ANIMAL PROTECTION WITHIN THE CONTEXT OF BRAZILIAN LEGISLATION
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202411101344
Hyandra Kammylly Monjardim Dorigo¹;
Rute Witter Franco²;
Elizabeth Hortêncio de Melo³.
Resumo
Com o passar do tempo tornou-se evidente a modificação da forma em que o ser humano vem tratando os animais, contudo essa relação está longe de ser a forma ideal de trata-los. Para assegurar que os animais e os seres humanos convivam de forma harmônica a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e a agência especializadas da Organização das Nações Unidas (ONU) criaram a Declaração Universal dos Direitos dos Animais, onde visaram defender o direito dos animais a uma vida digna, sem maus-tratos ou exploração. A partir desse momento o Brasil desenvolveu e vem desenvolvendo legislações que se destinam a proteção dos animais, onde reconhece que os animais não só possuem os seus direitos, como também é o dever do ser humano assegurar que os mesmos sejam tratados de forma igualitária, garantindo o acesso a esses direitos e o respeito as suas liberdades. Esse trabalho possui como objetivo proporcionar um histórico referente as leis de proteção animal, com ênfase nos primeiros decretos e o avanço da legislação vigente.
Palavras-chave: Maus tratos. Leis. Direito dos animais. Posse responsável.
Abstract
Over time, changes in the way in which humans have been treating animals have become evident, however this relationship is far from being the ideal way of treating them. To ensure that animals and humans live harmoniously, the United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (UNESCO) and specialized agencies of the United Nations (UN) created the Universal Declaration of Animal Rights, where they aimed to defend the right of animals to a dignified life, without mistreatment or exploitation. From that moment on, Brazil developed and has been developing legislation aimed at protecting animals, which recognizes that animals not only have their rights, but it is also the duty of human beings to ensure that they are treated equally, guaranteeing access to these rights and respect for their freedoms. This work aims to provide a history of animal protection laws, with an emphasis on the first decrees and the advancement of current legislation.
Keywords: Mistreatment. Laws. Animal rights. Responsible ownership
1. INTRODUÇÃO
A relação entre humanos e animais passou por transformações significativas ao longo dos anos, já que anteriormente, cães e gatos desempenhavam papéis práticos, como a caça de ratos, vigilância das residências e na caça. Atualmente, essa dinâmica se transformou, uma vez que esses animais se tornaram principalmente companheiros e são vistos como integrantes da família (Bernard; Demaret, 1996; Ramalhais, 2020).
Eles vêm proporcionando apoio emocional a vários indivíduos, como crianças, idosos e pessoas com distúrbios mentais. Ademais, a presença de animais de estimação aprimora a qualidade de vida, diminuindo a solidão e proporcionando uma maior alegria e conforto em fases de mudança, como aposentadorias ou alterações de ambiente(Bernard; Demaret, 1996; Lewgoy, 2015; Giumelli; Santos, 2016; Aires, 2021).
Com esse desenvolvimento da relação entre o homem e animais, a proteção dos animais de estimação vem se tornando cada vez mais importante na sociedade atual. Podemos dizer que a proteção animal reconhece que os animais não só possuem os seus direitos, como também é dever do ser humano assegurar que os mesmos tenham acesso a esses direitos (Silva; Gonçalves, 2020; Moraes, 2021; Andrade, 2023).
No aspecto normativo, a proteção dos animais tem como base a Declaração Universal dos Direitos dos Animais, que foi proclamada pela UNESCO em 1978, tendo como reconhecimento o valor da vida de todo ser vivo, sua dignidade, respeito e integridade dos animais. Já no Brasil, temos especificamente a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 em seu artigo 225 proibindo atos de crueldade contra os animais (Gomes; Chalfun, 2017).
A partir desse momento, a justiça ampliou as legislações para garantir o bem estar e os direitos dos animais, sendo as mesmas sempre modificadas a favor dos animais, estabelecendo aos tutores penas cominadas a qualquer infração referente aos direitos dos animais (Siqueira; Bastos, 2020).
A realização deste trabalho busca ressaltar e promover uma contextualização a respeito da proteção aos animais, proporcionando um histórico referente às leis de proteção animal, com ênfase nos primeiros decretos e o avanço da legislação vigente no Brasil, visando gerar uma reflexão referente a eficácia dessas legislações atualmente.
2. REVISÃO DE LITERATURA
2.1. Relação homem e animal doméstico
É notório que a relação homem e animal vem se modificando com o decorrer do tempo, no passado, os cães e gatos eram mantidos para desempenharem atribuições práticas, os gatos eram usados para a caça de ratos e os cães serviam para a guarda, caça, rastreio de caça, pastoreio, para puxarem trenós e em alguns países serviam de alimento para a população. Não havia esse elo como encontramos nos dias atuais, pois anteriormente quando esses animais não conseguiam mais desempenhar suas funções pré-estabelecidas eram sacrificados ou abandonados (Bernard; Demaret, 1996; Lewgoy, 2015; Ramalhais, 2020).
Com a evolução dessa relação, não é incomum encontrarmos cães antes usados para caça e pastoreio sendo tratados como animais domésticos comuns, já que atualmente os animais vêm desempenhando menos essas funções práticas e se tornando animais de companhia, sendo por muitas vezes considerados e tratados como membros da família, podendo servir como suporte emocional tanto para idosos, adultos, crianças ou pessoas com ansiedade, depressão, síndrome do pânico (Bernard; Demaret, 1996; Lewgoy, 2015; Giumelli; Santos, 2016; Aires, 2021).
“O que é o homem sem os animais? Se os animais se fossem, o homem morreria de uma grande solidão de espírito. Pois o que ocorre com os animais, breve acontece com o homem. Há uma ligação em tudo”. (Chefe Seattle – da etnia indígena Duwamish, 1855)
É importante ressaltar que os animais de estimação contribuem para a melhoria da qualidade de vida, pois os mesmos ajudam a reduzir a solidão, amenizando o sentimento de perda e mudanças na vida de algumas pessoas, isso resulta em um aumento dos estados de felicidade e conforto nesse período estressante de transição, tais como para alguns idosos a aposentadoria, para algumas crianças e adultos a mudança do ambiente onde vivem ou por motivos mais graves como a perda de um ente querido (Andrade et al., 2018; Ramalhais, 2020; Aires, 2021).
Podemos citar que os principais fatores que explicam esse efeito terapêutico que sentimos quando estamos em contato com os animais, está associado diretamente a necessidade humana do toque e da aceitação, já que com a companhia dos animais a pessoa não se sente julgada pelas suas escolhas, mas sim acolhida, tendo um amor incondicional direcionado a ela, já os mesmos são extremante fieis aos seus tutores, como vemos no dia a dia, sendo retratados em livros, adaptados em filmes e series (Moraes, 2013; Ramalhais, 2020).
“Um cachorro não precisa de carrões, casas grandes ou roupas de marca. Um graveto está ótimo para ele. Um cachorro não se importa se você é rico ou pobre, inteligente ou idiota, esperto ou burro. Dê seu coração para ele, e ele lhe dará o dele.” (Marley e Eu, 2008)
A terapia assistida por animais (TAA) tem se tornado uma aliada de extrema importância como ferramenta terapêutica em pessoas de todas as idades, com o objetivo de proporcionar um suporte, auxiliando o desenvolvimento das condições físicas, sociais, emocionais e cognitivas das pessoas (Giumelli; Santos, 2016; Nascimento et al., 2022).
Outro aspecto que mostra a evolução dessa relação é o acentuado crescimento do setor pet, devido a intensa variedade de produtos e alimentos voltados para a linha pet, bem como as inúmeras possibilidades no mercado de trabalho para os veterinários, e a demanda constante por espaços pet friendly, creches, hotéis, pet shops, adestradores, passeadores de cães e fotógrafo de animais.
De acordo com Moraes (2013), para manter essa convivência de forma saudável, a legislação brasileira regulamentou a guarda e o controle da população de animais, fazendo necessário que os tutores assumam uma postura de responsabilidade sobre o animal, visando sempre garantir que o mesmo tenha acesso as suas liberdades e direitos.
2.2. Bem-estar animal X Direito dos animais
Podemos afirmar que os animais merecem proteção tanto de seus tutores quanto de terceiros, se necessário. Atualmente, o bem-estar animal e os direitos dos animais são tópicos frequentes em discussões, já que muitas pessoas não conseguem diferenciar esses dois conceitos, que apesar de possuírem objetivos semelhantes, possuem significados distintos (Cestari, 2020; Aires, 2021).
O bem-estar animal refere-se ao estado em que o animal encontra-se, o tratamento que o mesmo recebe, como a criação, cuidado e o tratamento humanitário que os mesmos recebem, para isso foi definido as cinco liberdades dos animais (Alves; Muraro, 2014; Siqueira; Bastos, 2020).
O princípio das 5 (cinco) liberdades define que os animais devem:
- Ser livres de medo e estresse;
- Ser livres de fome e sede;
- Ser livres de desconforto;
- Ser livre de dor e doenças;
- Ter liberdade para expressar seu comportamento natural. (FAWC, 1979)
Pode-se dizer que o bem-estar é uma ciência que considera todas as necessidades e sentimentos dos animais, a fim de que sejam preservadas as suas necessidades e a sua qualidade de vida em primeiro plano (Andrade et al., 2018; Siqueira; Bastos, 2020).
Atualmente essas liberdades são cada vez mais conhecidas pelo público geral especialmente no que diz respeito a animais de produção, já que nos mercados podemos encontrar alguns itens com selos de bem-estar animal, como frangos, ovos, carnes e leite, esse selo ressalta o compromisso com a sustentabilidade, com o meio ambiente e principalmente respeito com a vida animal, além de garantir a qualidade dos produtos que serão consumidos, garante também, que todos os processos envolvidos sejam livres do sofrimento animal (Certified Humane Brasil, 2016; Santos et al., 2024).
O direito dos animais vem ganhando mais destaque nos parâmetros das leis brasileiras, que por sua vez defende o reconhecimento de que os animais são sujeitos a direitos fundamentais, englobando regras criadas para assegurar a proteção contra os maus-tratos, além de garantir que todas as espécies domésticas e silvestres tenham uma existência digna (Y Castro, 2006; Paula; Pontes, 2020).
Considerando que todo o animal possui seus direitos, podemos dizer que o respeito dos homens pelos animais está ligado ao respeito dos homens pelo seu semelhante o que leva os humanos a ensinar desde a infância a observar, compreender, respeitar e a amar os animais (ONU, 1978).
Para isso a Declaração Universal dos Direitos dos Animais criada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e pela agência especializada da Organização das Nações Unidas (ONU) em Bruxelas na Bélgica, criada em 1977, mas somente foi proclamada em 27 de janeiro de 1978, estabelece que os animais possuem 10 (dez) direitos que devem ser respeitados e garantidos (ONU, 1978; Cabral; Mascarenhas, 2018).
- Todos os animais têm o mesmo direito à vida;
- Todos os animais têm direito ao respeito e à proteção do homem;
- Nenhum animal deve ser maltratado;
- Todos os animais selvagens têm o direito de viver livres no seu habitat;
- O animal que o homem escolher para companheiro não deve ser nunca ser abandonado;
- Nenhum animal deve ser usado em experiências que lhe causem dor;
- Todo ato que põe em risco a vida de um animal é um crime contra a vida;
- A poluição e a destruição do meio ambiente são consideradas crimes contra os animais;
- Os direitos dos animais devem ser defendidos por lei;
- O homem deve ser educado desde a infância para observar, respeitar e compreender os animais. (ONU, 1978)
Contudo mesmo que esses direitos sejam diferentes, eles procuram garantir as mesmas situações para os animais como garantir que eles sejam cuidados, protegidos e respeitados, ou seja, possuam como objetivo alcançar a harmonia entre homem e animal, para que os mesmos coexistam da melhor forma possível (Y Castro, 2006; Paula; Pontes, 2020; Cestari, 2020).
É importante ensinar a população a respeitar as outras formas de vida e conscientizar sobre a existência dos direitos e das leis que protegem os animais e que respeitá-los é dever de todos. O descumprimento relacionado aos diretos dos animais assim como a privação das suas liberdades são passiveis de punições previstas por lei (Paula; Pontes, 2020).
2.3. Abandono animal
Embora existam leis, mobilizações e organizações de proteção aos animais, o abandono é uma questão que impacta a existência de diversos animais globalmente, pois além de provocar dor física, emocional e violar os direitos fundamentais dos animais, pode acarretar impactos à saúde pública (Alves; Muraro, 2014; Santos, 2022).
O abandono de animais domésticos, não é algo novo, pois essa ação vem ocorrendo de forma gradativa, onde se refere ao ato de deixar os animais sem os devidos cuidados, tanto em locais públicos ou privados, causando sofrimento e muitas vezes condições de vida precárias. Devido ao abandono, muitos animais são levados para abrigos, acarretando muitas vezes uma superlotação e falta de recursos suficientes para mantê-los a salvo e futuramente gerando um grande impacto na saúde pública, devido ao risco de transmissão de zoonoses para os seres humanos (Salles; 2014, Lemos, 2021; Santos 2022).
Os casos de abandono são registrados devido a dificuldades financeiras, mudança de residência, separação dos tutores ou nascimento de filhos, falta de comprometimento por não considerar as futuras responsabilidades para com as necessidades básicas dos animais. Essa situação também pode ocorrer devido a circunstâncias mais severas, como catástrofes naturais e pandemias, onde pode-se citar fatos dos últimos 4 anos como a pandemia de COVID-19 e o impacto das enchentes no Rio Grande do Sul que ocorreu em 2024, onde muitas pessoas perderam seus empregos, residências ou até mesmo suas vidas (Azevedo, 2020; Santos, 2022; Silva, 2023).
Outro aspecto bastante debatido do abandono é a ocorrência de maus-tratos, que afeta milhões de animais globalmente. Maus tratos configura qualquer ação, direta ou indireta, voluntária ou involuntária, que cause dor ou sofrimento desnecessário ao animal, podendo incluir violência física e exploração dos mesmos (CFMV, 2023; Sousa; Weba, 2023; Scariot, 2023).
Infelizmente ainda há um cenário mais obscuro por trás da violência cometida contra os animais. Ao passar dos anos foram constatadas por psicólogos, sociólogos e criminalistas uma ligação direta que os atos de crueldade cometidos contra um animal está ligada diretamente a personalidades criminosas na sociedade. De acordo com o serviço de investigação federal dos Estados Unidos – FBI (“Federal Bureau of Investigation”) em torno de 80% dos “serialkillers” (assassinos em série) começam sua vida de crime torturando e matando animais (ANDA, 2015; Nassaro, 2024).
Combater o abandono e os maus-tratos requer uma abordagem abrangente em diversos setores. A educação da população é uma das principais áreas envolvidas nesse problema, para isso, torna-se fundamental a divulgação sobre as responsabilidades e cuidados para com os animais, a intensificação da fiscalização e das leis de proteção animal, a adoção consciente e a importância dos programas de castração para prevenir a superpopulação desses animais. (Salles, 2014; CFMV, 2023).
2.4. Reconhecimento dos direitos dos animais no decorrer do tempo
No território brasileiro, a primeira legislação de proteção aos animais, a nível federal, foi estabelecida através do Decreto nº 16.590, de 10 de setembro de 1924, que aprova o regulamento das casas de diversões públicas, sendo estes quaisquer locais utilizados para a realização de concertos ou apresentações musicais, onde foi proibido qualquer entretenimento que ocasiona sofrimento aos animais como as corridas de touros e as brigas de galo (Brasil, 1924; Silva; Gonçalves, 2020).
No entanto em 10 de julho de 1934 iniciou-se o verdadeiro movimento legislativo para interrupção de maus-tratos contra animais no Brasil, ao ser publicado o Decreto-Lei nº 24.645, no governo de Getúlio Vargas, resultando em medidas de contravensão penal em caso de desobediência das mesmas (Brasil, 1934; Almeida, 2014; Gomes; Chalfun, 2017; Cestari, 2020; Aires, 2021; Andrade, 2023).
Decreto nº 24.645:
Estabelece medidas de proteção aos animais onde decreta:
Art. 1º – Todos os animais existentes no País são tutelados do Estado.
Art. 2º – Aquele que em lugar público ou privado, aplicar ou fizer maus tratos aos animais, incorrerá em multa de 20$000 (vinte mil-réis) a 500$000 (cinquenta mil-réis) e na pena de prisão celular de 2 a 15 dias, quer o delinquente seja ou não o respectivo proprietário, sem prejuízo da ação civil que possa caber.
§ 1º – A critério da autoridade que verificar a infração da presente Lei, será imposta qualquer das penalidades acima estatutadas, ou ambas.
§ 2º – A pena a aplicar dependerá da gravidade do delito, a juízo da autoridade. § 3º – Os animais serão assistidos em juízo pelos representantes do Ministério Público, seus substitutos legais e pelos membros das Sociedades Protetoras de Animais. (Brasil, 1934)
Com base no que foi descrito anteriormente sobre o abandono, podemos destacar várias legislações vigentes para os casos que se caracterizam dentro desse crime, atribuindo aos infratores uma responsabilidade penal perante a isso.
Para isso a lei federal nº 9.605/98 de 12 de fevereiro de 1998, no artigo 32 estabelece pena de prisão e multa que podem ser aumentadas se o ato resultar na morte do animal (Brasil, 1998).
Artigo 32 da Lei Federal nº 9.605/98:
É considerado crime praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.
§ 1º Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos.
§ 1º-A Quando se tratar de cão ou gato, a pena para as condutas descritas no caput deste artigo será de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, multa e proibição da guarda. (Incluído pela Lei nº 14.064, de 2020)
§ 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal. (Brasil, 1998)
Em 21 de novembro de 2001 a assembleia legislativa do estado do Rio de Janeiro aprovou a lei nº 3.714, onde proíbe em todo o território do estado do Rio de Janeiro espetáculos circenses que tenha como atrativo a exibição de animais de qualquer espécie compreendendo todo ser irracional, quadrúpede ou bípede, doméstico ou selvagem. A criação dessa lei ocorreu mediante debates e situações comprovadas de maus tratos dos animais utilizados em circos, uma vez que eram privados de seus habitats naturais e eram impostos treinamentos severos e, muitas vezes, violentos e torturantes, assim como acidentes decorrentes da falta de segurança nesses espaços, colocando em risca à população e a vida dos animais (Câmara dos deputados, 2001; Bechara, 2010).
Já em 2005 foi sancionado o projeto de lei nº 6.445, onde proíbe a utilização de animais em espetáculos circenses ou de qualquer natureza, bem como a entrada no Brasil de companhia circense ou similar estrangeira, caso tenha animais incluídos em suas apresentações (Câmara dos deputados, 2005).
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º Fica proibida, em todo o território nacional, a apresentação de espetáculo circense ou similar que utilize, ou tenha como atrativo, a exibição de animais de quaisquer espécies, domésticos ou silvestres.
Art. 2º Fica proibido o ingresso no território nacional de companhia circense ou similar estrangeira que tenha animais, domésticos ou silvestres, incluídos em suas apresentações.
Art. 3º Não se aplicarão as proibições previstas nos arts. 1º e 2º quando se tratar de eventos sem fins lucrativos, de natureza científica, educacional, conservacionista ou de proteção aos animais:
Parágrafo único – Para os efeitos deste artigo, os organismos responsáveis pela exibição, apresentação, promoção e organização dos eventos mencionados, também devem ser constituídos como entidades sem fins lucrativos. (Câmara dos deputados, 2005)
Somente em 23 de abril de 2009, o Governo do Estado de Rondônia, sancionou a legislação n° 2.068, onde foi vedada a utilização de animais em apresentações circenses ou similares, além de proibir a entrada no Estado de Rondônia de companhias circenses ou similares estrangeiras, caso incluam animais em suas performances (Governo do Estado de Rondônia, 2009).
Em 2019 entrou em vigor o projeto de lei nº 1.095 que alterou a lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, onde em sua ementa garante aumentar as penas cominadas ao crime de maustratos aos animais quando se tratar de cão ou gato. Onde estabelece pena de reclusão de 2 a 5 anos e proibição de guarda quando praticado ato de abuso, maus-tratos ou mutilação contra cães e gatos. Atualmente temos a sansão federal nº 14.064 aprovada em 2020, onde ampliou que além da reclusão e proibição de guarda entrou em conjunto uma multa que pode variar de acordo com a gravidade do crime cometido (Senado Federal, 2019; Azevedo, 2020; Brasil, 2020).
No ano de 2019, também tivemos o projeto lei da câmara nº 27/2018, que acrescentou um dispositivo à Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, onde dispõe sobre a natureza jurídica dos animais não humanos, proibindo que os animais sejam juridicamente tratados como coisas, criando uma natureza jurídica específica para animais não-humanos. (Senado Federal, 2019).
“Determina que os animais não humanos possuem natureza jurídica sui generis e são sujeitos de direitos despersonificados, dos quais devem gozar e obter tutela jurisdicional em caso de violação, vedado o seu tratamento como coisa”. (Senado Federal, 2019)
O Governo do Estado de Rondônia promulgou a Lei estadual nº 4.656, de 20 de novembro de 2019, que dispõe sobre a obrigatoriedade de pet shops, clínicas veterinárias e hospitais veterinários de informar quando constatarem indícios de maus tratos nos animais por eles atendidos (Governo do Estado de Rondônia, 2019).
Lei estadual nº 4.656, de 20 de novembro de 2019:
Art. 1º. Os pet shops que prestem o serviço de banho e tosa, as clínicas veterinárias, os consultórios veterinários e os hospitais veterinários localizados no Estado de Rondônia ficam obrigados a informar imediatamente ao Núcleo de Proteção aos Animais, instalada na Delegacia Especializada em Repressão aos Crimes Contra o Meio Ambiente (DERCCMA) por meio de ofício físico ou comunicação digital, quando detectarem indícios de maus tratos nos animais atendidos.
Parágrafo único. O ofício de informação ou a comunicação digital dirigida ao Núcleo de Proteção aos Animais, deverá conter as seguintes informações:
I – Qualificação contendo nome, endereço e contato de acompanhante do animal presente no momento do atendimento; II – relatório de atendimento prestado, contendo a espécie, raça e características físicas do animal, descrição de sua situação de saúde na hora do atendimento e os respectivos procedimentos adotados; e III – quando possível, juntar documentos que comprovem a situação, tais como fotos ou vídeos gravados em meio físico ou eletrônico.
(Governo do Estado de Rondônia, 2019)
O uso de animais em experimentos científicos é regulamentado pela Lei Federal nº 11.794/08, conhecida como Lei Arouca, que estabelece limites nos procedimentos realizados com esses animais em estudos científicos, assegurando um mínimo de conforto e higiene nos locais de confinamento e protegendo os animais de possíveis maus tratos (Gomes; Chalfun, 2017; Lemos, 2022).
Além das leis, existem diversos programas, campanhas e projetos de proteção animal promovidos por organizações não governamentais (ONG), onde as mesmas instituem que os adotantes/tutores priorizem a posse/guarda responsável dos animais (Santana; Oliveira, 2006).
A guarda responsável consiste no preceito de que os tutores devem garantir o bem-estar, segurança e a saúde dos animais que estão sob sua tutela, ou seja, pode-se dizer que ter a tutela de um animal é um compromisso que demanda atenção, dedicação e amor. Incluindo fornecer alimentação adequada, abrigo, cuidados veterinários e atenção emocional, garantindo que os mesmos tenham acesso aos seus direitos e as suas liberdades (Santana; Oliveira, 2006; Salles, 2014; Moutinho; Serra; Valente, 2019).
O estado de Rondônia, em 20 de maio de 2021, sancionou a lei n° 4.994 e instituiu a “Campanha Dezembro Verde – Não ao Abandono de Animais no Estado de Rondônia”. Com o objetivo de fortalecer ações educativas e de conscientização quanto ao abandono de animais, de modo a estimular a população a aderir a guarda responsável dos animais de estimação e ampliar o nível de resolução das ações direcionadas ao combate do abandono de animais, previsto pela Lei Federal nº 9.605/98 (Governo do Estado de Rondônia, 2021).
Atos de crueldade, caracterizado como uma forma extrema de violência contra os animais é o crime de zoofilia. A lei nº 1494/2021 tipifica o crime de zoofilia, como o ato de praticar atos libidinosos ou ter relações sexuais com qualquer animal não humano, sob a pena de reclusão de 2 a 6 anos, além de multa e proibição de posse de qualquer espécie animal. Nos casos em que ocorre a morte do animal, a pena é duplicada (Senado Federal, 2021). É importante destacar que as legislações podem diferir conforme a cidade, o estado ou o país, pois cada região possui sua própria competência para elaborar leis de proteção aos animais. Isso pode incluir normas específicas para o gerenciamento de populações de animais, proibição de práticas de crueldade e regulamentação de feiras e transações comerciais envolvendo animais.
3. CONCLUSÃO
A trajetória das legislações de proteção animal, tanto no Brasil quanto em âmbito internacional, salienta um avanço significativo na conscientização e no reconhecimento dos direitos dos animais. Desde as primeiras iniciativas até as legislações atuais, com as leis, sanções e os recentes projetos de lei sobre diversos temas voltados para a proteção da integridade dos animais, podemos dessa forma visualizar um progresso no comprometimento da população com o bem-estar animal.
No entanto, a efetividade dessas leis ainda é um desafio que exige a colaboração de todos. Para que os direitos e liberdades dos animais sejam plenamente respeitados, é imprescindível que cada um assuma a responsabilidade nessa luta, desde a educação de crianças até a conscientização de adultos sobre a importância do cuidado e da denúncia de abandono, abusos e exploração de animais. Ao promovermos um ambiente de respeito e empatia, estamos não apenas garantindo uma vida digna aos animais os deixando livres para expressar seus comportamentos naturais, mas também enriquecendo nossa própria humanidade.
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¹Discente do Curso Superior de Medicina Veterinária do Instituto Federal de Rondônia – Campus Jaru. E-mail: hyandra272@gmail.com
²Docente do Curso Superior de Medicina Veterinária do Instituto Federal de Rondônia – Campus Jaru. Doutora em Ciências Veterinárias (UFMT). E-mail: rute.witter@ifro.edu.br
³Docente do Curso Superior de Medicina Veterinária do Instituto Federal de Rondônia – Campus Jaru. Doutora em Medicina Veterinária (UFRPE). E-mail: elizabeth.melo@ifro.edu.br