REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7484302
Bárbara Helena P. Gargiulo1
João O. Miranda2
Matheus S. Mascarenhas2
William S. R. Rios2
Hugo B. Quirino2
Anamaria M. M. Paniago3
Ana Paula C. Marques4
Resumo
Paracoccidioidomicose (PCM), micose endêmica no Brasil, acomete principalmente homens na faixa etária mais produtiva da vida, gerando alto impacto social e econômico devido ao potencial incapacitante e mortes precoces que ocasionam. A PCM evolui de forma progressiva e na maioria das vezes, acomete o sistema pulmonar causando sequelas que levam ao comprometimento funcional e incapacitação do paciente, dificultando o desempenho de atividades rotineiras e profissionais. Dessa forma, o objetivo deste trabalho é avaliar os impactos das sequelas pulmonares na qualidade de vida (QV) dos pacientes com PCM. Para tal, foram incluídos 25 pacientes com sequelas pulmonares da PCM atendidos no ambulatório de micoses sistêmicas do HU/UFMS. Foram coletados dados epidemiológicos e eles responderam ao questionário do Hospital Saint George para avaliar a QV e o questionário da dispnéia do MRC. Além disso, foram avaliados quanto a percepção da dispnéia de Borg. Todos os pacientes eram homens com idade média de 57,4 anos e a maioria fumantes. Na avaliação da dispneia na escala MRC, 8% deles não conseguem mais sair de casa e 8% precisam parar para descansar após 100m, já na percepção da dispneia de Borg, 20% estavam com falta de ar mesmo em repouso. Apesar desses resultados, quando avaliado a QV a maioria avalia seu estado de saúde como bom ou moderado, contudo 16% avaliam seus dias como ruins, em decorrência do problema respiratório e para 48% a PCM é seu maior problema ou é o responsável por muitos deles. A maioria dos pacientes são obrigados a parar de trabalhar ou devem mudar de profissão, além de terem dificuldades de realizar as atividades rotineiras e de lazer. Pode-se concluir que as sequelas respiratórias da PCM geram impacto negativo na qualidade de vida desses pacientes, causando esforço, frustração por não poder realizar atividades cotidianas e por serem afastados do trabalho, além da necessidade de ajuda constante. Autorização legal: O projeto-mãe “Estudo da evolução clínica da paracoccidioidomicose” foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa da UFMS em 2002 sob o protocolo 2.038.260. O projeto foi renovado com data de finalização em 2019. Palavras-chave: Fibrose pulmonar; micose sistêmica; Paracoccidioides spp. Introdução: A paracoccidioidomicose (PCM), doença de natureza granulomatosa causada pelo fungo do gênero Paracoccidioides é considerada a mais importante micose endêmica da América Latina. Está geograficamente limitada às Américas e representa um sério problema de saúde, por seu potencial incapacitante e número de mortes precoce, acarretando um forte impacto social e econômico (COUTINHO et al, 2002; SHIKANAI-YASUDA et al, 2006). Coutinho et al., (2002) observaram que no período de 1980 a 1995 a PCM ocupava o 8o lugar em casos de mortes dentre as doenças crônicas, infecções recorrentes e parasitárias, sendo o Mato Grosso do Sul o estado com a maior frequência relativa de mortes. No entanto a PCM, ainda é considerada uma das doenças negligenciadas na América Latina, por isso, o impacto sobre a saúde pública ainda não foi quantificado devido a falta de dados disponíveis (HOTEZ et al., 2008). A PCM manifesta-se de duas formas clínicas diferentes: forma aguda-subaguda e a forma crônica (FC) na qual o pulmão é o principal órgão afetado (FRANCO et al., 1987; SHIKANAI-YASUDA et al., 2006). Na FC, os sintomas respiratórios se instalam lentamente, iniciando com tosse discreta, que em seguida evolui para expectoração. A dispneia progressiva é a queixa mais frequente (BRUMMER et al., 1993). Esses sintomas são frequentemente subvalorizados ou atribuídos a outras causas, como o tabagismo que é altamente prevalente entre os portadores da PCM (SANTOS et al., 2003). As lesões pulmonares costumam evoluir para processos fibróticos, desenvolvendo muitas vezes quadro de insuficiência pulmonar crônica com severa restrição da função respiratória (TUDER et al, 1985), a qual interfere de maneira importante na qualidade de vida (QV) do paciente. Além disso, o prejuízo social, psicológico e econômico das sequelas da PCM não tem sido adequadamente avaliado pela comunidade científica e pelas autoridades de saúde. (SANTOS, 2015). Considerando a escassez de estudos e publicações sobre o impacto das sequelas da PCM na QV dos pacientes, o presente trabalho tem como objetivo avaliar os impactos das sequelas na QV dos pacientes com PCM e com isso pretende-se gerar informações que contribuam para a promoção da saúde especialmente de agricultores e indivíduos que vivem em áreas rurais, principais acometidos pela doença.
Metodologia
Estudo epidemiológico, observacional, transversal, com coleta de dados primários que vem sendo desenvolvido no Ambulatório de Micoses Sistêmicas do Hospital Dia Professora Esterina Corsini do Hospital Universitário da UFMS, com pacientes que tiveram diagnóstico de PCM confirmado pelo achado do fungo em amostras clínicas por exame direto ou histopatológico e que evoluíram com sequela pulmonar da doença. Pacientes com histórico de infecções pulmonares prévias ou concomitantes a PCM que possam gerar sequelas pulmonares foram excluídos. Para avaliar a qualidade de vida e a função respiratória foram utilizados, além da coleta de dados clínicos e epidemiológicos, o questionário do Hospital Saint George na doença respiratória (QHSGm) validado para o Brasil, versão modificada (SOUZA et al., 2000; FERRER et al., 2002, CAMELIER et al., 2006), o questionário de dispneia do Medical Research Council (MRC) validado para o Brasil e modificado (KOVELIS et al., 2008) e foram questionados quanto a percepção da dispneia de Borg (BORG, 1982).
Resultados e Discussão
Participaram do trabalho 25 pacientes, todos homens com média de idade de 57,4 anos (DP ± 9,5), com sequelas pulmonares e a maioria deles fumantes. Esses dados são semelhantes ao encontrado na literatura que relata prevalência superior aos 90% de homens com faixa etária dos 30 aos 50 anos de idade e tabagistas (PANIAGO et al., 2003; SANTOS et al., 2003; LOPES NETO et al., 2011). Em relação a escala MRS que avalia o grau de dispneia desses pacientes, 40% deles sofrem com a falta de ar durante exercícios intensos, contudo, 8% ao andar menos de 100 metros ou por alguns minutos quando precisam parar para respirar e ainda 8% não conseguem mais sair de casa por causa da falta de ar. A escala de Borg foi verificada em repouso e 52% dos pacientes não estavam sentindo falta de ar no momento da arguição, por outro lado, 20% deles estavam com falta de ar leve, mesmo estando sentados por algum tempo. Todos os pacientes entrevistados neste estudo possuem sequela pulmonar, tem relação íntima com a QV, uma vez que o processo de envelhecimento, a sintomatologia respiratória e o declínio da função pulmonar tendem a piorar gradativamente (GOMES, 2008). Em relação ao questionário que avalia a QV, apenas 4% dos pacientes avaliam seu estado de saúde como muito bom, 36% avaliam como bom e 44% como moderado. Por outro lado, 12% deles descrevem sua saúde como ruim e 4% muito ruim. Para 16% dos pacientes todos os dias da semana são ruins devido ao seu problema respiratório. Por outro lado, 68% relatam que quase todos os dias ou todos dentro de uma semana habitual são bons. Isso contraria a descrição da doença, pois 16% dos pacientes relatam que a PCM não causa nenhum problema enquanto que para 24% dos pacientes a doença é o seu maior problema e para a mesma proporção dos pacientes a PCM é responsável por muitos problemas. Em relação ao impacto da PCM sobre a vida profissional dos pacientes, 52% deles foram obrigados a parar de trabalhar e 4% deles tiveram que mudar de atividade laboral. Em relação a alguns sintomas da doença, 92% relataram que a tosse não lhes causa dor, por outro lado, 28% relatam que a tosse os cansa, 36% tem falta de ar ao falar, para 28% a tosse perturba o sono e 48% ficam exaustos com facilidade. Quando não conseguem respirar 44% dos pacientes sentem medo e/ou pânico. Para 28% dos pacientes a PCM os debilitou fisicamente fazendo com que necessitem da ajuda de outras pessoas. A maioria deles – 52%, sentem que tudo que fazem é um esforço muito grande. Quando questionados sobre o impacto das sequelas da PCM sobre suas atividades rotineiras, a maioria relata que atividades relativamente simples como tomar banho, vestir-se, realizar as tarefas da casa, subir escadas, caminhar rápido, carregar pesos, subir ladeiras, dançar e praticar esportes são afetados, muitas vezes devem realizá-los de forma mais lenta ou precisam parar para descansar. A sequela respiratória da PCM faz com que 28% dos pacientes sintam-se impedidos de fazer a maioria das coisas que gostam e para 16% a doença os impede de fazer tudo que gostariam. Segundo Almeida (2017), pacientes com fibrose pulmonar apresentam dificuldade ao respirar, obtém um mau prognóstico e consequentemente uma redução da QV, situação semelhante à dos participantes do presente estudo. Conclusões: Pode-se concluir que as sequelas respiratórias da PCM geram impacto negativo na qualidade de vida desses pacientes, causando esforço, frustração por não poder realizar atividades cotidianas e por serem afastados do trabalho, além da necessidade de ajuda constante. Sugerimos o acompanhamento psicológico desses pacientes, pois são homens em idade produtiva que são obrigados a deixar ou mudar de trabalho, e em muitos casos, passam a precisar de ajuda para realizar suas atividades.
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1Estudante de IC da Fac.de Medicina da UFMS
2Estudante voluntário no projeto de IC da Fac. de Medicina da UFMS
3Pesquisadora da Faculdade de Medicina da UFMS
4Pesquisadora do Instituto de Biociências da UFMS/Orientador