REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.11042046
VASCONCELOS, Maria Eduarda Darigo1
ALBUQUERQUE, Lucas Carvalho Aragão2
DA CUNHA, Marina Pimentel3
DANTAS, Renata Gabriela Santos4
DE ARAÚJO, Priscilla Cristina Assis5
DE FRANÇA, Arthur José Barbosa6
DE SOUZA, Williane Félix Dias7
MENDONÇA, Pedro Gabriell Thorpe Nunes8
PACÍFICO, Fernando Augusto9
FILHO, Gilberto Cunha de Sousa10
RESUMO
O cisto nasolabial é um cisto não odontogênico raro, que acomete tecidos extra ósseos, especialmente na região do sulco nasolabial. Apesar de geralmente ser assintomático, provoca um aumento de volume que se estende do lábio superior até a asa do nariz, podendo evoluir para uma obstrução nasal.
Palavras-chaves: Cisto nasolabial, Cisto maxilar, Cisto não odontogênico.
1. Introdução
O cisto nasolabial (CNL) é um cisto de origem não odontogênica do desenvolvimento, originado dos remanescentes epiteliais do ducto nasolacrimal, correspondente a apenas 0,7% de todos os cistos maxilares que afeta, principalmente, mulheres entre a quarta e a quinta década de vida [1]. Se caracteriza por um edema na região de lábio superior, próximo a asa do nariz, podendo acarretar dor e obstrução nasal. Por se assemelhar a outras patologias orais, o seu diagnóstico deve ser feito através do exame clínico e de exames de imagens complementares, sendo de extrema importância a comprovação histopatológica, pois quando não diagnosticado corretamente, o profissional pode conduzir o tratamento de forma inadequada, causando prejuízos ao paciente [2].
2. Relato de caso (Observação)
Paciente do sexo feminino, 45 anos, sem antecedentes na história médica, encaminhada a um Ambulatório de Cirurgia BucoMaxiloFacial, queixando-se de edema na região do lábio superior próximo a asa do nariz do lado esquerdo com aumento da largura da narina e apagamento do sulco nasolabial ipsilateral, relatando um desconforto estético e tempo de evolução de aproximadamente dois anos (Fig. 1).
Após o exame clínico foi possível constatar que consistia em uma massa, presente no rebordo edêntulo anterior da maxila, de caráter bem definido, flutuante e assintomático, a qual estava recoberta por mucosa oral normal e sem área de drenagem.
A tomografia computadorizada revelou modificação do contorno e espessura do limite anterior e lateral da fossa nasal do lado esquerdo além de concavidade e modificação da forma e espessura do rebordo alveolar na região edêntula do 21 e 22, sendo o CNL a principal hipótese de diagnóstico (Fig. 2 e Fig. 3). A paciente foi submetida a cirurgia de enucleação em bloco cirúrgico sob anestesia local e sedação.
À respeito do momento cirúrgico, foi realizada a enucleação por via intra-oral, com rebatimento de retalho de espessura total na região edêntula do 21 e 22, separando a lesão cística dos tecidos circundantes e expondo-a, deixando visível o consequente defeito ósseo (Fig. 4). A lesão foi armazenada em um recipiente com formol a 10% para posterior envio para o Laboratório de Patologia Oral para realização do exame histopatológico (Fig. 5). Foi feita a síntese da incisão e do retalho e a cirurgia foi finalizada com sucesso (Fig. 6). O resultado do exame histopatológico comprova o diagnóstico de CNL.
Fig. 1. Vista extraoral. Aumento de volume em região anterior da maxila esquerda, promovendo um apagamento do sulco nasolabial e aumento da largura da narina do mesmo lado.
Fig. 2. Corte axial da Tomografia Computadorizada (TC). Lesão hiperdensa em região anterior de maxila esquerda com evidente concavidade na tábua óssea vestibular.
Fig. 3. Corte coronal da Tomografia Computadorizada (TC). Lesão hiperdensa em região anterior de maxila esquerda causando obstrução da cavidade nasal do mesmo lado.
Fig. 4. Vista intra operatória. Massa bem definida e flutuante exposta após a incisão e retalho de espessura total.
Fig. 5. Exeŕese de lesão cística para realização de exame histopatológico.
Fig. 6. Síntese da incisão e retalho.
3. Discussão
Os cistos podem se originar em tecidos moles ou em osso e são definidos como cavidades patológicas revestidas por epitélio e preenchidas por conteúdo fluido ou semi fluido. Os cistos que afetam a região maxilar podem ser classificados em dois grandes grupos: cistos odontogênicos que, histologicamente, apresentam semelhanças com estruturas odontogênicas, e os não-odontogênicos [1,3].
O CNL, primeiramente descrito em 1882, por Zuckerkandl, é um cisto benigno não odontogênico de desenvolvimento, de ocorrência rara (0,7% dos cistos dos ossos gnáticos) que ocorre em tecido mole, entre o lábio superior e o vestíbulo nasal, podendo envolver o osso da região em casos mais avançados [1, 4, 5, 6].
Também chamado de cisto de Klestadt, fissural ou nas vestibular, o CNL apresenta crescimento lento, podendo manifestar-se de forma assintomática, contudo os pacientes geralmente apresentam sintomas característicos como edema bem circunscrito no lábio superior adjacente a asa do nariz, secreção purulenta, capaz de causar obstrução nasal. Apesar de não ser frequente, a dor pode ocorrer nos casos em que há infecção. E, nos casos mais graves, a deformidade alar pode ser encontrada. O seu diâmetro pode variar entre 1 e 5 cm ocorrendo de forma unilateral em aproximadamente 90% dos casos e afetando principalmente pacientes do sexo feminino entre a quarta e quinta década de vida, sendo a proporção de mulheres atingidas de 4:1 [2, 7, 8, 9, 13].
A literatura apresenta diversas teorias quanto a etiopatogenia do CNL, alguns autores acreditam que sua origem se dá através do epitélio remanescente do ducto naso labial, enquanto Klestadt afirmou que este se originava do epitélio remanescente preso entre os processos maxilar, nasal e globular. Porém, a teoria mais aceita foi descrita por Bruggemann em 1920, que propôs que o CNL se desenvolve dos restos epiteliais embrionários da porção ântero-inferior do ducto nasolacrimal, inclusive, o revestimento interno do CNL é semelhante ao do ducto, o qual é formado por um epitélio colunar pseudoestratificado [2, 9, 10,11].
No que tange aos diagnósticos diferenciais, têm-se o abscesso proveniente de uma infecção odontogênica que se estende para o espaço canino, porém o mesmo é descartado a partir dos resultados negativos dos testes de vitalidade pulpar dos dentes mais próximos à lesão; bem como, cistos dentígeros, do ducto nasopalatino e periapicais, os quais são lesões tipicamente ósseas, descartadas durante a visualização dos exames de imagem; entretanto, os cistos epidermóides e o cisto de inclusão epidérmico são semelhantes clinicamente e histopatologicamente com o CNL, sendo necessária uma revisão histopatológica completa do epitélio[4].
À respeito dos tipos de tratamento do CNL, nota-se que há uma grande diversidade de opções, entre eles estão a aspiração com agulha, incisão e drenagem simples, cauterização, injeção de agente esclerosante e cirurgia. Essa última é mais segura devido à sua menor taxa de recidiva quando comparada a outras abordagens terapêuticas. Segundo a literatura, a excisão sublabial foi evidenciada como o tratamento padrão, mas na busca de técnicas menos invasivas, foi proposta a marsupialização endoscópica transnasal, a qual oferece um menor tempo cirúrgico, dor pós operatória, taxa de complicações, taxa de internação, tempo de internação, uso de anestesia geral para a cirurgia e custos médicos, mas não foi observado menor taxa de recorrência [13].
Devido a sua raridade, o cirurgião-dentista pode diagnosticar de maneira inadequada, como uma lesão odontogênica, periodontal ou como um cisto residual o que pode levar a um tratamento inadequado, resultando em prejuízos ao paciente [1, 10, 12].
Conflito de interesses
Nenhum conflito de interesse.
Referências
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1, 3, 4, 7,8 Estudante do curso de Odontologia da Universidade Federal de Pernambuco
5 Cirurgião-Dentista, especialista em Ortodontia, formada pela Universidade Federal de Pernambuco
6, 10 Cirurgião-Dentista, especialista em Cirurgia Bucomaxilofacial
2, 9 Especialista em Morfologia, Mestre e Doutor em Neurociências
10 Professor do curso de Odontologia da Universidade Federal de Pernambuco