014).

Segundo Souza (2019) a ascensão da tecnologia trouxe inúmeros benefícios em diversas áreas, incluindo saúde, educação e segurança, oferecendo avanços significativos em termos de diagnóstico médico, acesso à informação, comunicação e muito mais. No entanto, é importante reconhecer os desafios associados ao uso desmedido ou inadequado da tecnologia, especialmente quando se trata de impactos na saúde mental e nas relações sociais, pois segundo  a  Organização  Pan Americana  da  Saúde  (OPAS, 2021) o  acesso  e  o  uso  de tecnologias estão entre os múltiplos fatores que influenciam a saúde mental. O acesso constante vem causando a dependência crescente das mídias digitais, aumento de condições como depressão, ansiedade, cyberbullying, além de distúrbios do sono e da alimentação, problemas auditivos e visuais (Cunha; Resende; Silva, 2022).

Nota-se a dependência tecnológica, que é compreendida como o uso impulsivo e desenfreado da internet, que pode acarretar na presença da dificuldade, irritabilidade  e  intolerância  à  frustração  na  ausência  dos aparelhos (Spritzer; Picon, 2012). A intensa busca por conexão nas redes sociais, apontada por Kohn e Moraes (2007), reflete uma necessidade fundamental de pertencimento e reconhecimento social. Essa dependência digital pode evoluir para um quadro semelhante a outras adicções, como o uso de drogas ilícitas,manifestando sintomas de abstinência quando o acesso à internet é limitado (Huan et al., 2021).

As relações interpessoais conforme Tavares (2010) são mediadas por imagens, modas, comportamentos, tendências impostas por veículos de comunicação, globalização de costumes, necessidades e modos de ser dos indivíduos enquanto atores da cena social, portanto, nesse contexto a sociedade torna-se em sua essência, movida apenas por aparências.

A sociedade, focada em imagens e aparências, impõe grandes pressões sobre o eu (ego), que no contexto psicanalítico é compreendido como uma das três instâncias psíquicas descritas por Sigmund Freud em sua teoria das estruturas psíquicas, juntamente com o id (isso) e o superego (supereu). O “eu”, também chamado de ego, representa a parte da mente que lida com a realidade externa, mediando as demandas instintivas do id, as exigências morais do superego e as condições impostas pelo mundo real, gerando uma sensação de insatisfação em relação ao que “deveria” ter sido alcançado, mas ainda não foi, provocando um sentimento de vazio, fracasso e desamparo, influenciando mesmo que de forma indireta, para o aumento dos índices de sofrimento psíquico (Vieira 2024). Dentro da perspectiva psicanalítica, o adoecimento melancólico ocorre devido a recriminações pessoais que surgem após a perda do objeto pelo qual se identificou, gerando forte sentimento de culpa e responsabilidade (Vieira, 2024). 

Dunker (2019) explora a melancolia como uma das patologias relacionadas ao luto interrompido ou mal elaborado. A partir da teoria freudiana, ele explica que, na melancolia, o eu se identifica com o objeto perdido, internalizando-o de forma que a perda se traduz em um ataque ao próprio eu. Essa dinâmica pode levar a um estado patológico em que o processo de luto não avança para a integração ou superação da perda. Além disso, Dunker apresenta a ideia de um “luto infinito”, caracterizado pela eternização do sofrimento, que, embora nem sempre aparente na forma de depressão, representa uma dissolução constante do eu.

Segundo Glazzard e Stones (2019) com o uso de mídias sociais (WhatsApp, Instagram, Facebook etc.) os indivíduos passam várias horas por dia encontrando-se mais propícios a desenvolverem problemas de depressão. Bauman (2001 apud Ferreira; Santos, 2018) aponta que as redes sociais, podem amplificar essa característica ao facilitar conexões rápidas e descartáveis sendo a forma de modernidade caracterizada por uma sensação constante de insegurança e ansiedade, pois a velocidade e a quantidade de informações disponíveis superam a capacidade humana de processá-las, gerando aumento de sobrecarga.

Dessa forma, o objetivo do presente artigo foi a realização de uma revisão na literatura sobre a existência de uma relação entre os casos de depressão com o advento da exposição a tecnologias, focando principalmente no público de adolescentes. Pretende-se abordar os mecanismos psicológicos do sofrimento, levantar hipóteses das variáveis envolvidas no comportamento de indivíduos e também analisar o impacto das redes sociais no aumento do sofrimento psíquico.

2 METODOLOGIA

Foi realizada uma revisão de literatura integrativa, com base qualitativa e descritiva, utilizando as bases de dados SCIELO, Literatura Latino- Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), MEDLINE, tendo como ferramenta de pesquisa a plataforma Periódicos Capes, Public Medline (PubMed) e Google Acadêmico para a pesquisa de livros e artigos científicos publicados entre 2010 e 2024.

Este trabalho consiste em uma revisão integrativa de literatura, que permite reunir elementos sobre um tema específico através de levantamentos bibliográficos, visando à definição de conceitos relacionados a uma problemática e à análise de estudos (Souza; Silva; Carvalho, 2010).

Para a pesquisa foram utilizados os seguintes descritores: depressão; melancolia; sociedade; tecnologia. As buscas foram realizadas em português e inglês.

3 REFERENCIAL TEÓRICO
3.1 Melancolia: depressão o sentimento de mal-estar

Das primeiras referências da melancolia buscadas, foi possível encontrar a descrição da “bile negra” no século V A.C. por Hipócrates (460 a.C. – 370 a.C.) que seria uma espécie do humor, dentre os quatro definidos pela sua Teoria Humoral, e na qual o excesso desta bílis negra, invadia o sangue, e agindo sobre o corpo e a alma do doente, provocaria um estado caracterizado pela tristeza e pelo abatimento. (Mendes; Viana, Bara, 2014).

Vieira (2019) aponta que Freud descreve a melancolia como uma condição complexa caracterizada por uma intensa auto recriminação e perda de interesse pelo mundo externo, muitas vezes acompanhada por sentimentos de indignidade e desvalorização. Em contraste com o luto, que envolve uma reação saudável à perda, a melancolia se estabelece quando a perda não é totalmente consciente ou não é elaborada adequadamente, resultando em um conflito interno profundo.

Na melancolia, a perda desconhecida terá por consequência um trabalho interior semelhante, e por isso será responsável pela inibição que é própria da melancolia. […] O melancólico ainda  nos  apresenta  uma  coisa  que  falta  no  luto: um extraordinário rebaixamento da autoestima, um enorme empobrecimento do Eu. (Freud, 1917, p. 175 apud Vieira, 2024, grifos do autor).

O temperamento melancólico pode ser descrito como “[…]  No plano filosófico e literário, a melancolia é caracterizada como tédio, como falta de interesse pelo mundo externo, dor existencial, paralisia psíquica, tristeza profunda, abatimento, desgosto, etc.”(Mendes; Viana, Bara, 2014, p. 424). Vale ressaltar que a inserção do termo depressão, ocorre por meio da relação com a temática da melancolia, passando a ser utilizado, inicialmente, durante o século XIX  e por sua vez tornou-se uma das formas de expressão do mal-estar na atualidade. (Mendes; Viana, Bara, 2014).

Freud introduziu o termo “psiconeuroses narcísicas” para descrever um grupo nos quais o conflito central ocorre entre o ego (eu) e o isso (id) e a melancolia é apresentada como um exemplo típico dessa categoria (Vieira, 2024). O indivíduo melancólico, segundo Freud (1914 apud Vieira, 2024), experimenta dificuldades na formação do narcisismo primário, fase em que a energia libidinal é dirigida para o próprio eu, resultando em uma identidade mais frágil e dependente de um objeto externo para suprir suas carências internas, onde ao perder o objeto de apego, o sujeito sente como se estivesse perdendo uma parte de si mesmo. “[…] quando o objeto é perdido, o indivíduo sente que perdeu parte de si próprio” (Vieira, 2024).

Diante da impossibilidade de satisfazer suas necessidades e desejos e à pressão social por uma felicidade imediata e constante, o indivíduo sente-se encurralado, sem espaço para refletir, entristecer-se, sofrer e curar suas feridas no seu próprio tempo. (Freud, 1930 apud Santos, 2021) Na melancolia, ocorre uma espécie de negação da realidade externa, em que o indivíduo mantém uma ligação intensa com o objeto perdido através de uma espécie de “psicose alucinatória de desejo” (Mendes; Viana; Bara, 2014).

O vínculo quando é suspenso, ocorre não porque o objeto amado necessariamente morreu, mas porque foi perdido enquanto objeto de amor. Em alguns casos, essa perda é real, mas em outros, trata-se de uma perda idealizada, onde o indivíduo se apega ao objeto que ainda pode existir fisicamente ou não, sustentando assim a fantasia de um amor inalcançável ou rompido. Isso acaba exacerbando o sofrimento psíquico, já que o eu continua preso a uma representação que, na realidade, não pode ser reconstituída (Mendes; Viana; Bara, 2014).

3.2 A valorização da imagem e adoecimento do ser

A depressão, assim como a melancolia no século XIX, tornou-se uma das principais expressões do sofrimento psíquico contemporâneo (Mendes; Viana; Bara, 2014). Um dos fatores para este adoecimento psicológico são os padrões de individualismo, pressão pela produtividade e pela busca de sucesso, bem como a dependência da validação externa, as rápidas mudanças sociais, econômicas e culturais da contemporaneidade impulsionaram mudanças na constituição da subjetividade (Vieira, 2024).

A fragilização dos laços sociais e familiares e a valorização do individualismo, aliada à lógica da sociedade do espetáculo, culminou em uma profunda transformação da subjetividade contemporânea (Santos, 2021)

O espetáculo é aquele onde o ator se utiliza de máscaras para encarnar seus personagens e atuar para admiração e contemplação do espectador e da mesma forma, na vida o sujeito se veste de máscaras para desfilar “no cenário social” exibindo somente aquilo que o outro deseja ver, tornando-se descartável ao reduzir seu eu (ego) e ignorar sua individualidade, destacando-se o parecer e o ter, ao próprio ser, a perda de sua subjetividade para mostrar algo que o social anseia ver (Birman, 2005 apud Santos, 2021)

A busca incessante por reconhecimento, a superficialidade das relações e a dificuldade de simbolizar as experiências internalizadas levam a um empobrecimento da vida interior e ao surgimento de sofrimento psíquico (Santos, 2021). Torna-se cada vez mais complicado sair deste padrão de cobranças absurdas visto que os valores se modificam de forma que ocorre a valorização do individualismo competitivo, a sociedade do espetáculo dá ênfase ao mundo das imagens, do consumo exacerbado e do desenvolvimento tecnológico e científico (Santos, 2021).

O problema surge quando um indivíduo não se enquadra nos padrões sociais e é rejeitado, como acontece com os deprimidos imersos nas exigências da sociedade do espetáculo, que prioriza o prazer imediato e a aparência, o homem moderno então, se sente em uma expectativa de felicidade impossível de ser alcançada, onde constante busca por um ideal gera frustração, aumentando o sofrimento e a sensação de inadequação, o que agrava os quadros de depressão (Birman, 2005 apud Santos, 2021)

Segundo Quinet (2006 apud Santos, 2021), o indivíduo depressivo é aquele que não tem consciência de seu próprio desejo, falhando assim em cumprir o papel ético da psicanálise de desvendar esse desejo. No entanto, não saber sobre o desejo não significa que o sujeito não possui, mas recusa reconhecê-lo, resultando em uma dor psíquica mais intensa.

O depressivo vive a chamada “onipotência narcísica” que imobiliza o sujeito diante da ilusão de que ao se envolver com o gozo do outro, alcançará uma completude. Essa ilusão não busca apenas a satisfação, mas também a de compor espaço no outro, ocasionando empobrecimento do eu e o desaparecimento da subjetividade que caracteriza o quadro depressivo (Santos, 2021).

3.3 Depressão na atualidade e seus facilitadores tecnológicos

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o número de pacientes com depressão aumentou 18,4% entre 2005 e 2015, o que significa que 322 milhões de pessoas em todo o mundo sofrem deste transtorno. No Brasil, 5,8% da população é afetada por este transtorno, sendo o segundo com maior número de depressivos nas Américas (OMS,2017).

Conforme dados do Instituto de Métricas de Saúde (2019) sabe-se que no Brasil, o transtorno depressivo está estimado em 4,3% de predominância e mesmo para as diferentes classes econômicas, os índices de depressão mantêm-se constantes.

Segundo o Ministério de Saúde (2018), metade de todas as doenças mentais têm início aos 14 anos, porque a adolescência é uma época da vida em que ocorrem muitas mudanças, onde os sujeitos acabam por enfrentar questionamentos e desafios para lidar com as mudanças que vivenciam, tornando-os suscetíveis a alterações psicoemocionais que por sua vez podem acabar levando à depressão.

Conforme um estudo epidemiológico do Ministério da Saúde (2019) a prevalência de depressão ao longo da vida no Brasil é de cerca de 15,5%. A Organização Mundial da Saúde também revela que a depressão ocupa o 4º lugar entre as principais causas de ônus, representando 4,4% do impacto total das doenças ao longo da vida (Ministério da Saúde, 2019). Quando considerado o tempo de vida vivido com incapacidade, a depressão ocupa o 1º lugar, com 11,9%. Embora a depressão costume se manifestar no final da terceira década de vida, ela pode se iniciar em qualquer idade (Ministério da Saúde, 2019).

Para os autores Silva, Safatle e Dunker (2018), a sociedade atual impõe uma pressão constante por perfeição, que vem sendo intensificada pelo ambiente digital, a demanda constante de valorização, idealização e a performance de uma imagem perfeita nas redes, acarretando diversos problemas na qualidade do estado mental, pois os indivíduos se sentem constantemente insatisfeitos ao não conseguirem corresponder a esses padrões, e essa dinâmica provoca um impacto psicológico profundo, levando a sentimentos de inadequação, ansiedade e, em alguns casos, à depressão.

Aos poucos, o véu que escondia a dor da perda e o luto passou a ser falado, compartilhado e exposto em fotografias e memoriais on-line. O sofrimento também é curtido através da internet. Logo, entende-se que a psicanálise na contemporaneidade tem se debruçado sobre os novos modos de expor o sofrimento, sobretudo a partir do uso de redes sociais digitais e os novos modos de transmissão do mesmo (Kallas, 2016 apud Lima 2019, p. 19 grifos do autor).

As redes sociais oferecem um espaço onde fantasias frequentemente reprimidas pela sociedade podem ser expressadas, formando um ambiente de realização virtual para desejos que o indivíduo, no cotidiano, não consiga satisfazer (Lima, 2019).

Com essa ampla gama de possibilidades, as redes acabam se tornando um objeto de desejo que permite ao sujeito escapar de suas frustrações. Nesse contexto, a atividade de postar ou compartilhar conteúdos muda a experiência de mal-estar, permitindo uma sensação momentânea de intervalo ou satisfação, já que o meio digital oferece uma válvula de escape (Lima, 2019).

3.4 Depressão na população jovem com o contexto das redes sociais.

Conforme dados do IBGE, entre 2019 e 2021, o número de pessoas com 10 anos ou mais de idade que utilizam a Internet durante a PNAD TIC (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) aumentou de 79,5% para 84,7%. A ascensão da tecnologia tem auxiliado em diversas áreas como a da saúde, educação, segurança etc. De acordo com a Organização Pan-americana de Saúde (OPAS, 2018), as questões relacionadas à saúde mental são responsáveis ​​por 16% das doenças e lesões em todo o mundo entre pessoas de 10 a 19 anos.

Profissionais afirmam que há relação entre o crescimento da depressão nos jovens e o aumento do tempo gasto em redes sociais. Segundo Silva e Silva (2017) o uso diário da internet causa dificuldades de aprendizagem, transtorno de ansiedade e depressão, conflitos familiares, relações superficiais. Há evidências de que o uso das redes sociais pode levar ao desenvolvimento de sintomas como ansiedade, estresse e depressão em jovens. Pesquisas sugerem que os jovens que passam mais de duas horas por dia nas redes sociais têm maior probabilidade de relatar problemas de saúde mental, incluindo sofrimento psicológico (Glazzard & Stones, 2019).

Silva e Souza (2018 apud Souza, 2019) destacaram que o uso demasiado da internet tem gerado impactos negativos, com consequências tanto psíquicas quanto sociais e físicas. No entanto, a dependência tecnológica só deve ser considerada de ordem severa no sofrimento psíquico quando o indivíduo se torna incapaz de viver sem o celular, o que passa a prejudicar sua vida cotidiana.

Silva (2016) chamou a atenção para como as redes sociais se transformaram em parte do nosso dia a dia., onde em tempos de nativos digitais, o uso da tecnologia tem grandes chances de tornar-se uma dependência, pois é neste período em que os pré-julgamentos são realizados, onde os relacionamentos são declarados e exibidos em “público”, tendo então como principal objetivo, alcançar o maior número de “amigos” com status manipulados por outros indivíduos, buscando incansavelmente obter aprovação (curtidas) e comentários em suas postagens nas redes sociais.

Profissionais afirmam que há relação entre o crescimento da depressão nos jovens e o aumento do tempo gasto em redes sociais; isso geralmente acontece devido à grande “vitrine virtual” apresentada nas redes, onde são exibidos corpos e personalidades “perfeitas (Souza; Cunha, 2019, p. 204)

Segundo Keles, McCrae e Grealish (2019), a adolescência é conhecida por ser um momento de formação de identidade pessoal e social. Portanto, pode-se dizer que os desenvolvimentos atuais dependem das redes sociais.

Os adolescentes são especialmente vulneráveis ​​a desenvolver um uso dependente da internet. Durante essa fase de desenvolvimento, o cérebro ainda está em formação, o que inclui estruturas relacionadas ao controle de impulsos e à tomada de decisões. Além disso, os jovens geralmente carecem de habilidades críticas para discernir conteúdos elevados e disponíveis online, o que pode contribuir para um uso excessivo das redes sociais e da internet. (Cunha; Resende; Silva, 2022).

Essa combinação de imaturidade cerebral e pouca supervisão do tempo de uso aumenta o risco de impactos negativos na saúde mental e física, como dificuldades de sono, problemas de concentração, aumento da ansiedade e redução das interações sociais presenciais, entre outros (Cunha; Resende; Silva, 2022).

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

Mediante a motivação de explorar a dita depressão patológica do DSM e o sofrimento psíquico e suas relações com a tecnologia, destacando-se para o período da adolescência, o presente trabalho percorreu por apontamentos ligados à contemporaneidade, à depressão e a própria angústia, pautado pelo discurso psicanalítico.

Como resultado, percebe-se que embora as redes sociais possibilitam interações facilitadas e mais informações, o acesso a diversas realidades pessoais e subjetivas sem um pensamento crítico a respeito, podem levar o sujeito a sofrer noções de fracasso em diversos âmbitos envolvendo autoestima, percepção de mundo ligada ao ressentimento e a inadequação, principalmente no período da adolescência onde encontram-se mais suscetíveis e buscando por identificações.

A depressão herda assim a figura social do fracassado, do inadequado, daquele que não consegue se ajustar a normas e regras […] Esta nova narrativa de sofrimento individualiza o fracasso, na forma de culpa, sem interiorizá-lo na forma de conflitos. Com isso ela consegue isolar completamente a dimensão política, das determinações objetivas que atacam nossas formas de vida, redimensionando trabalho, linguagem e desejo, do sofrimento psíquico. (DUNKER, 2021b, p. 180-190 apud Coelho, 2023,p. 31)

Com os marcos do capitalismo, da tecnologia, da cultura e do discurso contemporâneo de produção e felicidade a qualquer custo, maximiza-se a ocorrência de estados depressivos, portanto as constantes reconfigurações que a contemporaneidade oferta, tornam toda uma conjuntura marcada pelas mudanças, ou mutações. Em concordância, Christian Dunker (2015 apud Coelho, 2023, p.22) aponta que “[…] a forma depressiva, paranoica, melancólica e ressentida de sofrer é, antes de expressar uma doença natural, um modo subjetivo de responder às demandas e exigências do capitalismo tardio”.   

De um ponto de vista psicanalítico, a depressão aparece como a dificuldade em buscar determinações inconscientes e responde à angústia como uma impotência do sujeito em responsabilizar-se pelo seu desejo, de forma que leva o sujeito a defender-se das angústias da vida atrás da depressão. Portanto, compreende-se que os indivíduos modificam suas percepções sobre si mesmos em virtude do conhecimento que sobre eles é adquirido pelo campo científico e social a qual este ser está inserido. Devido ao funcionamento da sociedade, os indivíduos encontram-se cada vez mais insatisfeitos com suas condições de vida, tendo em vista inúmeros fatores, mas em sua maioria por conta dos padrões impostos. Segundo Silva e Santos (2021).

O uso excessivo das redes sociais, alimentado pela busca incessante por validação e pela comparação com padrões de felicidade e perfeição, contribui significativamente para o agravamento da saúde mental, especialmente em adolescentes. As redes sociais oferecem um espaço onde a busca por aprovação e reconhecimento se torna central, gerando uma pressão constante para atender às expectativas irrealistas (Furtado et al., 2016). Esse comportamento está diretamente relacionado à ideia discutida por Birman (2005, apud Santos, 2021), onde a sociedade do espetáculo impõe padrões inalcançáveis ​​de felicidade, levando à frustração e ao sofrimento.

Além disso, como apontado por Quinet (2006, apud Santos, 2021), o sujeito que se vê imerso nessa dinâmica de constante busca por aprovação e prazer imediatamente acaba negligenciando seus próprios desejos e necessidades. A falta de reconhecimento interno e a dependência da validação externa geram uma dor psíquica, amplificada pela tradição nas redes sociais, que intensificam o empobrecimento da identidade e o aumento da sensação de inadequação, contribuindo para o desenvolvimento de quadros depressivos.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O universo midiático corresponde a um conjunto de diferentes plataformas destinadas à divulgação de informação. As mídias sociais fazem parte deste universo e se definem como quaisquer ferramentas ou aplicativos digitais capazes de permitir interação social. Com este panorama midiático diversificado e inclusivo, é evidente que as pessoas, especificamente o público jovem, estão cada vez mais expostos a estas redes em idades cada vez mais precoces, e com aumento no uso de tecnologia, especialmente dispositivos como smartphones e o acesso constante às redes sociais, tem sido fortemente associado a alguns desafios de saúde mental.

Diante do visto até aqui, entende-se que o sujeito ao fazer mau uso das redes sociais tem seus aspectos psicológicos prejudicados, afetando seu estilo de vida pessoal e principalmente sua vivência em sociedade. A dinâmica das redes sociais muitas vezes induz a uma necessidade constante de curtidas, atenção, popularidade e status. Assim, os adolescentes necessitam constantemente desta atenção e aceitação. Como resultado, a tendência de surgirem conflitos internos e outros pensamentos negativos aumentam significativamente, podendo levar a estados tidos como patológicos, a exemplo da depressão.

Em resumo, a relação entre depressão e tecnologia é ambivalente. O impacto da tecnologia na saúde mental depende em grande parte da forma como é utilizada e integrada na vida diária de uma pessoa. É essencial encontrar um equilíbrio saudável e consciente no uso da tecnologia, buscando maneiras de aproveitar os benefícios enquanto se protege contra os possíveis impactos negativos. Se alguém estiver enfrentando problemas de saúde mental, é fundamental procurar ajuda profissional.

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1Acadêmica do curso de psicologia do centro universitário univel

2Graduada em Psicologia, Especialista em Psicanálise Clínica Freud à Lacan,
professora do centro universitário univel