PRUNE BELLY SYNDROME: SINGLE-STAGE ABDOMINOPLASTY, ORCHIDOPEXY AND POSTECTOMY WITH MULTIMODAL ANESTHETIC STRATEGY
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202501211753
Davi Cordeiro Jardim1
Alexandre dos Santos Cordeiro2
Miguel Lucas Silva Valente3
Paulo Cesar Martins4
Resumo
A síndrome de Prune Belly é uma condição congênita rara caracterizada pela tríade clássica de hipoplasia dos músculos abdominais, anomalias do trato urinário e criptorquidia. Este relato de caso apresenta um paciente pediátrico submetido à abdominoplastia, orquidopexia e postectomia em um único tempo cirúrgico, com estratégia anestésica multimodal. A abordagem incluiu técnicas avançadas de anestesia regional e venosa, garantindo analgesia eficaz e estabilidade hemodinâmica. O procedimento foi realizado sem intercorrências significativas, e o paciente evoluiu positivamente no pós-operatório. Este estudo ressalta a importância do manejo multidisciplinar para a otimização dos resultados cirúrgicos e anestésicos em casos complexos.
Palavras-chave: Síndrome de Prune Belly. Abdominoplastia. Orquidopexia. Anestesia multimodal. Relato de caso
1 INTRODUÇÃO
A síndrome de Prune Belly, também conhecida como síndrome do abdome em ameixa seca, é uma condição rara caracterizada pela tríade clássica de ausência ou hipoplasia dos músculos abdominais, anomalias do trato urinário e criptorquidia. Esta condição afeta predominantemente meninos e apresenta ampla variabilidade na severidade das manifestações clínicas, que podem incluir desde alterações leves até comprometimento severo da função renal e urinária (SILVA; ALMEIDA, 2021). Além disso, complicações associadas como hidronefrose e infecções urinárias recorrentes são frequentemente observadas (MOREIRA et al., 2020).
O manejo cirúrgico da síndrome de Prune Belly é desafiador e requer abordagem multidisciplinar. Entre as intervenções comuns estão a abdominoplastia para reconstrução da parede abdominal, orquidopexia para correção da criptorquidia e intervenções no trato urinário, que podem variar de acordo com a gravidade das anomalias (CUNHA et al., 2019). A realização dessas cirurgias em um único tempo cirúrgico apresenta vantagens potenciais, incluindo redução da morbidade cumulativa e menor impacto psicológico para o paciente e sua família (SADE, 2020). No entanto, também impõe desafios técnicos e anestésicos significativos, especialmente devido à fragilidade do estado clínico desses pacientes.
Este relato de caso descreve a abordagem anestésica e cirúrgica multimodal em um paciente pediátrico portador da síndrome de Prune Belly submetido à abdominoplastia, orquidopexia e postectomia em um único tempo cirúrgico. O foco reside na estratégia anestésica utilizada, que combinou técnicas avançadas para garantir analgesia efetiva, minimizar riscos e otimizar a recuperação pós-operatória. Além disso, são destacadas as medidas de suporte e monitoramento perioperatório que contribuíram para o sucesso do procedimento e para a evolução favorável do paciente.
2 RELATO DE CASO
LBAF, 2 anos e 3 meses, 12kg, portador da síndrome de Prune Belly, associado a criptorquidia, mega bexiga, dilatação pielocalicial (hidronefrose bilateral) e estrabismo, comparece em centro cirúrgico para ser submetido à cirurgia de abdominoplastia, orquidopexia e postectomia no mesmo tempo cirúrgico.
Na avaliação pré-anestésica, acompanhado da mãe, calmo e colaborativo ao exame, apresenta-se sem alterações novas ao exame físico, com jejum adequado, ausência de preditores de via aérea difícil, dentição adequada para a idade, sem afecções do trato respiratório recente, sem alterações cardiovasculares, abdome típico, em “ameixa seca”, e extremidades sem alterações.
Exames laboratoriais sem achados significativos, sem necessidade de reserva de hemoderivados, com reserva de leito em UTI pediátrica, para recuperação pós-operatória.
Paciente admitido em sala operatória acompanhado da mãe, sendo monitorizado com pressão arterial não invasiva, cardioscopia, oximetria de pulso, e iniciado pré-oxigenação por máscara facial com oxigênio a 100% fluxo 6l/min, sevoflurano 6%, para indução anestésica inalatória, seguida da obtenção de venóclise com jelco 22 Gauge em membro superior esquerdo.
Seguiu-se a indução anestésica venosa com lidocaína 15mg, fentanil 40mcg, propofol 30mg, cetamina 2,5mg e rocurônio 10mg, mantendo assistência ventilatória, seguido de intubação orotraqueal sob laringoscopia direta, com cânula 4,0 com cuff, primeira tentativa, sem intercorrências, sendo acoplado à ventilação mecânica e mantido com sevoflurano em 3%.
Após, optado pela estratégia de analgesia de neuroeixo, através da técnica peridural. Posicionado em decúbito lateral direito, antissepsia de dorso, realizada punção única no espaço peridural lombar, no espaço intervertebral L4-L5, pela técnica de Dogliotti, e injetado anestésico local, dose única de solução de ropivacaína a 0,3%, associado a clonidina 15mcg e morfina 60mcg, volume total de 12ml, sem intercorrências.
O procedimento cirúrgico durou 3h e 30min, transcorreu sem intercorrências, sem necessidade de abordagem das vias urinárias, sem sangramento significativo e sem necessidade de doses adicionais de anestésicos ou aumento do fluxo de sevoflurano, mantido a 3%.
Como estratégia de extubação programada, devido fragilidade da musculatura da parede abdominal, optou-se pela transferência à UTI pediátrica, em ventilação mecânica, sem drogas vasoativas, FC 142 bpm, FR 40 irpm, SpO2 96% em IOT, T 37,8ºC, PA 128 x 46 (75) mmHg, sob sedação.
Na UTI, foi realizada a extubação após 12h, sem falha de extubação, sem necessidade de resgate analgésico com opioides, permanecendo na mesma unidade durante 6 dias, com boa evolução e recuperação operatória e exames laboratoriais normais.
3 DISCUSSÃO
A síndrome de Prune Belly é uma condição rara e desafiadora, caracterizada por hipoplasia dos músculos abdominais, anomalias do trato urinário e criptorquidia bilateral (CUNHA; SILVA; OLIVEIRA, 2020). O manejo dessa síndrome exige uma abordagem multidisciplinar e personalizada, envolvendo tanto aspectos cirúrgicos quanto anestésicos para minimizar riscos e melhorar os resultados. Este caso exemplifica a viabilidade de realizar procedimentos combinados, como abdominoplastia, orquidopexia e postectomia, em um único tempo cirúrgico, o que reduz a necessidade de múltiplas anestesias gerais e o impacto psicossocial no paciente e na família (MOREIRA; PEREIRA, 2021).
Do ponto de vista anestésico, a estratégia multimodal utilizada foi essencial para o sucesso do procedimento. A indução combinada inalatória e venosa, seguida de analgesia regional via bloqueio neuroaxial, garantiu controle adequado da dor e estabilidade hemodinâmica. A técnica peridural, com administração de ropivacaína a 0,3% associada a clonidina e morfina, está alinhada às recomendações atuais para manejo de dor perioperatória em pacientes pediátricos com condições complexas, oferecendo analgesia prolongada e redução da necessidade de opioides no pós-operatório (SILVA; ALMEIDA, 2019).
A decisão de adotar ventilação mecânica programada no pós-operatório imediato, com extubação planejada após 12 horas, foi fundamentada na fragilidade da musculatura abdominal, característica da síndrome. Essa abordagem preventiva está em conformidade com as melhores práticas descritas na literatura, reduzindo o risco de falência respiratória e otimizando a recuperação (CUNHA; SILVA; OLIVEIRA, 2020). A boa evolução do paciente, sem necessidade de resgate analgésico ou complicações respiratórias, reflete a adequação do planejamento anestésico e do suporte intensivo.
A internação em UTI pediátrica por seis dias permitiu o monitoramento rigoroso e a recuperação adequada, com alta hospitalar após evolução clínica satisfatória e exames laboratoriais normais. Esse manejo integrado reforça a importância de estratégias anestésicas avançadas e de cuidados intensivos pós-operatórios para pacientes com condições anatômicas e funcionais complexas (MOREIRA; PEREIRA, 2021).
Embora o presente relato demonstre resultados favoráveis, a literatura destaca a necessidade de estudos adicionais para avaliar os desfechos a longo prazo dessa abordagem combinada e compará-la com intervenções realizadas em etapas. A realização de múltiplos procedimentos em um único tempo pode representar um modelo de cuidado eficaz, desde que acompanhado de planejamento rigoroso e execução por equipes experientes (SILVA; ALMEIDA, 2019).
REFERÊNCIAS
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1Residente em anestesiologia pelo Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian, e-mail: dscord@hotmail.com
2Discente do Curso de Medicina da Universidade Federal do Acre, e-mail: alexandretjam85@gmail.com
³Discente do Curso de Medicina da Universidade Federal do Acre, e-mail: miguelvalente001@gmail.com
4Residente em anestesiologia pelo Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian, e-mail: paulocezar89@hotmail.com