REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10205396
Meiry Jany de Souza Parente1
Raimunda De Fátima de Souza Farias2
Orientadora: Me. Carla Cristina de Souza Dimarães3
RESUMO
O presente estudo visa analisar os sofrimentos psicológicos causados aos jovens em situação de vulnerabilidade social e familiar, incluindo o período da adolescência e pontuar as contribuições da psicologia no processo de apoio psicológico aos adolescentes em panorama de vulnerabilidade social. Trata-se de uma revisão de literatura, de cunho exploratório, em artigos publicados de 2018 a 2023. Os principais resultados que contribuem para o desenvolvimento de sofrimentos psicológicos em jovens e adolescentes em vulnerabilidade social e familiar, incluem exposição à violência, negligência, abuso, pobreza, e a falta de acesso a recursos educacionais e de saúde. Estes fatores, muitas vezes interligados, potencializam problemas como ansiedade, depressão, baixa autoestima e comportamentos de risco. Foi também observado que a adolescência, sendo uma fase de transição e busca por autonomia, pode agravar essas questões, principalmente quando os jovens se veem privados de um ambiente seguro e estimulante. Além disso, o estudo destaca o papel essencial da psicologia no apoio a estes jovens. As intervenções psicológicas, adaptadas às necessidades específicas de adolescentes em situações de vulnerabilidade, demonstraram ser eficazes na promoção de bem-estar mental, desenvolvimento de habilidades de enfrentamento, e na construção de um futuro mais positivo. Estratégias como aconselhamento individual, terapia em grupo, atividades lúdicas e de desenvolvimento de habilidades sociais, são algumas das abordagens destacadas. Importante ressaltar a relevância de criar espaços seguros onde os jovens possam expressar suas emoções e serem ouvidos sem julgamentos, uma prática que favorece a resiliência e o desenvolvimento pessoal.
Palavras-chave: Adolescentes. Sofrimento psíquico. Psicologia. Vulnerabilidade Familiar. Vulnerabilidade Social.
ABSTRACT
The present study aims to analyze the psychological suffering caused to young people in situations of social and family vulnerability, including the period of adolescence, and to highlight the contributions of psychology in the process of psychological support for adolescents in a socially vulnerable situation. This is an exploratory literature review of articles published from 2018 to 2023. The main results that contribute to the development of psychological suffering in young people and adolescents in social and family vulnerability include exposure to violence, neglect, abuse, poverty, and lack of access to educational and health resources. These factors, often interconnected, increase problems such as anxiety, depression, low self-esteem and risky behaviors. It was also observed that adolescence, being a phase of transition and the search for autonomy, can worsen these issues, especially when young people find themselves deprived of a safe and stimulating environment. Furthermore, the study highlights the essential role of psychology in supporting these young people. Psychological interventions, adapted to the specific needs of adolescents in vulnerable situations, have proven to be effective in promoting mental well-being, developing coping skills, and building a more positive future. Strategies such as individual counseling, group therapy, playful activities and the development of social skills are some of the highlighted approaches. It is important to highlight the importance of creating safe spaces where young people can express their emotions and be heard without judgement, a practice that promotes resilience and personal development.
Keywords: Adolescents. Psychic suffering. Psychology. Family Vulnerability. Social vulnerability.
1. INTRODUÇÃO
O Brasil é um país onde as diferenças sociais e econômicas ainda atingem milhares de pessoas, marginalizando-as em relação ao desenvolvimento social, econômico e político. Nesse cenário, a maior parte das crianças e adolescentes do nosso país, os provenientes de camadas menos favorecidas socioeconomicamente, se veem em situações de risco social e vulneráveis a mazelas da desigualdade.
Desse modo, aliado à vulnerabilidade social exposta, os jovens brasileiros são vitimados pela violência de todas as espécies (física, sexual, psicológica), na qual, se veem desolados e restritos aos seus direitos seja no âmbito familiar ou social. Diante desse contexto, têm-se a seguinte indagação: quais os sofrimentos psicológicos dos adolescentes em contexto de vulnerabilidade social e familiar?
Nesse sentido, é possível que os adolescentes tenham diversos efeitos psicológicos, dado a sua condição social, pois estes estão relacionados a vulnerabilidade psicológica, dispostas em seus nichos: familiar, social e cultural. Percebeu-se que, os adolescentes em meio a sua vivência e crescimento no contexto de vulnerabilidade social podem denotar uma série de sofrimentos psicológicos que, ficam silenciados por esses indivíduos em sua fase de crescimento e desenvolvimento humano.
A escolha da temática se baseia na relevância social e acadêmica, pois é essencial compreender e destacar os sofrimentos psicológicos dos adolescentes em situação de vulnerabilidade social. E, como futuros profissionais de psicologia, é imperativo entender as percepções e significados do sofrimento psicológico diante da vulnerabilidade social, dada a importância da adolescência no desenvolvimento humano, com suas múltiplas mudanças físicas, psicológicas, emocionais e sociais.
Dessa maneira, pretende analisar os sofrimentos psicológicos causados aos jovens em situação de vulnerabilidade social e familiar, incluindo o período da adolescência e pontuar as contribuições da psicologia no processo de apoio psicológico aos adolescentes em panorama de vulnerabilidade social.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1. A adolescência e seus fatores
O Ministério da Saúde (2018) define a adolescência como o período de crescimento e desenvolvimento humano que ocorre após a infância e antes da idade adulta, entre 10 e 19 anos. É uma das fases transitórias mais importantes na vida do ser humano. É classificado em 3 estágios (BRASIL, 2018):
a) Adolescência precoce: Entre 10 e 13 anos;
b) Adolescência média: Variando de 14 a 16 anos de idade;
c) Adolescência tardia: Cobre de 17 a 19 anos.
Conforme Silva e Silva (2017), a adolescência é um período importante no processo evolutivo do ser humano, no qual ocorrem muitas mudanças físicas, psicológicas, emocionais e sociais. É o período de crescimento e desenvolvimento entre a infância e a idade adulta. Geralmente, esse período é acompanhado por pressões e a necessidade de sentir uma sensação de pertencimento e de ser aceito em grupos (SILVA; SILVA, 2017). Esse fato torna os adolescentes vulneráveis às influências de seu ambiente (TARDIVO, 2018).
Nesse sentido, enfrentam um transtorno nos aspectos emocionais e em sua personalidade, que está organizando uma nova identidade. Segundo Alves (2020), a adolescência passa pelas seguintes etapas: busca por si mesmo e identidade; tendências de grupo; a necessidade de intelectualizar e fantasiar; crises religiosas; deslocamento temporal; evolução sexual; uma atitude social com tendências anti ou associativas de intensidade variável; sucessivas contradições em todas as manifestações de comportamento, dominadas pela ação, que constitui a forma mais típica de expressão conceitual desse período de vida; separação progressiva dos pais; e flutuações constantes de humor e humor. A adolescência, além de compreender fatores biológicos, muitas de suas características dependem de fatores socioculturais, representando um estágio de desenvolvimento da personalidade (ALVES, 2020). Além disso, a adolescência é uma “idade psicológica”, uma vez que o desenvolvimento passa a ser considerado como um processo que não ocorre automaticamente, nem é fatalmente determinado pelo amadurecimento do organismo, mas tem principalmente uma determinação histórico-social (RODRIGUES, 2020).
2.2. A adolescência, a vulnerabilidade e os conflitos sociais
Em meio aos conflitos evidenciados na adolescência, atrelados à vivência em uma sociedade com uma estrutura social mais fragilizada, os jovens estão relacionados a vulnerabilidade genética, psiquiátrica, psicológica, além dos aspectos familiar, social e cultural e os efeitos da mídia e da internet (SILVA; BOTTI, 2017).
Deste modo, a pluralidade dos modos de viver a adolescência na sociedade contemporânea possibilita que a passagem por esse período seja atravessada por diferentes experiências e contextos.
Nesse sentido, Brondani et al. (2021) elucidam que, as características peculiares da experiência adolescente são amplamente influenciadas pelo ambiente sociocultural em que se dão os diferentes percursos de vida. Logo, a percepção de vulnerabilidade não se dispõe a percepção dos jovens.
A palavra vulnerável associa-se à ideia de dano, lesão, perdas. Logo, a vulnerabilidade social dos adolescentes perpassa na ideia dos vínculos sociais fragilizados, não se restringindo somente à pobreza, mas a falta de proteção social, acesso a serviços públicos, a frágeis vínculos afetivos, a discriminação pela cor, raça, gênero e afins, bem como a ideia social de pertencimento (BRONDANI et al., 2021).
Segundo Scott (2018), a vulnerabilidade social de uma pessoa, família ou comunidade é entendida como uma combinação de fatores que podem afetar o nível de bem-estar de uma pessoa, família ou comunidade e levar a uma maior exposição ao risco.
Portanto, na percepção do autor trata-se de um conceito multidimensional, pois a vulnerabilidade afeta diferentes níveis de bem-estar das pessoas, grupos e comunidades de diferentes formas e com diferentes intensidades, o que está relacionado à capacidade dos envolvidos em controlar o acesso aos recursos necessários para usar as oportunidades oferecidas pelo estado, mercado e sociedade (SCOTT, 2018).
Nunes (2021, p. 12), afirma que, “o ser humano vulnerável, não necessariamente sofrerá danos, mas está mais suscetível a eles uma vez que possui desvantagens para a mobilidade social, terá dificuldades para acessar melhor qualidade de vida em sociedade em função de sua cidadania fragilizada”.
Segundo Pires (2019), avaliar a vulnerabilidade é uma tarefa complexa, pois examina a situação pessoal do indivíduo e a posição social em que se encontra. Uma gama de aspectos da vida privada e coletiva, as condições socioambientais em que os indivíduos vivem e o cuidado com que as instituições sociais públicas são capazes de atender às suas necessidades são determinantes da vulnerabilidade individual.
As diferentes áreas de vulnerabilidade merecem atenção para compreender as dimensões da vulnerabilidade de cada pessoa (CARMO; GUIZARDI, 2018). As vulnerabilidades individuais, sociais e procedimentais, embora se cruzem, possuem características distintas. Assim, Carmo e Guizardi (2018), elucidam que, a vulnerabilidade pessoal diz respeito ao conjunto de informações que um indivíduo possui e sua capacidade de elaborá-las, bem como de tomar decisões práticas sobre suas vidas.
A vulnerabilidade social é causada por diversos fatores que acabam por manter grandes segmentos da população em situação de exclusão social. Assim, o adolescente em situação de vulnerabilidade, sente-se como um sujeito excluído é aquele que não consegue traçar uma identidade (social) no trabalho, na família ou na comunidade, tornando-se excluído das relações sociais e do mundo das representações a elas associadas (NUNES, 2021).
Sabe-se que a adolescência é uma fase da vida em que o sujeito precisa identificar e definir seu papel no meio social em que se encontra, além de fortalecer e consolidar sua identidade (SCOTT et al. 2018). Logo, Scott et al. (2018, p.607), afirma que “o adolescente pode se tornar vulnerável a determinadas situações de risco individual ou social, uma vez que se expõe a experiências para consolidar aspectos da sua personalidade. ” Scott et al. (2018) elucida que a vulnerabilidade social no âmbito da psicologia no Brasil é de extrema relevância, visto que, discorre como resultado os indivíduos fragilizados, que necessitam de auxílio e proteção para a garantia de seus direitos como cidadãos. Nesse viés, os adolescentes que então no âmbito da exclusão social perpassam por situações sociais como pobreza e marginalidade, que os gera sofrimentos psicológicos de alto impacto no decorrer de suas vidas.
Desta forma, questões como essas deixam um grande segmento quanto aos sofrimentos psicológicos que pautam a adolescência, considerando que o adolescente sem oportunidades e representatividade acaba vivendo em situações que os corrompem e os fazem desenvolver uma série de sofrimentos, seja por não ter o mesmo acesso a recursos que outros grupos sociais, quanto por não se sentir pertencente ao meio que vive (FARIA, 2021).
3. METODOLOGIA
O presente estudo tem como metodologia a revisão de literatura, de cunho exploratório, visto que, foi baseada em artigos já publicados e devidamente estudados para fundamentação do trabalho. De acordo com Baek et al (2018), quando aplicado a revisão de literatura, esta permite observar possíveis falhas nos estudos realizados; conhecer os recursos indispensáveis para a construção de um estudo com características específicas; desenvolver estudos que cubram brechas na literatura trazendo real contribuição para um campo científico.
Nesse ensejo, os instrumentos de pesquisa dos artigos e amostragem na literatura foram a Biblioteca Virtual em Saúde, tais como: LILACS (Literatura Latino – Americana e do Caribe em Ciências da Saúde), Biblioteca Virtual de Saúde, Scielo (Scientific Electronic Library Online), PUBMED (base de dados MEDLINE, oferecido pela Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos) e sites de universidades que continham trabalhos científicos publicados. No qual, abordam a temática de sofrimento psicológico de adolescentes em vulnerabilidade social e familiar.
Os critérios de inclusão foram revisões sistemáticas, sem restrição de idioma, e no período de 2018 a 2023 da publicação. Sendo também, incluídos nos métodos de busca as palavras-chave: sofrimento psicológico, adolescentes, vulnerabilidade social, vulnerabilidade familiar. Já os critérios de exclusão foram artigos anteriores a 2018 e artigos que não vislumbraram o sofrimento psicológico dos adolescentes em situação de vulnerabilidade, que então, não constam nos resultados.
Após a análise dos artigos selecionados para compor a discussão da pesquisa, foi realizada uma análise descritiva. A análise descritiva é indicada para visualizar os dados e entender o impacto presente no âmbito de estudo, mas sem fazer relação com o passado ou o futuro (MARTINS, 2017). A análise descritiva representa um conjunto de técnicas que têm por finalidade descrever, resumir, totalizar e apresentar os dados de pesquisa. Sendo assim, foram descritas através dos dados obtidos a partir da leitura dos artigos incluídos nesta pesquisa.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Como resultado inicial foram encontrados 1.506 artigos. Contudo, considerando os critérios de inclusão e exclusão, foram escolhidos 10 artigos que abordam os sofrimentos psicológicos causados aos jovens em situação de vulnerabilidade social e familiar, e as contribuições da psicologia no processo de apoio psicológico. Vide Quadro 1:
Quadro 1 – Artigos para discussão dos resultados
N | Autor (Ano) | Título | Base de Dados | Resultados |
1 | SOUZA, L.B.; et al. (2019) | Crianças e adolescentes em vulnerabilidade social: bem-estar, saúde mental e participaçao em educação | Scielo | Os resultados obtidos na pesquisa permitem perceber um tipo de sofrimento invisível, fluido e indizível, que as crianças e os adolescentes não verbalizam e os responsáveis e professores não percebem. Além disso, os problemas sociais brasileiros, que são a base e a sustentação da vulnerabilidade social, ocupam papel central na determinação do sofrimento, afetam a saúde e o bem-estar da população estudada, interferindo de forma negativa no desempenho de diversas ocupações, inclusive a educação. |
2 | OLIVEIRA, P. C. de et al. (2022) | Sobrevivendo”: vulnerabilidade social vivenciada por adolescentes em uma periferia urbana | Scielo | A violência presente em ambientes estressores e marginalizados, como na comunidade investigada, pode provocar sofrimento psíquico crescente em crianças e adolescentes. Além disso, a violência intrafamiliar também está associada a influências políticas, sociais e culturais que geram desigualdades e interferem na qualidade da inserção relacional da família e do adolescente. No estudo, a vulnerabilidade social é compreendida como um complexo multifatorial nas dinâmicas familiar e comunitária, que submete o adolescente à opressão ou à superação das suas limitações, explicitado no fenômeno central: “sobrevivendo”. |
3 | FARIA, Guilherme Nascimento, et al. (2021) | Adolescência e vulnerabilidades sociais: demandas para profissionais de psicologia na prática clínica | BVS | Os resultados da pesquisa apontaram que, as transformações pelas quais os adolescentes passam, em conjunto com o enfrentamento frente às vulnerabilidades sociais, podem colocar o sujeito adolescente em um local de fragilidade, fazendo com que por vezes esse público se torne dependente do ambiente físico e social em que se encontra. Logo, a atuação clínica da psicologia pode contribuir para o enfrentamento das vulnerabilidades sociais enfrentadas pelos adolescentes por meio de intervenções cabíveis a essas vulnerabilidades. |
4 | FREITAS, L.R.; et al. (2023) | Grupos psicoterapêuticos com adolescentes: relato de experiência de uma residência multiprofissional | BVS | Os principais fenômenos psicológicos observados durante o atendimento psicoterapêutico foram a: vulnerabilidades do adolescer: abuso sexual e bullying; crise suicida e violência autoprovocada; emoções e dificuldades em vivenciá-las; a família como um fator de vulnerabilidade e de proteção; e a relação terapêutica, vínculo e resistência. |
5 | BUENO, Karine Galbardi et al. (2018) | Crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social: um olhar da psicologia e sua atuação em casa abrigo | BVS | Este estudo evidencia as dificuldades enfrentadas por crianças e adolescentes em abrigos, frequentemente passando por um “período de luto” devido à perda da família, percebendo o ambiente do abrigo como ameaçador e enfrentando desafios na adaptação e no sofrimento psicológico. Fatores como a falta de atendimento individualizado, a perda da identidade pessoal, a necessidade de adaptação a novas rotinas e a convivência com cuidadores sem vínculo afetivo contribuem para sentimentos de abandono, rejeição e isolamento, muitas vezes manifestados por comportamentos agressivos. O estudo destaca a importância da presença de psicólogos nos abrigos, que, utilizando recursos lúdicos, podem promover a inclusão, o fortalecimento de vínculos, a expressão livre e o bem-estar emocional desses jovens, ajudando-os a sentir-se amados, valorizados e a ter uma visão mais positiva de suas vidas, enfatizando a valorização pessoal e o empoderamento dos abrigados. |
6 | ALVES, Pedro Henrique Melo et al. (2021 | Principais fatores associados à Covid-19 que impactam na saúde e educação de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade socioeconômica. | BVS | Os resultados foram que, a pandemia da COVID-19 destacou as desigualdades globais no acesso a serviços de saúde e educação, resultando em trauma coletivo em diversas famílias e contribuindo para um alto índice de morbimortalidade. As famílias em situação de vulnerabilidade socioeconômica foram particularmente afetadas, enfrentando impactos negativos em aspectos físicos, cognitivos, emocionais e ocupacionais. Estes efeitos prejudiciais não só afetam a geração atual, mas também tendem a se perpetuar em gerações futuras. |
7 | KEPLER, Rosilei dos Santos Rodrigues; NOGARO, Arnaldo (2021) | Finitude e angústia existencial entre estudantes de ensino médio de uma escola pública: agravantes da covid-19. | BVS | Os principais resultados do estudo destacam que os problemas emocionais em adolescentes, muitas vezes difíceis de identificar devido à naturalidade com que os transtornos de humor se manifestam, exigem atenção especial quando o humor negativo se torna persistente e prejudicial. A pesquisa ressalta que a angústia existencial e a finitude são aspectos intrínsecos à condição humana, desafiando-nos a buscar respostas criativas e inteligentes para enfrentá-las. As crianças e adolescentes, em particular, dependem do apoio de pais e educadores para navegar essas questões, crescendo de maneira equilibrada e desenvolvendo autonomia. A experiência da pandemia de Covid-19 exacerbou a exposição às realidades de perdas e morte, gerando incertezas, medos e diversas sequelas emocionais tanto em adultos quanto em jovens. O estudo enfatiza a importância de abordar pedagogicamente essas questões, visando à reflexão sobre a vida, a felicidade, o amor, as perdas e a morte, e indica que muitas dessas feridas emocionais abertas pela pandemia podem ser desafiadoras para superar, especialmente as relacionadas a perdas de familiares próximos. |
8 | SILVA, Alicyregina Simião et al. (2021) | Os aspectos multifatoriais da automutilação na adolescência: uma abordagem educativa. | BVS | Este estudo sobre a automutilação em adolescentes e crianças enfoca a importância de abordar esse tema delicado com orientadores sociais, visando desenvolver estratégias de prevenção e uma melhor gestão do problema. Realizado no Centro de Referência da Assistência Social no Ceará, o estudo descritivo destaca que a automutilação é um fenômeno complexo, que ultrapassa as fronteiras da saúde e envolve aspectos sociais e políticos. Conclui-se que a automutilação, sendo multifatorial, exige a colaboração e constante atualização dos profissionais de diferentes áreas, principalmente saúde e educação, na promoção do bem-estar dos adolescentes. A capacitação destes profissionais se torna crucial para o efetivo acompanhamento e detecção de casos, tratando-se de um tema ainda pouco explorado e compreendido. |
9 | FAGUNDES, Marise et al. (2018) | Prevalência de sintomas depressivos entre adolescentes da rede pública de ensino. | Pubmed | Foi identificado que 51,4% dos estudantes se sentiam frequentemente nervosos e 68,5% estavam excessivamente preocupados. Além disso, 33,6% se sentiam agitados, 39,5% ficavam frustrados facilmente, 22,1% tinham problemas de autocontrole, 46,8% frequentemente se sentiam tristes e 24,7% enfrentavam problemas de sono. A pesquisa também destacou uma maior incidência de sintomas depressivos em meninas, com diferenças estatisticamente significativas em comparação com meninos. Esses achados apontam para uma alta prevalência de sintomas que podem predispor a transtornos depressivos entre jovens estudantes, ressaltando a necessidade urgente de intervenções e políticas de saúde pública focadas na melhoria da saúde mental e qualidade de vida dos adolescentes. |
10 | BERNARDINELI, Ademilson José et al. (2021) | Fatores de risco associados a sintomas depressivos em adolescentes de um município de pequeno porte | BVS | A pesquisa revelou que 64,2% dos adolescentes de um município de pequeno porte apresentaram sintomas depressivos moderados a graves, sendo esses sintomas mais prevalentes no sexo feminino, com 20,1% mostrando sintomas graves. Os principais fatores de risco identificados incluíam o uso prolongado de celulares, a não frequência a parques, a falta de prática esportiva, o consumo de drogas lícitas, histórico pessoal de ansiedade e antecedentes familiares de depressão. Destacou-se que adolescentes que jogam no celular sozinhos tinham 5,1 vezes mais chances de desenvolver depressão, e aqueles que usavam drogas em grupo tinham 5,5 vezes mais chances. Esses achados indicam a importância de políticas públicas focadas na melhoria da qualidade de vida e bem-estar mental de jovens, especialmente em pequenas cidades |
Deste modo, considerando os artigos apresentados, a discussão foi dividida em 2 tópicos, sendo: analisar os sofrimentos psicológicos causados aos jovens em situações de vulnerabilidade social e familiar, incluindo especificamente o período da adolescência; e, as contribuições da psicologia nesse processo de apoio psicológico aos adolescentes em panorama de vulnerabilidade social ou familiar.
4.1 Os sofrimentos psicológicos causados aos jovens em situação de vulnerabilidade social e familiar, incluindo o período da adolescência
Conforme Kepler e Nogaro (2021) a transição da adolescência para a vida adulta é um momento propício para que vulnerabilidades psíquicas e emocionais apareçam, e que nesta fase, as pessoas se sentem cobradas para tomar uma série de decisões, o que pode gerar estresse e favorecer o aparecimento de fragilidades.
Conforme Souza et al. (2019), é crucial reconhecer a invisibilidade e a complexidade do sofrimento psicológico em crianças e adolescentes em contextos de vulnerabilidade social. Esse sofrimento pode ser fluido e indizível, muitas vezes não verbalizado pelos próprios jovens e não percebido por responsáveis (em sua casa) e professores (no âmbito familiar). Todavia, as adversidades sociais enfrentadas por esse grupo influenciam negativamente sua saúde, bem-estar e desempenho educacional.
A pesquisa de Oliveira et al. (2022) amplia essa visão, indicando que a violência — seja ela intrafamiliar ou comunitária — em ambientes marginalizados contribui significativamente para o sofrimento psíquico dos jovens. A vulnerabilidade social, vista como um complexo multifatorial, coloca o adolescente em uma posição de constante opressão ou desafio para superar limitações, marcando a experiência de “sobrevivência” nesses contextos.
Além disso, as transformações biopsicossociais características da adolescência, quando combinadas com a exposição a contextos de vulnerabilidade social, podem aumentar a fragilidade desses indivíduos. Faria et al. (2021) destacam a importância da psicologia clínica no enfrentamento dessas vulnerabilidades, ressaltando que os adolescentes muitas vezes se tornam dependentes do ambiente físico e social em que estão inseridos.
Freitas et al. (2023) apontam fenômenos como abuso sexual, bullying, crises suicidas e violência autoprovocada como vulnerabilidades específicas do período da adolescência. Deste modo, ressalta-se também o papel ambivalente da família, que pode representar tanto uma fonte de vulnerabilidade quanto de proteção. Logo, a relação terapêutica e a formação de vínculos são aspectos fundamentais no atendimento a esses jovens em sofrimento psicológico.
A questão da violência autoprovocada, como a automutilação, é minuciosamente explorada por Silva et al. (2021), no qual, enfatiza a complexidade do comportamento de automutilação, usualmente associado a tentativas do adolescente para lidar com emoções dolorosas ou traumáticas, e frequentemente correlacionado a outros problemas de saúde mental, como depressão e ansiedade.
Fagundes et al. (2018) e Bernardineli et al. (2021) trazem à tona a preocupante prevalência de sintomas depressivos entre adolescentes, com taxas alarmantes de nervosismo, preocupação, agitação, frustração, problemas de autocontrole, tristeza e problemas de sono. Tal fator, se dá pela vulnerabilidade familiar, uma vez que a maior parte dos jovens diminuem seu contexto social, fazendo o uso excessivo de celulares e a falta de atividade física. Ademais, pode-se relacionar com o histórico familiar.
De acordo com os autores Kepler e Nogaro (2021), a pandemia da covid-19 agravou ainda mais esse sofrimento psíquico dos jovens e adolescentes estudados devido a diversos fatores, como a mudança na rotina devido às medidas de distanciamento social, a interrupção de tratamentos por dificuldades de acesso, às consequências econômicas na rotina de trabalho ou nas relações afetivas, as experiências traumáticas associadas à infecção ou à morte de pessoas próximas, entre outros. Além disso, a pandemia do Covid-19 gerou incertezas e medos nos adolescentes, desencadeando em muitos deles sentimentos de ansiedade, depressão e um sentido exacerbado de vulnerabilidade (Kleper; Nogaro, 2021).
Este cenário, segundo Kepler e Nogaro (2021), torna-se especialmente complexo para os adolescentes em situações de vulnerabilidade social e familiar, uma vez que estes já se encontram em uma posição de maior risco psicológico e emocional. As interrupções nos estudos e nas interações sociais, fundamentais para o desenvolvimento e a socialização nesta fase da vida, contribuíram para um senso de isolamento e perda. Os jovens, já enfrentando a pressão de formar sua identidade e planejar seu futuro, se viram confrontados com um mundo onde as certezas são poucas e os caminhos tradicionais parecem incertos ou inalcançáveis.
Ainda nesse contexto, Alves et al. (2021) destacam como a pandemia da COVID 19 exacerbou as desigualdades, afetando significativamente a saúde mental de famílias vulneráveis, em especial dos adolescentes. Uma vez que, o impacto foi notório em aspectos físicos, cognitivos, emocionais e ocupacionais.
4.2 As contribuições da psicologia no processo de apoio psicológico aos adolescentes em panorama de vulnerabilidade social
O estudo de Souza (2019), juntamente com as observações de Faria et al. (2021), destacam a importância da psicologia na compreensão e no tratamento das vulnerabilidades sociais durante a adolescência. Este período, caracterizado por intensas transformações físicas e psicológicas, coloca o adolescente em uma posição onde a dependência do contexto social e físico pode ser significativa.
Nesse sentido, a psicologia clínica atua não apenas como um espaço para a exploração de questões internas, mas também como um campo de enfrentamento dessas vulnerabilidades externas. A adoção de uma perspectiva crítica sobre o meio social permite aos profissionais entender como diferentes fatores como pobreza, violência, discriminação e falta de acesso a serviços de saúde e educação afetam o desenvolvimento psicossocial do adolescente. Essa compreensão é crucial para a formulação de intervenções clínicas efetivas, que não somente abordam os sintomas psicológicos, mas também os contextos sociais em que estes indivíduos estão inseridos (Souza et al., 2019; Faria et al., 2021).
De modo geral, a psicologia assume o papel vital de facilitar a resiliência e a autonomia entre os jovens em situações de vulnerabilidade social, pois ao desenvolver um olhar crítico sobre as condições sociais que impactam a adolescência, os psicólogos podem auxiliar esses jovens a compreender e a navegar por suas complexas realidades. A atuação clínica vai além do tratamento de questões individuais, englobando a capacitação dos adolescentes para lidarem com os desafios sociais e ambientais que enfrentam, além de inclui o fortalecimento de habilidades de vida, a construção de identidades positivas, e o incentivo a conexões sociais saudáveis e suporte comunitário (Souza et al., 2019; Faria et al., 2021).
Tratando de comportamentos como automutilação, abordados por Silva et al. (2021), a psicologia clínica oferece técnicas e abordagens para lidar com essas manifestações de dor emocional. Terapias cognitivo-comportamentais, terapia dialética comportamental, e intervenções baseadas em mindfulness são exemplos de abordagens que podem ajudar os adolescentes a desenvolver habilidades de regulação emocional e enfrentamento de problemas.
Ademais, o estudo de Freitas (2023) aborda a importância do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) para o grupo de adolescentes, uma vez que, as observações descritas realçam o papel vital da psicologia no apoio a adolescentes em situações de vulnerabilidade social, especialmente aqueles enfrentando desafios como abuso sexual, bullying e crises suicidas. Esses jovens frequentemente se veem envolvidos em comportamentos impulsivos e práticas prejudiciais como formas de aliviar angústias profundas, fruto de traumas e experiências negativas.
A psicologia, neste contexto, não só fornece uma escuta empática e um espaço seguro para a expressão e processamento dessas vivências, mas também contribui para a compreensão e ressignificação das dores emocionais que levam a comportamentos de risco e violência autoprovocada. Através de atendimentos grupais e individuais, os psicólogos trabalham para desenvolver estratégias de coping e resiliência, promovendo uma compreensão mais profunda do self e de relacionamentos saudáveis, algo essencial para o desenvolvimento e bem-estar dos adolescentes (Freitas, 2023).
No estudo de Bueno et al. (2018), reforça-se a importância da inserção do profissional de psicologia nos abrigos para crianças e adolescentes, ecoando a incorporação dos recursos lúdicos, promovendo a inclusão social, o fortalecimento de laços dentro do grupo e oferecendo um espaço seguro para a expressão livre. Através do brincar, a interação com os cuidadores e a equipe técnica proporciona aos jovens abrigados experiências de carinho, atenção e afeto, fundamentais para o desenvolvimento saudável.
Além disso, um ambiente lúdico permite que eles expressem desejos e sonhos, aprendam regras, exerçam a criatividade e fortaleçam os vínculos com outros jovens no abrigo. Essas práticas contribuem para que se sintam amados e valorizados, ajudando a construir uma visão mais positiva de si mesmos e de seu futuro. Assim, o papel do psicólogo nos abrigos transcende a função tradicional de cuidado, abraçando a valorização pessoal, o fortalecimento e o empoderamento dos abrigados, elementos chave para um desenvolvimento integral e saudável (Bueno et al., 2018).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Observou-se que os sofrimentos psicológicos experimentados por jovens em situações de vulnerabilidade social e familiar, especialmente durante a adolescência, são multifacetados e profundamente impactantes. A adolescência, por si só, é um período de intensas transformações físicas, emocionais e sociais. Quando combinadas com fatores de vulnerabilidade como pobreza, desestruturação familiar, violência e marginalização, estas transformações podem acarretar desafios psicológicos significativos, em que esses jovens frequentemente enfrentam questões como baixa autoestima, ansiedade, depressão e uma sensação de alienação ou desesperança em relação ao futuro.
A vulnerabilidade durante a adolescência afeta profundamente o desenvolvimento psicossocial do indivíduo, marcando uma fase onde a busca por identidade, aceitação social e independência se torna preponderante. Neste período crítico, a exposição a fatores de risco, como a falta de suporte familiar, pressão dos pares, e o acesso limitado a oportunidades educacionais e de desenvolvimento pessoal, pode conduzir a desafios significativos, incluindo problemas de saúde mental, comportamentos de risco e menor desempenho acadêmico.
Logo, para mitigar tais impactos, a sociedade poderia se mobilizar através da criação de programas de mentoria, oferta de serviços de aconselhamento acessíveis, espaços seguros para discussão e expressão, e políticas que assegurem a inclusão e o respeito à diversidade. Escolas e comunidades podem desempenhar um papel fundamental, promovendo a educação socioemocional e fortalecendo redes de apoio que capacitem os jovens a navegar pelas complexidades da adolescência com resiliência e confiança, preparando-os para uma transição saudável para a vida adulta. Para tanto, as contribuições da psicologia no apoio a esses adolescentes são vitais e multifacetadas, visto que os profissionais de psicologia são fundamentais para identificar, compreender e tratar as questões psicológicas específicas dessa faixa etária em contextos de vulnerabilidade. Além do que, estratégias como terapia individual ou em grupo, atividades lúdicas e programas de suporte social não só ajudam no enfrentamento das questões imediatas, mas também contribuem para a construção de um senso de identidade, autoeficácia e resiliência. O papel do psicólogo nos contextos de abrigos e ambientes de cuidado estende-se além do alívio imediato do sofrimento. Os profissionais de psicologia são treinados para identificar e intervir em padrões de comportamento e pensamento que podem estar prejudicando o desenvolvimento saudável do adolescente. Através de terapias baseadas em evidências, eles podem ajudar os jovens a processar traumas, a desenvolver habilidades de coping (enfrentamento) e a melhorar suas habilidades de interação social e comunicação.
Além disso, os psicólogos também colaboram com outros profissionais, como assistentes sociais, educadores e profissionais da saúde, criando uma rede multidisciplinar de suporte. Este trabalho em equipe é essencial para atender às múltiplas necessidades dos adolescentes, desde as questões de saúde mental até as necessidades educacionais e vocacionais, preparando-os para uma reintegração bem-sucedida na sociedade.
Portanto, o psicólogo atua como peça central na engrenagem de apoio ao adolescente vulnerável, promovendo a saúde mental, o bem-estar e o desenvolvimento de habilidades necessárias para enfrentar o mundo com resiliência. Através de um compromisso contínuo com o cuidado individualizado e com a mudança sistêmica, o psicólogo ajuda a pavimentar um caminho mais promissor para os jovens em circunstâncias desafiadoras.
REFERÊNCIAS
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