PERFIL LIPÍDICO E O RISCO DE DEMÊNCIA EM PACIENTES IDOSOS: UMA REVISÃO DE LITERATURA

LIPID PROFILE AND THE RISK OF DEMENTIA IN ELDERLY PATIENTS: A LITERATURE REVIEW

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10850801


Isabel Moura Almeida1; Davi Abrantes Lucena Messias2; Fabian Chris de Lima Mendonça3; Graziele Gleice da Silva4; Isabelly Sampaio Bezerra5; João Heitor de Oliveira Fernandes6; Manoel Bras Júnior7; Marfran José Cunha Urtiga8; Marina Farias de Paiva9; Valgrícia Matias de Sousa10


Resumo

Introdução: O envelhecimento da população é um fenômeno global que tem ganhado destaque nas discussões socioeconômicas e de saúde pública em todo o mundo, incluindo o Brasil. Com o decorrer do tempo, devido à idade avançada, o ser humano torna-se mais vulnerável às doenças crônicas e aos riscos nutricionais. Nas próximas décadas haverá um aumento espetacular nas doenças relacionadas à idade. Os processos neurodegenerativos e a aterosclerose serão os fenômenos mais prevalentes nessa população. Estudos avaliam a associação entre perfil lipídico e demência e, dentre eles, o colesterol elevado tem sido associado com o aumento do risco para demência.  Objetivo: Avaliar a relação entre o perfil lipídico e o risco de demência em pacientes idosos.  Metodologia: O presente estudo constitui uma revisão integrativa de literatura, tendo sido produzido segundo as diretrizes estabelecidas na declaração PRISMA 2020 (PAGE et al, 2020). O processo de pesquisa foi realizado nas seguintes etapas: definição da pergunta de pesquisa; escolha da fonte de dados; pesquisa na fonte de dados; seleção dos estudos elegíveis; sumarização dos resultados. Definiu-se a plataforma MEDLINE como fonte de dados e informação, de modo que a pesquisa foi realizada neste banco de dados no dia 28 de fevereiro de 2024. Resultados: Sugere-se que níveis elevados de LDL, níveis baixos de HDL, níveis elevados de CETP e a presença de APOE4 podem estar associados a maior incidência de demência. Nesse contexto, alguns polimorfismos de CETP, como o rs5882, tem relação com esse perfil lipídico de risco e, consequentemente, com a incidência de demência e comprometimento cognitivo. Após ajustes multivariados para fatores de risco estabelecidos para demência, participantes com maior consumo de colesterol dietético tiveram um menor risco de demência de todas as causas (HR 0,70; IC 95% 0,57-0,93) e demência de Alzheimer (HR 0,68; IC 95% 0,60-0,88) em comparação com indivíduos com o menor consumo. Conclusão: A análise da literatura revisada permite concluir que há uma possível relação entre o perfil lipídico e o risco de demência em idosos. Nesse sentido, observou-se uma relação direta entre níveis séricos de LDL-C, APOB e a incidência de demência. Além disso, o consumo de colesterol dietético mostrou reduzir o risco de demência por todas as causas em 30%, de maneira estatisticamente significativa

Palavras-chave: colesterol, demência, idosos. 

Abstract 

Introduction: Population aging is a global phenomenon that has gained prominence in socio-economic and public health discussions worldwide, including in Brazil. As time passes, due to advanced age, humans become more vulnerable to chronic diseases and nutritional risks. In the coming decades, there will be a dramatic increase in age-related diseases. Neurodegenerative processes and atherosclerosis will be the most prevalent phenomena in this population. Studies assess the association between lipid profile and dementia, among which high cholesterol has been linked to increased dementia risk. Objective: To evaluate the relationship between lipid profile and dementia risk in elderly patients. Methodology: This study constitutes an integrative literature review, produced according to the guidelines established in the PRISMA 2020 statement (PAGE et al, 2020). The research process was carried out in the following stages: defining the research question; choosing the data source; searching the data source; selecting eligible studies; summarizing the results. The MEDLINE platform was defined as the data and information source, and the search was conducted in this database on February 28, 2024. Results: Elevated levels of LDL, low levels of HDL, high levels of CETP, and the presence of APOE4 are suggested to be associated with a higher incidence of dementia. In this context, certain CETP polymorphisms, such as rs5882, are related to this lipid risk profile and, consequently, to the incidence of dementia and cognitive impairment. After multivariate adjustments for established dementia risk factors, participants with higher dietary cholesterol consumption had a lower risk of dementia from all causes (HR 0.70; 95% CI 0.57-0.93) and Alzheimer’s dementia (HR 0.68; 95% CI 0.60-0.88) compared to individuals with lower consumption. Conclusion: The analysis of the reviewed literature allows concluding that there is a possible relationship between lipid profile and dementia risk in the elderly. In this sense, a direct relationship was observed between serum levels of LDL-C, APOB, and dementia incidence. Additionally, dietary cholesterol consumption was shown to reduce the risk of dementia from all causes by 30%, in a statistically significant manner.

Keywords: cholesterol, dementia, elderly.

1. Introdução

O envelhecimento da população é um fenômeno global que tem ganhado destaque nas discussões socioeconômicas e de saúde pública em todo o mundo, incluindo o Brasil. Neste país, essa mudança demográfica é particularmente marcante, com a população idosa emergindo como o grupo etário de crescimento mais rápido, com aproximadamente 19 milhões de indivíduos com 60 anos ou mais, representando mais de 10% da população brasileira (LEONARDO et al., 2023). 

As projeções apontam que esse contingente atingirá a marca de 32 milhões de idosos até 2025, posicionando o Brasil como o sexto país com o maior número de longevos no mundo. Essa mudança demográfica tem implicações profundas em vários aspectos da sociedade, desde políticas públicas até o sistema de saúde, demandando uma resposta ampla e eficaz para atender às necessidades dessa população crescente e envelhecida (PONTES et al., 2017). 

Com o decorrer do tempo, devido à idade avançada, o ser humano torna-se mais vulnerável às doenças crônicas e aos riscos nutricionais. Com o processo de envelhecimento, dentre as alterações orgânicas, ocorre a perda na capacidade de ingerir, absorver e metabolizar os nutrientes consumidos através da alimentação. Com o envelhecer também podem ocorrer restrições na capacidade cognitiva, sensorial, funcional e distanciamento de uma vida social. Tais condições culminam no desenvolvimento de doenças associadas à idade avançada (MARTINS et al., 2019). 

Nas próximas décadas haverá um aumento espetacular nas doenças relacionadas à idade. Os processos neurodegenerativos e a aterosclerose serão os fenômenos mais prevalentes nessa população. Desta forma, as demências vêm se tornando um sério problema de saúde pública, cujas causas mais frequentes são doença de Alzheimer (DA) e doença cerebrovascular (MELLA et al., 2018).

Com o aumento da expectativa de vida, as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) tornam-se um desafio importante para a saúde pública, principalmente devido à alta morbidade que causam. A demência está entre as DCNT e pode resultar em sérios graus de incapacidade, afetando tanto os hábitos de vida e o bem-estar do indivíduo, quanto a economia do país (SANTOS et al., 2020). Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2012, mais de 35 milhões de pessoas no mundo apresentavam algum grau de demência, e esse número poderá triplicar até 2050, atingindo mais de 115 milhões de pessoas.

A  demência,  é  caracterizada  por  déficits  cognitivos  e  funcionais,  que  interferem  na realização  das  atividades  diárias,  sendo  por  este  motivo,  uma  doença  que  suscita  um  forte impacto  negativo  na  qualidade  de  vida  dos  idosos  portadores,  gerando  uma  progressiva limitação de sua autonomia, afetando simultaneamente a vida do indivíduo e dos responsáveis pelo cuidado (PEDATELLA et al., 2023). 

Estudos avaliam a associação entre perfil lipídico e demência e, dentre eles, o colesterol elevado tem sido associado com o aumento do risco para demência. O colesterol elevado está associado ao desenvolvimento de demência devido à sua contribuição para a aterosclerose, que pode prejudicar o fluxo sanguíneo cerebral, e ao aumento do acúmulo de beta-amiloide, uma proteína ligada à doença de Alzheimer. Além disso, o colesterol afeta a integridade das membranas celulares, interferindo na função cerebral (SOARES et al., 2021). 

Portanto, o presente estudo tem como objetivo avaliar a relação entre o perfil lipídico e o risco de demência em pacientes idosos.  

2. Metodologia

2.1 Protocolo e registro

De início, o presente estudo constitui uma revisão integrativa de literatura, tendo sido produzido segundo as diretrizes estabelecidas na declaração PRISMA 2020 (PAGE et al, 2020). Nesse contexto, o processo de pesquisa foi realizado nas seguintes etapas: definição da pergunta de pesquisa; escolha da fonte de dados; pesquisa na fonte de dados; seleção dos estudos elegíveis; sumarização dos resultados.

2.2 Fonte de dados

Quanto à fonte de dados que seria utilizada para selecionar os artigos pertinentes a esta revisão, definiu-se a plataforma MEDLINE como fonte de dados e informação, de modo que a pesquisa foi realizada neste banco de dados no dia 28 de fevereiro de 2024.

2.3 Pesquisa na base de dados

Quanto à pesquisa na base de dados, utilizou-se as palavras-chave colesterol, idosos e demência, com a restrição de que os artigos tivessem sido publicados nos últimos 10 anos. Além disso, foram excluídos estudos experimentais em animais, artigos incompletos e estudos que não tinham relação com a pergunta de pesquisa após avaliação por texto completo.

Desse modo, a pesquisa, que encontrou 703 artigos, foi realizada da seguinte forma:

Pubmed/MEDLINE: (colesterol) AND (idosos) AND (demência) AND (year_cluster:[2019 TO 2024])

2.4 Critérios de seleção

No processo de seleção, os artigos foram avaliados por título e resumo, o que resultou na exclusão daqueles sem relação com a pergunta de pesquisa. Posteriormente, os artigos restantes foram avaliados por texto completo, de maneira que cada estudo foi analisado por pelo menos dois autores. Nesse contexto, foram excluídos artigos incompletos e estudos com graves conflitos de interesse, de modo que subsistiram ao escrutínio e foram selecionados seis estudos.

2.5 Sumarização dos resultados

Quanto às medidas de sumarização, os seis estudos foram relatados com foco na metodologia, objetivo e resultados, de modo que uma tabela foi criada com informações relevantes acerca dos estudos incluídos nesta revisão.

3. Resultados e Discussão 

Quadro 1: Resultados

Título do ArtigoAno de PublicaçãoObjetivoResultados
Mendelian randomization reveals apolipoprotein B shortens healthspan and possibly increases risk for Alzheimer’s disease2024Avaliar a relação entre apolipoproteina B e a incidência de AlzheimerNíveis mais elevados de APOB aumentam o risco de Alzheimer (estimativa IVW [log odds] = 0,25; IC 95%: 0,13 a 0,37; P = 3,94E-05; MR-Egger [log odds] = 0,26; IC 95%: 0,04 a 0,48; P = 1,25E-02; mediana ponderada [log odds] = 0,27; IC 95%: 0,08 a 0,47; P = 5,15E-03; modo ponderado [log odds] = 0,33; IC 95%: 0,09 a 0,57; P = 8,07E-03).
Elevated serum LDL-C increases the risk of Lewy body dementia: a two-sample mendelian randomization study.2024Avaliar as relações causais de várias medidas de lipídios séricos com o risco de desenvolver demência por corpos de Lewy (LBD)Não foram encontrados efeitos causais nem para triglicerídeos (odds ratio [OR] = 1,149; intervalo de confiança [IC] de 95%, 0,887-1,489; P = 0,293) nem para HDL-C (OR = 0,864; IC 95%, 0,718-1,041; P = 0,124) sobre LBD. No entanto, foi identificada uma relação causal entre LDL-C e LBD (OR = 1,343; IC 95%, 1,094-1,649; P = 0,005), a qual permaneceu significativa (OR = 1,237; IC 95%, 1,015-1,508; P = 0,035) após ajuste para HDL-C e TG no MR multivariado.
Roles of peripheral lipoproteins and cholesteryl ester transfer protein in the vascular contributions to cognitive impairment and dementia.2023Avaliar o papel da proteína de transferência de éster de colesterol (CETP) e das lipoproteínas periféricas nas contribuições vasculares para o comprometimento cognitivo e demência (VCID).Sugere-se que níveis elevados de LDL, níveis baixos de HDL, níveis elevados de CETP e a presença de APOE4 podem estar associados a maior incidência de demência. Nesse contexto, alguns polimorfismos de CETP, como o rs5882, tem relação com esse perfil lipídico de risco e, consequentemente, com a incidência de demência e comprometimento cognitivo.
High Intake of Dietary Cholesterol Decreases the Risk of All-Cause Dementia and AD Dementia: A Results from Framingham Offspring Cohort.2023Avaliar a associação entre o consumo diário de colesterol dietético e a incidência de demênciaUm total de 3249 indivíduos foram incluídos com uma idade média de 54,7 anos (± 9,8). Durante um acompanhamento mediano de 20,2 anos (14,2-24,8), ocorreram um total de 312 eventos de demência incidente, incluindo 211 (67,7%) casos de demência de Alzheimer (DA). Após ajustes multivariados para fatores de risco estabelecidos para demência, participantes com maior consumo de colesterol dietético tiveram um menor risco de demência de todas as causas (HR 0,70; IC 95% 0,57-0,93) e demência de Alzheimer (HR 0,68; IC 95% 0,60-0,88) em comparação com indivíduos com o menor consumo. No entanto, as associações não foram significativas para o grupo com consumo médio de colesterol dietético.
Low- and High-Density Lipoprotein Cholesterol and Dementia Risk Over 17 Years of Follow-up Among Members of a Large Health Care Plan.2023Avaliar a associação entre HDL-C, LDL-C e o risco de demência incidente.Valores mais altos e mais baixos de HDL-C foram associados a um risco elevado de doença de Alzheimer em comparação com o HDL-C no quantil médio. HDL-C no quintil mais baixo foi associado a um HR de 1,07 (IC 95% 1,03-1,11), e HDL-C no quintil mais alto foi associado a um HR de 1,15 (IC 95% 1,11-1,20). LDL-C não foi associado ao risco de demência globalmente, mas o uso de estatinas modificou qualitativamente a associação. LDL-C mais alto foi associado a um risco ligeiramente maior de Alzheimer para usuários de estatinas (53% da amostra, HR por aumento de 10 mg/dL = 1,01, IC 95% 1,01-1,02) e um risco menor para não usuários (HR por aumento de 10 mg/dL = 0,98; IC 95% 0,97-0,99). Houve evidências de modificação do efeito pela idade com HDL-C linear (p = 0,003), mas não com LDL-C (p = 0,59).
Association of Baseline Metabolomic Profiles With Incident Stroke and Dementia and With Imaging Markers of Cerebral Small Vessel Disease.2023Avaliar a associação entre metabólitos e a incidência de doença silenciosa dos pequenos vasos cerebrais, demência e AVCAumento dos lipídios totais em HDL muito grande e aumento do tamanho de partícula de HDL foram associados a um aumento no dano da substância branca (menor anisotropia fracionária OR 1,44, IC 95% 1,07-1,95, e OR 1,19, IC 95% 1,06-1,34, respectivamente; difusividade média OR 1,49, IC 95% 1,11-2,01, e OR 1,24, IC 95% 1,11-1,40, respectivamente) e um aumento no risco de AVC incidente (HR 4,04, IC 95% 2,13-7,64, e HR 1,54, IC 95% 1,20-1,98, respectivamente) e AVC isquêmico (HR 3,12, IC 95% 1,53-6,38; HR 1,37, IC 95% 1,04-1,81). Valina foi associada a uma diminuição na difusividade média (OR 0,51, IC 95% 0,30-0,88) e teve uma associação protetora com demência de todas as causas (HR 0,008, IC 95% 0,002-0,035).

Fonte: autores

3.1 Impacto do LDL-C e HDL-C no risco de demência

Os níveis de colesterol LDL estão sabidamente associados ao risco cardiovascular, especialmente no que diz respeito à formação de placas ateroscleróticas envolvidas na patogênese não só do infarto do miocárdio, mas também do acidente vascular encefálico (AVE). Isso ocorre porque as partículas de LDL podem atravessar o endotélio vascular por um processo chamado transcitose, precipitado ou agravado por um ambiente inflamatório. Nesse contexto, vários outros fatores estão envolvidos na formação, eventual ruptura e trombose dessa placa de ateroma, entre os quais se destacam a resistência insulínica, histórico de tabagismo, doenças inflamatórias e níveis de PCR. No contexto de associação do LDL-C com doenças cardiovasculares, postula-se a hipótese de relação também com os quadros demenciais, na medida em que o dano vascular está presente na fisiopatologia tanto da demência vascular, quanto da doença de Alzheimer. Na demência vascular, uma doença cerebrovascular subjacente produz dano às redes neuronais que suportam a cognição, de modo que o paciente inicia um declínio cognitivo progressivo. Quanto à doença de Alzheimer, sua etiopatogenia ainda não é completamente compreendida, mas postula-se que envolve inicialmente a inflamação vascular, secundária à disfunção endotelial. Em decorrência disso, o cérebro sofre com hipóxia tecidual, neurogênese prejudicada e perda de sinapses. Portanto, estando a fisiopatologia dos quadros demenciais associada à doença vascular, espera-se que o dano endotelial causado pelo LDL-C reflita em maior risco de demência naqueles pacientes com hipercolesterolemia. Na literatura revisada, observou-se que os níveis de LDL-C estavam diretamente relacionados ao risco de demência por corpos de Lewy. Além disso, os níveis de APOB, uma apolipoproteína associada à lipoproteína de baixa densidade, estavam associados à maior incidência de doença de Alzheimer (MARTIN et al, 2024). Nesse sentido, os níveis de triglicerídeos também foram avaliados, mas não houve efeito estatisticamente significativo no risco de demência (LIU et al, 2024).

Em contraste, a relação entre o HDL-C e a incidência de demência permanece incompreendida, na medida em que estudos diferentes mostraram resultados conflitantes. Observou-se tanto redução do risco de demência com o aumento do HDL-C quanto um efeito não linear, caracterizado por maior risco tanto nos percentis de HDL elevado quanto nos percentis de HDL baixo, de modo que a menor incidência de demência foi observada com níveis intermediários de lipoproteína de alta densidade (FERGUSON et al, 2023).

3.2 Consumo de colesterol dietético e o risco de demência

Apesar da associação entre LDL-C e a incidência de demência, observou-se também uma associação inversa entre o consumo de colesterol dietética e o risco de demência. Isso ocorre porque o colesterol da dieta não tem impacto imediato no perfil lipídico, na medida em que existem mecanismos compensatórios que reduzem a absorção e a síntese de colesterol quando do consumo excessivo, além de aumentar a produção de ácidos biliares, mantendo o colesterol LDL inalterado (FERNANDEZ et al, 2022).

Nessa perspectiva, a redução do risco de demência em quase 30% no subgrupo de maior consumo de colesterol em comparação com o subgrupo de menor consumo pode estar relacionada ao aumento do HDL e redução dos triglicerídeos em mulheres, mas não homens, com maior nível de colesterol dietético. Também observou-se uma redução de 32% no risco de Alzheimer no subgrupo de maior consumo de colesterol. Apesar disso, as recomendações nutricionais do último guideline da USDA recomendam limitar o consumo de colesterol ao mínimo possível, o que pode aumentar o risco de demência na população aderente às recomendações segundo a literatura revisada (WANG et al, 2023)

4. Conclusão

A análise da literatura revisada permite concluir que há uma possível relação entre o perfil lipídico e o risco de demência em idosos. Nesse sentido, observou-se uma relação direta entre níveis séricos de LDL-C, APOB e a incidência de demência. Quanto ao HDL-C, dados conflitantes não permitem conclusão, mas merecem melhor investigação, na medida em que enquanto alguns estudos encontraram relação inversa entre HDL-C e o risco de demência, outros estudos revelaram que tanto níveis baixos quanto níveis elevados de HDL-C aumentaram o risco de demência, indicando um efeito possivelmente não linear. 

Além disso, o consumo de colesterol dietético mostrou reduzir o risco de demência por todas as causas em 30%, de maneira estatisticamente significativa. Esse achado não contradiz a relação direta entre LDL-C e o risco de demência, na medida em que o consumo de colesterol dietético não tem relação direta com os níveis séricos de LDL-C. 

5. Referências

FERGUSON, Erin L. et al. Low-and High-Density Lipoprotein Cholesterol and Dementia Risk Over 17 Years of Follow-up Among Members of a Large Health Care Plan. Neurology, v. 101, n. 21, p. e2172-e2184, 2023.

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HARSHFIELD, Eric L.; MARKUS, Hugh S. Association of baseline metabolomic profiles with incident stroke and dementia and with imaging markers of cerebral small vessel disease. Neurology, v. 101, n. 5, p. e489-e501, 2023.

LEONARDO, Jeanne Fonseca; PEREIRA, Virna Lisi Mozer Silva; MIRANDA, Valtair Afonso. POLÍTICAS PÚBLICAS E A PESSOA IDOSA: CONQUISTAS REAIS OU EXPECTATIVAS NÃO ATENDIDAS?. Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação, v. 9, n. 10, p. 601-611, 2023.

LIU, Pengdi et al. Elevated serum LDL-C increases the risk of Lewy body dementia: a two-sample mendelian randomization study. Lipids in Health and Disease, v. 23, n. 1, p. 42, 2024.

MARTIN, Leah et al. Mendelian randomization reveals apolipoprotein B shortens healthspan and possibly increases risk for Alzheimer’s disease. Communications Biology, v. 7, n. 1, p. 230, 2024.

MARTINS, Caroline Machado et al. Deficiência nutricional de micronutrientes em idosos: uma revisão de literatura. 2019.

MELLA, Lucas Francisco Botequio. Queixas cognitivas na prática clínica: organização de um serviço de saúde para prevenção de demência e preditores clínicos de comprometimento cognitivo leve. 2018. Tese de Doutorado. [sn].

PEDATELLA, Marco Túlio Araújo et al. As consequências da demência na qualidade de vida dos pacientes idosos. Brazilian Journal of Health Review, v. 6, n. 5, p. 24911-24914, 2023.

POLIAKOVA, Tetiana; WELLINGTON, Cheryl L. Roles of peripheral lipoproteins and cholesteryl ester transfer protein in the vascular contributions to cognitive impairment and dementia. Molecular Neurodegeneration, v. 18, n. 1, p. 86, 2023.

PONTES, Lécia Alves Soares. Principais demandas e dificuldades do cuidador idoso no Hospital Estadual Dr. Ruy Pereira dos Santos: desafios para o trabalho do assistente social. 2017. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

SANTOS, Camila de Souza dos; BESSA, Thaíssa Araujo de; XAVIER, André Junqueira. Fatores associados à demência em idosos. Ciência & Saúde Coletiva, v. 25, p. 603-611, 2020.

SOARES, Davi Barbosa et al. Relação entre síndrome metabólica e comprometimento cognitivo: uma revisão sistemática. 2021.

WANG, Mingmin et al. High Intake of Dietary Cholesterol Decreases the Risk of All-Cause Dementia and AD Dementia: A Results from Framingham Offspring Cohort. The Journal of Prevention of Alzheimer’s Disease, v. 10, n. 4, p. 748-755, 2023.


1Graduanda em medicina pela AFYA Faculdade de Ciências Médicas da Paraíba. bel.mouraalmeida@gmail.com
2Graduando em medicina pela AFYA Faculdade de Ciências Médicas da Paraíba. davimessiaz77@gmail.com
3Graduando em medicina pela AFYA Faculdade de Ciências Médicas da Paraíba. fabianlima172@gmail.com
4Graduanda em medicina pela AFYA Faculdade de Ciências Médicas da Paraíba. grazielle_gleice@hotmail.com
5Graduanda em medicina pelo Centro Universitário Santa Maria (UNIFSM). Isabellysampaiobezerra@gmail.com
6Graduando em medicina pela AFYA Faculdade de Ciências Médicas da Paraíba. joaoheitorfernandesof@hotmail.com
7Graduando em medicina pela AFYA Faculdade de Ciências Médicas da Paraíba. manoelbrasjunior@hotmail.com
8Graduando em medicina pela AFYA Faculdade de Ciências Médicas da Paraíba. marfranjose@gmail.com
9Graduanda em medicina pela AFYA Faculdade de Ciências Médicas da Paraíba. marinafarias10@hotmail.com
10Graduanda em medicina pelo Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ). valgriciamatias14@gmail.com