PROTEÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DOS TRABALHADORES: O DESCANSO OBRIGATÓRIO DOS MOTORISTAS DE TRANSPORTES DE CARGA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202411101608


Elen de Vito Branco1
Domerito Aparecido da Silva2


Resumo 

Tendo em vista os movimentos jurídico-legislativos, aqui representados pelas Leis n. 13.103/2015 e 13.467/2017, que, na contramão da realidade concreta, concebem a saúde e a jornada de trabalho como categorias apartadas, a pesquisa propõe-se a analisar a relação entre os direitos fundamentais à saúde e à limitação da jornada de trabalho, primeiro a nível abstrato e, depois, sob o recorte das relações de trabalho dos motoristas profissionais de transporte de cargas. Empregam-se abordagem dedutiva e técnicas de pesquisa bibliográfica e documental, por meio de revisão de literatura, análise da legislação e análise jurisprudencial de acórdãos do TST. Toma-se por referencial teórico o direito fundamental ao trabalho, a partir da interdependência material e normativa entre a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho, aponta que o valor a ser tutelado e promovido pela ordem constitucional é o trabalho realizado em condições de dignidade, por meio do exercício dos direitos fundamentais. No caso dos motoristas profissionais de transportes de cargas, visualiza-se que a atual regulamentação da jornada de trabalho da categoria é incompatível com a preservação da saúde do trabalhador, na medida em que o excesso de jornada, consolidado como elemento da organização do trabalho nesse setor econômico. Constatada a insuficiência da remuneração de horas extraordinárias como política jurisdicional regulatória para conter a sistemática violação do direito fundamental à limitação da jornada de trabalho do motorista, defende-se o reforço argumentativo da inseparabilidade e da indissociabilidade da proteção aos direitos fundamentais à saúde e à limitação da jornada de trabalho.     

Palavras-chave: Direito do Trabalho. Direitos fundamentais. Trabalho digno. Saúde. Motoristas profissionais.  

Abstract 

In view of the legal-legislative movements, represented here by Laws No. 13,103/2015 and 13,467/2017, which, contrary to concrete reality, conceive health and working hours as separate categories, the research proposes to analyze the relationship between the fundamental rights to health and the limitation of working hours, first at an abstract level and, then, under the scope of the employment relationships of professional freight transport drivers. A deductive approach and bibliographic and documentary research techniques are used, through a literature review, analysis of legislation and case law analysis of TST judgments. The fundamental right to work is taken as a theoretical reference, based on the material and normative interdependence between the dignity of the human person and the social value of work, indicating that the value to be protected and promoted by the constitutional order is work performed in conditions of dignity, through the exercise of fundamental rights. In the case of professional freight transport drivers, it is clear that the current regulation of the category’s working hours is incompatible with the preservation of workers’ health, since excessive working hours are consolidated as an element of the organization of work in this economic sector. Given the insufficiency of overtime pay as a regulatory jurisdictional policy to contain the systematic violation of the fundamental right to limit the drivers’ working hours, we defend the reinforcement of the argument of the inseparability and inseparability of the protection of fundamental rights to health and the limitation of working hours.

Keywords: Labor Law. Fundamental rights. Decent work. Health. Professional drivers.

INTRODUÇÃO 

Como pesquisadora, a escolha desta problemática é atribuída a pessoas do meu ciclo familiar que realizam trabalhos exaustivos como caminhoneiros. Surgiu-se o interesse de discutir este tema não só como interesse pessoal, mas para levantar uma pauta para instituição acadêmica.  

A frequência com que as pessoas buscam renovar e/ou mudar de categoria em suas CNHs (Carteira Nacional de Habilitação) tem sido crescente afim de adquirir uma profissão de motorista de carga e dessa forma tira garantir o sustento da família. Esta pesquisa tem por finalidade investigar quem é este cidadão que busca tirar ou tira do trânsito seu meio de sobrevivência exercendo a profissão de motorista. Quais suas características pessoais como idade, escolaridade, renda familiar, quais seus objetivos e motivações ao escolher esta profissão e, quais suas expectativas pessoais, bem como a compreensão que tem desta área de trabalho considerando as vantagens e desvantagens de tal ocupação. Entretanto, teve a pretensão de traçar um perfil deste indivíduo. O método a ser utilizado consiste na abordagem dedutiva, amparada nas técnicas de pesquisa bibliográfica e documental, por meio de revisão de literatura e análise da legislação. 

O problema é a rotina continuada, a condução de veículos como atividade profissional sobrecarrega a coluna do trabalhador, em razão da manutenção de uma mesma postura durante horas, do levantamento de peso na carga e na descarga do veículo, dos movimentos repetitivos e das torções e inclinações do tronco. Vê-se, portanto, que a exposição do motorista a ruídos e vibrações a as exigências mecânico-posturais da atividade são alguns dos elementos do meio ambiente laboral do motorista profissional que oferecem relevante risco à saúde. 

Além disso, a própria Constituição já alberga a hipótese flexibilizatória do regime de compensação, que, embora pudesse beneficiar o trabalhador em sua modalidade clássica, foi aprofundada por meio de alterações legislativas produzidas na década de 1990, que permitiram 184 a institucionalização do banco de horas anual, o qual promoveu a tendência de anualização e de desvinculação da duração do trabalho em relação aos limites diários. 

Atribuídas aos métodos de pesquisa e abordagem, este presente trabalho se divide em três capítulos, para fundamentar ao leitor os institutos estudados, e posteriormente encontrar a resposta ao problema da existência, ou não, do abuso na dignidade da pessoa humana, da razoabilidade e da proteção ao atribuir o exame toxicológico para os motoristas profissionais diante das longas jornadas de trabalho. No primeiro capítulo irá fundamentar os princípios de proteção ao trabalhador na legislação brasileira, comprovando que tanto princípios constitucionais quanto princípios específicos da legislação trabalhista servem como balizadores diante de novas normas jurídicas. Entre diversos princípios existentes no ordenamento jurídico, far-se-á a exemplificação dos princípios mais relevantes, sendo que um dos mais céleres é o princípio da dignidade humana, sendo considerado o epicentro de todo ordenamento jurídico. 

É claro que existem medidas específicas voltadas à redução desses riscos – a realização de manutenções no veículo com regularidade, a utilização de assento ergonomicamente adequado, a melhoria da infraestrutura das estradas, a realização de alongamentos corporais, para ficar em alguns exemplos. Não se pode desconsiderar, no entanto, que o prolongamento da jornada de trabalho conduz à elevação desses riscos, por aumentar o tempo de exposição aos agentes nocivos.

1 REFERENCIAL TEÓRICO

A questão da jornada de trabalho e dos períodos de descanso dos motoristas de transporte de cargas no Brasil está regulamentada por uma série de normas nacionais e internacionais que visam garantir a proteção desses trabalhadores. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) estabelece normativas específicas a respeito da jornada de trabalho, conforme disposto no art. 235-C, que aborda os motoristas de transporte de cargas. Esta legislação é complementada pela Lei n.º 13.103/2015, conhecida como Lei do Motorista, que estabelece direitos fundamentais em relação à jornada de trabalho e ao descanso para os motoristas profissionais. É essencial discutir como a referida lei se aplica e quais os principais direitos assegurados aos motoristas, visto que sua efetiva implementação é vital para a proteção desse grupo.

Em um contexto mais amplo, a Convenção n.º 153 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) também trata da regulamentação do tempo de trabalho e do descanso dos motoristas, influenciando, portanto, a legislação brasileira. A adoção de diretrizes internacionais, como as orientações apresentadas pela Diretiva 2002/15/EC da União Europeia, embora não diretamente aplicáveis no Brasil, serve como um referencial comparativo que enriquece a discussão sobre a regulamentação e as práticas de trabalho dos motoristas.

Além da legislação, estudos acadêmicos e pesquisas têm sido fundamentais para a compreensão da realidade enfrentada por esses trabalhadores. Cruz (2018) em sua análise sobre a eficácia da Lei n.º 13.103/2015, aponta que, apesar dos avanços na proteção dos direitos dos motoristas, a implementação da lei ainda enfrenta múltiplos desafios, especialmente em relação à fiscalização e ao cumprimento das normas de descanso. Silva (2019) complementa essa análise ao destacar os impactos adversos na saúde dos motoristas decorrentes da sobrecarga de trabalho e da falta de períodos de descanso adequados, evidenciando a urgente necessidade de um rigor maior na aplicação das legislações pertinentes.

Adicionalmente, relatórios de órgãos governamentais, como o publicado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (2020), e estudos da ANTT (2021), fornecem dados empíricos que corroboram as conclusões acadêmicas, revelando as condições de trabalho dos motoristas e as dificuldades de fiscalização do cumprimento da Lei do Motorista.

Em suma, a conjugação da legislação nacional com as normas internacionais e os dados empíricos de estudos acadêmicos e relatórios institucionais forma uma base teórica robusta para a análise do impacto da jornada de trabalho dos motoristas de transporte de cargas. A contínua luta pela eficácia na implementação destas normas é fundamental para garantir a saúde e os direitos desse grupo profissional. 

2 METODOLOGIA             

2.1 Método Indutivo

O método de pesquisa indutivo é uma abordagem fundamental em diversas áreas do conhecimento, desde as ciências sociais até as ciências naturais. Ele se baseia na observação de casos específicos para chegar a conclusões gerais ou teorias. Ao contrário do método dedutivo, que parte de princípios gerais para chegar a conclusões específicas, o método indutivo segue uma trajetória inversa.

A essência do método indutivo reside na coleta de dados empíricos e na análise cuidadosa desses dados para identificar padrões, regularidades ou relações. A partir dessas observações, o pesquisador formula hipóteses ou generalizações que descrevem os fenômenos estudados. Essas hipóteses são então testadas por meio de novas observações ou experimentos, a fim de confirmar ou refutar sua validade.

Uma das principais vantagens do método indutivo é sua capacidade de descobrir novos conhecimentos e insights a partir da análise de casos concretos. Ele permite que o pesquisador explore a complexidade e a diversidade dos fenômenos estudados, levando a descobertas inovadoras e a uma compreensão mais profunda do mundo ao nosso redor.

No entanto, é importante ressaltar que o método indutivo também possui algumas limitações. Por exemplo, as conclusões gerais obtidas por meio desse método podem ser influenciadas pela seleção dos casos observados, pela subjetividade do pesquisador e por outros fatores. Além disso, as hipóteses formuladas pelo método indutivo não são necessariamente verdadeiras; elas precisam ser testadas e validadas por meio de evidências adicionais.

Em suma, o método de pesquisa indutivo é uma ferramenta poderosa para a descoberta e a geração de conhecimento. Ao observar cuidadosamente o mundo ao nosso redor e analisar os padrões e regularidades presentes nos fenômenos estudados, os pesquisadores podem avançar no entendimento das questões complexas que permeiam a sociedade e a natureza.

2 DO DIREITO DO TRABALHADOR COMO DIMENSÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE COMO TRABALHO DIGNO CONFORME A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

O conceito de direito fundamental só pode ser aferido à luz da ordem constitucional concreta, eis que até mesmo certas categorias universais de fundamentalidade, tais como liberdade, igualdade e vida, podem ser valoradas de forma distinta conforme circunstâncias específicas de cada sociedade. Também há de se ter em mente que a fundamentalidade decorre não só da relevância do bem jurídico tutelado em si mesmo, mas também da importância que lhe é atribuída pelo constituinte, ao ponto de assegurar-lhe regime jurídico distinto.

Entende-se que a fundamentalidade em seus sentidos formal e material. O primeiro sentido associa-se à positivação dos direitos fundamentais como parte integrante da constituição escrita, situando-os no topo da hierarquia das normas e submetendo-lhes a limites reforçados de reforma, verificados no procedimento agravado para emenda e na vedação à abolição de direitos e garantias individuais.

Conforme a fundamentalidade material, reflete esses direitos pois vinculam em decisões fundamentais quanto à estrutura básica do Estado. Essa vinculação atribui a substância constitucional dos direitos fundamentais, o que permite a abertura da Constituição a direitos fundamentais não constantes expressamente do Texto Constitucional.

Nesse sentido, Ingo Sarlet propõe um “conceito aberto” de direitos fundamentais:

Direitos fundamentais, são, portanto, todas aquelas posições jurídicas concernentes às pessoas, que, do ponto de vista do direito constitucional positivo, foram, por seu conteúdo e importância (fundamentalidade em sentido material), integradas ao texto da Constituição e, portanto, retiradas da esfera de disponibilidade dos poderes constituídos (fundamentalidade formal), bem como as que, por seu conteúdo e significado, possam lhes ser equiparados, agregando-se à Constituição material, tendo, ou não, assento na Constituição formal. (SARLET, 2024). 

 Os direitos fundamentais têm dupla dimensão. Na sua dimensão subjetiva, oferecem a possibilidade concreta de o seu titular impor juridicamente seus interesses em face do obrigado. Na sua dimensão objetiva, representam valores estruturais e diretivos do ordenamento jurídico e veiculam um dever geral de proteção pelos órgãos estatais.

São características comuns aos direitos fundamentais a sua inalienabilidade, imprescritibilidade e irrenunciabilidade, atributos que evidenciam a sua posição de destaque no ordenamento jurídico. Também são indivisíveis e interdependentes: um só alcança realização plena quando os demais são preservados.  Têm, ainda, eficácia irradiante, o que significa que orientam a aplicação e a interpretação das normas infraconstitucionais, e eficácia horizontal, ou seja, incidem também sobre as relações entre particulares.

2.1 Proteção Constitucional

Conforme o artigo 7º da Constituição Federal de 1988, é atribuída a proteção dos direitos dos trabalhadores no Brasil, incluindo os motoristas de transporte de carga. Este artigo enumera uma série de direitos que garantem condições dignas de trabalho. 

Inciso I: Relação ao direito ao salário mínimo, capaz de atender às necessidades do trabalhador e de sua família. – Inciso II: Estabelecimento de jornada de trabalho de até 44 horas semanais e, em caso de horas extras, pagamentos adicionais. 

Inciso XXII: Direito ao descanso semanal, preferencialmente aos domingos e feriados. Aplicação para Motoristas de Carga Para os motoristas de transporte de carga, esses direitos são cruciais.

Jornada de Trabalho: Limitação de carga horária e garantia de trabalhadores por horas extras, o que é especialmente relevante devido à natureza das longas jornadas frequentemente utilizadas.   (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988). 

Regula o descanso dos motoristas profissionais, incluindo a obrigação de segurança após determinada jornada de trabalho. A obrigação do exame toxicológico surgiu com a lei 13.103 de 2 de março de 2015, com a finalidade de reeducar a profissão dos motoristas profissionais no Brasil. 

2.2 Resolução Nº 5.232/2016 da Agência Nacional de Transportes Terrestres 

De acordo com a Resolução nº 5.232/2016 da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) estabelece regras sobre o tempo de direção e os períodos de descanso dos motoristas de transporte rodoviário de carga. Essa normativa é fundamental para garantir a segurança nas estradas e a saúde dos motoristas, considerando a natureza das longas jornadas de trabalho que eles enfrentam.  Principais Pontos da Resolução nº 5.232/2016 1. Limitação do Tempo de Direção: A resolução define uma quantidade máxima de horas que um motorista pode dirigir sem pausa, evitando a fadiga.

De acordo com a pesquisa bibliográfica elaborada, e o levantamento de dados através da pesquisa de campo, onde os participantes contribuíram de forma aberta, nota-se que o principal interesse pela mudança de categoria em CNH’s, é melhorar a remuneração e manter-se instável na profissão de motorista, sem pensar que não é apenas a mudança de categoria que irá prevalecer no novo campo para a atuação, e sim um conhecimento mais amplo, do que o trânsito no qual está acostumado a lidar.

 Entretanto, para muitos condutores que atuam em um campo limitado, (zona urbana e zona rural), e decidem mudar de atividade, não tendo o devido conhecimento das diversidades que possam a vir enfrentar no trânsito em âmbito rodoviário, e variedades de comportamento cotidianamente com uma infinidade de personalidades.

2.3 Princípios de Proteção ao Trabalhador na Legislação Brasileira 

Tendo em vista a proteção ao trabalhador no contexto da legislação, será atribuído os princípios constitucionais e trabalhistas mais abordados para o desenvolvimento do tema em tela, além de, discorrer sobre os motoristas profissionais para uma melhor análise dos demais capítulos. 

De acordo com o doutrinador Lenza (2015, p. 1503), “[…] a palavra “princípio”, vem do termo latino principium, traz a ideia de começo, origem, base, ponto de partida […]”. Delgado (2010), ensina que os princípios são de extrema importância para a convivência social, impactando na realidade das pessoas, seja na elaboração de paradigmas de conduta para serem respeitadas na sociedade ou na lapidação de atitudes já praticadas em diversas culturas.  

Estes princípios servem para atribuir ao criador das normas, nortear os julgamentos, suprir pontos omissos na legislação e, conforme descreve Rodriguez (2015, p. 30): […] os princípios gerais de direito não se podem identificar com os princípios próprios de uma disciplina.

 O próprio qualificativo “gerais” indica-nos a nota de amplitude, de compreensão de todos os ramos de extensão e aplicação a todo o direito. Assim, os princípios representam uma verdade universal utilizados para nortear o ser humano, ou seja, aquilo que o ser humano acredita como um dos seus valores mais inegociáveis.  GONÇALVES, 2021). 

No direito do trabalho existem princípios próprios e específicos, e com o objetivo de delimitar a discussão no tema da presente monografia, deve-se passar a análise sobre os princípios que estão presentes em nossa Constituição como garantias de proteção aos trabalhadores e também quanto ao princípio protetor específico do direito do trabalho que diretamente contribuem na discussão ora proposta.  (OLIVEIRA, 2019). 

No caso posto, para resolução dos conflitos, diante de possíveis lacunas ou omissões na legislação, os princípios vão apresentar uma base na resolução das lides, em todos os ramos do direito, incluindo neste contexto, a lei do motorista profissional e a exigência do exame toxicológico. 

2.4 Princípios do Direito do Trabalho 

A Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, em seu artigo 8º dispõe que: As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público (BRASIL, 1943, grifo do autor). 

 Importante observar que os princípios serão utilizados pelos juízes para decidir questões omissas e duvidosas na legislação. Para Nascimento (2013, p. 468) os princípios “[…] são normas jurídicas que atuam no ordenamento como as demais normas e com hierarquia superior […]”. Logo, diante de uma exigência recente e polêmica, os princípios serão muito utilizados na resolução de conflitos trabalhistas. 

O Direito do Trabalho têm como principais princípios:  […] (1) princípio de proteção […]; (2) princípio da irrenunciabilidade dos direitos; (3) princípio da continuidade da relação de emprego; (4) princípio da primazia da realidade; (5) princípio da razoabilidade; (6) princípio da boafé; e (7) princípio de não discriminação (RODRIGUEZ, 2015, p. 61).

Observando os princípios próprios, nada impõe que não sejam utilizados princípios gerais do Direito nos casos concretos. 

3 MOTORISTA PROFISSIONAL 

Este presente capítulo atribui a melhor compreensão das inovações no ordenamento jurídico, que serão discorridas posteriormente, é necessário vincular o conceito de motorista profissional, portanto, é possível identificar quais dos motoristas serão afetados pelas mudanças legislativas. 

 Segundo o Conselho Nacional de Trânsito (2017a), Motorista profissional é: “[…] condutor que exerce atividade remunerada ao veículo”. Ou seja, qualquer motorista que utiliza o veículo para tirar o seu sustento. O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), com base na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), define a atividade do motorista:  Transportam, coletam e entregam cargas em geral; guincham, destombam e removem veículos avariados e prestam socorro mecânico. Movimentam cargas volumosas e pesadas, podem, também, operar equipamentos, realizar inspeções e reparos em veículos, vistoriar cargas, além de verificar documentação de veículos e de cargas. Definem rotas e asseguram a regularidade do transporte. 

As atividades são desenvolvidas em conformidade com normas e procedimentos técnicos e de segurança. De acordo com a classificação se identifica no Código Brasileiro de Ocupações (CBO). Sendo que outras nomenclaturas mais específicas, por título e número no CBO– Resultados de títulos encontrados. (Fonte: Ministério do Trabalho, 2017).

 Na Lei Federal 13.103/15 que regulamenta o exercício da profissão de motorista consta que Motoristas Profissionais são “[…] aqueles motoristas de veículos automotores cuja condução exija formação profissional […]” (BRASIL, 2015a). 

O doutrinador Navarro (1962 apud Nascimento, 2013, p. 227), conceitua e diferencia o motorista profissional do não profissional: […] profissional é a atividade desempenhada de modo ordenado e direcionada a terceiros, com a característica da habitualidade. Por outro lado, não profissional é a atividade dirigida à própria pessoa que a prática, em benefício próprio. 

Para Nascimento (2013, p. 228), “O profissional é o homem que exerce uma profissão. […]”. Assim, pode-se perceber que em qualquer categoria da Carteira Nacional de Habilitação – CNH (Brasil, 1988) existem motoristas profissionais: 

 Categoria A: motofrete e mototáxi, que são aqueles condutores de motocicletas que exercem atividade remunerada entregando mercadorias ou levando passageiros. Esta categoria profissional foi regulamentada através da Lei Federal 12.009 de julho de 2009 (BRASIL, 2009). Segundo o Ministério da Saúde, em 2014, os motociclistas representaram 54% das internações decorrentes de acidentes de trânsito, acarretando ao SUS um gasto de R$ 126,1 milhões, dessa forma, indaga-se o porquê desta categoria não necessita realizar o exame toxicológico (CNT, 2017). 

 Categoria B: taxista, uma classe que foi regulamentada pela Lei Federal 12.468 de agosto de 2011. (BRASIL, 2011). Chofer, Condutor de turistas, motorista de carro forte, motorista vigilante, motorista segurança.

 Categoria C: motoristas de caminhões (caminhoneiros), regulamentado pela Lei Federal 13.103 de março de 2015. (BRASIL, 2015a). 

Categoria D: motoristas de ônibus, profissional também regulamentado pela 13.103/15. (BRASIL, 2015a). Motoristas de ambulâncias.

 Categoria E: motoristas de carreta (carreteiros), profissional também regulamentado pela lei 13.103/15. (BRASIL, 2015a). Contribuindo com este entendimento, Belmonte (2016, p. 24), ensina que motorista profissional: […] é o trabalhador cujo labor consiste, mediante formação profissional e habilitação por meio do Código de Trânsito Brasileiro nas categorias A, B, C, D e E, na condução de veículos automotores para o transporte rodoviário de carga ou passageiros e na realização de verificações e manutenções básicas do veículo para efeito de alimentação de combustível e óleo, pressão de pneus e avaliação da necessidade preventiva de revisões e reparação de avarias. 

Percebemos que em todas as categorias existem motoristas profissionais, assim, para todas as categorias deveriam ser exigidos os exames toxicológicos, porém, a legislação exige apenas paras categorias de habilitação C, D e E. (CONTRAN, 2016).

Cabe destacar que os TRIBUNAIS SUPERIORES DO TRABALHO, viabilizam a atribuição para o empregador o controle de jornada dos empregados para objetivar a fiscalização do controle de jornada, conforme SÚMULA 338, INCISO I DO TST: 

Ementa: MOTORISTA PROFISSIONAL. HORAS EXTRAS. A Lei 12.619 /2012 instituiu a obrigatoriedade de controle de jornada para os motoristas profissionais, com a previsão de métodos de controle pelo empregador, para viabilizar a fiscalização. A partir dessa previsão legal, o empregador está obrigado a comprovar a jornada de trabalho efetivamente desempenhada pelo trabalhador, mediante apresentação dos controles de ponto ou outros documentos equivalentes, tais como relatórios de tacógrafos, sistema de rastreamento por satélite, fichas de viagens e outros. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE CONTROLES DE JORNADA. SÚMULA 338, I, TST. PRESUNÇÃO RELATIVA. Não apresentados os controles de jornada pela empresa, presume-se a veracidade da jornada declinada em exordial, conforme previsto pela Súmula 338 /TST. Trata-se, no entanto, de presunção relativa, admitindo-se prova em contrário. (TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10º REGIÃO: TRT-10: 0000864-06.2017.5.10.0821 DF, RELATOR ANDRÉ R. P. V. DAMASCENO)

         Cabe relembrar, que motoristas profissionais que conduzem motocicletas e carros (como os taxistas e motofretistas), estão dispensados destas exigências pelo CONTRAN. Será que os milhares de motoboys (que ocupam mais da metade dos leitos dos hospitais brasileiros) que trabalham na cidade de São Paulo, e tantas outras espalhadas pelo Brasil não utilizam drogas, e não causam acidentes

CONCLUSÃO 

O presente tem por objeto pesquisar sobre a proteção dos direitos fundamentais dos trabalhadores: o descanso obrigatório dos motoristas de transportes de carga. Para os motoristas profissionais, sob o enfoque dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da razoabilidade e da proteção visando a proteção do trabalhador. Estudou-se também os principais pontos da lei 13.103/15, popularmente conhecida como “Lei do Motorista”, no sentido de interpretar os conflitos existentes com os princípios de proteção ao trabalhador, realizando um apanhado histórico e estatístico sobre as novas exigências.

  Neste sentido, se houver a redução das jornadas exaustivas de trabalho, conforme previsão constitucional, os motoristas não vão recorrer às drogas para manter-se acordados. Assim, os direitos referentes à saúde, lazer, trabalho em condições dignas serão respeitados, evitando danos gravíssimos para essa classe de trabalhadores e todos envolvidos no trânsito. Foi possível demonstrar através do estudo realizado, que mesmo estando a profissão de motoristas profissional regulamentada, diversos trabalhadores continuam conduzindo seus veículos em jornadas diárias intensas sem o devido descanso, tornando-se verdadeiros “sonâmbulos” da direção de seus veículos e de suas vidas.

A presente pesquisa propõe a resolução desta problemática a promover a fiscalização das horas trabalhadas, visto que os tribunais superiores exigem a fiscalização. Diante disso, propõe analisar interesses dos responsáveis a investigar ou inspecionar empresas que não atribuem sua responsabilidade perante o empregado, visto que a Constituição Federal usa princípios basilares da proteção aos empregados, contudo, os legisladores devem respeitar os comandos fundamentais aos trabalhadores, pois isso promove a melhor qualidade de vida e saúde para as pessoas no Estado. 

REFERÊNCIAS

Brasil. Código de Trânsito Brasileiro. Código de Trânsito Brasileiro: instituído pela Lei 9.503, de 23-09-1997 – Brasília: DENATRAN, 2006.

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CONFEDERAÇÃO NACIONAL DO TRANSPORTE. Painel CNT de Consultas Dinâmicas dos Acidentes Rodoviários, 2021. Disponível em: https://www.cnt.org.br/boletins. Acesso em 29.09.2022. 196 

CONFEDERAÇÃO NACIONAL DO TRANSPORTE. Pesquisa CNT perfil dos caminhoneiros 2019. Brasília: CNT, 2019

SARLET, Ingo Wolfgang. Algumas considerações em torno do conteúdo, eficácia e efetividade do direito à saúde na Constituição de 1988. Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE), Salvador, n. 11, set./out./nov. 2007, p. 1-17. Disponível em: https://tinyurl.com/yyqwv2pj. Acesso em 12.02.2022.

SARLET, I Direitos fundamentais: uma abordagem aberta. 2. ed. Porto Alegre. 2024.

TRT – 10: 0000864-06.2017.5.10.0821 DF, RELATOR: ANDRÉ R. P. V. DAMASCENO. DECISÃO 2 DE SETEMBRO DE 2020.


1 Estudante do curso de Direito na FIMCA JARU. E-mail: elenvitobranco@gmail.com
2 Orientador. Professor de Direito na FIMCA JARU. E-mail: domerito@hotmail.com