SÍNDROME DE BURNOUT: ADOENÇA DO SÉCULO XXI DO PROFESSOR. POR QUE A EDUCAÇÃO ESTÁ ADOECENDO COM TANTA FREQUÊNCIA?

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7730885


Rubiamara Mayumi Policarpo Nishida Bueno1


A Síndrome de Burnout foi descoberta por um psicólogo alemão chamado Herbert Freudenberger que a diagnosticou a si mesmo no ano de 1974. Pessoas extremamente dedicadas ao trabalho excessivo estão mais propícias a desenvolver essa síndrome, considerada como o ponto máximo de estresse.

No cenário social, se por um lado a proletarização do trabalho do professor, as condições para ele, as decepções frente a impossibilidade de se realizar na profissão são elementos que tem carregado muitos professores a abandonarem de forma silenciosa a profissão; por outro, os professores que assumem seu trabalho com empenho que a profissão necessita, acabam ficando doentes.

Estudos recentes Codo (2006) e Esteve (1999) enfatizam sobre a saúde do professor, mostram que as dificuldades afetivas como o Burnout são resultadas do enfraquecimento diário a qual o educador se submete no convívio com os alunos. Além da sobrecarga de trabalho burocrático, a precarização do trabalho do professor, a perda de autonomia, o cenário socioeconômico e as condições de vida dos estudantes surgem como os fatores essenciais que acometem os docentes. (Landini, 2006).

No mundo de hoje, dentre tantas crises e dilemas, vivemos uma crise de valores e de inversão de valores. Nas escolas os professores, atualmente, se veem diante de situações além de desinteresse de alunos que não querem aprender, situações de agressividade, de preconceitos, ações machistas etc. O contexto social e cultural desses alunos coloca para a escola e seus professores novos dilemas focados na dimensão humana e relacional de ensino.

Ensinar hoje é diferente do que era há vinte anos. Fundamentalmente, porque não tem a mesma dificuldade trabalhar com um grupo de crianças homogeneizadas pela seleção ou enquadrar a cem por cento as crianças de um país, com os cem por cento de problemas sociais que essas crianças levam consigo. Daí o desencanto que atinge muitos professores, que não souberam definir o seu papel perante esta nova situação. (Nóvoa, 1995, p.96)

Para este combate os educadores precisam estar preparados, não apenas cientificamente, alimentados de saberes e práticas interessantes, contudo, os educadores necessitam sem sombra de dúvida estar preparados psicologicamente. Necessitam estar equilibrados e lúcidos. “Os professores são criticados por não garantirem na escola aquilo que a sociedade não consegue fora dela”. (Nóvoa, 2002, pg. 57).

É consenso abordar esse tema em meu Projeto de Pesquisa, pois o mal-estar docente ou Burnout, como é mais conhecido, tem levado muitos dos nossos bons profissionais ao esgotamento total (físico, emocional e mental), pois as exigências que foi acarretada durante esses anos de transformações da educação, desencadearam esse estresse, ao ponto de desistirem do combate, ou não resistirem ao combate.

O professor é o profissional que trabalha com o ser humano, cuida portanto do desenvolvimento do próximo e seu maior objetivo é a aprendizagem, assim, a relação afetiva entre o professor e aluno é fundamental e vai além do conhecimento. Isso é a maior causa do desgaste profissional do professor.

Atualmente nas escolas é possível encontrar professores que fazem muito mais do que as condições de trabalho lhes permitem, essa sobrecarga e mudança de ensino é causador do esgotamento físico e mental. Devido a tanta exigência, ocorre então a existência do conflito entre trabalho e família, percebendo-se o aumento de exaustão emocional e desgaste físico. Embora, muitos professores sintam-se exausto emocionalmente e fisicamente, a maioria ainda acredita e realiza-se em sua profissão, mesmo sendo sacrificante.

A realidade social e econômica em nosso país, fez com que os profissionais da educação se vejam encurralados diante do desafio de construir uma escola para todos e vencer limites impostos pela organização do trabalho.

Ser professor é uma tarefa que envolve riscos. Ainda que não sejam aparentes, como os que enfrentam um policial ou um bombeiro, eles existem e podem limitar o desempenho na docência. Um deles é a Síndrome de Burnout, ou síndrome do esgotamento profissional. Apesar de ser um sofrimento vivido por muitos profissionais de diversas áreas, a síndrome de Burnout acomete de forma mais acentuada profissionais da área da saúde, segurança e educação. São profissionais que enfrentam eventos estressores constantemente no ambiente de trabalho, além de um intenso e contínuo envolvimento emocional.

  • Exaustão ou esgotamento de energia;
  • Aumento do distanciamento mental do próprio trabalho;
  • Redução da eficácia profissional.  

Como ocorreu em muitas profissões, o trabalho do professor passou por profundas mudanças. O aumento de exigências e responsabilidades atribuídas ao professor com a massificação do ensino não foi acompanhado por maiores investimentos financeiros e a escassez de recursos materiais e as deficientes condições de trabalho dificultam a docência.

O professor está sobrecarregado, acredita que muitos deles fazem mal o seu trabalho devido a incapacidade de cumprirem um enorme leque de funções.

Para além das aulas, devem desempenhar tarefas de administração, reservar tempo para programar, avaliar, reciclar-se, orientar os alunos e atender os pais, organizar atividades várias, assistir a seminários e reuniões de coordenação, de disciplina ou de ano, porventura mesmo vigiar edifícios e materiais, recreios e cantinas. (Nóvoa, 1995, p. 108).

Os estudos alertam para as consequências disto, pois, este problema pode levar à falência dos sistemas de ensino. Se por um lado a proletarização do trabalho docente, as condições para o exercício da profissão, as frustrações diante da impossibilidade de se realizar na profissão, são fatores que têm levado muitos profissionais a abandonar silenciosamente a profissão; por outro, os docentes que assumem seu trabalho com compromisso que a profissão requer, estão ficando doente. É provável que se tenha cada vez mais professores afetados pela síndrome estando ainda no exercício da profissão.

Além disso, a desvalorização da profissão com baixos salários, a falta de reconhecimento da importância do trabalho docente, o desprestígio do professor permite questionar.

Os professores precisam encontrar novos valores, novos idealismos escolares que permitam atribuir um novo sentido à ação docente”. (Nóvoa, 1995, p. 29).

É preciso, primeiramente, evidenciar de forma científica o histórico da Síndrome de Burnout, para em seguida se aprofundar suas definições e aspectos essenciais, conforme os estudos desenvolvidos sobre o assunto. 

De acordo com Carlotto (apud França, 1987), Burnout é um termo inglês que indica “deixar de funcionar por exaustão de energia”. A expressão foi usada primeiramente no de 1974, por Freudenberger, que o caracteriza como um sentimento de fracasso e exaustão provocado por um alto desgaste de energia e recursos e este expõe que Malach (1978), uma das percussoras nas pesquisas empíricas sobre a síndrome de Burnout, o estabeleceu de início como um processo que acontece pela perda de criatividade e como uma reação de desprazer e aborrecimento.  Podemos comparar com um motor de um automóvel, que vai demonstrando desgaste e seu dono continua botando pressão para o funcionamento, porém, com o tempo o motor chega ao seu limite e simplesmente para de funcionar.

As pesquisas sobre Burnout começaram com profissionais da saúde, constatadas já em algumas pesquisas, constata-se que Lara (1999) confirma junto com outros pesquisadores da síndrome, que profissionais que possuem contato direto com outras pessoas são as mais atingidas pela síndrome porque detêm de um ideal humanista em seu campo de atuação e se deparam com um sistema de saúde habitualmente empedrado e excludente, ao qual precisam se adequar. 

… a origem de ‘Burnout’ se situa no âmbito dos profissionais, cuja ocupação se define por estar centrada em proporcionar serviço a pessoas. Uma revisão bibliográfica permite que nos estudos sobre ‘Burnout’ tem predominado este tipo de profissionais (médicos, enfermeiros, psicólogos escolares, terapeutas, assistentes sociais, professores, policiais, pessoas do âmbito da justiça.) (Lara, 1999, p.7)

Esta síndrome acontece sempre que o lado humano do trabalho, não é levada em consideração, havendo um desequilíbrio entre a natureza do trabalho e a natureza do sujeito que o realiza. De acordo com Carlotto (s/d), a Síndrome de Burnout tem sido estudado no decorrer do seu processo de criação a partir de quatro concepções:

  1. Clínica: a primeira a nascer, apresentado por Herbert Fredenberger no ano de 1974. Para ele, a situação de exaustão é o fruto do trabalho, contudo sem a preocupação em acolher as carências das pessoas. 
  1. Social-psicológica: sustentada por Christina Malach, através de pesquisas que diagnosticaram ser o espaço de trabalho o alicerce dos variáveis preditoras de Burnout. 
  1. Organizacional: representado por Cary Cherniss, que buscava entender como os aspectos de funcionamento da escola e seu ambiente cultural afetam os sujeitos em seu trabalho. Defende três dimensões de Burnout: exaustão emocional, despersonalização e sentimento de baixa realização profissional.
  1. Social-histórica: estabelecida por SeymorSarason no ano de 1983, enfatizando o impacto da sociedade como causador da síndrome, mais que questões individuais ou organizacionais. 

As pesquisas sobre Burnout têm uma longa tradição na América do Norte, sendo que em países europeus, com exceção da Inglaterra, as pesquisas estão em fase embrionária. No Brasil, há alguns estudos que abordam o estresse ocupacional e poucos são os que abordam especificamente a síndrome de Burnout. (Carlotto, s/d).

Mesmo com a ausência de trabalhos neste campo, a estudiosa paranaense Silvana de Lara participou do Congresso “Trabajemos contra elestrés” – que foi realizado na Europa em outubro de 2002, onde defendeu sua tese sobre a Síndrome de Burnout.

Visando o processo de formação sobre as perspectivas que estão ligadas à Síndrome de Burnout, far-se-á um estudo na perspectiva organizacional, para basear o estudo empírico, por se tratar de uma pesquisa que envolve uma organização específica: a instituição escolar.

Nesta concepção, analisa-se três dimensões próprias da síndrome de Burnout, sendo a primeira, a exaustão emocional que é equiparada com gráficos relativos ao esgotamento afetivo devido ao trabalho, frustração no trabalho e exaustão no trabalho.

Como aconteceu em outras profissões, o trabalho do educador sofreu grandes transformações. Tais transformações fazem referência às condições objetivas de exercê-la. Elas estão ligadas na transformação do próprio campo social onde se efetiva. Os professores e o sistema de ensino precisam preparar seus alunos não para uma sociedade do presente, mas do futuro e de um futuro sem dúvida, muito diferente do atual (Esteve, 1999, p.21). 

Entre as diversas acepções da síndrome de Burnout, consideradas em recente estudo, pode-se dizer que “é uma síndrome através da qual o trabalhador perde o sentido da sua relação com o trabalho” (Codo, 2006, p.238). Resumindo é uma desistência da profissão. O trabalhador não achando mais sentido em sua realização, acaba desistindo dela sem ter noção. Isso também pode ser causado pela desvalorização profissional, quando uma equipe gestora não valoriza o trabalho ou sobrecarrega um bom trabalhador pode ocorrer a desistência da profissão.

As pesquisas alertam para as consequências disto, uma vez que esse problema pode acarretar a falência dos processos de ensino. É provável que se possua cada vez mais docentes infectados pela síndrome estando ainda exercendo a profissão. Isto expressaria a desistência destes professores em continuar a sua função de zelar pelo desenvolvimento do outro.   

Burnout foi o nome que se encontrou para falar da desistência do trabalho. E esta desistência tem diversas formas de manifestação. Trata-se de um problema que afeta não apenas determinados países, ou determinada realidade educacional, cultural ou social, mas já é reconhecida pelos pesquisadores como uma epidemia internacional (Codo, 2006, p.249). 

Interferir nas questões ligadas ao desenvolvimento da síndrome de Burnout, dando mais atenção às pesquisas já efetuadas, significa tentar afastar uma dificuldade maior, isto é, a falência do próprio processo de ensino. Quando o profissional chega a esse limite, não tem nem o que levar para sua sala de aula de ensino, pois a falta de motivação ao trabalhar não trás boas estratégias para encantar seu aluno, e com pouco interesse desse aluno e pouco ensinamento desse professor, como ficará a educação?

Consequências da Síndrome de Burnout

Muitas questões continuam não esclarecidas, mas os autores, de uma maneira geral, admitem que o Burnout causa interferência nos campos institucional, social e pessoal. 

Na organização: A organização tem um crescimento em seus gastos (tempo e dinheiro) com decorrente rotatividade de funcionários interpelados pela síndrome, tal como o Absenteísmo destes (Gil – Monte, 1997; Maslach e Leiter, 1997).

Existem pesquisas que afirmam que a Síndrome de Burnout incide na vontade de alguns componentes da equipe por ações inovadoras, auxiliando como elemento impeditivo na difusão de comportamentos fundamentados em evidências. (Corrigan et al., 2003)

De acordo com Maslach e Leiter (1997): “[…] os indivíduos que estão neste processo de desgaste estão sujeitos a largar o emprego, tanto psicológica quanto fisicamente. Eles investem menos tempo e energia no trabalho, fazendo somente o que é absolutamente necessário e faltam com mais frequência. Além de trabalharem menos, não trabalham tão bem. Trabalho de alta qualidade requer tempo e esforço, compromisso e criatividade, mas o indivíduo desgastado já não está disposto a oferecer isso espontaneamente. A queda na qualidade e na quantidade de trabalho produzido é o resultado profissional do desgaste.

O absenteísmo não é proposital, ele acontece de forma sorrateira e rasteira, que vai corroendo pelas beiradas a equipe, e dependendo do âmbito profissional, muitas vezes negativista, mais de da metade do ambiente escolar vai se afastando, como se fosse um vírus que vai passando um para o outro, pois quando a falta de professores começa afetar uma escola, isso significa que os que ainda estão saudáveis ficarão sobrecarregados.

Para o sujeito: O sujeito pode manifestar fadiga contínua e progressiva; dores musculares ou osteomusculares (na nuca e ombros; na localidade das colunas cervical e lombar); distúrbios do sono; cefaleias, enxaquecas; distúrbios gastrointestinais (gastrites e úlceras); imunodeficiência com resfriados ou gripes contínuas, com afecções na pele (pruridos, alergias, queda de cabelo, ampliação de cabelos brancos); distúrbios cardiovasculares (hipertensão arterial, infartos, entre outros); enfermidades no sistema respiratório (suspiros profundos, bronquite, asma); disfunções sexuais (redução do desejo sexual, dispareunia/anorgasmia em mulheres, ejaculação precoce ou impotência nos homens); alterações menstruais nas mulheres (Araújoet al., 1998; Nakamuraet al., 1999). 

Relativo ao psiquismo, pode-se apresentar: ausência de concentração; mudanças de memória; lentificação do pensamento; solidão; falta de paciência, sentimento de impotência, labilidade emocional; falta de autoestima; desânimo (Araújoet al., 1998)

Pode acontecer o começo da agressividade, problemas para relaxar e aceitar transformações, perda de disposição, consumo de substâncias como o álcool, café, fumo, entre outras, comportamento elevado de suicídio.  (Murofuseet al., 2005)

Para o trabalho: Acontece a redução na qualidade do trabalho por mau atendimento, métodos errados, negligências e irresponsabilidade.  (Murofuseetal., 2005). A propensão a acidentes cresce por causa de atenção e concentração.  (Gil-Monte, 1997; Maslache Leiter, 1997).

O abandono psicológico e físico do trabalho pelo sujeito com Burnout possui perda de tempo e dinheiro para o próprio sujeito e para a organização que tem seu trabalho comprometido (Constable e Russell, 1986; Gil-Monte, 1997; Maslach e Leiter, 1997). 

Para a sociedade: O sujeito afetado pela Síndrome de Burnout pode gerar o distanciamento da família, até filhos e cônjuge (Constable e Russell, 1986). Já os clientes que são mal atendidos assumem os prejuízos emocionais, financeiros e físicos que podem se prolongar aos seus familiares e até ao seu espaço de trabalho (Dejours,1992; Maslach e Leiter, 1997). 

Identificando o Burnout em Professores

Farber (1991) decompõe as manifestações do Burnout em docentes em sintomas particulares e profissionais, ressaltando, entretanto, que estas questões são de complexas generalizações e explicações globais.

Para o autor, no geral, os educadores se sentem emocional e fisicamente cansados, estão constantemente irritados, ansiosos, com raiva ou tristes. As decepções afetivas peculiares a este fenômeno podem levar a sintomas psicossomáticos como por exemplo a insônia, úlceras, hipertensão, dores de cabeça, além de uso excessivo de álcool e medicamentos, adicionando dificuldades na família e conflitos sociais. 

No âmbito profissional, o docente pode ter prejuízos em seu planejamento de aula, virando-se menos frequente e zeloso. Possui pouco entusiasmo e imaginação, sentindo menos simpatia pelos seus alunos e menos otimismo quanto à avaliação de seu próprio futuro. 

Pode também sentir-se naturalmente frustrado pelas dificuldades que acontecem dentro de sala de aula ou pela pouca evolução dos seus alunos, desenvolvendo desta forma, um amplo distanciamento relacionado a estes. Sentimentos de antipatia relacionados a administradores e familiares dos alunos também são habituais, tal como o desenvolvimento de pensamento depreciativo relacionado à profissão. O professor se expõe autodepreciativo e arrependido de vincular-se na profissão, fantasiando e/ou visando abandoná-la (Carlotto, 2002). 

De acordo com Edelwich e Brodsky (1980), os docentes apresentam Burnout quando começam a gastar muito tempo de seu intervalo rebaixando alunos, reclamando da gestão, se arrependendo de sua escolha profissional e planejando novas oportunidades de trabalho. Em outras palavras, quando tudo que envolve sua profissão não tem sentido, ninguém tem valor, as pessoas e as coisas são taxadas como inválidas, tornando-se uma pessoa insuportável de conviver. Construindo inimizades por onde passa.

O Campo Docente e a Síndrome de Burnout

Camana (2007) sustenta que o sofrimento do docente é um episódio social relevante, pois além de lesar um grande número de pessoas, acarreta efeitos como: redução da qualidade pedagógica, absenteísmo e sofrimento humano. 

Por meio de uma concepção sociológica, a autora acima, critica o fato de ser pouco difundido o momento profissional sinalizado pelo desprazer, pelo mal-estar alto, por diversas vezes velado por um diagnóstico médico. Salienta ainda que “o sofrimento do professor é relegado ao registro da doença e imputado a uma fraqueza da pessoa. Erro de diagnóstico, é óbvia a necessidade de desvelar tal segredo a fim de libertar os professores doentes da profissão que eles amam” (Camana, 2007 p.96). 

Camana (2007) ainda ressalta pesquisas desenvolvidas em outros países como Estados Unidos e Canadá desde o início da década de 60 até a década de 70. Nos Estados Unidos, Burnout, foi um instrumento de pesquisa, onde o assunto foi discutido como um momento doloroso de duração inconstante para cada pessoa. Para a autora a preocupação com este assunto levou Malsach (2007) a adequar uma ferramenta psicométrica, o Maslach Burnout Inventory (MBI), em 1986. Dois pontos do MBI a pesquisadora abarca os sintomas para enunciar os indicativos de Burnout observados nas narrativas das pessoas de seu estudo sobre o sofrimento “externo” do docente. 

Fonte: Christiane Camana. O sofrimento “externo” do professor, 2007, p. 102

Esses aspectos combinados não deixam mais o docente desenvolver o seu trabalho em sala de aula. Dos sintomas, serão conceituados agora as consequências relevantes do mal-estar docente relacionadas no estudo de Zaragoza (1999), mostradas em ordem decrescente respeitando o quantitativo de docentes acometidos: 

1. Sentimentos de desconcerto e insatisfação ante os problemas reais da prática do magistério, em franca contradição com a imagem ideal do mesmo que os professores gostariam de realizar. 

2. Desenvolvimento de esquemas de inibição, como forma de cortar a implicação pessoal do trabalho realizado. 

3. Pedidos de transferência como forma de fugir de situações conflitivas. 

4. Desejo manifesto de abandonar a docência (realizado ou não). 

5. Absenteísmo trabalhista como mecanismo para cortar a tensão acumulada. 

6. Esgotamento. Cansaço físico permanente. 

7. Ansiedade como traço ou ansiedade de expectativa. 

8. Estresse. 

9. Depreciação do ego. Autoculpabilização ante a incapacidade para melhorar o ensino. 

10. Ansiedade como estado permanente, associada como causa-efeito a diversos diagnósticos de doença mental. 

11. Neuroses reativas. 

12. Depressões. 

Assim, é possível entender o valor e a relevância de um trabalho mais perto do professor, o que justifica investimentos em projetos que busquem atender não somente a formação pedagógica do docente, mais o zelo com a sua saúde afetiva.  “As licenças-saúde ocultam um problema profissional desconhecido que é importante retirar da sombra” (Camana, 2007, p.119). 

A dificuldade da realização do professor unida às novas exigências profissionais, baseado num contexto social em frenética transformação despertou aquilo que Zaragoza (1999) chamou de mal-estar no campo docente, essencialmente a partir dos anos 90, quando o mundo do trabalho sofreu mudanças significativas. “Os professores se encontram ante o desconcerto e as dificuldades de demandas mutantes e a contínua crítica social por não chegar a atender essas novas exigências” (Zaragoza, 1999, p.13). 

Esteve (1991) enumera doze indicativos básicos para sintetizar as transformações acontecidas no campo educacional. São eles: 

1. Aumento das exigências em relação ao professor: As responsabilidades do professor extrapolam o campo cognitivo. Não se pede apenas que saiba a matéria que leciona, mas que seja um facilitador da aprendizagem, pedagogo eficaz, organizador do trabalho de grupo. Além disso, também é atribuído a ele que cuide do equilíbrio psicológico e afetivo dos alunos, da educação sexual, além de dar a devida atenção aos alunos especiais integrados na turma. 

2. Inibição educativa de outros agentes de socialização: O conjunto de valores básicos que eram transmitidos pela família passa a ser também responsabilidade da escola. 

3. Desenvolvimento de fontes de informação alternativas à escola: O professor deixa de ser fonte única de transmissão oral de conhecimento. É preciso integrar às suas aulas os novos meios de comunicação, as novas tecnologias. 

4. Ruptura do consenso social sobre a educação: Divergência nas propostas de modelos de educação para uma sociedade multicultural. 

5. Aumento das contradições no exercício da docência: O professor estará sempre sujeito a críticas tanto no que diz respeito ao seu plano de valores quanto ao domínio metodológico independente do modelo educativo que escolher. 

6. Mudança de expectativa em relação ao sistema educativo: Passamos de um sistema de elite baseado na seleção e competência para um ensino de massas incapaz de garantir um trabalho adequado ao nível do aluno. 

7. Modificação do apoio da sociedade ao sistema educativo: Abandono da ideia de educação como promessa de um futuro melhor. Grande parte dos meios de comunicação e até de alguns governantes chegaram à conclusão simplista de que são os professores os responsáveis diretos pelo fracasso do sistema de ensino. 

8. Menor valorização social do professor: O fato de alguém ser professor tem relação com a incapacidade de conseguir um emprego melhor, ou seja, uma atividade em que se ganhe mais dinheiro. Vai longe o tempo em que ter um professor na família era motivo de orgulho. 

Se não se promoverem, em termos de salários, os professores que se encontram efetivamente no ensino e se não se melhorar a sua imagem social, a batalha das reformas dos sistemas de ensino ocidentais será perdida por um exército desmoralizado (Esteve, 1991, p.105) 

9. Mudança dos conteúdos curriculares: Com o avanço das ciências torna-se imprescindível o investimento na atualização dos professores através de um programa de formação permanente para garantir a compreensão adequada dos objetivos das reformas curriculares. 

10. Escassez de recursos Materiais e Deficientes condições de trabalho: A renovação pedagógica do trabalho docente exige o investimento em recursos materiais e melhoria das condições de trabalho no exercício da docência. Com a massificação do ensino isso não aconteceu. A falta de recursos sempre aparece nas pesquisas como um dos fatores que fomentam o mal-estar docente. 

11. Mudanças na relação professor-aluno: Se há décadas passadas o professor tinha todos os direitos e os alunos só tinham deveres e muitas vezes eram submetidos a situações vexatórias, hoje se inverteu a questão. Observamos igualmente injusta as situações de agressões verbais, físicas e psicológicas aos professores e colegas de classe. 

12. Fragmentação do trabalho do professor: Várias pesquisas identificam a falta de tempo do professor para atender às múltiplas tarefas, além das aulas, tais como reservar tempo para planejar, atualizar-se, orientar alunos, atender pais, organizar atividades várias, assistir a seminários e reuniões de coordenação. Esteve,1991, p.100)

Todas estas modificações, como foi percebido, irão ajudar na promoção do mal-estar na profissão docente. Muito antes dos anos 90, a expressão mal-estar já era usada, entretanto ele vai ganhar atenção e se tornar instrumento de estudo mais atual. Observa-se um discurso afinado com os contextos sociais em mudança, apontando para a necessidade de os professores desenvolverem novas atitudes, atendendo a demanda de uma nova escola. 

Esta nova escola precisa ser eficiente em trabalhar com as exigências da sociedade das novas tecnologias de informação e comunicação.  “Trata-se, assim, de capacitar os alunos a selecionar informações, mas, principalmente, a internalizar instrumentos cognitivos (saber pensar de modo reflexivo) para aceder ao conhecimento” (Libâneo, 2000, p.27). 

De acordo com Libâneo (2000, p. 28), uma nova escola cobra dos professores novos comportamentos, ressaltadas a seguir: 

1. Assumir o ensino como mediação: aprendizagem ativa do aluno com a ajuda pedagógica do professor. 

2. Modificar a ideia de uma escola e de uma prática pluridisciplinar para uma escola é uma prática interdisciplinar. 

3. Conhecer estratégias do ensinar a pensar, ensinar a aprender a aprender. 

4. Persistir no empenho de auxiliar os alunos a buscarem uma perspectiva crítica dos conteúdos, a se habituarem a apreender as realidades enfocadas nos conteúdos escolares de forma crítico-reflexiva. 

5. Assumir o trabalho de sala de aula como um processo comunicacional e desenvolver capacidade comunicativa. 

6. Reconhecer o impacto das novas tecnologias da comunicação e informação na sala de aula (televisão, vídeo, games, computador, internet, CD-ROM etc.). 

7. Atender à diversidade cultural e respeitar as diferenças no contexto da escola e da sala de aula. 

8. Investir na atualização científica, técnica e cultural, como ingredientes do processo de formação continuada. 

9. Integrar no exercício da docência a dimensão afetiva. 

10. Desenvolver comportamento ético e saber orientar os alunos em valores e atitudes em relação à vida, ao ambiente, às relações humanas, a si próprios. 

Porém, educadores dedicados e fascinados com seu trabalho, logo notaram a distância entre o correto e o possível de efetuar frente aos enfrentamentos cotidianos no chão da escola real, frente às distinções e desafios diários. Aprofunda-se a partir de então uma crise de identidade.

CONCLUSÃO

Para que o processo educacional avance, faz-se necessário que comecemos pelo professor, mas não é simplesmente com a formação dele, mas principalmente com a saúde deste profissional no desempenho de sua prática docente. A preocupação com a saúde docente deve ser um parâmetro fundamental para um sistema educacional consistente, que priorize melhores condições de trabalho e a valorização destes profissionais. Assim, é prioritário atentar para os principais fatores que contribuem para o adoecimento do profissional de educação, visando mantê-lo em plenas condições de exercer seu papel na escola e na sociedade.

As ocupações de mais risco são aquelas cujas atividades estão direcionadas às pessoas e que envolvam contato muito próximo, de cunho emocional. Os fatores de risco para o desenvolvimento do Burnout são dispostos em quatro dimensões, que são relativas à organização, o indivíduo, o trabalho e a sociedade.

Diante da complexidade da Síndrome e de seu poder de comprometimento na vida pessoal, social e ocupacional do docente, os quais podem levar à necessidade de afastamento do trabalho, a adoção de estratégias individuais e organizacionais é fundamental, para combater a síndrome e/ou minimizar seus efeitos sobre os professores.

Mediante esta pesquisa entende-se que o papel do professor no atual modelo educacional, está repleto de novas exigências e atribuições, as quais têm causado acúmulos de demandas, que podem refletir diretamente nas condições de saúde, causando ou agravando patologias de ordem psicoemocionais ou psicossomáticas. Tais irregularidades na saúde docente podem refletir em sua prática pedagógica, implicando na qualidade do ensino. 

Deve-se destacar que o assunto Burnout em professores no Brasil ainda é incipiente, na cidade de Paranaguá, muitos ainda nem ouviram falar dessa doença, desconhecem até o nome da Síndrome, dificultando a comparação com outros estudos nacionais. Porém, os resultados da revisão proporcionaram uma aproximação com a realidade vivida, atualmente, pelos docentes e seu nível de obrigação para com as funções causando assim uma vulnerabilidade psicológica e uma sobrecarga física e emocional.

Pode-se afirmar, contudo, que as evidências apontam que a profissão docente é uma profissão ameaçada e nada desejada atualmente, o que causa muita preocupação para o futuro dos brasileiros. 

Se a educação está desvalorizada e o trabalho docente cada vez mais ignorado, quem serão os próximos pedagogos e magistrados para atuar em salas de aula. A desvalorização da profissão que vem não só da própria instituição de ensino em que esse profissional atua também se dá por pela sociedade em geral, violência, falta de apoio, falta de direcionamento no que ensinar insatisfação profissional, e principalmente pelo governo brasileiro, são alguns dos motivos que contribuem gradativamente para que a precarização do trabalho docente aconteça.

Deste modo, professores são reféns do sistema escolar e raramente têm espaço, liberdade e criatividade, além de perderem a credibilidade, quando dizem que os alunos precisam estudar. Os pais por não terem tempo para educar seus filhos acabam exigindo que os professores assumam essa responsabilidade, docentes de escolas particulares especialmente passam a tratar pais e alunos como clientes e na lógica, “o cliente sempre tem razão”, muitas cobranças e exigências. Professores de escolas públicas sentem na pele a mesma violência e agressões sofridas pelos alunos em casa, esta classe está cansada, deprimida, estressada, desiludida.

Muito se fala em qualidade de vida do ser humano, o homem se preocupa mais com seu sucesso, seus lucros do que ter uma qualidade de vida. O Burnout tem consequências tanto no ponto de vista pessoal como no institucional, e isso interfere na relação de ensino e aprendizagem causando danos no relacionamento professor-aluno, interferindo na qualidade do trabalho pedagógico. O progresso do esgotamento profissional pode ser diminuído pelo acesso à psicoterapia, ao apoio social, à compreensão no ambiente de trabalho, às mudanças de atividades e ao apoio familiar. O estresse ocasiona um grande esgotamento físico e mental do docente, e tal problemática não aflige apenas a sua própria vida, as suas funções, expectativas e vontades além de afetar todo o seu sistema imunológico.

A depressão e a síndrome de burnout possuem algumas semelhanças, como cansaço; isolamento social e sentimento de desvalia. A depressão tem sintomas e duração específicos. Quando estamos tristes, conseguimos identificar o motivo da tristeza, que normalmente passa. Entretanto, quando estamos com depressão, não conseguimos identificar de onde vêm os sentimentos, e ela nem sempre passa, mas pode melhorar com o tempo. A depressão afeta os pensamentos, os sentimentos e a capacidade de entendimento das pessoas, além de como elas reagem a si mesmas e ao mundo. O oposto da depressão não é a felicidade, mas sim a vitalidade.

Os motivos que levam os professores a readaptação e, consequentemente a lotação funcional em espaços pedagógicos estão diretamente ligadas ao ambiente de trabalho, uma vez que diversos fatores resultantes das políticas vigentes, às quais exigem muito desse profissional, porém não oferece meios necessários para que os docentes desenvolvam um bom trabalho, o resultado disso são menos professores atuando em sala de aula e mais docentes sendo readaptados. 

Este estudo mostra a relevância de novas pesquisas no âmbito da qualidade ocupacional, no que diz respeito aos fatores desencadeantes da Síndrome de Burnout em professores, e como ela coloca em risco bem-estar físico, psíquico e emocional desses profissionais e como isso afeta diretamente na qualidade da prática docente ocasionando assim o afastamento do mesmo do trabalho.

A prevenção do burnout em docentes não é tarefa fácil e solitária, depende de todos os atores envolvidos dentro do processo ensino-aprendizagem e modificação do meio ambiente laboral do professor. O que está em jogo não é somente a saúde do professor, mas a qualidade de ensino ofertado por ele. Se o docente quiser não apenas sobreviver em seu ambiente de trabalho, é necessária uma mudança pessoal e coletiva da categoria docente, levando à construção de espaços saudáveis no contexto biopsicossocial do docente. Para isto, tornam-se necessárias mais pesquisas científicas deste problema.

O docente diariamente defronta-se com circunstâncias em que se sente abandonado, pois se depara diante da ameaça do fracasso e da perda do que para ele, é muito valioso: o respeito, a valorização e o reconhecimento profissional. A angústia, nesse caso, é um desprazer capaz de manifestar-se em dor física diante das dificuldades de uma tarefa para a qual o professor não se sente preparado.

A despersonalização faz com que o docente se isole na tentativa de se defender se esquivando das responsabilidades profissionais e dos indivíduos envolvidos na relação do trabalho. Com isso este profissional sente-se injustiçado, que não têm mais competência, chegando a desistir de algo, que antes, para ele, era prazeroso.

Não é possível desvincular o trabalho do docente dos fatores estressores existentes dentro do ambiente acadêmico, mas há formas de amenizá-los com a maior valorização do docente, implantando planos de cargos e salários, incentivando a atualização didático-pedagógica, proporcionando ao docente, horas reais para pesquisa e extensão e o incentivo à atividade física regular, pois é uma atividade que melhora as condições do corpo e da mente do sujeito, além de ser um horário em que pode desvincular sua atenção do trabalho e ampliar suas relações sociais, aumentando a autoestima deste profissional que sente dor e acredita que não é importante.

A educação é um processo permeado de relações. Professor e aluno devem ser transformados, um pelo outro, através de uma relação direta, firmada pelo afeto e por trocas de informações, conhecimentos e comportamentos. 

A atividade física é essencial na prevenção de doenças físicas e mentais e na promoção da saúde física e mental, melhorando a qualidade de vida pessoal e no trabalho, diminuindo a insônia e a tensão, e promovendo o bem-estar físico e emocional, além de gerar benefícios cognitivos e sociais para qualquer indivíduo.

Sem a docência saudável não existe e nem existirá uma sociedade culta e sadia.


1Mestre em Educação