REPERCUSSÕES DA PRÁTICA DO LIAN GONG EM 18 TERAPIAS: UMA REVISÃO INTEGRATIVA DA LITERATURA

REPERCUSSIONS OF LIAN GONG PRACTICE ON 18 THERAPIES: AN INTEGRATIVE LITERATURE REVIEW

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8303299


¹Alice Jardânia Pereira Mota
²Camila do Amaral Ficagna
³Dhovana da Silva Ceolin
4Tiago Veloso Neves


RESUMO

Este artigo traz considerações acerca da Lian Gong em 18 terapias, considerada a prática corporal mais praticada no âmbito das redes públicas de saúde, no Brasil. Trata-se de um método de exercícios terapêuticos criado pelo ortopedista chinês Zhuang Yuan Ming, que os concebeu na intenção de tratar dores musculoesqueléticas e constatou também o seu grande benefício na prevenção destes sintomas. Por meio de um estudo de revisão integrativa de literatura, o presente artigo tem como objetivo identificar os efeitos da aplicação do Lian Gong em 18 Terapias no contexto de promoção à saúde. Para tanto, foram incluídos 15 estudos, os quais mostraram que esse tipo de terapia tradicional chinesa oferece diversos benefícios que corroboram para uma melhor qualidade de vida de seus praticantes. Dentre os efeitos elencados, destacam-se melhora da dor, de aspectos psíquico-emocionais e das relações sociais e familiares, além de redução da busca por atendimento médico e uso de medicamentos.

Palavras–Chave: Lian Gong, Medicina Tradicional Chinesa, Terapias Complementares.

ABSTRACT

This article brings considerations about Lian Gong in 18 therapies, considered the most practiced body practice within the scope of public health networks in Brazil. It is a method of therapeutic exercises created by the Chinese orthopedist Zhuang Yuan Ming, who conceived them with the intention of treating musculoskeletal pain and also found their great benefit in preventing these symptoms. Through an integrative literature review, this article aims to identify the effects of applying Lian Gong in 18 Therapies in the context of health promotion. For that, 15 studies were included, which showed that this type of traditional Chinese therapy offers several benefits that corroborate for a better quality of life for its practitioners. Among the listed effects, there are improvements in pain, psychological-emotional aspects and social and family relationships, as well as a reduction in the search for medical care and use of medication.

Keywords: Lian Gong, Medicine Chinese Traditional, Complementary Therapies.

1. INTRODUÇÃO

No Brasil, as chamadas Práticas Integrativas e Complementares de Saúde (PICS) foram iniciadas com o intuito de prevenção e o tratamento de diversas comorbidades. A iniciativa surgiu da Organização Mundial da Saúde (OMS), no ano de 1978, quando recomendou a implementação das Práticas Complementares e da Medicina Tradicional Chinesa (MTC), no âmbito da Atenção Primária à Saúde (APS), incentivando a criação de políticas e portarias que regulamentassem essas práticas (BRASIL, 2015; KUBA; VATTIMO, 2015).

Nesse contexto, a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) foi institucionalizada em 2006, para contribuir no fortalecimento dos princípios fundamentais do Sistema Único de Saúde (SUS), baseado em um modelo de atenção humanizado e centrado na integralidade do indivíduo. Por meio desta política, o Lian Gong em 18 Terapias (LG18T) surgiu como uma prática corporal inserida na Medicina Tradicional Chinesa (BRASIL, 2015).

O Lian Gong é composto por 54 exercícios, organizado em três séries de 18 exercícios. A primeira parte, denominada Lian Gong Anterior (Lian Gong Qian Shi Ba Fa), previne e trata dores no pescoço, ombros, costas, região lombar, glúteos e membros inferiores. Já a segunda parte, Lian Gong Posterior (Lian Gong Hou Shi Ba Fa), previne dor nas articulações, nos tendões e as disfunções dos órgãos internos. A terceira, Lian Gong Continuação (Lian Gong Shi Ba Fa Xu Ji), atua na debilidade respiratória e cardiovascular (MOREIRA et al., 2013).

Silva e Pásztor (2015) explicam que os exercícios são desenvolvidos na posição em pé e não necessitam de roupas especiais para sua prática, sendo acompanhados de uma música exclusiva para a realização das manobras, devendo ser efetuadas em um ambiente tranquilo, o que facilitará a apreciação da atividade, que tem duração de em média 12 minutos diários.

Os exercícios proporcionam aos praticantes o conhecimento do próprio corpo, através de um processo educativo corporal e da consciência de posturas, sendo de fácil realização: abrir, fechar, expandir e recolher o corpo, o que induz a uma função pulmonar adequada, fortalecer o sistema imunológico, recupera a vitalidade fisiológica, melhorando a função digestiva, ativando a circulação e prevenindo mialgias (MOREIRA et al., 2013; RANDOW et al., 2017)

O Lian Gong foi elaborado em 1974, na cidade de Shangai, na China, pelo médico ortopedista Zhuang Yuan Ming. Os exercícios foram sistematizados a partir da combinação dos conhecimentos adquiridos mediante sua prática clínica somados à movimentos adaptados das artes maciais, ginástica e massagem terapêutica, e técnicas de respiração (LIMA; COUTINHO, 2019). A difusão do Lian Gong se deu de tal maneira no Brasil que se tornou a prática corporal mais praticada no âmbito das Redes Públicas de Saúde (BRASIL, 2015).

Tendo em vista a importância da disseminação de práticas de baixo custo e caráter altamente resolutivo, como o Lian Gong, e considerando a escassez de pesquisas nesta temática, mais estudos acerca desta prática tornam-se imprescindíveis, justificando a relevância deste estudo, o qual tem como objetivo de identificar os efeitos da aplicação do Lian Gong em 18 Terapias no contexto de promoção à saúde, a partir da literatura científica.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

Trata-se de uma revisão integrativa da literatura, de caráter descritivo, realizada através do levantamento bibliográfico, entre os meses de maio e agosto de 2023. O presente estudo foi desenvolvido seguindo as seis fases do processo de construção descritas por Ganong (1987): elaboração da pergunta norteadora, busca na literatura, coleta de dados, análise crítica dos estudos incluídos, discussão dos resultados e apresentação da revisão integrativa.

Partindo dessa perspectiva, a questão norteadora do estudo foi: Quais são os efeitos do Lian Gong em 18 Terapias sobre os seus praticantes, à luz da literatura científica? Para tanto, a busca pelos artigos foi realizada nas bases de dados Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Medical Literature Analysis and Retrieval Sistem online (MEDLINE) e Scientific Eletronic Library (SciELO), por meio da combinação dos Descritores em Ciências da Saúde: “Lian Gong”, “Terapias Complementares”, “Terapia por exercícios” e “Medicina Tradicional Chinesa”, por meio dos operadores booleanos AND, OR e NOT.

Os critérios de inclusão definidos foram: idioma português ou inglês, disponibilidade do conteúdo com texto integral e de acesso gratuito, e ainda a data de publicação entre 2001 a 2023. Foram excluídos os artigos não relacionados ao tema, além de trabalhos de conclusão de curso, teses e dissertações. Foi feita a leitura do título e resumo de cada artigo para verificação da temática e elegibilidade, sendo removidos os que não responderam à pergunta norteadora.

Para a apresentação dos resultados, os dados dos artigos selecionadas foram distribuídos e organizados considerando ano, autor(es), localidade, país, metodologia aplicada, objetivo e as principais constatações dos estudos, por meio de diagrama de Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA) para revisão integrativa.

A extração dos dados foi norteada por um instrumento validado e adaptado que contempla as informações sobre os autores, ano de publicação, tipo de estudo, objetivo, características metodológicas, principais resultados e considerações dos autores. Após a extração, sucedeu-se para a análise quantitativa dos dados, a síntese destes dados se deu por meio de tabelas na qual enfatizam os principais achados.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram incluídos durante a pesquisa 48 artigos estabelecidos nas bases de dados e, após a identificação, 11 artigos foram excluídos por duplicidade e quatro por não estarem disponíveis na íntegra. Após essa etapa, 33 foram avaliados para elegibilidade, sendo 11 excluídos após a leitura dos títulos e resumos, onde realizou-se a leitura integral de 22 estudos, e sete excluídos por não atenderem a questão norteadora, sendo 15 artigos compondo a amostra final (Figura 1).

Figura1: Fluxograma do processo de seleção dos artigos

Fonte: Adaptado do PRISMA, 2023.

Todos os artigos incluídos foram publicados entre 2008 e 2019, a maioria em língua portuguesa. Os mesmos foram organizados e sintetizados no quadro a seguir, com o intuito oferecer mais informações sobre os estudos selecionados (Quadro 1).

Quadro 1: Síntese geral dos estudos selecionados sobre os benefícios da Lian Gong em 18 Terapias evidenciados na literatura científica.

AUTOR, ANO/ TÍTULOMATERIAL E MÉTODOSOBJETIVOCONSTATAÇÕES DO ESTUDO
LOPES et al., 2019
Impacto do lian gong na qualidade de vida de indivíduos com tontura na atenção primária
Ensaio clínico randomizado-controlado.
Minas Gerais, Brasil.
avaliar os efeitos da prática do Lian Gong como estratégia de reabilitação na APS sobre a qualidade de vida e capacidade funcional de pessoas com tontura.Melhora a qualidade de vida de indivíduos com tontura.
LIMA; COUTINHO, 2019
Avaliação da qualidade de vida, do sono e da flexibilidade em idosos após Lian Gong
Pesquisa de intervenção, prospectiva, analítica, de abordagem quantitativa.
Piauí, Brasil.
Observar se haveria melhora na qualidade de vida, qualidade do sono e na flexibilidade em idosos sedentários que praticariam a técnica de lian gong durante dois meses.Melhora da flexibilidade dos idosos, da qualidade do sono, insônia, stress, cansaço físico, alívio e sensações de falta de ar, e em todos os parâmetros da qualidade de vida desses participantes (físico, psicológico, relações sociais, ambiente e geral).
MANFROI et al., 2019
Pain: the impulse in the search for health by means of integrative and complementary practices
Estudo de abordagem qualitativa.
Santa Catarina, Brasil.
Investigar as relações estabelecidas entre o componente lúdico e o processo de reabilitação, tratamento e promoção da saúde no contexto de um grupo que trata da dor.A prática do Lian Gong diminuiu a necessidade de fisioterapia.
RANDOW et al., 2017
Periferização das práticas integrativas e complementares na atenção primária à saúde: desafios da implantação do lian gong como prática de promoção à saúde
Estudo transversal.
Minas Gerais, Brasil.
Identificar os desafios enfrentados na implantação de programas de Promoção da Saúde, investigando o programa de Lian Gong em 18 Terapias na APS.Redução de pessoas relatando sentir dor intensa, diminuição nos níveis de dor após o início da prática de LG18T, maior redução da dor quanto maior o tempo de prática do exercício, menos procura aos serviços de saúde como consequência da redução da dor e diminuição do uso de medicamentos como analgésicos, antidepressivos e anti-inflamatórios.
BOBBO et al., 2016
Saúde, dor e atividades de vida diária entre idosos praticantes de Lian Gong e sedentários
Estudo de abordagem qualitativa.
São Paulo, Brasil.
Avaliar a presença de dor crônica em idosos atendidos em uma unidade de atenção primária, comparando os praticantes da ginástica chinesa (Lian Gong) e os idosos sedentários.Dificuldade na inserção de práticas como Lian Gong advinda dos próprios gestores dos centros de saúde. Isso está diretamente relacionado com a cultura do assistencialismo.
CORREIA et al., 2016
Uso do Lian Gong na estratégia de saúde da família: tratamento da dor crônica.
Pesquisa-ação, com presença de grupo controle.
Pernambuco, Brasil.
Compreender os benefícios da terapia Lian Gong para o tratamento de dor crônica na Estratégia de Saúde da Família.Melhores resultados em pacientes que fizeram terapia medicamentosa e prática de Lian Gong.
SOUSA; PICANÇO, 2015
Percepção de trabalhadores da saúde em relação à prática corporal chinesa Lian Gong – análise qualitativa
Estudo de abordagem qualitativa.
Tocantins, Brasil.
Identificar as percepções de trabalhadores da Secretaria Municipal da Saúde de Palmas, em relação à qualidade de vida obtida com a prática chinesa Lian Gong.Diminuição do uso de medicamentos e melhoria na qualidade do sono e repouso.
SANTOS et al., 2014
Percepção dos usuários de um centro de saúde acerca de sua participação no grupo de ginástica chinesa – Lian Gong: uma análise compreensiva
Estudo de abordagem qualitativa.
Minas Gerais, Brasil.
Compreender os significados da prática do Lian Gong para participantes do grupo de ginástica terapêutica chinesa.Diminuição da dor e da procura por atendimento médico após o início das atividades, ampliação do convívio social de seus participantes, proporcionando sensação de bem-estar, prazer e felicidade.
et al., 2013
Efeito do Lian Gong Shi Ba Fa na condição dolorosa de trabalhadores de um serviço administrativo
Ensaio clínico analítico.
Bahia, Brasil.
avaliar o efeito do exercício terapêutico chinês Lian Gong Shi Ba Fa na condição dolorosa de trabalhadores de um serviço administrativo.Melhora a condição dolorosa dos trabalhadores.
SILVA et al., 2012
Intervenção nutricional integrada à prática de Lian Gong em usuários hipertensos de uma unidade básica de saúde de Belo Horizonte, Minas Gerais
Estudo de intervenção.
Minas Gerais, Brasil.
Realizar intervenção nutricional integrada à prática de atividade física com usuários hipertensos que praticam Lian Gong em uma Unidade Básica de Saúde.Redução das médias de CC e RCQ entre os participantes, aumento significativo da quantidade consumida de verduras e legumes, diminuição na ingestão de carnes e redução do hábito de substituir o almoço ou o jantar por lanches.
NASCIMENTO et al., 2012
Os efeitos do lian gong em hipertensos assistidos em Unidade de Saúde da Família do município de Parnaíba, Piauí
Estudo qualitativo descritivo.
Piauí, Brasil.
Conhecer os efeitos do Lian Gong em uma população de hipertensos usuários de uma Unidade Saúde da Família.Melhora dos sintomas físicos, dos sintomas psíquico – emocionais (sono, depressão, ansiedade, medo e diminuição do estresse) e das relações sociais e familiares.
ANDRADE et al., 2012
Experiência da inserção do Lian Gong na Estratégia Saúde da Família de Samambaia – Distrito Federal
Estudo quali-quantitativo, prospectivo.
Distrito Federal, Brasil.
Contribuir para a implantação do Lian Gong e avaliar a qualidade de vida de seus praticantes.Melhora a saúde mental, os aspectos emocionais, a percepção de saúde, vitalidade, dor, capacidade funcional, aspectos sociais, qualidade do sono e de aspectos físicos.
KAKIHARA et al., 2011
Lian Gong como forma de melhorar a qualidade de vida de idosos institucionalizados
Abordagem quantitativa comparativa.
São Paulo, Brasil.
Comparar a qualidade de vida dos idosos institucionalizados antes e após a intervenção terapêutica do Lian Gong.Melhora da qualidade de vida de idosos institucionalizados.
SOUZA et al., 2010
Lian Gong: prática corporal chinesa e sua relacã̧o com a qualidade de vida em idosos
Avaliação qualitativa por meio de questionário.
São Paulo, Brasil.
Avaliar a percepção destes usuários sobre a prática do Lian Gong.Melhora do relacionamento social, bem-estar físico e mental dos idosos.
PEREIRA; BARBOSA; BARBOSA, 2008
Exercícios de Lian Gong: estudo de caso de recuperação funcional de tendinopatia do supra-espinhal
Estudo de caso.
São Paulo, Brasil.
Verificar a eficácia do Lian Gong no estudo de caso de inflamação no tendão do músculo supra-espinhoso com diagnóstico clínico e de imagem (Ultrasom).Eficácia no aspecto funcional do método aplicado no tratamento da tendinite de supraespinhoso na paciente em questão.

Fonte: Elaborado pelos autores, 2023.

A população desses estudos variou entre 1 a 1091 participantes, devido as diferentes metodologias aplicadas, incluindo estudos de caso. No entanto, em sua maioria, as variações se mantiveram entre 6 a 73 participantes. A média de idade dos participantes foi de 65,3 anos, e o percentual de mulheres foi 84,4%, enquanto os homens representaram 15,6%.

60% dos artigos relataram, como benefício, melhora de dor após a prática do Lian Gong, 25% constataram melhora de aspectos psíquico-emocionais (medo, ansiedade, estresse, depressão e insônia, por exemplo), da qualidade de vida e de aspectos físicos, 20% apontaram melhora das relações sociais e familiares, 15% evidenciaram diminuição na busca por atendimento médico e descontinuação do uso de medicamentos por seus praticantes (analgésicos, antidepressivos e anti-inflamatórios), além disso, 25% relataram outras vantagens, como mudança de hábitos alimentares, melhoria do padrão respiratório, redução de medidas (circunferência abdominal e relação cintura-quadril) e diminuição dos fatores de risco para doenças cardiovasculares. Em um dos artigos estudados foi demonstrada dificuldade de implementação da prática de Lian Gong na Atenção Primária à Saúde (APS), devido à cultura do assistencialismo.

Em relação ao local das pesquisas, 55% passaram-se na APS e 30% em outros locais como hospitais, igrejas, lar de idosos, instituto de educação superior e outros. Entre os demais não foi relatado local específico da aplicação do estudo.

Já quanto às regiões em que os mesmos aconteceram, a maior parte ocorreu na região sudeste do Brasil, primordialmente no estado de Minas Gerais e São Paulo, o equivalente a 45% dos artigos; na região nordeste passaram-se 25%, nos estados de Piauí, Bahia, Pernambuco e Alagoas; 10% desenvolveram-se no Distrito Federal e ainda 5% na região norte, especialmente no estado do Tocantins e 5% na região sul, no estado de Santa Catarina.

Grande parte desses estudos tratam dos benefícios/vantagens da prática do Lian Gong que foi aplicada em sua maioria na Atenção Primária à Saúde (APS). De modo geral, ao final dos trabalhos, os resultados culminaram para uma melhora dos fatores que contribuem para a qualidade de vida. Dentre esses fatores, destacam-se a melhora da dor e os aspectos psicossociais como a saúde mental e interação social. Assim, também, fatores que influenciam de forma positiva a saúde, considerando a prevenção de doenças e outras morbidades, como a diminuição do uso de medicamentos e mudanças de hábitos de vida. Em suma, reflete-se que essas melhorias e as mudanças de atitude a fim de obter bem-estar/saúde cooperam de forma direta para o próprio sistema de saúde, uma vez que, os praticantes relatam diminuírem as idas à principal porta de entrada do SUS após experimentarem os benefícios dessa prática. Em contrapartida, ainda foi encontrado em um estudo publicado por Randow et al. (2016), a dificuldade de implementação dessa prática devido a cultura assistencialista.

Para facilitar a compreensão dos aspectos mais abordados na literatura, os resultados foram divididos por assunto: dor, aspectos psicossociais e reflexo do Lian Gong na Atenção Primária à Saúde.

Dor

Segundo a Associação Internacional para Estudos da Dor (IASP, 2020), dor é “uma experiência sensitiva e emocional desagradável associada a uma lesão tecidual real ou potencial, ou descrita nos termos de tal lesão”. Além disso, a dor pode ser classificada como aguda e crônica considerando o caráter temporal. A primeira surge de forma súbita e é limitada. Já a segunda, está relacionada a um processo de destruição tecidual com duração maior que 3 meses. Ademais, é uma dor que influencia o estado emocional e vida social do paciente de forma mais intensa, pois o leva a sofrimento por um período maior de tempo (BASTOS, 2007).

Assim sendo, os artigos estudados relacionam a dor e o Lian Gong em diversas particularidades: tipo de dor, causa da dor, relação da dor e o tempo de prática e terapia coadjuvante. De acordo com Bobbo et al. (2016), a dor do tipo crônica na amostra de praticantes obteve melhora em comparação a amostra de sedentários. Em consequência da melhora da dor, Manfroi et al. (2019) relata em seu estudo que os participantes dessa prática diminuíram a necessidade de sessões de fisioterapia, da mesma forma, essa atividade também lhes proporcionou maior autonomia em lidar com sua própria dor.

Consolidando tais afirmativas, quanto a causa da dor, Ming (2001) demonstra através de ensaio clínico melhora de 98,2% das dores em portadores de sintomas musculoesqueléticos, dos quais 1361 pessoas participaram sendo tratadas apenas com Lian Gong. Já Randow et al. (2017), compara o tempo de prática e a presença de dor constatando que daqueles que participavam a mais de 12 meses 66,4% relataram diminuição na dor, contra 50,4% dos que praticavam entre 1 a 3 meses.

O Lian Gong, pode, ainda, entrar como método potencializador de medidas primárias do tratamento da dor como foi evidenciado por Correia et al. (2016), o qual, constatou através do grupo controle (Tratados com terapia farmacológica) e do grupo intervenção (Tratados com terapia farmacológica e com Lian Gong) que o primeiro, ao fim do estudo, apresentava-se com dores leves enquanto o segundo apresentava-se sem dor. Além disso, quanto à interferência da dor em suas vidas, foi observado interferência moderada e leve, respectivamente.

Em conformidade, Ming (2007) demonstra através de estudo realizado em Shangai com 280 praticantes, que das 130 pessoas que apresentavam dores no pescoço, ombros, cintura e pernas, 77 relataram desaparecimento dos sintomas e recuperação total. Já dos 74 que apresentavam dores nas articulações, 36 relataram o desaparecimento dos sintomas. E ainda, das 109 pessoas que apresentavam disfunções dos órgãos internos, problemas do coração, pressão alta e bronquite, 54 relataram desaparecimento dos sintomas e 48, desaparecimento dos sintomas e recuperação total.

Confirmando a influência do Lian Gong, Ming atestou resultados semelhantes abordando as mesmas variáveis, porém, agora em estudo realizado com 182 participantes da Associação de Amizade Japão-China. Por fim, ressalta-se ainda, no primeiro estudo, que 42 praticantes economizaram 55.850,00 rén min bi (moeda chinesa) em remédios (o equivalente a R$ 45.700,00), consolidando a repercussão dessa prática não somente na melhora da dor de seus participantes, mas também na redução do uso de medicamentos e, consequentemente, redução da automedicação, da polifarmácia e dos custos gerados por essas aquisições.

Aspectos/fatores psicossociais

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), é definida como saúde mental o estado de bem-estar no qual o indivíduo é capaz de perceber suas próprias habilidades, consegue lidar com as tensões normais da vida, trabalhar de forma produtiva, bem como contribuir para a sua comunidade. A instituição afirma, ainda, que a saúde mental é essencial para manutenção da integridade individual e coletiva, sendo necessário o controle emocional e interação social (OMS, 2018).

Em vista disso, é fundamental a promoção de atividades que mantenham e restauram a saúde mental. Dentre elas, o Lian Gong tem demonstrado por meio de produções científicas sua contribuição para a preservação da saúde mental.

Entre os artigos analisados, muitos expressaram a melhora de aspectos psicológicos de seus praticantes como a diminuição de medo, da ansiedade, da depressão, do estresse, da insônia e promoveram satisfação, alegria, prazer e entusiasmo, por exemplo. Nascimento et al. (2012), evidenciou através de assistência a indivíduos hipertensos no município de Parnaíba (PI) melhora de 50% dos sintomas psicoemocionais e 30% nas relações sociais e familiares dos participantes.

No estudo de Andrade et al. (2012), também foi constatado melhora da saúde mental e dos aspectos emocionais, bem como, de aspectos sociais, da vitalidade e da qualidade do sono. Dentre os mais significativos, destacam-se aspectos emocionais com uma pontuação de 72,81 antes e 94,81 depois da prática; os aspectos sociais que pontuou 67,27 antes e 95,45 depois da prática; a classificação da saúde que foi de 54,4 para 84,09 e a capacidade funcional que evoluiu de 73,63 para 89,54, por exemplo. Já no trabalho de Lima e Coutinho (2019), foi vista a melhora de todos os parâmetros de qualidade de vida dos idosos, incluindo físicos, psicológicos, relações sociais, ambiente e geral.

Nessa perspectiva, vale lembrar que de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (2019) os indivíduos idosos brasileiros equivalem a 13% da população e esse número só tende a dobrar nos próximos anos. Assim, a inserção dessas práticas influencia de forma positiva na qualidade de vida dos mesmos e até no sistema de saúde, principalmente, quando se considera que é nessa fase que aparecem os resultados dos maus hábitos apregoados no decorrer do tempo. Por isso, é interessante a introdução de medidas que ofereçam resultados em cadeia voltadas para a promoção de saúde, não somente nessa faixa etária, mas também, em pessoas mais jovens, dessa forma, refletindo na melhora do fluxo de atendimento na porta de entrada do SUS.

Reflexo do Lian Gong na Atenção Primária à Saúde

“A dor é um sintoma e uma das causas mais frequentes da procura por auxílio médico” (MISON et al., 2015, p. 45). Nesse sentido, a prática do Lian Gong colabora para reverter essa situação, já que, alguns estudos comprovam a diminuição da procura por atendimento médico pelos participantes desse grupo. Como já discutido anteriormente, os benefícios do Lian Gong vão além da melhora da qualidade de vida do paciente, contribuindo, também, no fluxo de atendimento da Atenção Primária à Saúde (APS).

Randow et al. (2017) certifica que houve menos procura nos serviços de saúde como consequência da redução da dor proporcionada pelo Lian Gong. Nesse estudo, constatou-se um declínio de 78,5% na busca de atendimento médico. Além disso, 49,6% dos participantes afirmaram descontinuar o uso de medicamentos como analgésicos, antidepressivos e anti-inflamatórios, após observarem boa evolução da sua condição. Em conformidade, Santos et al. (2014) também evidencia diminuição da demanda de atendimento em 43% dos praticantes. Da mesma forma que Sousa e Picanço (2015) evidenciaram em sua produção a diminuição do uso de medicamentos para dor pelos integrantes do grupo.

Como visto, o Lian Gong oferece uma resposta em cadeia, uma vez que, ao proporcionar o bem-estar como um todo dos participantes, incide sobre a busca corriqueira e demandas mais comuns da APS. Além disso, é interessante, também, a forma como a prática do Lian Gong desperta outros hábitos que, a princípio, são difíceis de lidar tanto pelo paciente como por aquele que cuida/trata o mesmo. Um exemplo disto, é observado no estudo de Silva et al. (2012) que atestou resultados significativos estatisticamente quanto a redução das médias da circunferência da cintura e da relação cintura-quadril entre os participantes, os quais eram hipertensos. Notou-se, além do mais, mudanças nos hábitos alimentares como aumento da ingestão de legumes, verduras, diminuição da ingesta de carnes e do hábito de substituir as refeições principais por lanche.

Assim, a prática do Lian Gong é um componente forte para atuar junto com outras estratégias da Atenção Primária com o foco de promover e estimular a qualidade de vida dos usuários e, consequentemente, daqueles que se integram aos grupos dessa atividade. Infelizmente, ainda assim, a sua inserção nesse ambiente pode ser dificultada. Isto, foi o que Randow et al. (2016) concluiu em sua pesquisa, a qual, avaliou 6 grupos focais de instrutores, 5 grupos focais de gestores de centros de saúde e 3 grupos de praticantes, ratificando que os gestores e as equipes de saúde ainda têm dificuldade em priorizar as ações de promoção à saúde, em razão da cultura assistencialista ainda ser o foco dos serviços prestados.

4. CONCLUSÃO

Por meio da análise dos artigos selecionados para este estudo podemos concluir que o Lian Gong em 18 terapias oferece diversos benefícios que corroboram para uma melhor qualidade de vida de seus praticantes. Dentre esses benefícios, destacam-se melhora da dor, de aspectos psíquico-emocionais e das relações sociais e familiares, além de redução da busca por atendimento médico e uso de medicamentos.

Mais estudos científicos, como revisões sistemáticas e/ou meta-análises, são necessários para confirmar a relevância clínica dos benefícios do Lian Gong em 18 Terapias e como esta terapia pode ser utilizada em diferentes contextos e abordagens.

5. REFERÊNCIAS

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¹Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos – ITPAC Palmas. E-mail: alice_mota97@hotmail.com.

²Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos – ITPAC Palmas. camila.ficagna@hotmail.com.

³Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos – ITPAC Palmas. dhovanaceolin@icloud.com.

4Docente do Instituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos – ITPAC Palmas. nevestv@gmail.com.