REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th10248150946
Axel Rocha de Alencar da Costa1
Isadora Haíssa Marques Cavalcante2
Amanda Sánchez Martínez3
Maria Vitória Araújo de Oliveira4
Leonardo Barros Figueira5
Eduarda Carneiro Souza6
Demócrito Andrade Costa Filho7
Italo Rocha Lima Brito8
Luís Gustavo Miranda Cavalcante Farias9
Edward Vinicius Damasceno Rocha10
Mariana de Oliveira Vitalino11
Juliana Pantoja Gonçalves12
Raphaela Aguiar Paranaguá13
Valdeizio Junior Modesto Silva de Sousa14
Patrícia Alonso Beltrami15
INTRODUÇÃO
No Brasil, a Atenção Básica se caracteriza por um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que preconiza a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação, a redução de danos e a manutenção do bem-estar, a fim de impactar o estado geral e autonomia das pessoas. Considerada a porta de entrada e centro da comunicação da Rede de Atenção à Saúde (RAS), deve ser o contato inicial e preferencial dos usuários, que devem se orientar pelos princípios e diretrizes preconizados pelo Ministério da Saúde (PNAB, 2017).
O termo ‘’Atenção Primária à Saúde’’ (APS) remete a atenção ambulatorial não especializada que é ofertada em unidades básicas, garantindo facilidade no acesso a rede de saúde (Lavras, 2011). Ademais, um dos fundamentos e diretrizes essenciais da APS é a integralidade do serviço, em que o cuidado é trabalhado de forma multiprofissional, interdisciplinar e coordenado em conjunto na rede de atenção, priorizando as demandas e singularidades de cada paciente a fim de maior resolutividade (PNAB, 2017)
Por conseguinte, com a intenção de garantir a longitudinalidade do cuidado e a atenção continuada, a APS apoiada ao objetivo de assistir os usuários e auxiliá-los em suas queixas, lançam mão de tecnologias que qualifiquem o cuidado prestado diante daquilo que não pode mais ser solucionado em uma unidade básica de saúde. Desse modo, os profissionais de saúde utilizam de instrumentos que aprimoram o serviço, mesmo que não sejam realizados na UBS, os chamados protocolos de encaminhamento; Ferramentas que apoiam a decisão do médico responsável em encaminhar o usuário para outros serviços, por meio da sistematização da indicação clínica e classificação de risco (Pliz, 2019)
Dito isso, diagnósticos sindrômicos raros como é o caso da síndrome Imerslund-Gräsbeckfogem da alçada de ação da atenção primária em saúde sendo necessário lançar mão do encaminhamento como forma de ofertar maior qualidade no atendimento do paciente. A síndrome de Imerslund-Grasbeck (IGS) ou anemia megaloblástica por má absorção seletiva de cobalamina com proteinúria é uma deficiência de vitamina B12 resultando em anemia megaloblástica na infância e é corrigida com a administração parenteral de vitamina B12. Esta patologia está localizada principalmente na Finlândia, Noruega e países muçulmanos mediterrâneos. A doença foi descrita por volta de 1960 simultaneamente por Olga Imerslund, pediatra norueguesa e Ralph Gräsbeck, médico-bioquímico finlandês (Gräsbeck, 2006).
A IGS é causada por mutações no gene CUBN que codifica a cubilina ou AMN que codifica a amniocentese. A Mutação homozigótica ou composta heterozigótica em CUBN ou AMN leva à IGS. Cubilina e amniocentese são as duas subunidades do receptor vitB12-IF da mucosa ileal, conhecido como cubam. É considerado essencial para a absorção intestinal de vitB12, bem como para a reabsorção de proteínas renais. A maioria dos pacientes com IGS é tratada com vitB12 intramuscular, que corrige mais frequentemente o fenótipo clínico. Antes do diagnóstico de deficiência de vitamina B12 os pacientes tem sintomas não específicos, como falha no crescimento, fadiga, infecções virais frequentes e sinais neurológicos leves, a proteinúria sem lesão renal está presente em metade dos pacientes (Kingma, 2023)
Em relação as manifestações neurológicas, os sintomas mais comuns são: letargia, ataxia e déficits motores ou sensoriais, podendo ser confundidos com outras doenças e transtornos, como por exemplo o transtorno do espectro autista e o transtorno de déficit de atenção com hiperatividade. No entanto, quadros clínicos mais graves incluem mielose funicular (degeneração combinada subaguda da medula espinal), convulsões, atrofia cortical focal da região insular esquerda na ressonância magnética e demência progressiva (Storm, 2013).
Quanto ao prognóstico, pacientes com IGS tratados com vitB12 são clinicamente e hematologicamente normais. A proteinúria persiste, mas não aumenta em gravidade. A função renal não se deteriora. No entanto, para o conhecimento dos autores, os estudos de longo prazo descreveram apenas pacientes com até 46 anos de idade. O acompanhamento com médico especialista é essencial (Kingma, 2023).
Em suma, fica evidente a importância da Atenção primaria como porta de entrada ao sistema de saúde. Posto que, além de acolher, acompanhar e resolver boa parte das demandas dos usuários, o encaminhamento a outros setores da rede também parte dela, em sua maioria, colaborando para um tratamento mais efetivo e específico.
RELATO DE CASO
No dia 23 de agosto de 2023, paciente J.Q.L.N, escolar, 7 anos de idade, sexo masculino, acompanhado de sua mãe procura a Unidade Básica de Saúde (UBS), queixando-se de agressividade no ambiente escolar e apatia nos demais momentos diários. Mãe relata que nos últimos dias o filho se apresenta bastante irritado e que durante a noite a criança apresenta dificuldade para dormir ao mesmo tempo que durante o dia apresenta sonolência. Narra que a criança fez uso de melatonina, porém não obteve os resultados esperados e agora solicita um fármaco mais específico. A criança estuda no período vespertino e foi diagnosticada aos 7 meses de idade com a síndrome Imerslund-Grasbeck por uma médica pediatra, mãe também afirma que o escolar não uso contínuo de nenhum medicamento.
No decorrer da consulta a mãe retira de seus pertences um documento (Figura 1), assinado pela coordenação da escola onde a criança cursa seus estudos, que informa sobre suas reações no ambiente escolar, afirmando que o paciente se apresenta agitado demonstrando agressividade em situações de conflitos e em situações de estresse coloca a mão sobre os ouvidos com o intuito de evitar barulhos, informa também que a criança puxa o próprio cabelo quando não consegue realizar as atividades, além do mais, o documento narra que é uma criança que não aceita limites estabelecidos e usa meios físicos para alcançar o que deseja sendo difícil para os professores contornar a situação.
No mesmo documento há a confirmação de que o aluno apresenta dificuldade de concentração e estabelecer foco, confirma também acerca da inquietação para atividades simples como ficar sentado no seu lugar. Todavia, a criança já domina as letras do alfabeto e alguns numerais relatado também que o paciente consegue realizar atividades básicas da vida diária como comer ir ao banheiro sozinho. Ademais, durante o recreio o aluno se recusa a voltar para sala de aula sendo necessário que uma professora o auxilie no retorno para a sala de aula ou para realização de atividades lúdicas e diferenciadas no próprio pátio. Por fim, com relação à família, é presente na vida escolar na medida do possível sendo constatado, pela escola, que a família e a escola constituem importantes pilares no desenvolvimento cognitivo e social do paciente.
Ao exame físico, na inspeção paciente se apresenta sonolento e em bom estado geral (chegando a dormir no colo da mãe), demonstrando que o relato da mãe acerca da sonolência matutina é verídico, também deambula sem auxílio, exprime fácia sindrômica. Sem mais observações.
Com relação a percussão, palpação e ausculta apresenta normalidade em todos os sistemas avaliados. Sinais vitais: Temperatura= 36,2ºC; Pulsos= 65 ppm; Respiração; 12 irpm; Pressão arterial= 98×59 mmHg; Frequência cardíaca= 65 bpm. Peso e altura dentro da faixa de normalidade entre score 0 e +1 da avalição.
Devido a diagnóstico já estabelecido de Síndrome de Imerslund-Grasbeck, uma síndrome rara que, no Brasil, em que há a prevalência de apenas mais dois casos, não foi necessário a elaboração de uma hipótese diagnóstica, entretanto, atendendo à demanda da mãe sobre uma avalição mais aprofundada e acompanhamento com um especialista, foi determinado uma conduta na qual houve o encaminhamento para um neuro pediatra em caráter de urgência para uma maior assertividade no tratamento do paciente.
DISCUSSÃO
Corroborando com Bedin et al., 2021, a importância da atenção primária no acompanhamento de diagnósticos raros é um aspecto crucial no sistema de saúde, uma vez que ela é a ordenadora do cuidado no SUS. Portanto, a atenção primária desempenha um papel fundamental na detecção precoce, manejo contínuo e encaminhamento adequado de pacientes com doenças raras.
Por conseguinte, sendo a IGS uma doença hereditária rara caracterizada pela má absorção de vitamina B12 e consequentemente levando a uma série de complicações hematológicas e neurológicas, principalmente. Pacientes com IGS devem ser amparados pelos diversos níveis de saúde com o intuito de cumprir a longitudinalidade expressa nos princípios e diretrizes do sistema (Pliz, 2019).
À vista disto, no âmbito da APS a detecção precoce se torna imprescindível, posto quea atenção primária é o primeiro ponto de contato dos pacientes com o sistema de saúde (Seixas, 2023), os profissionais de saúde da atenção primária devem estar capacitados para reconhecer sinais e sintomas inespecíficos que podem indicar doenças raras, como a anemia persistente e sintomas neurológicos em pacientes jovens, no caso específico da síndrome de Síndrome de Imerslund-Gräsbeck.
Continuando o pensamento de Seixas, 2023, o manejo contínuo na atenção primária é vital para garantir que os pacientes com doenças raras recebam tratamento adequado e monitoramento regular. É essencial o acompanhamento frequente que permite ajustes no tratamento, como a administração de vitamina B12, e a identificação precoce de complicações. Além disso, a atenção primária pode proporcionar suporte psicológico e social, ajudando pacientes e suas famílias a lidarem com o impacto da doença.
Portanto, o encaminhamento adequado é crucial para pacientes com doenças raras como a IGS. Sendo assim, para o fluxo correto do manejo, a atenção primária deve identificar rapidamente a necessidade de consulta com especialistas, como hematologistas e geneticistas, para confirmação diagnóstica e planejamento terapêutico especializado. E, o encaminhamento precoce pode prevenir complicações graves e melhorar significativamente a qualidade de vida dos pacientes.
CONCLUSÃO
Em suma, devido ao baixo grau tecnológico encontrado na atenção primária é virtualmente impossível que todas as demandas sejam solucionadas nesse nível atenção, contudo, o SUS tem como um de seus princípios a integralidade, que apoia o paciente do início ao fim do seu tratamento em todas as esferas necessárias para continuidade do cuidado, dessa maneira, aos casos que fogem da esfera de ação da atenção primária, pode e deve-se lançar mão do encaminhamento com instrumento de comprimento desse princípio básico do SUS.
Portanto, de acordo com a PNAB, 2017, é preferencial que o médico atuante na unidade básica de saúde seja especialista em comunidade e saúde, sendo assim, com intuito de oferecer o melhor atendimento possível mesmo para pacientes com diagnósticos raros, é recomendável que haja o encaminhamento para sub especialidades que possam se resolutivos e melhorar de fato a qualidade de vida do paciente afetado.
REFERÊNCIAS
BEDIN, Karine et al. Doenças raras e práticas de Saúde Coletiva: relato de experiência na formação médica. Revista de APS, v. 24, n. 4, 2021.
BRASIL. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Diário Oficial da República Federativa do Brasil 2017; 15 out.
GRÄSBECK, Ralph. Imerslund-Gräsbeck syndrome (selective vitamin B 12 malabsorption with proteinuria). Orphanet journal of rare diseases, v. 1, p. 1-6, 2006.
KINGMA, Sandra DK et al. Imerslund-Gräsbeck syndrome: a comprehensive review of reported cases. Orphanet Journal of Rare Diseases, v. 18, n. 1, p. 291, 2023.
LAVRAS, Carmen. Atenção primária à saúde e a organização de redes regionais de atenção à saúde no Brasil. Saúde e Sociedade, v. 20, p. 867-874, 2011.
PILZ, MARINA MANZANO CAPELOZA. FATORES ASSOCIADOS À ADOÇÃO DE PROTOCOLOS DE ENCAMINHAMENTO PELOS MÉDICOS (AS) DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE DE PORTO ALEGRE, 2019.
SEIXAS, Marcos Renck de. Doença de Wilson na Perspectiva da Atenção Primária em Saúde: um Relato de Caso. 2023. Trabalho de Conclusão de Curso.
STORM, Tina et al. Detailed investigations of proximal tubular function in Imerslund-Gräsbeck syndrome. BMC medical genetics, v. 14, p. 1-11, 2013.
ANEXOS
FIGURA 1 – Acervo pessoal
1 Axel.alencar@gmail.com
https://orcid.org/0000-0003-2732-3814
Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos/ Porto Nacional
2 Isadorahaissa22@hotmail.com
https://orcid.org/0000-0003-2188-6325
Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos/ Porto Nacional
3 amanda.sanchez@uni9.edu.br.sanchez
https://orcid.org/0009-0009-3721-150X
Universidade Nove de Julho
4 Mariavituriaaa13@gmail.com
https://orcid.org/0000-0003-2105-932X
Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos/ Porto Nacional
5 leonardobarrosfigueira@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-9425-6714
Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos/ Porto Nacional
6 eduardacarneiro559@gmail.com
https://orcid.org/0000-0002-8099-6818
Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos/ Porto Nacional
7 democritomed@gmail.com
https://orcid.org/0000-0001-8854-3285
Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos/ Porto Nacional
8 italo.rlbrito@gmail.com
https://orcid.org/0000-0001-6245-310X
Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos/ Porto Nacional
9 1gustavo7cavalcante8@gmail.com
https://orcid.org/0009-0009-0825-4447
Centro Universitario UNINOVAFAPI
10 edwardvinicius69@gmail.com
https://orcid.org/0009-0007-5085-9461
Centro Universitario UNINOVAFAPI
11 marianavitalino@gmail.com
https://orcid.org/0009-0006-3619-1699
AFYA Faculdade de Ciências Médicas da Paraíba
12 juliannnapantoja@gmail.com
https://orcid.org/0000-0001-5050-5355
13 Raphaela.paranagua@gmail.com
https://orcid.org/0009-0007-6322-8634
14 eng.junior2021@gmail.com
https://orcid.org/0009-0008-0313-5484
UNITPAC- Araguaína – TO
15 patriciabelmed@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-9233-1119
Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos/ Porto Nacional