REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10031437
Itana Pimenta de Oliveira1
Maria Angela Alves do Nascimento2
PALAVRAS-CHAVE: Processo de trabalho, Cuidar, Gerenciar.
INTRODUÇÃO
A Enfermagem, como participante do processo de trabalho em saúde, na rede básica de saúde é responsável tanto pela prestação de cuidado ao indivíduo sadio ou doente, família ou população para promoção, manutenção, recuperação e reabilitação da saúde, quanto pela gerência de serviços (ALMEIDA; ROCHA, 1997).
Historicamente, o trabalho da enfermagem caracteriza-se no cuidar/assistir, gerenciar/administrar, pesquisar/ensinar, no hospital e na rede básica de saúde. (ALMEIDA; ROCHA, 1997; PERES; CIAMPONE, 2006).
Segundo Peres (2006), a gerência é uma ferramenta/instrumento do processo do “cuidar”, que tem, como o objeto (recursos humanos e organização do serviço) e como finalidade, a obtenção das condições adequadas de assistência e de trabalho, em busca de uma melhor “atenção à saúde”. “(…)gerenciar o cuidado, resulta em mais do que simplesmente organizar o serviço segundo padrões de eficiência, mas acima de tudo, busca também construir sujeitos sociais nesse território singular de prática, tendo em vista que são esses sujeitos que contribuem para a concretização e dão características ao cuidar” (ROSSI; SILVA, 2005, p.8).
Neste sentido, processo gerenciar-cuidar/cuidar-gerenciar compreende um conjunto de competências técnica, política e administrativa para produzir de trabalho produtores de atos cuidadores com o caráter articulador e integrativo. Assim, entendemos que, a articulação gerência- cuidar/cuidado deverá defender a vida do usuário a partir das ações de prevenção, promoção da saúde, controle dos riscos e agravos, no desenvolvimento de ações que permitam a produção de um maior grau de autonomia da relação do usuário no seu modo de estar-no-mundo.
Para tanto, definimos como objetivos neste estudo analisar a [des] articulação entre o cuidar gerenciar no processo de trabalho da(o) enfermeira(o) no PSF de Feira de Santana-BA e identificar os aspectos que facilitam e/ou limitam a articulação do cuidar-gerenciar no trabalho da(o) enfermeira(o) nas Unidades de Saúde da Família.
Por conseguinte, questionamos: como se dá a articulação entre o cuidar e o gerenciar no processo de trabalho da enfermeira no PSF de Feira de Santana-BA?
METODOLOGIA
Trata-se de um estudo exploratório com abordagem qualitativa, que nos permite reconhecer a subjetividade como parte integrante do fenômeno social a partir do aprofundamento da realidade, ao considerar o sujeito do estudo pertencente a determinada condição social, instituído de crenças, valores e significados (TRIVIÑOS, 1987; MINAYO,1996).
O estudo foi realizado em dez (10) Unidades de Saúde da Família (USF), de Feira de Santana, escolhidas aleatoriamente. Os sujeitos da pesquisa foram dez enfermeiras(os) com atuação nas respectivas Unidades de Saúde da Família (USF) de Feira de Santana-BA.
Em função da natureza qualitativa da pesquisa, foi escolhida como técnica de coleta de dados a entrevista do tipo semi-estruturada. Outra técnica utilizada foi a observação, no sentido de complementar os dados da entrevista, do tipo sistemática, aquela que, segundo Marconi e Lakatos (2006), é estruturada, planejada e controlada, tendo como elementos de coleta de dados os fenômenos observados.
Todos os aspectos éticos foram considerados para a realização deste estudo de acordo com as exigências éticas presentes nas Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas Envolvendo Seres Humanos contidas na Resolução do Conselho Nacional de Saúde/MS 196/96 (BRASIL, 1996). Os sujeitos entrevistados foram informados a respeito dos objetivos da pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
O método de análise escolhido para estudar o material pesquisado foi a Análise de Conteúdo e a partir da organização dos dados coletados e da definição dos núcleos de sentidos elaboramos duas categorias de análise: Processo de trabalho da enfermeira no PSF: o gerenciar, o cuidar, o educar e (Des) articulação cuidar X gerenciar nas ações da enfermeira no PSF: facilidades e limites.
RESULTADOS E/OU DISCUSSÃO
O processo de trabalho da enfermeira no PSF deverá ser permeado por uma articulação de atividades essenciais tais como gerência, assistência, pesquisa e educação. Inicialmente dividimos as atividades em gerenciamento de serviços e gerenciamento do cuidado.
A prática gerencial das enfermeiras nas Unidades de Saúde da Família estudadas, possibilitou nos através dos dados coletados no decorrer de seu processo de trabalho, observar as ações gerenciais desenvolvidas na USF, com destaque ao controle de pessoal, realização de reuniões em equipe, administração de recursos materiais, organização, coordenação, supervisão e planejamento (cronograma anual e mensal) para o funcionamento da Unidade de Saúde da Família. Vemos ainda, no cotidiano do trabalho da enfermagem a reprodução dos modelos tradicionais, em que as estruturas hierárquicas de controle, submissão, obediência às normas e padrões são reproduzidas, até porque, as influências das correntes administrativas tradicionais encontram-se fortemente impregnadas nas ações das enfermeiras. Nesta perspectiva, concordamos com Jorge e outros (2007), de que o enfermeiro desempenha atividades rotineiras, em decorrência da sua acomodação a esse modelo tradicional, que o mantém ‘obediente’, ‘submisso’, sofrendo e suportando pressões de toda ordem.
Além disso, percebemos nos depoimentos que a gerência ainda é muito associada às ações burocráticas, caracterizadas no controle de recursos materiais destinados à atividades/ tarefas.
O cotidiano das USF observadas revelou que a enfermeira ainda atua no modelo de gestão taylorista e fordista, à medida que, ao caracterizarem ações gerenciais, elas baseiam-se ainda no controle de atividades, de materiais e de pessoas,
Quanto ao cuidado direto ao usuário da USF, está associado às ações programáticas direcionadas a grupos de controle de patologias como hipertensos, diabéticos, de saúde mental, e outros, além de execução de ações de assistência integral em todas as fases do ciclo de vida: criança, adolescente, mulher, adulto e idoso. Observamos na prática que, no trabalho da enfermeira, a assistência é muitas vezes centrada no ato prescritivo, compondo um modelo que tem na sua natureza, o saber médico hegemônico, produtor de procedimentos. Diante disso, a forma com que a enfermeira desenvolve suas ações assistenciais vem a influenciar na produção de atos cuidadores em saúde.
A maioria das enfermeiras, em seus depoimentos, afirma que consegue articular seu processo de trabalho assistencial e gerencial, porém destacam alguns limites, entre eles, a burocratização excessiva do serviço, o excesso de impressos, o grande tempo gasto para consolidação de dados, o limitando a produção de cuidado. Diante disso, concebemos que, a prática gerencial não deve dificultar o trabalho assistencial, mas sim, facilitar a produção de cuidados deve ser feita de modo ampliado, ou seja, não restrito somente a ações burocráticas e administrativas, possibilitando a formação e as transformações de práticas (REZENDE, 2007).
Além da sobrecarga de trabalho, destacamos aqui o cumprimento quantitativo das ações de saúde, uma meta da Secretaria Municipal de Saúde, o que também limita produção de um trabalho articulado, coeso, focado na qualidade do serviço e na valorização, até porque, quantificar consultas não representa qualidade em serviço.
Apesar de todos os limites atribuídos à articulação da prática gerencial à assistencial, facilidades também foram explicitadas nas falas das enfermeiras, ao revelarem a interação entre a equipe e a contribuição da Secretaria Municipal de Saúde para o desenvolvimento do serviço. O planejamento também aparece como uma ação facilitadora no processo cuidar-gerenciar no PSF.
Para mudança de perspectivas tanto do processo gerenciar, quanto do cuidar, compreendemos que é fundamental que a enfermeira conheça as teorias gerenciais contemporâneas e procure aplicá-las.
O estudo possibilitou a compreensão de como se é instituído o processo de trabalho da enfermeira, em todas as suas dimensões: gerenciar, cuidar e educar, além de como são direcionadas e divididas as suas ações junto a Equipe de Saúde da Família, no Programa Saúde da Família (PSF).
Além disso, o cuidado como uma maneira de se relacionar presente na relação familiar, pode contribuir para a melhoria da gerência dos serviços e gerência do cuidado.
Concluímos que é fundamental que a enfermeira, reconheça que em seu processo de trabalho não deve ocorrer o distanciamento entre as dimensões cuidar/assistir, gerenciar/administrar e educar. Ao articulá-las, torna-se possível enfrentar os limites, a fim de promover mudanças nas práticas individuais e coletivas do agir em saúde no contexto do PSF.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, Maria Cecília Puntel de; ROCHA, Semiramis Melani Melo. O trabalho de enfermagem. São Paulo: Cortez, 1997.
BRASIL, Ministério da Saúde Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Brasília.DF 1996.
JORGE, MSB, FREITAS, CHA, NÓBREGA, MFB, QUEIROZ, MVO. Gerenciamento em Enfermagem: um olhar crítico sobre o conhecimento produzido em periódicos brasileiros (2000-2004). Rev Bras Enferm. V.60, n.1, p. 81-6, jan/fev. 2007. 2007.
MINAYO, Maria Cecilia de Souza. O desafio do conhecimento : pesquisa qualitativa em saúde. 4. ed Rio de Janeiro: Hucitec-Abrasco, 1996. 269 p.
REZENDE, Kátia Terezinha Alves. O processo de Gerência nas Unidades de Saúde da Família: limites e possibilidades em sua construção.Tese , USF, Ribeirão Preto, SP, 2007.
ROSSI, Flávia Raquel; SILVA, Maria Alice Dias da. Fundamentos para processos gerenciais na prática do cuidado. Rev Esc Enferm-USP, v. 39, n.4, p.460-8. 2005.
TRIVIÑOS, Augusto Nibaldo Silva. Introdução a pesquisa em Ciências Sociais : a pesquisa qualitativa em educação: o positivismo, a fenomenologia, o marxismo. São Paulo: Atlas, 1987. 175 p.
1Mestre em Enfermagem, Universidade Estadual de Feira de Santana, e-mail: itana.oliveira1@gmail.com
2Orientadora, Coordenadora do NUPISC, Departamento de Saúde, Universidade Estadual de Feira de Santana,fe-mail: angelauefs@yahoo.com.br