PREVENÇÃO DE GRAVIDEZ EM COMUNIDADES INDÍGENAS DA CIDADE DE MANAUS: PLANO DE INTERVENÇÕES ESTRATÉGICAS ADAPTADAS ÀS REALIDADES LOCAIS

PREGNANCY PREVENTION IN INDIGENOUS COMMUNITIES OF MANAUS: STRATEGIC INTERVENTION PLAN ADAPTED TO LOCAL REALITIES

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202411212113


Beatriz Maquiné de Moura1,
Vanesssa de Souza Fonseca2,
Cynthia de Freitas Santos3,
Siayla Almeida Borges4,
Adriano Dos Santos Oliveira5


RESUMO

A prevenção da gravidez nas comunidades indígenas de Manaus enfrenta desafios significativos devido à combinação de práticas de saúde tradicionais e modernas e à limitação no acesso a serviços de saúde essenciais. Este estudo visa analisar essas complexidades culturais e sociais para desenvolver intervenções adaptadas que respeitem as tradições locais e melhorem a eficácia das estratégias de prevenção. Para tanto, foi realizada uma revisão literária abrangente sobre o tema, através da análise de registro científico e publicações relevantes, fundamentais ao contexto teórico. Os resultados obtidos destacam a complexidade da saúde reprodutiva em comunidades indígenas urbanas e enfatizam a necessidade de uma abordagem integrada que respeite suas particularidades culturais e sociais.

Palavras-chave: Prevenção. Gravidez. Intervenções. Indígenas. Manaus.

Abstract

The prevention of pregnancy in indigenous communities of Manaus faces significant challenges due to the combination of traditional and modern health practices and limited access to essential health services. This study aims to analyze these cultural and social complexities to develop adapted interventions that respect local traditions and improve the effectiveness of prevention strategies. To this end, a comprehensive literature review was conducted on the topic, through the analysis of scientific records and relevant publications, fundamental to the theoretical context. The results highlight the complexity of reproductive health in urban indigenous communities and emphasize the need for an integrated approach that respects their cultural and social particularities.

Keywords: Prevention. Pregnancy. Interventions. Indigenous. Manaus.

1 INTRODUÇÃO

A gravidez não planejada em comunidades indígenas representa um grande desafio para a saúde pública e a integridade cultural. Isso decorre em virtude de diversas barreiras enfrentadas ao acesso à saúde e às diferenças existentes entre os povos tradicionais em áreas urbanas como na cidade de Manaus.

De acordo com o estudo de Calegare (2021), pouco mais da metade da população, autodeclarada indígena no Amazonas, vivem em Manaus. O autor declara que:

No Censo de 2010, dentre as pessoas autodeclaradas indígenas no Brasil, cerca de 52% delas viviam em cidades (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE], 2012). No estado do Amazonas, pouco mais da metade de toda a população reside em Manaus e, compondo este cenário urbano, havia a presença de 3837 indígenas pelo Censo 2010, mas mais de 30 mil indígenas de 34 etnias pelo levantamento da Coordenação dos Povos Indígenas de Manaus e Entorno (COPIME) de 2015 (Ferreira, Calegare, Sampaio, & Clennon, 2019). Eles são oriundos do interior do Amazonas, de outros estados e nascidos nessa capital (CALEGARE, 2021, p. 334).

Nesse contexto, ao abordarmos questões de valores culturais e práticas modernas de saúde nessa população, precisamos ter bastante cuidado e atenção, devido à complexidade do tema. Isso porque, a prevenção da gravidez nas aldeias indígenas também envolve diferentes contextos culturais, sociais, econômicos e até mesmo, geográficos que exige uma atenção cuidadosa a essas questões.

Neste sentido, a pesquisa de Calegare, (2021), nos ajuda a entender e compreender como as características étnicas se mantêm nessas comunidades e destacam a importância de torná-las mais visíveis para sociedade. Isso ajuda a manter sua singularidade em comparação com outros grupos sociais.

Analisar a complexidade dessas questões sobre a sexualidade e a reprodução requer abordagens que respeitem suas particularidades. Sendo assim, é importante que intervenções culturais sejam feitas de forma sensíveis e eficazes, a fim de observar o sentimento de pertencimento, entendendo de que forma essas pessoas se sentem em relação aos espaços urbanos que habitam.

Além disso, o reconhecimento das práticas tradicionais, como a medicina indígena, reflete a importância de integrar os saberes ancestrais com o sistema de saúde vigente. Isso demonstra a necessidade de um modelo de saúde que seja diferenciado e culturalmente respeitoso, para aprimorar o atendimento primário nas comunidades de povos tradicionais (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2024).

Dessa forma, este estudo tem como objetivo compreender as características culturais, sociais e econômicas, em relação a prevenção da gravidez em aldeias indígenas situadas na cidade de Manaus, a fim de desenvolver intervenções estratégicas que ajudem e respeitem a autonomia dessas comunidades. Analisar como as práticas atuais de prevenção à gravidez são utilizadas, observando os problemas e desafios que surgem durante a aplicação das políticas públicas de saúde reprodutiva e elaborar uma proposta de intervenções estratégicas que façam sentido, dentro do contexto sociocultural local, e que realmente sejam eficazes a longo prazo.

O estudo realizou uma análise literária incluindo fontes documentais, artigos científicos, dissertações, teses e outras publicações relevantes ao tema, o que permitiu a análise e o mapeamento das lacunas existentes, além de compreender o contexto sociocultural. A partir de uma abordagem qualitativa, foi possível investigar a aplicação das estratégias de saúde reprodutiva em populações indígenas, permitindo um melhor entendimento dos desafios e da avaliação da elaboração do plano de intervenção estratégico.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA OU REVISÃO DA LITERATURA
2.1 Histórico e Panorama da Saúde Reprodutiva em Comunidades Indígenas

As populações indígenas no Brasil são uma das mais vulneráveis em relação aos cuidados médicos preventivos, incluindo a prevenção de gravidez. Ávila e Alves (2022) descrevem as dificuldades e desafios de se prestar atenção à saúde reprodutiva em grupos indígenas, destacando a importância de uma abordagem culturalmente sensível, que não só reconheça as diferenças, mas também combata as diferenças. O reconhecimento dessa abordagem é essencial para assegurar que a saúde indígena seja compreendida não apenas como um serviço básico, mas como um direito fundamental, com respeito e a valorização das particularidades culturais.

Esse direto, por sua vez, demanda o desenvolvimento de políticas que respeitem e integrem as tradições culturais dessas comunidades. Contudo, apesar desse princípio, o modelo de assistência à saúde indígena no Brasil, encontra desafios significativos no campo da diversidade cultural (ÁVILA e ALVES, 2022). Esses desafios são evidentes na abordagem do bem-estar reprodutivo de mulheres em comunidades indígenas, onde diferentes compreensões de saúde e direitos reprodutivos surgem, levantando questões sobre os cuidados à saúde.

Outro tema central nas discussões sobre políticas de saúde indígena no Brasil é a relação entre os sistemas tradicionais de saúde dos povos originários e o sistema médico ocidental. Historicamente, as comunidades indígenas confiam em seus próprios sistemas tradicionais como a principal fonte de cuidados de saúde (AZEVEDO, 2009). A integração dessas práticas com a medicina moderna enfrenta desafios, exigindo políticas públicas que respeitem e articulem essas tradições para garantir um atendimento eficaz e igualitário.

Além disso, a proteção dos conhecimentos tradicionais indígenas tornou-se um tema central nas agendas nacional e internacional nas últimas décadas, especialmente após a promulgação da Constituição de 1988, que reconhece o valor imaterial dos bens culturais nos artigos 215 e 216 (PIB, 2024), o que reflete o esforço contínuo para garantir que as populações indígenas não sejam privadas de seu patrimônio intelectual. Esses saberes, acumulados ao longo de gerações, abrangem um vasto conjunto de práticas fundamentais para a preservação cultural e a sustentabilidade ambiental.

Sendo assim, o desenvolvimento de mecanismos legais têm sido ferramentas essenciais para a proteção desse patrimônio e a valorização desses bens imateriais.

Para que essa integração seja efetiva, é necessário compreender os conhecimentos tradicionais das comunidades, especialmente no que diz respeito aos cuidados relacionados à saúde das mulheres. Nesse contexto, a pesquisa de Azevedo (p. 466, 2009) releva que as comunidades rio-negrinas possuem conhecimentos e cuidados próprios sobre a saúde das mulheres. As mais velhas, principalmente aquelas com muitos filhos, ainda mantêm e usam esses métodos tradicionais de contracepção. Por outro lado, as mais jovens demonstram um conhecimento mais limitado sobre essas práticas.

Essa divergência reflete os desafios enfrentados por esses povos em relação à saúde reprodutiva. Os estudos apontam que essas comunidades enfrentam grandes desafios que são intensificados por conflitos entre suas práticas medicinais tradicionais e modernas, levando à perda conhecimento ancestral e desinteresse dos mais jovens, especialmente, nas áreas urbanas.

2.2 Análise das Políticas Públicas de Saúde para Povos Indígenas

Desde que o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SASI) foi criado no SUS, houve algumas melhorias, mas ainda persistem diversas dificuldades culturais e estruturais. Segundo a análise realizada por BRASIL. Ministério da Saúde (2018), a falta de sensibilidade cultural representa um obstáculo para a efetividade das intervenções de saúde direcionadas a essas populações.

A criação do SASI/SUS, através da Lei nº 9.836/99, ou a famosa Lei Arouca, foi um passo importante para fechar as lacunas deixadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Antes do SASI/SUS existir, o SUS não conseguia atender bem às necessidades da população indígena que tem características culturais e sociais únicas. Por isso, o subsistema foi desenvolvido para oferecer um atendimento completo e especial à saúde dos povos originários, abrange desde cuidados primários até os mais complexos (BRASIL. Ministério da Saúde, 2018).

Dessa forma, a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI), busca mudar essa visão, reconhecendo a importância da união entre biomedicina e medicina tradicional indígena, ressaltando que a melhoraria da saúde dos povos indígenas não se resume apenas a transferência de conhecimentos biomédicos, mas sim em troca de saberes (BRASIL. Ministério da Saúde, 2018).

Além disso, a qualificação é essencial não apenas para a coleta e análise dos dados, mas também para garantir que realmente sejam utilizados nas instituições de saúde (CUNHA, 2023). Contudo, dentre outros desafios enfrentados, inclui-se a carência de capacitação profissional na área da saúde e as limitações estruturais. Essa perspectiva enfatiza a ausência estrutural e a deficiência da capacidade técnica, pois, sem essa base técnica, as informações geradas podem não ser adequadas ou proveitosas às intervenções específicas das realidades indígenas.

Neste contexto, para garantir a efetividade das políticas de saúde dessa população, é essencial uma estrutura bem desenvolvida que implemente ações integradas no setor da saúde e em outros setores relevante. Como destacado por Cunha (2023):

A saúde indígena requer uma estrutura organizacional capaz de implementar políticas integradas dentro do setor saúde e ações intersetoriais que garantam o direito à saúde e considerem as especificidades étnicas e culturais (CUNHA, 2023, p. 11).

Este aspecto destaca a importância de uma abordagem abrangente que considere não apenas os desafios imediatos da saúde, mas também as especificidades culturais e sociais dessas comunidades.

Essa compreensão é fundamental, já que as estratégias de intervenção precisam ser adaptadas ao contexto local para garantir sua eficácia. Nesse sentido, o programa Mais Médicos tem um papel crucial ao amplia o número de profissionais atuando em território Yanomami, com foco em treinamento contínuo em comunidades indígenas, visando prepará-los para lidar com os desafios específicos dessas regiões (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2024).

Da mesma forma, também, segundo o Ministério da Saúde (2024), como destacado pelo coordenador do Dgaps, Edson Gomes de Lucena, conhecer o dia a dia nas áreas indígenas é fundamental para orientar a elaboração de políticas públicas mais eficazes. Isso permite que os profissionais entendam melhor a dinâmica local e adaptem suas práticas médicas, garantindo uma assistência de saúde mais abrangente e eficaz.

Essa aproximação com as realidades locais também é fortalecida pela formação de indígenas como Agentes Indígenas de Saúde (AIS), que desempenham um papel importante na saúde dentro das comunidades. Esse processo permite que as comunidades indígenas possam adquirir conhecimento sobre a medicina ocidental, sem que isso, substitua suas práticas culturais tradicionais. Dessa forma, a capacitação desses agentes é uma ferramenta para a promoção de um cuidado com saúde, mais inclusivo, respeitoso e eficaz. (FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE, 2002).

2.3 Abordagens Culturais na Saúde Reprodutiva Indígena

No Brasil, as comunidades indígenas possuem uma perspectiva distinta em relação à gestação na juventude e são bem mais acolhedores do que a sociedade em geral.

Em muitas culturas indígenas, a menarca é frequentemente vista como um sinal de que a jovem está pronta para constituir família, conforme destaca Santiago (2017, p. 6) “Para cultura indígena na maior parte do país, a partir do momento que a menina menstrua já está pronta para constituir família”. Desse modo, as abordagens modernas devem considerar as diferenças culturais e como elas podem impactar na eficácia dos programas de saúde.

No contexto da saúde indígena, é essencial observar a vulnerabilidade específica deste grupo, caracterizada pela alta fecundidade e grande mortalidade materna (RMM). Dentro dessa ótica, Garnelo (2019) destaca que:

Para a população indígena, caracterizada como um segmento em situação de maior vulnerabilidade, apresentando alta fecundidade e elevada razão de mortalidade materna (RMM), preconiza-se que a atenção pré-natal seja implementada pelos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI), unidades operacionais do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SASI), vinculadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) (GARNELO, 2019, p. 2).

Assim, a implementação dessas práticas deve ser realizada de maneira cuidadosa, levando em conta as características particulares e culturais dessas comunidades. É necessário, também, assegurar que os serviços de saúde sejam eficientes às demandas dessa população.

No entanto, os serviços de saúde para essas comunidades apresentam desafios significativos. Sidney Garcia, obstetra e ginecologista que coordena o setor de obstetrícia no Hospital Universitário (MS), destaca um cenário preocupante, pois a taxa de gravidez entre adolescentes de comunidades indígenas seja bem maior, do que a população não indígena. Isso faz com que as gestações dessas jovens sejam, muitas das vezes, classificadas como de grande risco ao chegarem no hospital (SANTIAGO, 2017).

Esses desafios são, em parte, reflexo de causas socioculturais que influenciam a fecundidade das mulheres indígenas. Essas Fatores contribuem para a alta taxa de fecundidade, valorização de famílias numerosas e o início precoce da vida reprodutiva (GARNELO, 2019).

Além desses fatores culturais, há também outras dificuldades que aumentam o problema, como a ausência de informações disponíveis sobre saúde sexual, reprodutiva e à falta de programas de planejamento familiar.

Santiago (2017) observa que a falta de orientação, a exposição inadequada com a sociedade externa e aos meios de comunicação, como a televisão e a internet, contribuem, negativamente, para a situação dessa população.

Um exemplo concreto desses desafios é a precocidade na vida sexual entre as meninas da etnia Javaé, que geralmente inicia-se entre os 13 e 14 anos e está profundamente enraizada na cultura local. A menarca ocorre, em média, aos 11,5 anos entre essas jovens, e o uso de métodos contraceptivos é praticamente inexistente, sendo mais comum o uso do preservativo como proteção contra infecções sexualmente transmissíveis. Outras formas de controle de natalidade apenas são procuradas após o terceiro ou quarto filho. Além disso, os casos de sífilis na região aumentaram e continuam aumentando, principalmente entre a população adolescente sendo a mais afetada (SANTIAGO, 2017).

Neste contexto, altos índices de fecundidade e mortalidade entre as mães, associadas à escassez de acesso a informações e serviços de planejamento familiar, destacam a necessidade de intervenções estratégicas. Ademais, problemas como a iniciação sexual precoce e a ausência de métodos contraceptivos demostram a necessidade de uma abordagem adequada às realidades culturais e sociais dessas comunidades.

2.4 Compreensão Política e Cultural na Saúde das Comunidades Indígena de Manaus.
2.4.1 Comunidades Indígenas de Manaus

A cidade de Manaus passou por grandes evoluções de povoamento e urbanização ao longo do tempo, principalmente no começo da metade do século XIX, marcado pelo início do crescimento urbano e a intensificação da presença indígena na cidade de Manaus. Esse aumento da circulação indígena destacou importantes mudanças na demografia da cidade e a necessidade de elaborações de políticas públicas sociais e culturais voltadas para essa população (CALEGARE, 2021).

Neste contexto, Calegare (2021, p.334) argumenta que, na contemporaneidade, as condições de vida dos indígenas em Manaus eram frequentemente comparadas às das populações que residem nas periferias mais afastadas da cidade. Essas localidades eram caracterizadas pela falta de infraestrutura, ausência de serviços básicos e dificuldades de acesso a recursos essenciais. Além disso, a necessidade de adaptação às novas práticas culturais e sociais urbanas foram desafios adicionais a estas comunidades.

Em resposta a essas adversidades, destacou-se um movimento indígena da cidade de Manaus, formado por aldeias urbanas e grupamentos formados por núcleos familiares que migraram ao longo de gerações e se consolidaram em bairros periféricos da região de Manaus, reivindicando melhorias na educação e saúde, adaptadas às necessidades e contextos dessas comunidades (MIRANDA, 2015).

2.4.2 Implementações das Políticas

Diversos esforços e estratégias foram empreendidos através dos movimentos sociais indígenas para melhorar suas condições de vida e garantir seus diretos. Destaca-se a luta pela educação escolar, a formação em saúde, a luta por moradia e a revitalização de cultivos tradicionais. Em Manaus, as diversas frentes se manifestaram de várias formas na tentativa de superar as condições de urbanização precária e os desafios enfrentados na oferta de serviços básicos de saúde (MIRANDA, 2015, p. 41).

2.4.3 Desafios Enfrentados

Nesse contexto de mobilizações e reivindicações, proporcionaram avanços significativos na área da saúde indígena de Manaus, resultante das pressões e conquistas do movimento. Conforme Miranda, a crítica inicial referente à falta de instrumentos específicos para compreender as condições dos indígenas nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) do SUS levou à criação de novos procedimentos para inclusão dessa população (2015, p. 46). Esses avanços foram essenciais para adaptar os serviços de saúde às necessidades dessa comunidade.

Embora a formulação da PNASPI envolva uma abordagem colaborativa, que busca integrar os anseios e necessidades das comunidades indígenas, a realização prática dessas políticas enfrenta sérias barreiras. Segundo Cunha (2023) existem graves lacuna entre a elaboração e a execução da PNASPI, demonstrando a falta de conexão entre o planejamento e a prática. A reavaliação e aprimoramento dessas estratégias de intervenções são de extrema relevância para o real atendimento das necessidades da comunidade.

Nesse sentido, o cuidado integral voltado aos povos indígenas é essencial para o desenvolvimento de ações que envolvam a participação das comunidades locais. Para Cunha (2023), o planejamento participativo é fundamental para estabelecer prioridades e implementar ações de saúde que atendam às necessidades particulares dessas populações.

Esse comprometimento e planejamento colaborativo é essencial quando se considera a importância de estratégias direcionada para grupos específicos. Santiago (2017) enfatiza que a inclusão de diferentes participantes, como profissionais de saúde, familiares e instituições de ensino, é de grande valia para uma abordagem efetiva. Essas ferramentas são apresentadas como opções eficientes para tratar com questões de saúde pública, evidenciando uma abordagem integrada que leve em conta as particularidades dos diversos grupos indígenas.

3 METODOLOGIA

A metodologia aqui adotada visa analisar as práticas atuais referente a prevenção à gravidez em aldeias indígenas na região de Manaus, avaliando a aplicação das políticas públicas de saúde reprodutiva, com o intuito de elaborar e desenvolver um plano de intervenção estratégica adequado à realidade local. Para tanto, inicialmente, foi realizada uma revisão literária abrangente para compreender o estado atual das práticas de prevenção à gravidez e as políticas públicas associada à saúde reprodutiva dos povos originários. Esta etapa se desenvolveu através do levantamento de materiais e fontes documentais como registros científicos, dissertações, teses, artigos e publicações científicas acerca do tema, sobretudo, com foco específico nas comunidades indígena em Manaus. A revisão ajudou a identificar lacunas e fundamentar o contexto teórico da pesquisa.

3.1.  Tipo de Pesquisa

Este estudo adotou uma abordagem qualitativa teórica, que permitiu uma análise e verificação das aplicações práticas das diretrizes de saúde reprodutiva. Foram analisadas diversas comunidades indígenas, inclusive da região de Manaus, visando compreender como as práticas de prevenção à gravidez estavam sendo implementadas e quais os desafios enfrentados.

3.2.  Descrição do Local de Estudo

A pesquisa focou em aldeias indígenas específicas da região de Manaus, com a finalidade de obter informações sobre a realidade dessas comunidades e a eficácia dos programas de saúde reprodutiva, através da utilização de instrumentos como:

  • Entrevista: As entrevistas com os integrantes da comunidade, líderes comunitários e profissionais da saúde devem ser conduzidas para coletar informações e experiências sobre as aplicações práticas de prevenção da gravidez.
  • Observação Participante: A observação direta permitirá uma compreensão aprofundada sobre os desafios e sucessos das práticas de preservação e das interações das políticas com as práticas culturais.
3.3.  Análise de Dados

Os dados coletados deverão ser analisados para identificação de problemas e desafios relacionados à aplicação das políticas de saúde e reprodução indígenas. Dessa forma, a análise deverá ser desmembrada em duas seções:

  • Análise Qualitativa: Os dados qualitativos das entrevistas e das observações deverão ser analisados e interpretados com o intuito de identificar temas e padrões relevantes.
  • Análise Quantitativa: Os dados quantitativos existentes, como taxa de gravidez, eficácia das práticas de prevenção poderá ser utilizados para complementar a análise qualitativa.
3.4.  Proposta de Plano de Intervenção

Com base nas descobertas encontradas na pesquisa, será elaborado um plano de intervenção estratégica, visando atender às necessidades específicas das comunidades indígenas na região de Manaus, levando em consideração as particularidades culturais e sociais identificadas ao longo da pesquisa.

3.5.  Limitações e Desafios metodológicos

As principais barreiras que podem limitar ou dificultar a condução da pesquisa podem incluir a dificuldade de acesso a algumas aldeias, devido a possível resistência por parte de lideranças ou integrantes comunitários, além de certas condições geográficas. Para tentar minimizar esses desafios, é fundamental que a pesquisa seja conduzida em colaboração estreita com as lideranças comunitárias, respeitando os protocolos tradicionais de cada aldeia.

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES OU ANÁLISE DOS DADOS
4.1. Saúde reprodutiva nas comunidades indígenas de Manaus.

As análises realizadas através dos dados obtidos por meio do levantamento bibliográfico, revela que as práticas de prevenção à gravidez nas comunidades indígenas apresentam uma realidade complexa. Na cidade de Manaus, é possível também perceber este cenário diversificado, no qual as práticas tradicionais convivem com as políticas públicas contemporâneas. Os dados obtidos e as análises da literatura sugerem que, mesmo com os avanços proporcionados pela implantação do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SASI), ainda permanecem desafios significativos em relação à eficácia das políticas de saúde reprodutiva.

A adoção de uma abordagem culturalmente apropriada, como enfatizado por Ávila e Alves (2022), é fundamental para superar as dificuldades que existem. Nas comunidades indígenas de Manaus, as formas tradicionais de contracepção se misturam com as práticas biomédicas, o que indica a necessidade de uma interação culturalmente respeitosa, que ao mesmo tempo valoriza os métodos de prevenção da gravidez.

Os estudos de Santiago (2017) e Garnelo (2019) destaca que a taxa de fecundidade e a precocidade na iniciação sexual entre os adolescentes indígenas são influenciados por fortes elementos culturais e sociais. A percepção cultural associada a menarca como prontidão para a maternidade é um exemplo das particularidades culturais que influenciam o bem-estar reprodutivo.

Os dados revelam ainda uma notável carência de acesso a informações e serviços de planejamento familiar. Por essa razão, a combinação das práticas culturais tradicionais com as abordagens modernas deve levar em conta a realidade da vida urbana a as necessidades específicas das comunidades indígenas em Manaus. Além disso, considerando o aumento da gravidez e das infecções sexualmente transmissíveis, como a sífilis, reforça a urgência de ações apropriadas nas populações indígenas.

4.2 Propostas de Intervenção e Estratégias Adaptadas

Diante dos desafios identificados e das necessidades dessas comunidades, propõem-se a criação de um Plano de Intervenção Estratégica para a Prevenção da Gravidez em Comunidades Indígenas de Manaus, divididas em três etapas: análise da situação, intervenção e avaliação.

Análise da situação: A primeira etapa envolve o diagnóstico detalhado da situação atual, para identificar as características específicas, práticas culturais relacionadas à saúde reprodutiva e os acessos a serviços de saúde. Além disso, conduzir entrevistas com os grupos focais para coleta de dados sobre o grau de conhecimento desses grupos sobre métodos contraceptivos, infecções sexualmente transmissíveis e outros fatores relevantes.

Intervenção: Esta etapa visa promover ativamente o envolvimento da comunidade indígena nos debates relacionados a prevenção da gravidez e métodos contraceptivos, incentivando a participação dos jovens e mulheres para garantir a conscientização e eficácia da estratégia. É fundamental desenvolver programas de educação que combine os saberes tradições com conhecimento contemporâneo, a fim de formar profissionais da saúde que compreenda e valorize as práticas locais. Para tanto, é necessário a utilização de materiais pedagógicos e estratégias que favoreçam a aprendizagem ativa dos participantes, incluindo a programação de palestras e a utilização de recursos audiovisuais ajustados à realidade das comunidades indígenas, além disso, esses encontros devem ser periódicos.

Avaliação: Por fim, após a implementação das estratégias de intervenção, realizar a avaliação para verificar a eficácia das ações e identificar áreas de melhorias. Com base nos resultados será possível revisar e ajustar as estratégias, identificando os pontos fortes e áreas que precisam ser melhoradas. Esta avaliação deve ser contínua e adaptativa, permitindo não apenas medir o sucesso das intervenções, mas também garantir um impacto significativo e duradouro na prevenção da gravidez nas comunidades indígenas de Manaus.

5 CONCLUSÃO/CONSIDERAÇÕES FINAIS

O resultado da pesquisa ressalta a complexidade do bem-estar reprodutivo entre as populações indígenas de Manaus, apresentando a importância de uma abordagem que respeite e valorize as diferenças culturais. Embora existam políticas e estruturas disponíveis, a efetividade dessas ações depende de uma adaptação às realidades locais e da participação dessas comunidades.

É fundamental que futuras estratégias e políticas de saúde reprodutiva sejam ajustadas de forma regular para atender às particularidades das comunidades indígenas da região. Isso implica em um diálogo contínuo entre os profissionais de saúde e as lideranças comunitárias, garantindo que as intervenções sejam culturalmente sensíveis e de fato implementadas.

Além disso, é necessário investir na capacitação e formação de agentes de saúde que compreendam as tradições e os saberes locais. Dessa forma, pode-se promover um cuidado respeitoso e eficaz, que não apenas valorize as práticas culturais, mas também busque melhorar os resultados relacionados à saúde reprodutiva.

Também, é imprescindível promover a formação contínua dos profissionais da saúde, assegurando que eles compreendam as particularidades culturais e sociais dessas comunidades. Essa capacitação deve incluir a valorização das práticas tradicionais de saúde, que muitas vezes se mostram eficazes e pertinentes ao contexto indígena. O respeito a essas práticas não só fortalece a identidade cultural, mas também melhora a aceitação das políticas de saúde.

Portanto, ao considerar a saúde reprodutiva das comunidades indígenas urbanas, é imprescindível reconhecer a diversidade e as especificidades que caracterizam essas populações. O respeito à sua autonomia e a promoção de um sistema de saúde inclusivo e adaptável são essenciais para garantir uma abordagem mais saudável e igualitária.

Embora exista políticas e estruturas disponíveis, a efetividade dessas ações é, muitas vezes, limitada pela falta de adaptação às realidades locais e pela ausência de participação ativa das comunidades.

Ademais, é vital que as futuras estratégias considerem o impacto das mudanças ambientais e sociais que afetam diretamente as comunidades indígenas. A urbanização, a migração e a mudança nas dinâmicas familiares, são fatores que exigem atenção para garantir que os serviços de saúde sejam adequados e acessíveis.

Em conclusão, ao abordar a saúde reprodutiva das comunidades indígenas, é fundamental reconhecer e valorizar a diversidade e a características dessas populações, através do respeito, aliado a um sistema de saúde inclusivo e adaptável, garantindo um futuro mais saudável e equitativo, promovendo não apenas a saúde, mas também a dignidade e o respeito à sua cultura e identidade.

REFERÊNCIAS

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1Orcid: 0009.0003.1176.898Discente do Curso Superior de Enfermagem do Instituto Fametro
E-mail: maquinedemourabeatriz@gmail.com

2Orcid: 009.0003.2128.425Discente do Curso Superior de Enfermagem do Instituto Fametro
E-mail: rodriguess.vanessaa@gmail.com

3Orcid: 0009.0009.3412.9658Discente do Curso Superior de Enfermagem do Instituto Fametro
E-mail: cynthia.freitas69@gmail.com

4Orcid: 0009.0005.1715.7594Discente do Curso Superior de Enfermagem do Instituto Fametro
E-mail: Siaylaalmeidaborges@gmail.com

5Orcid: 009.0000.6528.7020Docente do Curso Superior de Enfermagem do Instituto Fametro
E-mail: Adriano Oliveira @fametro.edu.br