RESPONSABILIDADE CIVIL POR ERRO MÉDICO

 CIVIL LIABILITY FOR MEDICAL ERROR

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.10294649


 Bianca Malta de Souza Vieira¹
Andreza Alves de Oliveira²


Resumo: O objetivo deste trabalho é demonstrar a responsabilidade civil do médico. A presente pesquisa é de cunho qualitativo , é separado em tópicos,demonstrando desde o conceito de responsabilidade civil até o conceito de relação de consumo que está  descrito no código do direito do consumidor.Como fontes, utiliza a pesquisa bibliográfica, a jurisprudencial e a legislação pertinente ao assunto. A responsabilidade civil médica tem grande importância e vem a cada dia sendo mais discutida, devido às grandes quantidades de vítimas que sofrem danos, ou perdem as suas vidas devido a erros médicos, crescendo assim, as grandes quantidades de demandas recorríveis ao judiciário buscando a indenização pelo dano caudado.

Palavras-chave: Responsabilidade Civil; Erro Médico; Obrigação de Meio.

Abstract: This research is of a qualitative nature, it is separated into topics, demonstrating everything from the concept of civil liability to the concept of consumer relationship that is described in the consumer law code. As sources, it uses bibliographical research, jurisprudence and legislation relevant to the subject. Medical civil liability is of great importance and is being discussed more and more every day, due to the large number of victims who suffer damages, or lose their lives due to medical errors, thus increasing the large number of appealable demands to the judiciary seeking compensation. for the damage caused.

Keywords: Civil Liability; Medical error; Means Obligatio

1. INTRODUÇÃO

O ser humano para curar ou prevenir enfermidades recorre ao profissional médico. A medicina enquanto profissão tem como objetivo prevenir e melhorar os padrões de saúde e de vida da coletividade.

O médico é obrigado a empregar seus conhecimentos com técnica, diligência e perícia da melhor forma para dar segurança ao paciente, na tentativa de cura ou minoração dos males do paciente, no exercício de sua atividade médica poderá incorrer em erro, prejudicando o paciente, ensejando assim a responsabilidade civil médica, o qual é tema de estudo do presente trabalho.

A responsabilidade civil, vem sendo um tema bastante discutido pelos tribunais e juristas, gerando discussão na atualidade, como regra geral, é subjetiva, estando previsto no artigo 951 do Código Civil, que expressamente se refere ao dano decorrente da culpa, para que o erro médico seja caracterizado é necessário existir imprudência, negligência ou imperícia, sendo os elementos importantes para gerar a culpa. (Brasil, 2002).

A sociedade com a evolução e o inconformismo das vítimas, passando-se a exigir reparação dos danos causados, em decorrência do erro médico, partindo-se desse momento, razões dos inúmeros casos de lesão sofridas e dos danos causados, a responsabilidade civil do médico passou a ser estudada com maior profundidade , a atividade do médico começou a ser questionada , avaliada e alcançada em  todas as especialidades da ciência da medicina.

2. CONCEITO DE RESPONSABILIDADE CIVIL

O conceito de responsabilidade civil é hoje amplamente debatido. Quando explorar a responsabilidade civil são encontradas diversas definições do âmbito jurídico. Descreve Maria Helena Diniz (2002)  a respeito da definição de responsabilidade civil: 

Poder-se-á definir a responsabilidade civil como a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato de próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva) ou, ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva). (Diniz, 2002. p. 34.).

Em suma , a responsabilidade civil é o  Direito Obrigacional , que representa o dever que o autor tem de reparar o dano, é imprescindível toda e qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que viole direito ou cause prejuízo a outrem. Que a reparação do dano se dá por forma de indenização.

2.1. ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

A responsabilidade Civil segundo a teoria Clássica, tem três pressupostos sendo o dano, a culpa do autor e o nexo de causalidade entre o fato culposo e o mesmo dano, que autor veio causar, fazendo assim a configuração da responsabilidade.

Trazendo esse conceito para Âmbito do Direito Privado , e seguindo essa mesma linha de raciocínio, a responsabilidade civil deriva de uma agressão a um interesse eminentemente particular , sujeitando , assim ,o infrator , ao pagamento de uma compensação pecuniária  à vítima , caso não possa repor in natura o estado anterior de coisa . Decompõe -se , pois, nos seguintes elementos , ‘’conduta positiva ou negativa , dano , nexo de causalidade’’.

2.1.1    Dano 

 De acordo com  Gagliano e Pamplona Filho (2011, p.78) O dano ou prejuízo pode ser conceituado como lesão a um interesse jurídico tutelado, podendo ser este patrimonial ou não, causado pelo agente infrator por sua ação ou omissão, em situações que na maioria das vezes o agente tenta evitar o dano maior mais venha causar a terceiro.

A reparação do dano, sendo uma sanção imposta ao responsável pelo prejuízo ou danos em favor do lesado, temos assim, em regra, que todos os danos são ressarcíveis. Entretanto, para que seja efetivamente reparável o dano, é necessário o seguinte requisito fundamental para a sua caracterização: a violação de um interesse jurídico patrimonial ou extrapatrimonial de uma pessoa física ou jurídica, a efetividade ou certeza do dano e a subsistência do dano.

2.1.2 Nexo Causalidade 

O nexo de causalidade que liga a conduta do agente (positiva ou negativa) ao resultado danoso é indispensável para que possa atribuir a responsabilidade ao agente infrator. Abaixo são apresentadas as três teorias principais que tentam explicar o nexo de causalidade.

Para a Teoria da equivalência das condições, tudo aquilo que concorra para o evento será considerado causa, ou seja, haverá uma equivalência entre todos os fatores causais, caso tenham relação com o resultado danoso, por isso se diz “equivalência de condições”. Essa teoria, por trazer muitos inconvenientes e imprecisões, não tem muitos adeptos, como no exemplo citado acima, onde o fabricante da arma, ao fabricá- lá, não poderia imaginar o fim que se destinaria o seu produto, não podendo assim ser responsabilizado. (Gagliano e Pamplona Filho, 2009).

Já para teoria causalidade adequada, apenas o antecedente abstratamente apto à realização do resultado danoso, diante de um juízo razoável de uma apreciação de probabilidade por parte do julgador, que poderá ser considerado causa. (Gagliano e Pamplona Filho, 2011).

 A teoria da causalidade direta ou imediata, também denominada teoria da interrupção do nexo causal ou teoria da causalidade necessária, define a causa: “como sendo apenas o antecedente fático que, ligado por um vínculo de necessariedade ao resultado danoso, determinasse este último como uma consequência sua , direta ou imediata”. (Gagliano e Pamplona Filho, 2009, p. 90).

Há divergência em relação a qual teoria é adotada pelo código civil Brasileiro, referente ao nexo de causalidade.Posto que , o nosso código se adapta melhor à teoria da causalidade direta e imediata, sendo que, a jurisprudência muitas vezes adota a teoria da causalidade adequada

2.1.3 Conduta Humana 

A noção de conduta humana é configurada pela voluntariedade do agente, o qual através de sua liberdade de escolha tem o discernimento necessário, tendo assim, consciência daquilo que está fazendo, sabendo que poderá causar um dano ao próximo ou objeto.

A voluntariedade ocorre quando nos encontramos diante de uma situação de responsabilidade subjetiva noção de culpa, ocorrendo também na responsabilidade objetiva ideia de risco.

A conduta humana, dependendo da forma de sua manifestação é classificada em positiva ou negativa, por direito próprio do agente, sendo a primeira configurada pela prática de um comportamento positivo, ativo por parte do agente. E a segunda, traduz- se na atuação omissiva ou negativa, causadora do dano. Nesse sentido, de acordo com o artigo 186 do Código Civil: 

Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano à ordem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. (Brasil, 2002).

Muitos doutrinadores defendem que a ilicitude é o aspecto necessário da conduta humana. Ato ilícito pode ser conceituado em um comportamento voluntário do agente que infringe um dever, uma norma jurídica, mesmo sabendo do dano que está infringindo devida a sua imprudência.

3. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E OBJETIVA

O novo Código Civil brasileiro nada inovou a respeito da teoria subjetiva na responsabilidade médica, ou seja, a responsabilidade médica, em regra, continua a ser subjetiva, repousando-se assim no elemento culpa, cabendo à vítima provar o dolo ou culpa stricto sensu do agente, para obter a reparação devida.

O direito pátrio admite, em alguns casos específicos, a responsabilidade objetiva, ou seja, responsabilidade sem culpa. Temos como exemplo, o artigo 927 do Código Civil que prevê que: Haverá obrigação de reparar o dano, independente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. (Brasil, 2002).

Assim, de acordo com artigo citado, na responsabilidade objetiva, é descartada por completo a prova de culpa, não aplicando-se, está à responsabilidade médica, todavia há defensores de teorias objetiva, têm o objetivo de abranger todos os casos de dano e como consequência deste a reparação que é devida, sendo estes os seus principais argumentos.

No Brasil, em regra, a atividade médica é regida pela responsabilidade subjetiva. Entretanto, em algumas vezes, como no caso das cirurgias plásticas estéticas, por tratar-se de uma obrigação de resultado, ocorre uma presunção de culpa, cabendo ao médico, provar que não agiu com culpa (negligência, imprudência ou imperícia), podendo até mesmo ser o dolo, nesta situação haverá uma inversão do ônus da prova.

4. RESPONSABILIDADE DO MÉDICO

O direito à saúde, é uma obrigação do estado, estando previsto na Constituição Federal, e deve ser exigido por qualquer cidadão. Assim sendo, o ente estatal deve adotar medidas, visando à prevenção de doenças e o tratamento das mesmas, buscando evitar situações constrangedoras para o paciente ou seus familiares.

Os serviços dos profissionais da medicina, devido a sua importância e necessidade, fazem com que o Estado, exija título reconhecido para o exercício de tal atividade. Desde que preencha as exigências legais, tudo isso não faz com que o médico se torne imune a responder pelos danos que ocasionar.

A responsabilidade Subjetiva configura em tal negligência decorrente dos danos causados no exercício da atividade médica “lato sensu”, já se encontrava prevista no Código Civil de 1916, Lei nº 3.071, de 01 de Janeiro de 1916, em seu artigo 1.545, que estabelecia a seguinte lei : 

Art. 1545.Os médicos, cirurgiões, farmacêuticos, parteiras e dentistas são obrigados a satisfazer o dano, sempre que da imprudência, negligência, ou imperícia, em atos profissionais, resultar morte, inabilitação de servir, ou ferimento. (CC/16 – Lei nº 3.071, 1960).

O Código Civil de 2002 traz a mesma previsão em seu artigo 951 estabelecendo: 

Art.951.O disposto nos artigos 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho. (CC – Lei nº 10.406, 2002).

É importante ressaltar, que os artigos citados acima, referem -se às indenizações cabíveis nos casos de homicídio, lesão ou ofensa à saúde e o impedimento de exercício de profissão ou ofício, importante observar também o código de ética da atividade médica estabelece em seu artigo 1, que descreve: 

Art 1º  A medicina é uma profissão que tem por fim cuidar da saúde do homem, sem preocupação de ordem religiosa, racial, política ou social e colaborar para a prevenção da doença, o aperfeiçoamento da espécie, a melhoria dos padrões de saúde e de vida da coletividade. (Resolução CFM nº 2.222/2018)

Na medicina também há um dever que deve ser obedecido pelo médico , qual seja, o dever de informação , onde o profissional informará ao paciente ou sua família a respeito das técnicas e métodos a utilizados no tratamento ou na intervenção cirúrgica, buscando assim, o melhor para o paciente.

  4.1 RESPONSABILIDADE DO ANESTESISTA 

Dentro de uma equipe, em princípio, é o médico chefe quem se presume culpado pelos danos que acontecem, pois é ele quem está no comando dos trabalhos e só sob suas ordens é que são executados os atos necessários ao bom desempenho da intervenção. 

Mas a figura do anestesista é nos dias atuais de suma importância não só dentro da sala de operação, mas também no período pré e pós-operatório. Dessa forma, não pode mais o operador chefe ser o único responsável por tudo o que aconteça antes, durante e após uma intervenção cirúrgica. A sua responsabilidade vai depender do exame do caso concreto.

Fora de dúvida é a existência de responsabilidade autônoma do anestesista no pré e pós-operatório. A divergência ainda remanesce no caso do anestesista dentro da sala de operação e sob o comando do cirurgião, podendo nesse caso a responsabilidade ser dividida entre os dois:  cirurgião e anestesista. 

Na responsabilidade pelos atos dos auxiliares e enfermeiros é preciso distinguir entre os danos cometidos por aqueles que estão diretamente sob as ordens do cirurgião, ou os destacados especialmente para servi-lo, daqueles cometidos por funcionários do hospital. No primeiro caso, o cirurgião responderá.  No segundo, a culpa deverá ser imputada ao hospital, a menos que a ordem tenha sido mal dada ou que tenha sido executada sob fiscalização do médico-chefe, como por exemplo, injeção aplicada diante dos médicos. 

4.2 A RESPONSABILIDADE DOS HOSPITAIS E DOS LABORATÓRIOS 

Se o médico tem vínculo empregatício  com o hospital, integrando a sua equipe médica, responde objetivamente a casa de saúde, como prestadora de serviços, nos termos do art 14, caput, do Código de Defesa do consumidor, provocada a culpa daquele. No entanto, se o profissional apenas utiliza o hospital para internar os seus pacientes particulares, responde com exclusividade pelos seus erros, afastada a responsabilidade do estabelecimento.

Estão também sujeitos à disciplina do referido Código, com responsabilidade objetiva e de resultado, os laboratórios de análises clínicas, bancos de sangue e centros de exames radiológicos, como prestadores de serviços. Conforme observa Aguiar Dias:

O hospital responde pelo dano produzido pelas coisas (instrumentos, aparelhos) utilizados na prestação dos seus serviços: ‘ao dono da coisa incumbe, ocorrido o dano, suportar os encargos dele decorrentes, restituindo o ofendido ao status quo ideal, por meio da reparação. Essa presunção não é irrefragável. Mas ao dono da coisa cabe provar que, no seu caso, ela não tem cabimento (Aguiar Dias, 1997, p. 165).

Isso, contudo, não dispensa que se prove  a culpa  do servidor, na prática do ato  danoso. Isto é, o hospital não responde objetivamente, mesmo depois  da vigência do  código de Defesa do Consumidor, quando se trata  de indenizar dano produzido por  médico integrante de seus quadros (Agl 179.184-1-5°CC-tJSP), pois é preciso provar a culpa deste, para somente  depois se ter como presumida  a culpa do hospital.

4.3 OBRIGAÇÕES DE MEIO E DE RESULTADO NOS SERVIÇOS MÉDICOS

É fundamental esclarecermos a distinção entre obrigações de meio e de resultado, e resultado   e acerca da teoria do resultado, Rui Stoco (2007), defende que: 

A teoria do resultado aplica-se apenas à responsabilidade contratual, significando que nas obrigações de meios o profissional tem obrigação apenas de proporcionar o melhor tratamento e fazer uso dos meios adequados e técnicas aceitas. Responderá mediante demonstração de sua culpa se não tiver atuado adequadamente. Na obrigação de resultado, em que promete uma modificação para melhor no paciente e um efeito final, responderá também subjetivamente, mas sua culpa será presumida (Stoco, 2007, p. 556).

Nas obrigações de meio, o médico utiliza todos os seus esforços, meios necessários e técnicas adequadas para obter a cura do paciente, mas, não obrigando se ao resultado, isto é, a cura do mesmo. Na generalidade dos casos, as obrigações que os médicos assumem em face de seus pacientes, são de meio, pois muitas vezes, o fim esperado não é alcançado, devido ao organismo ter a possibilidade de reagir imprevisível, colocando em risco o sucesso do tratamento médico ou da intervenção cirúrgica do paciente.  Assim, se o médico apenas se compromete com paciente a chegar a um determinado resultado, mas não obrigando-se a este, isto é, uma obrigação de meio, caberá, no entanto, a vítima do dano provocar a culpa ou dolo, fazendo assim, configuração de norma jurídica imposta.

No entanto, para que o paciente ou sua família tenham direito a receber indenizações cabíveis, é necessário que provem que a atuação médica se deu com negligência, imprudência ou imperícia. (Stoco, 2007).

A obrigação de resultado é aquela em o médico assume contratualmente uma obrigação, ou seja, um resultado como, por exemplo, na cirurgia plástica, podendo ser também obrigação de resultado, a realização do raio-x, de um check-up, a transfusão de sangue, esterilização necessária, entre outros procedimentos.

Se o médico se vincular a atingir um determinado resultado e, caso não o atinja, será presumido culpado. Cabendo, no entanto, a este provar que não agiu com culpa ou o acontecimento derivou de caso fortuito ou força maior, que por tal motivo não conseguiu cumprir a sua obrigação perante o paciente. Conforme Rui Stoco (2007):

Evidentemente que se o resultado procurado for a cura de um mal, de uma doença, não se poderá responsabilizar o médico tão-só em razão da não obtenção desse objeto. Tal não poderá jamais ser exigido do médico, pois a ciência médica é, por definição, uma ciência incompleta, que a cada dia busca e encontra novas fronteiras, mas que se defronta com enfermidades novas ou desconhecidas. (Stoco, 2007, p. 557).

A respeito das obrigações de meio e de resultado do profissional médico a jurisprudência pátria defende que o erro médico, ausente a infração à obrigação de meio e de resultado, deve afastar a indenização, pois nem todos os casos configuram erro médico, em muitos caso o próprio paciente pode ser o responsável por tal dano.

5. DOLO

Previsto no artigo 145 do Código Civil, que expressa: ‘’São os negócios jurídicos anuláveis por dolo, quando este for a sua causa”. (Brasil, 2002).

A definição de dolo possui diversas definições do âmbito jurídico. Descreve Clóvis Beviláqua: “Dolo é artifício ou expediente astucioso, empregado para induzir alguém à prática de um ato jurídico, que o prejudica, aproveitando ao autor do dolo ou a terceiro.” (Beviláqua; Clóvis, 1980, p. 219)

Desde modo, o dolo no Direito Civil é qualquer meio utilizado com objetivo de induzir ou manter alguém a praticar qualquer ato que se diz contrário à lei, um vício de consentimento do negócio jurídico.

5.1 CULPA 

O crime culposo , está previsto no  Código Penal  de 1984  traz a previsão em seu artigo artigo 18, inciso II do Código Penal estabelecendo: 

Art. 18.II – culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).

Os artigos 186 e 951 do Código Civil Brasileiro , abrangem a teoria da culpa a respeito da responsabilidade médica. Devido a conduta do profissional, se ocorrer dano, morte, incapacidade ou ferimento, caberá à vítima, para que seja ressarcida, provar que o médico agiu com negligência, imprudência ou imperícia.

Referente à responsabilidade subjetiva do médico, a qual caracteriza-se pelo elemento culpa, sob as modalidades da negligência, imprudência e imperícia, o Código de Ética Médica traz em seu artigo 29 tal conceito: É vedado ao médico praticar atos danosos ao paciente, que possam ser caracterizados como imperícia, imprudência ou negligência. (Resolução CFM nº 1.931/09).

 5.1.1 Negligência 

A negligência é a omissão de uma conduta que o profissional médico deveria adotar, mas não adota. Há omissão referente aos comportamentos recomendados da prática médica. Cabe ao médico tomar todas as medidas necessárias e adequadas para garantir o sucesso no tratamento ou na intervenção cirúrgica.

A negligência pode ser caracterizada pela desatenção, pela desídia. pela falta de cuidado, assim, é essencial no exercício da atividade médica agir com amor, atenção, cuidado, para evitar toda e qualquer distração e falha, no momento em que estiver em cirurgia, no atendimento, ou aplicando receituário médico (Neto, 2003). 

O próprio Código de Ética Médica traz situações de negligência, em seus artigos 46: Afastar-se de suas atividades profissionais, mesmo temporariamente, sem deixar outro médico encarregado do atendimento de seus pacientes em estado grave; e 61: Art. 61. Abandonar o paciente sob seus cuidados. (Resolução CFM nº 1.931/09)

Podem ser citados como exemplo de negligência: a troca de prontuários e exames; o diagnóstico falho, por exame superficial; o retardamento na intervenção cirúrgica; a demora do envio do paciente ao especialista.

5.1.2. Imprudência

Na imprudência existe uma ação, e não uma omissão, é o contrário da negligência. O médico através de sua conduta expõe o paciente a grandes riscos, devido a sua falta de cautela. São situações em que o profissional supera os limites da prudência, da previsibilidade, aumentando o risco de atividade.

Quando o médico age com imprudência, o mesmo tem uma previsibilidade e uma antevisão do evento, mas acaba agindo da mesma forma. Assim, o profissional médico é imprudente quando mesmo tendo todo o conhecimento do risco e também obtendo o conhecimento da ciência médica, age assim mesmo. (Neto, 2003).

O Código de Ética Médica traz na parte final de seu artigo 57, uma situação de imprudência médica: Deixar de utilizar todos os meios possíveis de diagnóstico e tratamento ao seu alcance em favor do paciente. (Resolução CFM nº 1.931/09).

5.1.3 Imperícia

A imperícia é a deficiência de conhecimentos técnicos da profissão, o despreparo prático, a não observação das normas referentes à determinada profissão, que colocam em risco terceiros, sendo no caso, pacientes. É verificada uma conduta médica realizada em desconformidade com a melhor técnica, pois o profissional simplesmente não a domina a contento. (Neto, 2003).

Existe uma corrente no campo do Direito, a qual defende ser impossível considerar um médico imperito, pois se o mesmo estiver devidamente habilitado junto ao seu Órgão de Classe (Conselhos Regionais), subentende-se ser o médico perito na ciência médica. Outra corrente, no entanto, afirma que é perfeitamente aceitável o fato de que um médico, mesmo devidamente habilitado, possa errar por não dominar determinada técnica e, sendo assim, realizá-la com erro vindo a causar dano ao paciente. (Neto, 2003).

No entanto, tal controvérsia não é de nenhuma utilidade na prática, pois uma vez sendo comprovada a culpa do profissional médico, este será responsabilizado civilmente.

Podemos citar como exemplos de imperícia: o obstetra que, na operação cesariana, cortar a bexiga da parturiente, o médico que, manuseando o fórceps, provocou traumatismo crânio encefálico, com edema e congestão cerebral, dando causa à morte do recém-nascido, quando o médico obstetra realiza ligadura de trompas, ou laqueadura, e ainda assim a mulher engravida, o profissional da medicina que delega ato médico a pessoa não habilitada.

6.CAUSAS QUE EXIMEM A RESPONSABILIDADE CIVIL MÉDICA

O erro médico é aquele que decorre de uma ação ou omissão culposa, em qualquer de suas modalidades: negligência, imprudência ou imperícia, e da ação ou omissão dolosa. Podem ser causas que eximem a responsabilidade civil médica: o estado de necessidade, o erro e ignorância, caso fortuito e força maior, culpa do enfermo, obediência devida, iatrogênica, cumprimento de um dever legal e exercício regular de um direito, entre outros.

O estado de necessidade pode ser definido, quando alguém, para salvar um bem jurídico próprio ou de terceiro exposto a perigo atual, sacrifica a vida ou bem jurídico, a respeito do estado de necessidade, o Código Penal prevê em seu artigo 24:

Art. 24. Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se.
§ 1°- Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo.
§ 2°- Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços.(Decreto Lei nº 2.848, 1940).

O erro pode ser conceituado, quando o conhecimento a respeito de uma determinada matéria é presumido verdadeiro, quando na realidade é falso. Já a ignorância, é quando há ausência absoluta acerca de uma determinada matéria. Assim, no erro há conhecimento falso, e na ignorância não há conhecimento.

Referente ao caso fortuito e força maior, há previsão legal no artigo 1.058 do Código Civil:

Art. 1058. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito, ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado, exceto nos casos dos artigos 955,956 e 957.
Parágrafo único – O caso fortuito ou de força maior, verifica-se no fato necessário, cujo efeito não era possível evitar, ou impedir. (Lei nº 3.071, 1960).

É importante ressaltar, que o próprio legislador não fez distinção entre caso fortuito e força maior, os quais apresentam-se conjuntamente. Entretanto, a doutrina distingue esses eventos, o caso fortuito pode ser definido como o acontecimento que provém das forças da natureza, ou seja, um acontecimento natural, sem que haja intervenção humana. 

No estrito cumprimento de um dever legal, é imposto pela lei um determinado comportamento, onde a conduta mesmo sendo típica, não é lícita. Já no exercício regular de um direito, o sujeito tem que obedecer rigorosamente aos requisitos objetivos impostos pelo Poder Público, caso não obedecidos, ensejará o agente em abuso de direito, respondendo por tal conduta abusiva. Em ambos os casos, acima citados, o consentimento do ofendido poderá funcionar como causa excludente da antijuridicidade e excludente da tipicidade  

7. COMPLEXIDADE DA PROVA DA CULPA: A RESPONSABILIDADE MÉDICA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR 

A prova da culpa, pelo sistema tradicional do Código Civil, assim como o nexo causal entre a conduta e o dano, incube à vítima, ao paciente e seus herdeiros, tanto na relação contratual, como na relação extracontratual. Será sempre menos custosa a prova da culpa médica ficará sujeita às intempéries da prova no processo.

A culpa deve ser avaliada pelo juiz dentro dos princípios da obrigação de meio, salvo a cirurgia plástica exclusivamente estética e os exames técnicos, como já exposto. Por vezes, a inculpação apontará para o chefe da equipe médica, quando este assume para si a responsabilidade de uma cirurgia, por exemplo, embora esta possa ter ação regressiva contra os demais participantes do ato. Em outro enfoque, a culpa pode partir do profissional que fez diagnóstico falho, de onde partiram todas as vicissitudes do paciente. (Dias, 1979).

O Código de Defesa do Consumidor fornece parâmetros para avaliação do que se entende como serviço defeituoso:

§ 1º O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:
I-  O modo de seu fornecimento
II- O resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; 
III- A época em que foi fornecido (Lei nº 8.078, 1990).

O 2° parágrafo do mesmo artigo acrescenta que o serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas, neste último aspecto, quanto à responsabilidade médico, como assevera, qualquer nova técnica deve ser previamente aprovada pelo paciente, na hipótese de não ser ainda aceita pela comunidade médica mundial. Por outro lado, devemos acrescentar que, se o médico opta por técnica a qual ainda não domina, não é perito, assume o risco do insucesso, podendo esse procedimento tipificar ou agravar sua culpa.

O estabelecimento hospitalar e os prestadores de serviços médicos podem ser considerados responsáveis, neste plano se inserem também os chamados planos de saúde e seguros médicos, que atuam por profissionais, laboratórios e outras entidades credenciadas.                           

O caso concreto deve fazer concluir pela existência do nexo causal dentro da teoria clássica de nosso sistema de responsabilidade. Como regra geral no sistema do consumidor, cabe a este, ou a seu representante, como destinatário do serviço médico, produzir a prova do defeito, o dano e o nexo de causalidade.

É preciso ressaltar que a Lei do consumidor veio, portanto, facilitar sobremaneira os reclamos de maus serviços médicos, matéria que ainda não ganhou a dimensão esperada nos julgados justamente porque o acesso à justiça era sumamente dificultado pela manutenção dos princípios tradicionais de responsabilidade civil subjetiva.  

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS

No Direito brasileiro, como já mencionado, a responsabilidade civil médica, em regra, é uma responsabilidade subjetiva, repousando-se no elemento culpa, nas modalidades da imprudência, imperícia e negligência como regra. As obrigações que os médicos assumem em face de seus pacientes, são de meio, pois o médico obriga-se a aplicar todos os meios adequados para tratar o paciente, mas não estando obrigado a curar o mesmo.

Mas há exceções, onde a obrigação do médico será de resultado, como nas cirurgias plásticas, pois o médico assume um compromisso, previamente acordado, de atingir um determinado resultado.

A responsabilidade civil médica, também é defendida por grande parcela da doutrina e da jurisprudência como sendo contratual, mas em determinados casos podendo ser também extracontratual há causas que eximem a responsabilidade civil médica, não havendo o dever de indenizar, como o caso fortuito ou de força maior, o estrito cumprimento de um dever legal e o exercício regular de um direito, o estado de necessidade, a culpa do enfermo, entre outros.

A profissão do médico tem uma grande carga emotiva que a envolve, pois há uma ligação direta do profissional médico com o paciente. Tal profissão sempre procura o bem-estar do ser humano, preservando sua saúde. Mas esse tipo de profissão acarreta riscos tanto para o profissional, quanto para o paciente. 

Conclui-se que o médico, o qual lida com saúde, com a vida humana, tem o dever de empregar todos os meios necessários e técnicas adequadas no tratamento ou na intervenção cirúrgica do paciente, pois no direito civil,  as provas da culpa corresponde a um dos pressupostos da responsabilidade civil, ocasionando dano ao paciente, demonstrar a culpa do responsável,  o mesmo será responsabilizado, tendo que indenizar a vítima. 

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RESPONSABILIDADE DOS MÉDICOS. COAD.

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¹Acadêmica do curso Direito da Instituição de Ensino Superior (IES) da rede Anima Educação. Artigo apresentado como requisito parcial para a conclusão do curso de Graduação em Direito da Instituição de Ensino Superior (IES) da rede Anima Educação. 2023. Orientador: Prof.Laise Cardoso.