SAÚDE MENTAL NA GRAVIDEZ: UM OLHAR DA PSICOLOGIA PERINATAL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10094873


Christiane de Cássia França de Castro¹
Luciana Silva Pereira Salles²
Larissa Cristina Kremer dos Santos Paquiela³


RESUMO

Este artigo aborda a importância da saúde mental durante a gravidez, com foco nas questões psicológicas enfrentadas pelas mulheres grávidas. A gravidez é um período de intensas mudanças físicas e emocionais, e a saúde mental desempenha um papel fundamental no bem-estar das futuras mães. Explora as várias fases da gravidez, desde o primeiro trimestre até o pós-parto, destacando as mudanças emocionais e os desafios que as mulheres enfrentam em cada etapa. Além disso, discute a prevalência da depressão pós-parto e outros distúrbios mentais durante esse período. A Psicologia Perinatal, como disciplina especializada, é apresentada como um recurso crucial para apoiar as mulheres e casais ao longo dessa jornada. Os psicólogos perinatais desempenham um papel vital no fornecimento de suporte emocional, educação e orientação para enfrentar os desafios psicológicos associados à gravidez e ao pós-parto. O presente artigo enfatiza a importância de reconhecer os sinais precoces de distúrbios de saúde mental e fornece orientações sobre como identificar, prevenir e tratar essas questões. Promover a saúde mental durante a gravidez não apenas beneficia as mulheres, mas também impacta positivamente a saúde do bebê e o bem-estar geral da família. Destaca-se também a necessidade crítica de atenção à saúde mental durante a gravidez e enfatiza o papel vital desempenhado pela Psicologia Perinatal no apoio às mulheres e casais. Com um foco na prevenção e no tratamento de distúrbios de saúde mental, a comunidade médica e os profissionais de saúde têm a oportunidade de melhorar significativamente a experiência da gravidez e do pós-parto para as futuras mães.

Palavras-chave: Saúde mental, Gravidez, Psicologia perinatal.

ABSTRACT

This article addresses the importance of mental health during pregnancy, focusing on the psychological issues faced by pregnant women. Pregnancy is a period of intense physical and emotional changes, and mental health plays a fundamental role in the well-being of expectant mothers. The article explores the various stages of pregnancy, from the first trimester to postpartum, highlighting the emotional changes and challenges women face at each stage. Additionally, it discusses the prevalence of postpartum depression and other mental disorders during this period. Perinatal Psychology, as a specialized discipline, is presented as a crucial resource to support women and couples throughout this journey. Perinatal psychologists play a vital role in providing emotional support, education, and guidance to address psychological challenges associated with pregnancy and postpartum.The article emphasizes the importance of recognizing early signs of mental health disorders and provides guidance on how to identify, prevent, and treat these issues. Promoting mental health during pregnancy not only benefits women but also positively impacts the baby’s health and the overall well-being of the family. The critical need for attention to mental health during pregnancy is highlighted, as well as the vital role played by Perinatal Psychology in supporting women and couples. With a focus on the prevention and treatment of mental health disorders, the medical community and healthcare professionals have the opportunity to significantly improve the pregnancy and postpartum experience for expectant mothers

Keywords: Mental health, Pregnancy, Perinatal psychology.

1. INTRODUÇÃO

Como definida pelo Ministério da Saúde (2023), a gravidez é entendida como um evento resultante da fecundação do óvulo (ovócito) por um espermatozoide, ocorrendo habitualmente dentro do útero, e durando em torno de 40 semanas (280 dias). Este é um momento de grandes transformações para a mulher, seu (sua) parceiro(a) e para toda a família.

Durante esse período, o corpo lentamente se modifica para se preparar para o parto e a maternidade. Por se tratar deum fenômeno fisiológico, sua evolução se dá na maioria dos casos sem grandes intercorrências. Alguns sintomas físicos podem ser observados, como atraso menstrual (que geralmente sinaliza a possibilidade de uma gravidez), aumento dos seios, enjoo, mais sono e fome, maior sensação de cansaço, etc. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2023).

Para que a gestante receba os cuidados necessários nesse período, é realizado o pré-natal, um acompanhamento médico a fim de manter a integridade das condições de saúde da mãe e do bebê. São realizados exames laboratoriais a fim de identificar e tratar doenças que podem trazer prejuízos à saúde da mãe ou do bebê (MORAES, 2023).

A realização do pré-natal representa papel fundamental na prevenção e/ou detecção precoce de patologias tanto maternas como fetais, permitindo um desenvolvimento saudável do bebê e reduzindo os riscos da gestante. Informações sobre as diferentes vivências devem ser trocadas entre as mulheres e os profissionais de saúde. Essa possibilidade de intercâmbio de experiências e conhecimentos é considerada a melhor forma de promover a compreensão do processo de gestação. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2005)

No entanto o período de gravidez não apresenta apenas sintomas físicos, também são evidentes mudanças psicológicas e emocionais na gestante. Conforme Theme (2021), em meio a estas mudanças e todas estas transformações é passivo que questões, quando não tratadas adequadamente, possam acarretar problemas de saúde mental, desde questões mais simples a desafios mais sérios. Apesar de os problemas de saúde mental materna serem um desafio significativo para a saúde pública, é notório que o tema ainda carece de discussão e atenção adequada, tanto durante o pré-natal quanto no período pós-parto.

De acordo com Julianelli (2023), a Psicologia Perinatal vem em auxílio a todas estas questões relacionadas a esse período. Se trata de uma área especializada no atendimento psicológico da mulher ou do casal tanto na fase que antecede a gravidez, assim como no parto e no pós-parto.

Ela proporciona um espaço de reflexão em que os pais podem compreender melhor as inúmeras mudanças que ocorrem em cada uma destas fases, expor suas expectativas, fantasias, medos e angústias, dar um novo significado para suas vivências e, assim, lidar melhor com a nova realidade e aliviar eventuais sofrimentos (JULIANELLI, 2023).

A Psicologia Perinatal é uma abordagem que também visa:

o de atendimento às gestantes, casais grávidos e familiares do casal, visando oferecer acolhimento e orientação psicológica e preventiva às alterações emocionais significativas próprias desse período, ou evitar a sua cronificação no pós-parto. (SCHIAVO, p.1)

A gravidez envolve processos de reajustamento e estruturação em vários aspectos. A mãe e a criança estão desde o início de algum modo envolvidas em um processo relacional que pode trazer expectativas, alegria, satisfação ou, do mesmo modo, pode manifestar conflitos, ambivalência, medos, ansiedade, rejeição, negação e violência (CORDEIRO, 2022, p.6).

Faz-se necessário, perceber melhor os processos particulares da gravidez para a mulher em suas dimensões física, psicológica, social, e as possibilidades de auxílio à mãe, ao bebê e à família, observando a relevância da saúde dessa dinâmica relacional no que diz respeito aos cuidados com a mãe e o bebê, no contexto familiar e social, pois, segundo a Fundação Oswaldo Cruz, no Brasil, em cada quatro mulheres, mais de uma apresenta sintomas de depressão no período após o nascimento do bebê. (CORDEIRO, 2022, p.6).

2. DESENVOLVIMENTO

2.1. PRINCIPAIS MUDANÇAS NO PERÍODO GESTACIONAL

Os nove meses (40 semanas) costumam ser divididos em três trimestres devido as particularidades de cada estágio. O corpo da mulher se prepara para a formação da criança e para o parto, e cada semana é marcada por avanços significativos no desenvolvimento do bebê. No pré-natal, o médico acompanhará essas etapas para controlar a saúde da mãe e do bebê e prestar as orientações necessárias (LIMA, 2018).

Durante as semanas da gestação, diversos fatores contribuirão para o bom desenvolvimento do feto, incluindo a alimentação da mãe, a atenção com a saúde, o pré-natal, o histórico de doenças dos pais. A gestação é dividida em três trimestres. No primeiro, começa a divisão celular, que transforma o óvulo fecundado em um embrião. No segundo, todo o sistema do bebê é concluído. No terceiro, o bebê ganha peso e altura, enquanto o corpo da mãe se prepara para o parto. O acompanhamento semana a semana é essencial para garantir a saúde da mãe e do bebê. O pré-natal ajuda a prevenir doenças através das vacinas para gestantes, da observação do desenvolvimento do bebê e pela identificação de deficiências ou outras doenças com o máximo de antecedência. (Lima 2018).

Para facilitar a compreensão do processo gestacional, descreveremos suas etapas da seguinte maneira:

PRIMEIRO TRIMESTRE: 0 A 13 SEMANAS

O primeiro trimestre é o mais delicado, por ter maiores riscos de aborto natural. Ele é contado a partir do momento da fecundação até a terceira semana. Quando o óvulo é fecundado, começa o processo de multiplicação celular, até que o óvulo se torne um embrião. Com o passar das semanas, essas células irão desenvolver todos os sistemas essenciais para o bebê (LIMA, 2018).

O embrião tem o tamanho de um grão de arroz. Em geral, é neste período que se descobre a gravidez, devido ao atraso na menstruação. Também ocorrem náuseas e enjoos em função do hormônio HCG, liberado pela placenta. Alguns sintomas se apresentam nesse período, alguns sendo mais comuns do que outros, o que torna cada gestação única. Os sintomas mais conhecidos do início da gravidez são: menstruação atrasada, vontade constante de urinar, seios doloridos, com sensação de formigamento ou inchados, enjoos (matinais ou não), alteração de cor na aréola (parte circular que envolve o bico do seio), aparecimento de uma linha do umbigo até o osso púbico ou alterações na pele, desejos por alimentos ou sabores específicos, fadiga e muito sono, oscilações emocionais.

SEGUNDO TRIMESTRE: 14 A 26 SEMANAS

Neste período, o bebê completa sua formação, desenvolvendo suas funções respiratórias, auditivas e musculares. Além disso, desenvolve também suas características físicas, com a definição dos olhos, orelhas e crescimento dos pelos. Por ter capacidade de audição, o vínculo entre os pais e o bebê já pode começar a ser desenvolvido (LIMA, 2018).

Esta fase costuma ser mais tranquila e confortável, pois os sintomas do início da gravidez começam a desaparecer. No entanto, podem surgir desconfortos como hemorroidas, constipação e dores na área da virilha. A barriga da gestante começa a crescer, e é possível sentir os movimentos do bebê. Os seios começam a se preparar para a produção de leite, aumentando de tamanho, e a pele e o quadril também sofrem alterações.

O bebê começa seus movimentos respiratórios e mexe as mãos. Também já é possível descobrir o sexo do bebê por um exame de ultrassom, caso o bebê esteja em uma posição que permita a visualização do órgão genital. Próximo ao fim do segundo trimestre, o sistema do bebê já funciona completamente, e tem o tamanho de uma couve-flor (LIMA, 2018).

TERCEIRO TRIMESTRE: 27 A 40/41 SEMANAS

Durante as últimas semanas, a gestante pode sofrer com azias e faltas de ar, devido ao tamanho e peso do bebê. Neste período, os pais devem se preparar para a chegada do bebê e para a maternidade, tomando os devidos cuidados, como se informar, escolher um pediatra, conversar com um médico sobre o parto. (LIMA, 2018).

O corpo da gestante se prepara para o parto, e devido ao crescimento do bebê, a barriga cresce e causa desconforto e dores nas costas e tornozelos. Os seios ficam inchados e sensíveis, e o colostro (leite produzido nos primeiros dias de amamentação) pode vazar. O tamanho e o peso do bebê fazem pressão na bexiga, fazendo com que a gestante tenha constante vontade de urinar (LIMA, 2018).

Apesar do sistema do bebê já estar completamente formado, ele precisa crescer e ganhar peso. Entre 27 e 32 semanas, ele dobra de tamanho. O bebê já abre os olhos, percebe a luz fora do útero e identifica vários sons. Com 35 semanas, o bebê também se prepara para o parto, girando e ficando com a cabeça para baixo, pronto para nascer a qualquer momento a partir de 37 semanas (LIMA, 2018).

PERÍODO DE PRÉ-PARTO

Segundo Alessandra (2023), cerca de 15 dias antes do bebê nascer, a gestante já pode entrar em uma condição clínica chamada de pré-parto – principalmente as mães de primeira viagem (primigestas). É importante saber os sintomas desse período e o que fazer para se preparar da melhor forma para o parto. Isso minimiza o estresse e as possíveis complicações do final da gravidez e do trabalho de parto.

Ainda conforme Alessandra (2023), o pré-parto é o momento em que o bebê começa a se colocar na posição ideal para o parto normal, o que acontece, em média, na 35ª semana da gravidez. O bebê se volta para a parte de baixo da barriga, fazendo a pressão interna passar do diafragma para a bexiga. Isso leva a uma diminuição dos sintomas de falta de ar, mas há uma intensificação na vontade e ir ao banheiro. Os principais sintomas do período pré-parto incluem: Cólicas e dores na virilha, perda de peso (cerca de um quilo) ou nenhum ganho, picos e baixas de energia, redução dos movimentos fetais, muco vaginal em maior quantidade e mais espesso, expulsão do tampão mucoso, muco com sangue ou rosado indicam que o trabalho de parto já começou, contração uterina cada vez mais frequente e forte e diarreia.

PÓS-PARTO (PUERPÉRIO)

Para muitas mulheres, o puerpério, o período após o parto, é frequentemente considerado a fase mais desafiadora da maternidade. Isso se deve não apenas às mudanças físicas, mas também às oscilações emocionais, todas as quais precisam ser equilibradas com as necessidades do recém-nascido (FILHO, 2022).

O pós-parto é momento de readaptação do organismo após o nascimento do bebê, tendo início com a saída da placenta e até 45 dias após. O puerpério é marcado por diversas mudanças físicas e psíquicas, que mesmo quando esperadas e conhecidas podem gerar estranhamento. Os sintomas mais comuns no puerpério incluem desconforto nas mamas, inchaço abdominal, cólicas e desconforto na região íntima (mais comum em mulheres que realizaram parto normal).

SITUAÇÕES ANÔMALAS (IRREGULARES OU FORA DO COMUM)

Infelizmente, o pós-parto pode trazer sofrimento para a gestante e os familiares. Situações anômalas, como a morte do bebê e o abandono parental são problemas que algumas gestantes tristemente enfrentam.

Segundo Braga (2003), aproximadamente 10% dos bebês que nascem em nosso país pode necessitar de atendimento em UTI Neonatal. Destes, a grande maioria recebe alta com pouquíssimas recomendações, além daquelas que fazem parte dos cuidados habituais em puericultura.

Contudo, há aqueles que não conseguem seguir este caminho e morrem, deixando um rastro de dor para todos os que compartilharam de sua história, por mais efêmera e passageira que tenha sido. Mesmo que essa vida nunca tenha acontecido fora dos limites do corpo da mãe, como nos casos de morte intraútero ou ainda de natimorto, ela traz consigo traços dos sonhos de seus pais desde a mais tenra idade (BRAGA, 2003).

Os momentos que antecedem o óbito do bebê são cruciais. Nesse sentido, quando as condições estão extremamente críticas, muitas UTIs convocam e incentivam a presença da família ampliada – avós e irmãos – em torno do berço ou incubadora (BRAGA, 2003).

Segundo Teles (2003), abandono paterno também é um problema que pode se apresentar no pós-parto. Na relação familiar, o pai tem um papel fundamental na vida dos filhos. Eles precisam que este cumpra com suas responsabilidades paternas para se desenvolverem como adultos saudáveis e felizes. O papel do pai é prover segurança, estabilidade e orientação para que seus filhos possam crescer e ter o seu devido desenvolvimento psicossocial.

No entanto, a realidade existente no Brasil é da paternidade ausente, e o machismo estrutural é um dos principais fatores que influenciam nesta falta de prestação afetiva. Isto ocorre por ser um tipo de pensamento que não é apenas apoiado por normas sociais e estereótipos, mas também é validado pela sociedade. Estes estereótipos e normas sociais reforçam os papéis de gênero, que direcionam a responsabilidade do cuidado dos filhos às mães e tornam a paternidade opcional. Neste sentido, o abandono paterno é um problema social cada vez mais presente em nossa sociedade (TELES, 2023).

SAÚDE MENTAL PERINATAL

O início e o desenvolvimento de uma gestação são percebidos como fenômenos complexos, embora não sejam caracterizados como um estado patológico. Durante esse estágio ocorrem profundas alterações psicológicas, orgânicas e fisiológicas, repercutindo psíquica e socialmente na vida da mulher e de seus familiares, podendo inclusive ser considerado um episódio de crise no ciclo evolutivo de muitas mulheres (COSTA e col., 2010).

Segundo a pesquisa de Piccinini (2008), as principais mudanças psicológicas percebidas pelas gestantes são uma intensificação dos sentimentos/emoções, insatisfação e inadequação relacionadas a aspectos conjugais (ciúmes do parceiro, insatisfação por não ajudarem com sua gravidez e tarefas de casa, etc.). Portanto, é importante tanto para os conjugues quanto para o bebê buscar compreender a dinâmica psíquica desse momento e sua contribuição para a constituição da maternidade.

Logo, diante de todas estas mudanças e revivências psíquicas, a experiência de gestar leva a uma exacerbação da sensibilidade da mulher, o que a torna também suscetível a vários distúrbios emocionais (RAPHAEL-LEFF, 2000).

A gravidez pode tanto desencadear uma crise emocional para as gestantes como inaugurar um potencial de adaptação e resolução de conflitos até então desconhecidos. A maneira como a mulher lida com todas estas mudanças do período gestacional deverá influenciar fortemente a relação futura com a criança (MALDONADO, 1997).

DISTÚRBIOS RELACIONADOS AO PERÍODO GESTACIONAL

Segundo Serratini (2019), os distúrbios mentais constituem um sério desafio para a saúde pública e, na idade adulta. Tanto em países desenvolvidas como em países em desenvolvimento, é observado que,dentre estes distúrbios,a depressão e os transtornos relacionados a ansiedade afetam mais as mulheres do que os homens.

A maior predisposição do sexo feminino está, sobretudo, associada ao período reprodutivo, uma vez que o pós-parto se caracteriza por mudanças psicológicas, biológicas e sociais que tornam as mulheres mais suscetíveis a condições psiquiátricas, como a depressão pós-parto (SERRATINI, 2019).

De acordo com Steen e Francisco (2019), nessas fases as mães têm mais probabilidades de acarretar problemas psicológicos devido aos níveis altos de estresse e ansiedade, afetando assim sua saúde mental.

Vale ressaltar, ainda que a depressão pós-parto é a adversidade mais dominante, por isso é de extrema relevância mães serem avaliadas e promover o bem-estar para elas, além de uma rede apoio que facilite o processo.

O perigo de transtornos mentais serem ocasionados no processo da gestação e maternidade são bem maiores, pois, a partir do momento que uma mulher se torna mãe, ela pode abdicar da sua vida pessoal, social, trabalho etc., para se dedicar totalmente ao seu filho, acarretando uma sobrecarga que a impossibilita de ter uma vida leve e tranquila. É nesse momento que muitas mães ficam ainda mais expostas a apresentarem problemas psicológicos (POLES et al., 2018).

As doenças psiquiátricas podem acometer a mulher em qualquer período da vida. Especificamente no período pós-parto existem três distúrbios de humor já conhecidos: a depressão pós-parto, o baby blues (BB) e a psicose pós-parto (ZUGAIB, 2015).

Como afirmado por Lansky et. Al. (2014), o início precoce da atenção à gestante, além de possibilitar o acompanhamento das condições de saúde materna e fetais, proporcionam a identificação e implementação de intervenções sobre os fatores de risco. Nesse sentido, a inexistência dos cuidados pré-natais ou a realização de forma inadequada pode acarretar o aumento dos índices de mortalidade materna e infantil.

Diante desse cenário, é essencial a identificação de fatores de risco relacionados com a ocorrência da morte materna no período gravídico puerperal de modo que seja possível o planejamento das ações e intervenções da equipe de saúde (BRASIL, 2006).

Entre os transtornos psíquicos da puerperalidade, destaca-se a depressão pós-parto (DPP). De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (American Psichyatric Association, 2002), a depressão pós-parto (DPP) caracteriza-se pela presença de humor deprimido ou perda de interesse e prazer por quase todas as atividades (Episódio Depressivo Maior), que se manifesta duas semanas após o parto.

A ocorrência de transtornos depressivos no puerpério é alta. De acordo com dados do Ministério da Saúde (Brasil, 2006), 70% das pacientes apresentam sintomas depressivos que caracterizam o blues puerperal, estado depressivo mais brando e transitório marcado por fragilidade, hiper emotividade e sentimentos de incapacidade.

A Depressão Pós-Parto (DPP) tem sido investigada como um fenômeno com uma taxa considerável de incidência entre as mães no período pós-parto, podendo variar em intensidade de forma abrangente, desde formas mais brandas até casos mais graves. Ela pode surgir entre 4 e 20 semanas após o parto, afetando cerca de 10 a 20% das mulheres que acabaram de dar à luz. (CANTILINO, 2003; HIGUTI&CAPOCCI, 2003).

A depressão pós-parto não é reconhecida pelos sistemas de classificação atuais como uma doença em si, mas o início de um episódio depressivo em até 4 semanas do pós-parto pode ser registrado pelo especificador de início perinatal no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, quinta edição (DSM-5). Assim, no sentido geral, episódios depressivos que ocorrem de 6 a 12 meses após o parto podem ser considerados depressão pós-parto (BOMFIM et. Al., 2022).

Segundo o Ministério da Saúde (2006), mulheres que passaram por um trabalho de parto, em especial nos primeiros dias, podem apresentar sintomas da doença. Não existe uma única causa conhecida para a DPP. Ela pode estar associada a fatores físicos, emocionais, estilo e qualidade de vida, além de ter ligação, também, com histórico de outros problemas e transtornos mentais. No entanto, a principal causa da depressão pós-parto é o enorme desequilíbrio de hormônios em decorrência do término da gravidez.

Os principais sintomas associados à depressão pós-parto são: perda de interesse ou prazer em atividades diárias e atividades/coisas/pessoas que antes gostava, pensamento na morte ou suicídio, vontade súbita de prejudicar ou fazer mal ao bebê, perda ou ganho de peso, vontade de comer mais ou menos do que o habitual, dormir muito ou não dormir o suficiente, insônia, inquietação e indisposição constante, cansaço extremo, sentimento de indignação ou culpa, dificuldade de concentração e tomada de decisões, ansiedade e preocupação em excesso (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2006).

O baby blues (BB), também denominado blues puerperal, é um curto período que procede o parto e pode durar até duas semanas, ou seja, ocorre no pós-parto mediato podendo se prolongar ao tardio. É definido como uma “perturbação transitória do humor caracterizada por: labilidade de humor, tristeza, disforia, confusão subjetiva e choro” conforme Sadock (2017), e não se encaixa como doença de acordo com a American Psychiatriac Association (2014).

A ocorrência varia entre 30 e 75% das parturientes, porém, é considerada subdiagnosticada, uma vez que os sintomas tendem a desaparecer sozinhos. Teoriza-se que tais alterações estão ligadas a flutuações hormonais, ao estresse do parto e a própria chegada do bebê – momento de sobrecarga emocional e de responsabilidade à mulher (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).

O baby blues possui como sinais e sintomas o choro fácil ou frequente, ansiedade, irritabilidade e dependência conforme Campos (2015), entre o segundo e o décimo dia do puerpério. De acordo com Sadock (2017), insônia ou pensamentos que almejem prejudicar o bebê não fazem parte deste quadro. Podem ser ausentes ou leves os sintomas caracterizados por sentimento de culpa e inadequação.

Cavalcante Júnior (2015) aborda a condição como sendo uma alteração de humor não patológica ou então uma situação de transitoriedade emocional. Humor ou estado de ânimo é definido como o tônus afetivo do indivíduo ou ainda estado emocional de base (DALGALARRONDO, 2008).

Existe também a psicose pós-parto, que, segundo o DSM-V, é uma forma de transtorno psicótico breve. Os sintomas, segundo Cantilino (2009) envolvem insônia, agitação, logorreia, humor irritável, euforia, delírios, alucinações, estado confusional e pode haver sintomas relacionados à depressão e/ou mania. O risco de infanticídio nestes casos é maior.

Sadock (2017) aponta existir relação entre essa condição e transtorno depressivo maior e transtorno do humor. É classificada pela American Psychiatriac Association (2014) como um subtipo de transtorno bipolar. Os delírios ou comportamento desorganizado envolvem o filho, com o apelo de lhes causar dano. A internação destas pacientes decorre do maior risco de suicídio e infanticídio.

Berglund (2020) em estudo aponta que as desordens perinatais ainda são negligenciadas e isso impacta em suicídios e crianças desassistidas por mães adoecidas.

PSICOLOGIA PERINATAL

Diante de todos estes desafios, Schiavo (2023) aponta que a Psicologia Perinatal se apresenta como uma área de atuação e de produção de conhecimento referentes às questões da perinatalidade e da parentalidadeque se preocupa em conhecer os fenômenos psicológicos que estão em torno do nascimento como o planejamento familiar, luto perinatal, gravidez, parto e pós-parto, bem como dispõem de técnicas para prevenção de alterações emocionais significativas próprias desse período, como a ansiedade, estresse e depressão.

A atuação do psicólogo perinatal vai desde o planejamento familiar, auxílio às mulheres que desejam engravidar, gravidez, parto e pós-parto, adoção, luto materno, puerpério e associado aos estudos de parentalidade se abre uma maior amplitude de possibilidades de auxílio do psicólogo à família. Dessa forma a importância do pré-natal psicológico se dá pois:

O Pré-Natal Psicológico (PNP) é prática inovadora e complementar ao pré-natal ginecológico, durante a qual se realizam intervenções de natureza psicoprofilática no intuito de propiciar cuidados humanizados durante a gestação. Os temas trabalhados no PNP contemplam: discussão sobre as vias de parto, direito ao acompanhante, distúrbios emocionais do puerpério, ajuda qualificada no pós-parto, o papel dos avós, amamentação, desmistificação da maternidade e paternidade, sexualidade na gravidez. (Schiavo, 2019)

Schiavo (2019) indica que a psicologia perinatal procura conhecer e atuar acerca dos fenômenos psicológicos que estão presentes em torno do nascimento e dispõe de técnicas para prevenção de alterações emocionais significativas próprias desse período, como a ansiedade, estresse e depressão.

O psicólogo perinatal pode atuar em hospitais, maternidades, centros de saúde e na clínica, o atendimento pode ser individual ou grupal. A área ganhou visibilidade inicial no Brasil com a publicação da dissertação de mestrado de Maria Tereza Maldonado, intitulada “Psicologia da Gravidez, parto e puerpério”, no final da década de 70. (SCHIAVO, 2023)

De acordo com Schiavo (2003), a Psicologia Perinatal é uma área recente em nosso país, e está em processo de expansão. Teve início na década de 70 com Maldonado, continuando pela década de 80 Bortoleti, pela década de 90 Laconelli e mais recentemente outros nomes, como Profª. Drª. Rafaela Schiavo e Profª. Drª. Alessandra Arrais, que além de publicarem estudos científicos para a área, também realizam conferências e cursos presenciais e online para formação de novos profissionais.

Cursos de especialização também passaram a existir no Brasil no ano de 2018, permitindo a expansão e capacitação de mais profissionais para o atendimento clínico, hospitalar e nos serviços de saúde e saúde mental (SCHIAVO, 2023).

Segundo Gomes (2022), o trabalho da psicologia perinatal é variado e com muitas possibilidades de atuação. Uma delas é a atuação em grupos, podendo ocorrer com gestantes, mulheres que desejam gestar, mães com seus bebês nascidos e até mesmo mães por adoção, sendo o psicólogo o mediador e portador de informações necessárias para o grupo. A terapia breve é uma das demais possibilidades, podendo ocorrer nos ambientes hospitalares, de assistências e clínicos.

Ainda conforme Gomes (2022), a psicoterapia individual também se faz muito eficaz, principalmente para elaboração psicoemocional da mãe em relação a sua história, a sua forma de enxergar a maternagem, a traumas já vividos, com o objetivo de ressignificar suas experiências possibilitando um exercício de maternagem curativo e sem reservas, para sua experiência e para o desenvolvimento saudável do bebê e podendo ser concomitante com o pré-natal em formato de pré-natal psicológico.

É notória a eficácia da psicologia perinatal, como possibilidade de olhar para a gestação de forma multifocal, não somente com o olhar biológico. Maternar não é um processo somente fisiológico e bioquímico, mas primordialmente afetivo, perceptivo, subjetivo, interpessoal e intrapessoal (GOMES, 2022).

Desse modo, o Pré-Natal Psicológico tem como objetivo esclarecer, conscientizar e prevenir possíveis alterações e transtornos emocionais tão comuns nessa fase. Ressalta-se a importância de se realizar o PNP com o Psicólogo Perinatal para a conscientização das alterações emocionais que a fase ocasiona e também prevenção de futuros transtornos emocionais no puerpério. (DE JESUS, 2017).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo abordou diversos aspectos relacionados à gravidez, pré-natal, desenvolvimento do feto ao longo dos trimestres, período de pré-parto, pós-parto (puerpério) e os desafios relacionados à saúde mental perinatal. Além disso, discutiu a importância da Psicologia Perinatal como uma abordagem crucial para apoiar as gestantes, casais grávidos e suas famílias durante esse período de transformações.

A gravidez é um período marcado por mudanças físicas, emocionais e psicológicas para a mulher, e o pré-natal desempenha um papel essencial na garantia da saúde da mãe e do bebê. Durante os três trimestres da gestação, o corpo da mulher passa por adaptações significativas, e o acompanhamento médico é fundamental para garantir um desenvolvimento saudável do bebê.

O período de pré-parto é caracterizado pelas últimas semanas antes do nascimento, quando a gestante pode enfrentar sintomas como cólicas, perda de peso, inchaço abdominal e outros desconfortos. É um momento importante para se preparar para o parto e a maternidade.

O pós-parto, ou puerpério, é frequentemente considerado uma fase desafiadora da maternidade, pois envolve não apenas mudanças físicas, mas também oscilações emocionais. As mães enfrentam pressões adicionais, como cuidar do recém-nascido, e é nesse período que distúrbios de saúde mental podem se manifestar, incluindo a depressão pós-parto.

Distúrbios de saúde mental, como a depressão pós-parto, o baby blues e a psicose pós-parto, podem ocorrer durante o período perinatal. Eles podem ser desencadeados por uma combinação de fatores hormonais, emocionais e sociais. A identificação precoce e o apoio adequado são fundamentais para o bem-estar da mãe e do bebê.

A Psicologia Perinatal desempenha um papel crucial ao oferecer apoio emocional e orientação às gestantes, ao companheiro(a) e suas famílias. Ela ajuda a compreender e lidar com as complexidades psicológicas desse período, prevenindo ou tratando distúrbios emocionais. Além disso, a Psicologia Perinatal aborda questões como planejamento familiar, adoção, luto perinatal e parentalidade.

Em resumo, a gravidez e o período perinatal envolvem uma série de desafios, não apenas físicos, mas também emocionais e psicológicos. A Psicologia Perinatal desempenha um papel crucial ao oferecer apoio emocional e psicológico às gestantes e suas famílias, ajudando a garantir um ambiente de apoio e bem-estar durante essa fase de transição na vida de uma mulher.

REFERÊNCIAS

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¹Graduanda em Psicologia. Faculdade Carajás.

²Graduanda em Psicologia. Faculdade Carajás.

³ Orientadora, Bacharel em Psicologia, Especialista em logoterapia, avaliação psicológica e docência do ensino superior.