PREVALÊNCIA DE TRANSTORNOS ALIMENTARES EM ESTUDANTES DE MEDICINA

PREVALENCE OF EATING DISORDERS AMONG MEDICAL STUDENTS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10059880


Ana Carolina Reinaldo de Sá Lopes
Ana Karoline Corado Cavalcante Barros
Claudia Maria Sousa de Carvalho


RESUMO

Este artigo possui como tema central uma pesquisa que visa identificar a prevalência de transtornos alimentares entre estudantes do curso de medicina de uma instituição privada de ensino superior no município de Teresina, PI. O estudo adota uma abordagem quantitativa, transversal e descritiva, utilizando o Teste de Atitudes Alimentares – EAT-26, além de um questionário sociodemográfico para avaliar os fatores de risco associados ao desenvolvimento de transtornos alimentares. A pesquisa busca compreender o perfil epidemiológico dos participantes, considerando variáveis como índice de massa corporal (IMC), idade, gênero, período do curso, situação conjugal, prática de exercício físico e consumo frequente de bebidas alcoólicas. Além disso, procura identificar comportamentos que influenciam os estudantes de medicina a desencadear transtornos alimentares. Os resultados apontam para uma prevalência de comportamentos de risco para transtornos alimentares, especialmente entre as mulheres e indivíduos na faixa etária de 18 a 21 anos. Uma descoberta importante do estudo é a relação entre o estado nutricional dos estudantes e a adoção de práticas alimentares inadequadas, pois a análise revela que estudantes com IMC fora da faixa considerada ideal são mais propensos a desenvolver transtornos alimentares. Surpreendentemente, a pesquisa também identifica comportamentos de risco em estudantes com IMC normal, destacando a influência da sociedade atual na busca por um corpo idealizado, muitas vezes resultando em distorções na autoimagem. Em última análise, os resultados apontam para a importância de se reconhecer a significativa prevalência de transtornos alimentares entre os estudantes, o que pode ter sérias implicações para a saúde física e mental dessa população. Além disso, o artigo sugere a necessidade de medidas de assistência estudantil para alunos diagnosticados com transtornos alimentares ou em risco, destacando a importância de abordar essa questão nos ambientes acadêmicos.

Palavras-chave: Transtornos alimentares, estudantes de medicina, prevalência, fatores de risco, Teresina-PI.

SUMMARY

This article has as its central theme a research aimed at identifying the prevalence of eating disorders among medical students at a private institution of higher education in the city of Teresina, PI. The study adopts a quantitative, cross-sectional, and descriptive approach, using the Eating Attitudes Test-26 (EAT-26) as well as a sociodemographic questionnaire to assess risk factors associated with the development of eating disorders. The research seeks to understand the participants’ epidemiological profile, considering variables such as body mass index (BMI), age, gender, course period, marital status, physical exercise, and frequent alcohol consumption.Furthermore, it aims to identify behaviors influencing medical students in triggering eating disorders. The results indicate a prevalence of risk behaviors for eating disorders, particularly among women and individuals aged 18 to 21. A significant finding of the study is the relationship between students’ nutritional status and the adoption of inadequate eating practices. The analysis reveals that students with a BMI outside the ideal range are more likely to develop eating disorders. Surprisingly, the research also identifies risk behaviors in students with a normal BMI, highlighting the influence of contemporary society’s pursuit of an idealized body, often resulting in distorted self-image. Ultimately, the results underscore the importance of recognizing the significant prevalence of eating disorders among students, which can have serious implications for their physical and mental health. Additionally, the article suggests the need for student assistance measures for those diagnosed with eating disorders or at risk, emphasizing the importance of addressing this issue within academic environments.

Keywords: Eating disorders, medical students, prevalence, risk factors, Teresina-PI.

1. INTRODUÇÃO

A adolescência e o início da vida adulta são fases que vêm acompanhadas de um amadurecimento físico e emocional, marcadas pelas inúmeras mudanças corporais, como a redistribuição da massa corporal e alterações no sistema reprodutor e endócrino, resultando assim na perda do corpo infantil, e por mudanças psicossociais, como o aumento de preocupações com a estética, com os relacionamentos e com os comportamentos sociais. Além disso, o jovem vivencia uma realidade de grande pressão social gerada pelas mídias, especificamente as redes sociais, para alcançar o “corpo perfeito”, provocando preocupações com a imagem corporal, que por fim gera uma busca pela aceitação da sociedade (OLIVEIRA,2021).

Na sociedade contemporânea, tornou-se bastante comum a veiculação pelas mídias sociais de corpos “perfeitos” e a idealização da magreza como o padrão de beleza. Dessa forma, essa influência feita pelos meios midiáticos provoca certos comportamentos de risco à saúde em jovens, uma vez que esses estão em uma busca incessante pelo corpo “ideal” (STICE& SHAW, 2002). Assim, é observado nesses jovens uma distorção de imagem, que consiste em uma percepção irreal de si mesmo relacionado ao físico, por consequência de um perfeccionismo relacionado a autoimagem e a obsessão pela magreza induzidas pela sociedade atual, levando a um desagrado pessoal constante, que define vários comportamentos de risco para distúrbios alimentares, como anorexia e bulimia (BITTAR, 2020).

Os transtornos alimentares (TAs) são doenças psiquiátricas que levam a comportamentos alimentares de risco para saúde, relacionados a um destaque excessivo do peso, da configuração corporal e da ingestão de alimentos. Esses distúrbios podem afetar a absorção dos alimentos necessários para o pleno funcionamento do organismo e gerar inúmeros prejuízos ao sistema digestivo com alterações metabólicas e endócrinas, problemas cardiovasculares, anemia e alterações ósseas e dentárias (SOUTO, 2006). Os transtornos mais prevalentes são a anorexia nervosa (AN), bulimia nervosa (BN) e a compulsão alimentar (CA) (American Pychiatric Association, 2014). Além disso, essas doenças comprometem a saúde mental e o desempenho psicossocial, uma vez que deixam as pessoas mais propensas a depressão e ansiedade (FONTENELE, 2019).

Os Transtornos Alimentares (TAs) podem se originar em diversas fases da vida, mas há uma maior prevalência na adolescência e na fase do jovem adulto. Ademais, tais doenças são de origem multifatorial, como: obesidade, rejeições, fracassos sociais, bullying e entre os fatores de risco pode-se apontar a genética, história familiar, biológicos e a faixa etária. Um estudo transversal descritivo que analisou 220 adolescentes matriculados evidenciou a prevalência de comportamentos de risco em jovens propensos a desenvolver transtornos alimentares, como o medo do ganho de peso, as práticas de dietas e jejum e preocupação com calorias, praticar atividades físicas em excesso (DE SOUZA SANTOS, 2020).

Tais indivíduos utilizam-se de práticas alimentares e compensatórias com prejuízos a saúde, como a restrição alimentar como forma de diminuir o peso na anorexia nervosa ou a ingestão exagerada de alimentos como forma de satisfação imediata na compulsão alimentar, ou até utilizar ações compensatórias que evitam o ganho de peso como com o uso de laxativos, diuréticos e indução do vômito. Dessa forma, o consumo alimentar gera um sentimento dúbio no individuo com transtorno alimentar, podendo trazer satisfação imediata ou, muitas vezes, um sofrimento e autodepreciação (BALLONE, 2015).

O aumento do número de casos de transtornos alimentares nos últimos tempos, aliado aos prejuízos psicológicos e sociais ao indivíduo com TA´s demonstram a necessidade de ferramentas para avaliação e diagnóstico desses distúrbios, para, assim, auxiliarem em um melhor entendimento da doença e em melhores formas de tratamento, buscando um melhor sucesso terapêutico. Dessa forma, os principais instrumentos de avaliação são os questionários autoaplicáveis, entrevistas clínicas e automonitoração, dentre os questionários autoaplicáveis estão principalmente o Eating Attitudes Test – EAT, Eating Disorder Inventory (EDI), Eating Disorder Examination versão questionário (EDE-Q), Binge Eating Scale (BES) (FREITASA, 2002).

Diante disso, o objetivo da presente pesquisa consistiu em identificar a prevalência de transtornos alimentares entre estudantes do curso de medicina de uma instituição privada de ensino superior do município de Teresina-PI a partir do resultado obtido no Teste de Atitudes Alimentares – EAT-26 a fim de caracterizar o perfil epidemiológico dos estudantes de acordo com as variáveis sociodemográficas: IMC, idade, gênero, período do curso, situação conjugal, prática de exercício físico e consumo frequente de bebidas alcóolicas.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA OU REVISÃO DA LITERATURA

2.1. TRANSTORNOS ALIMENTARES

Os transtornos alimentares são considerados quadros psiquiátricos associados a alterações comportamentais, emocionais ou até mesmo fisiológicas. São marcados por distúrbios do comportamento alimentar, associados à distorção da imagem corporal. Nesse contexto, a sociedade atual desempenha uma considerável parcela de responsabilidade no que diz respeito a valorização de padrões estéticos como fator de representação social, visto que os ideais culturais associados a influência da mídia promovem um culto à magreza, o que corrobora com a busca desenfreada de um padrão de beleza inatingível (FROIS, MOREIRA & STENGEL, 2011).

Diante disso, os adolescentes e os adultos jovens são considerados os grupos sociais mais suscetíveis às imposições pela cultura de massa. Pois nessa faixa etária, há uma demanda urgente de adequação às pressões socias mediante a necessidade de aceitação não só por outros grupos sociais como também através da influência da mídia, já que a mesma repassa para o seu principal público alvo a idealização da imagem de que o corpo perfeito é magro. Sendo assim, os principais transtornos alimentares são: a Anorexia Nervosa, Bulimia Nervosa e Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica (OLIVEIRA, 2005; DA SILVA & DE MACÊDO, 2014).

2.2. ANOREXIA NERVOSA

A anorexia nervosa é caracterizada por uma preocupação anormal com a própria imagem e com uma distorção excessiva do peso corporal. Diante disso, nota-se que indivíduos anoréxicos apesar de apresentarem um padrão corporal eutrófico, possuem a percepção de que esse padrão é distante do ideal, levando o mesmo a adotar posturas dietéticas que interferem no ganho do peso (BOSI., et al, 2006).

Com relação aos comportamentos dietéticos, os adolescentes com anorexia nervosa podem ser classificados em dois grupos diferentes, sendo eles pertencentes a categoria de anorexia nervosa restritiva e anorexia nervosa purgativa. Nesse contexto, a principal diferença entre eles, diz respeito as ações executadas pelos pacientes, pois no grupo de anorexia nervosa restritiva, o paciente almeja a perca de peso através da adoção de dietas hipocalóricas associada a prática de exercício físico extenuante e admissão de jejuns intermitentes. Já na purgativa, o paciente ao se lançar do sentimento de culpa após refeição, propicia são só de mecanismos como a autoindução do vômito, como também do uso de medicamentos anorexígenos, diuréticos e laxantes de forma inadequada (APPOLINÁRIO & CLAUDINO, 2000).

Diante disso, o início do transtorno é marcado por uma redução drástica da ingestão de alimentos calóricos levando o indivíduo a restringir radicalmente a quantidade de carboidratos e lipídeos em prol da perca de peso através de uma alimentação pobre em refeições e constituída, principalmente, apenas de vegetais. Posteriormente, com a evolução do transtorno, o paciente apresenta constipação intestinal devido ao atraso do esvaziamento gástrico ocasionado pela redução da motilidade gástrica, visto que na doença há um hipofuncionamento do cólon o que predispõe ao surgimento de um trânsito intestinal mais lento (CORDÁS, LOPES & SEGALL, 2004).

Além disso, a anorexia possui uma predisposição acentuada para a desnutrição, o que corrobora na atrofia dos músculos periféricos e, consequentemente, no aumento não só da pressão no átrio direito como também das veias pertencentes a circulação sistêmica, diminuindo assim, o retorno venoso do sangue para coração. Devido a isso, há uma diminuição do débito cardíaco associada a uma redução da pressão arterial, o que provoca uma alteração da massa e frequência cardíaca, levando a uma insuficiência crônica do coração, que pode ser explicada através da elevação da resistência vascular periférica que é responsável pelo desbalanço dos eletrólitos, rápida alimentação e da oferta de grande volume (MEHLER & KRANZ, 2003).

Ademais, a maioria dos pacientes anoréxicos cursam com peso abaixo do esperado, possuindo em média um IMC menor que 16,4kg/m2, o que configura como fator de risco para a redução das taxas de estrogênio circulante. Com base nisso, o hipoestrogenismo adquirido desencadeia um desequilíbrio entre as células ósseas, proporcionando uma maior quantidade de osteoclastos, células responsáveis pela reabsorção óssea, do que a de osteoblastos, gerando uma perda acentuada da massa óssea, visto que devido a ausência de cálcio circulante, o organismo libera uma maior quantidade desse cátion proveniente dos ossos para suprir a necessidade do metabolismo (RIVERA-GALLARDO, DEL SOCORRO & BARRIGUETE, 2005).

2.3. BULIMIA NERVOSA

A bulimia nervosa pode ser definida por episódios frequentes de compulsão alimentar associados a comportamentos compensatórios inapropriados para impedir o ganho de peso por conta da perda de controle ao se alimentar. Sendo assim, os episódios bulímicos também são acompanhados por condutas inadequadas para controle de peso, como o uso de medicamentos, autoindução do vômito, dietas e exercícios físicos extenuantes. Diante disso, observa-se que os pacientes com bulimia e a anorexia nervosa lançam-se das mesmas medidas para controle do peso. No entanto, a diferença entre elas consiste na forma como a ingestão alimentar é feita. (ASSUNÇÃO, CORDAS & ARAÚJO, 2002).

Nesse viés, em 1985, Mitchell e Laine, estudaram pacientes hospitalizadas com bulimia nervosa que descreveram seus episódios de “binge eating”, que consiste na ingestão compulsiva de alimentos logo seguida de vômitos autoinduzidos. Esses episódios normalmente são precedidos por situações de estresse, em que o paciente busca não só saciar a fome, como também a aliviar seus estados emocionais durantes as refeições, buscando uma sensação prazerosa de confortamento, principalmente em alimentos com alto teor calórico, como sorvetes, bolos e hambúrgueres (MITCHELL & LAINE, 1985).

No entanto, para amenizar a culpa provocada pelo descontrole alimentar, as pacientes recorrem a indução do vômito, que é possível de ser percebido através de um achado clínico bem característico da doença conhecido por sinais de Ransael, que são os dedos machucados devido ao esforço provocado pelo vômito. Nesse sentido, as compulsões apresentam-se associadas não só a quadros emocionais, como baixa autoestima, insegurança, ansiedade e até mesmo depressão, como também a quadros metabólicos, resultantes na perda de potássio, irregularidades menstruais e alterações irritativas e ulcerosas no esôfago, o que pode predispor ao surgimento de um câncer esofágico (BOSI., et al 2004).

2.4. TRANSTORNO DE COMPULSÃO ALIMENTAR

O transtorno da compulsão alimentar periódica foi descrito pela primeira vez nos anos 1950. No entanto, sua inclusão como categoria diagnóstica pertencente aos transtornos alimentares só ocorreu em 1994, quando foi incluído no apêndice B do DSM IV, como uma síndrome caracterizada por episódios recorrentes de compulsão alimentar. Porém, diferentemente dos outros transtornos alimentares, na compulsão alimetar não há presença de nenhum comportamento de compensação para evitar um possível ganho de peso (AZEVEDO, SANTOS & FONSECA, 2004).

Diante disso, um dos principais motivos que provoca o surgimento de episódios de compulsão alimentar periódica é estresse. Pois, a partir do momento que o estresse é desencadeado, seja por pressões psicossociais seja por problemas de natureza intrínseca do paciente, há a ativação do eixo hipotálamo hipófise gonadal. Dessa forma, a ativação leva ao aumento de cortisol no plasma, o que eleva o metabolismo energético, estimulando a assim, a ingestão de alimentos. Pois, a condição estressante leva o individuo desenvolver um quadro de ansiedade que faz, muitas vezes, o paciente buscar alimento como conforto, numa tentativa de atender a necessidade energética demandada pelo impulso estressante (DALLMAN., et al 2003).

2.5. RELEVÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA

Os transtornos alimentares estão diretamente relacionados a variáveis sociodemográficas como IMC, idade, cor/etnia, ano escolar, turno, perfil socioeconômico, condições de moradia, prática de exercício físico e as variáveis subjetivas relacionadas à insatisfação corporal e ao comportamento alimentar. Sendo assim, o público jovem configura- se como o principal grupo alvo pertencente ao surgimento dos transtornos, visto que devido à sua insatisfação corporal e supervalorização da magreza adquirida pela influência sociocultural e estética, há uma tendência maior dessa população de adotar comportamentos de alto risco para saúde (LEITE & DINIZ, 2021).

A prevalência de transtornos alimentares é elevada em âmbito mundial, constituindo-se um verdadeiro problema de saúde pública. Sendo assim, analisar um perfil epidemiológico é fundamental para elaborar uma estratégia de prevenção e promoção de saúde de forma eficaz, uma vez que torna possível, através dos dados coletados, traçar estratégias para alcançar com mais eficiência o público-alvo de determinado transtorno, tanto para buscar a prevenção, como para servir de subsídios para ações voltadas com o intuito de minimizar a ocorrência deles (OLIVA, 2001).

Dessa forma, analisar o perfil epidemiológico de estudantes de Medicina portadores de transtornos alimentares em Teresina-PI, possibilitará uma busca mais rápida não só ao público- alvo como também a faixa etária persistente em cada transtorno no contexto local. Desencadeando, portanto, um auxílio no diagnóstico precoce e na prevenção de possíveis complicações futuras resultantes do desenvolvimento de transtornos.

3. METODOLOGIA

3.1. TIPO DE ESTUDO

Foi realizado um estudo quantitativo transversal e descritivo, a partir da aplicação de um questionário estruturado, que avaliou fatores de riscos associados ao desenvolvimento de Transtornos Alimentares em estudantes de Medicina uma instituição de ensino privada de Teresina-PI.

Segundo Knechtel (2014), o estudo quantitativo é uma modalidade de estudo que atua sobre um problema humano ou social, é baseado no teste de uma teoria e composta por variáveis quantificadas em números, as quais são analisadas de modo estatístico, com o objetivo de determinar se as generalizações previstas na teoria se sustentam ou não.

De acordo com Trivinos (2011), os estudos descritivos exigem do pesquisador uma série de informações sobre o que se deseja pesquisar, para que a pesquisa tenha um grau de validade científica necessita-se de uma precisa delimitação de técnicas, métodos, modelos e teorias que orientarão a coleta e interpretação dos dados. Além disso, ressalta que os estudos descritivos também podem ser chamados de estudos qualitativos

3.2. LOCAL DO ESTUDO

O estudo foi realizado em uma instituição de ensino de nível superior privada da capital do estado do Piauí que iniciou suas atividades acadêmicas em 12 de fevereiro de 2001 com os cursos de Enfermagem e Odontologia que haviam sido autorizados, respectivamente, em maio e junho de 2000. Ao longo do tempo mais cursos foram adicionados, porém só em 9 de julho de 2004 a instituição obteve autorização para ter o curso de medicina. Diante disso, a abertura da primeira turma do curso de medicina iniciou-se em agosto de 2004.

3.3. PARTICIPANTES DA PESQUISA

Foram incluídos no estudo estudantes de Medicina uma instituição de ensino superior de natureza privada, localizada na cidade de Teresina- PI, de ambos os sexos, com idade igual ou superior a 18 anos e que estevam devidamente matriculados no curso.

Foram excluídos do estudo, estudantes afastados da graduação por motivo de saúde, tenham realizado trancamento das atividades acadêmicas ou estejam em exercício de atividades acadêmicas domiciliares, além daqueles que não realizaram o preenchimento completo do questionário.

3.4. POPULAÇÃO E AMOSTRA

A pesquisa foi realizada com uma amostragem de 312 alunos do curso de medicina selecionados, aleatoriamente, entre os 1632 matriculados no segundo semestre de 2022. Esse número foi calculado através da fórmula n = (z2∙0,25∙N)/(E2(N-1)+z2∙0,25) = (1,962∙0,25∙1662)/(0,052∙1661+1,962∙0,25) = 312, na qual, z é o valor crítico, e a margem de erro e N o tamanho da população, considerando o grau de confiança de 95% (z=1,96), margem de erro E = 5% e N = 1662.

3.5. INSTRUMENTOS E PROCEDIMENTO DE COLETA DE DADOS

A coleta de dados foi desenvolvida nos meses de fevereiro e março de 2023, contudo foi iniciada somente após autorização da instituição coparticipante e aprovação pelo Comitê de ética e pesquisa do Centro Universitário UNINOVAFAPI.

Para o procedimento de coleta dos dados, foi aplicado um questionário sociodemográfico que possibilitou conhecer o perfil dos participantes da pesquisa e o Teste de Atitudes Alimentares – EAT-26 (BELING, 2008). Este é um instrumento com 26 itens que avalia principalmente os comportamentos anoréxicos. As pontuações são: sempre = 3; muitas vezes = 2; frequentemente = 1. E as três últimas respostas não recebem pontuação, pois são menos voltadas ao comportamento de risco para anorexia. Na questão 25 a pontuação é ao contrário: sempre, muitas vezes e frequentemente peso 0, poucas vezes = 1, quase nunca = 2, e nunca = 3. O escore é calculado a partir da soma de cada item. Varia de 0 a 78 pontos. Quanto maior o escore, maior o risco de desenvolver TA. Porém, o escore maior que 21 pontos são indicativos de comportamento alimentar de risco para TAs.

Assim, na coleta de dados os instrumentos foram disponibilizados aos participantes do estudo por meio de formulário online, elaborado na plataforma Google Forms. Desse modo, um formulário com dados sociodemográficos e com o Teste de Atitudes Alimentares – EAT-26 foi enviado aos participantes por meio de um link disponibilizado nos grupos de WhatsApp, após prévio esclarecimento sobre a pesquisa aos administrados dos grupos. O acesso foi realizado através de computadores ou smartphones conectados à internet.

Vale ressaltar que a o acesso aos instrumentos de coleta de dados foi permitido somente após o participante ter acesso e concordar com o detalhamento da pesquisa, descrito no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido-TCLE, e declarar o aceite assinalando “li e concordo” na página do formulário. Cada participante foi identificado por um código numérico para preservar sua identidade.

3.6. ANÁLISE DOS DADOS

Os dados coletados foram registrados em uma planilha Microsoft excel para posteriormente serem exportados e convertidos em gráficos e tabelas para avaliação. Foi utilizado o teste Qui-quadrado para as variaveis categóricas. Um valor de p <0,05 foi considerado estatisticamente significativo; Todos os cálculos foram realizados com o programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS for Windows, versão 20.0; SPSS, Chicago, IL, EUA).

3.7. ASPECTOS ÉTICOS E LEGAIS

Esta pesquisa obedeceu a Resolução nº 466/12 que trata das pesquisas envolvendo seres humanos (BRASIL, 2012). Todos os participantes receberam por meio do link, informações quanto ao detalhamento da pesquisa, ressaltando os objetivos e aspectos éticos relacionados e garantidos por meio do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

A amostra foi composta por 312 estudantes universitários de Medicina, caracterizados a partir de dados sociodemográficos, como idade, gênero, período do curso, situação conjugal e IMC. Além disso, foram agrupados de acordo com a prática de atividade física e consumo de bebida alcoólica. Percebe-se, portanto, predominância do sexo feminino como público alvo da pesquisa (70,2%, n= 217), da faixa etária variando entre 18 a 21 anos (43,2%, n=134), predominantemente solteiros (93,6%, n=260). A Tabela 1, a seguir, apresenta a caracterização do perfil das participantes da pesquisa.

Os achados revelaram ainda que houve a prevalência dos estudantes que cursavam, sobretudo, o sexto (19,9%, n=62), o quinto semestre (18,9%, n=59) e o sétimo semestre (18,27%, N=57) na pesquisa. Segundo, no que diz respeito à prática de exercício físico, a grande maioria dos estudantes afirmaram ter esse hábito com frequência (76,3%, n=238) e com relação a ingestão de bebida alcoólica, grande parcela nega seu consumo frequente (70,4%, n=219).

Tabela 1 – Perfil dos Participantes da Pesquisa

Fonte: dados da pesquisa. Elaborado pelas autoras, 2023.

A partir das respostas contidas no questionário do EAT, especificamente sobre a temática dos transtornos alimentares, 55 estudantes (17,67%) apresentaram risco de desenvolver transtorno alimentar, como pode ser visto na Tabela 2, havendo diferenças significativas entre gêneros. Uma vez que, dentre os participantes avaliados com comportamento de risco para transtornos alimentares, 47 indivíduos (85,45%) e são do sexo feminino e apenas 8 estudantes (14,55) configuram o sexo masculino, como ilustra o Gráfico abaixo.

Tabela 2 – Comportamento de risco para transtornos alimentares – EAT – 26

Fonte: dados da pesquisa. Elaborado pelas autoras, 2023.

Gráfico 1 – Pessoas com comportamento de risco para transtornos alimentares de acordo com a escala EAT – 26 e sua relação como IMC

Fonte: dados da pesquisa. Elaborado pelas autoras, 2023.

Em relação aos valores do IMC, calculados a partir do peso e altura, revelaram que dentre os participantes com comportamento de risco para o surgimento de transtornos, 24 alunos se encontram com peso normal. Enquanto que, por outro lado, 30 estudantes pertencentes a esse grupo de risco, apresentaram valores que demonstram IMC alterado. Sendo que desse conjunto, 20 estão acima do peso, 6 estão situados na faixa de obesidade tipo 1, 3 na faixa de obesidade do tipo 3 e 1 com valor classificado como baixo peso ou risco de desnutrição, evidenciado na Tabela 3.

Tabela 3 – Pessoas com comportamento de risco para transtornos alimentares de acordo com a escala EAT – 26

Fonte: dados da pesquisa. Elaborado pelas autoras, 2023.

Com base na análise de dados referente aos estudantes que apresentam hábitos de risco para o desenvolvimento de transtornos, nota-se que a faixa etária entre 18 a 21 anos, apresentou maior predisposição, totalizando 43,64 % em relação as demais. As outras faixas etárias,

ademais, também apresentaram valores consideráveis, em que o segundo grupo mais propenso integrou estudantes entre o intervalo de 22 a 24 anos (21,82%), seguido posteriormente dos acadêmicos com idade superior a 30 anos (20 %). Outrossim, nota-se que o sexo feminino além de ter predominado como público alvo da pesquisa, ele também foi responsável pela maior concentração de alunos com fatores de risco para insatisfação corporal (85,45%) comparado ao sexo masculino que concentrou 14,55%.

Com relação ao período do curso onde se encontra maior quantidade de estudantes sujeitos aos transtornos alimentares, pode-se salientar que o 5º semestre foi aquele que mais apresentou número de respostas, com 25,45%. No entanto, apesar desse período se encontrar com o maior índice de predisposição, não se deve desprezar as respostas dos demais, visto que o 6º e o 7º apresentaram equivalência de repostas, em que ambos apresentaram mesmo percentual de 16,36 %, seguido pelo 4 º período que demonstrou tamanha importância, uma vez que ele concentrou 12,73% de acadêmicos com comportamentos inadequados.

Com relação à situação conjugal, desprende-se que o grupo pertencente aos solteiros, apresentou acentuado índice de condutas negligentes para consolidação de transtornos alimentares. Pois a devida classe, evidenciou 80 % da amostra que, comparada às demais, representaram menor quantidade de repostas, já que acadêmicos declarados casados, relatou 10,91%; união estável 7,27 % e divorciados 1,82 %. Além disto, 76,28% dos alunos alegaram realizar prática de atividade física com frequência e 65,45% confessarão não ingerir bebida alcóolica com regularidade, conforme pode ser evidenciado na tabela 4 que ilustra o perfil dos participantes com comportamentos de risco para surgimento de transtornos alimentares.

Tabela 4 – Perfil dos participantes com comportamento de risco para transtornos alimentares, de acordo com o EAT – 26

Fonte: dados da pesquisa. Elaborado pelas autoras, 2023.

No presente estudo, encontrou-se a prevalência do sexo feminino, como principal grupo detentor de comportamentos que favorecem a consolidação de hábitos alimentares inadequados. Chiodini e Oliveira (2003), realizaram um estudo com adolescentes onde também encontraram uma pontuação mais elevada para as meninas (8,3 %) do que para os meninos (3,7 %). Sendo assim, percebe-se que a grande prevalência de mulheres nessas pesquisas pode ser explicada, através da influenciação do ideal de beleza feminino divulgado tanto pela mídia como pela cultura de massa, que prioriza o corpo magro em detrimento do biótipo gordo, o que favorece insatisfação corporal e a possibilidade de maior desenvolvimento de dietas e atitudes alimentares restritivas.

Ademais, foi possível constatar durante o estudo que todas as faixas etárias estão sujeitas ao crescimento de condutas alimentares incoerentes. No entanto, a análise de resultados na presente pesquisa, onde aponta a faixa etária entre 18 a 21 anos como principal grupo de risco, corrobora com a afirmativa proposta por Vale e Elias (2011) em que, segundo ele, essa parcela etária entre 12 a 28 anos, é mais vulnerável mediante às possíveis transformações que ocorrem na transição da adolescência para a fase universitária que somadas, a instabilidade psicossocial nesse período, favorece maior pressão a e cobrança esse grupo em relação aos aspectos corporais impostos pela sociedade.

Em relação ao estado nutricional, nota-se a intrínseca relação existente entre composição corporal e adoção de práticas inadequadas no âmbito alimentar, uma vez que dentro do grupo de 55 estudantes com comportamentos de risco para surgimento de transtornos alimentares, 30 possuem IMC fora da faixa ideal esperada. Tal fato, pode ser explicado através de outros estudos, que também demonstram que indivíduos com excesso de peso tendem a apresentar maior prevalência de insatisfação corporal (KAKESHITA, 2006; DE QUADROS, 2010), o que predispõe o surgimento de sintomas depressivos e ansiosos.

Por outro lado, em relação ao estado nutricional, estudos como o proposto por Bosi et al (2008) descrevem que a maior percentagem de insatisfação corporal está presente entre os académicos que se apresentam eutróficos, o que difere do nosso estudo, em que os piores desfechos foram encontrados para indivíduos com excesso de peso. A prevalência do excesso de peso está associada, sobretudo, às pressões académicas e a escassez de tempo para preparar alimentos saudáveis.

Além disso, de acordo com uma pesquisa desenvolvida por Osbel (2018), há uma associação significativa entre o surgimento de transtornos depressivos e episódios estressantes com estudantes que realizam dietas restritivas para perca de perco, chegando a totalizar em 30,8% na amostra correspondente. Dessa forma, depreende-se a necessidade de uma maior discussão a respeito desse tema, uma vez que a presença de transtornos alimentares favorece a predisposição do surgimento de sintomas depressivos e ansiosos que se não diagnosticados e tratados, atrapalham na realização das atividades diárias e prejudica a qualidade de vida do estudante, visto a presença dessas manifestações clínicas impactam negativamente na vida académica e profissional futura desses alunos.

Nesse contexto, pode-se citar que a predominância de transtornos alimentares ocorre, sobretudo, em estudantes voltados à cursos da aérea da saúde, conforme demonstrado por Prado (2015). Sendo assim, uma das principais hipóteses que justificam estudantes da área da saúde possuírem maior chances de transtornos alimentares é a pressão que esses alunos sofrem com relação à alimentação e ao corpo. Pois, devido a cobrança impostas pelas redes sociais e ao crescimento do marketing médico que propõe, em grande parte, à promoção de uma identidade que sirva como ferramenta para atração de clientes, muitos académicos associam a aparência física como uma vantagem para o avanço profissional futuro, permitindo a consolidação de transtornos ainda no período de graduação.

Alguns estudos como o de Rocks et al (2017) apontam, ainda, que o risco de desenvolver transtorno alimentar pode estar associado a dependência em exercícios. Fato este que também pode ser comprovado através do presente estudo, visto que dentre os 55 estudantes com insatisfação corporal, 47 deles relatam a adoção de atividade física com frequência. Sendo assim, nota- se que apesar da prática de exercícios regularmente ser caracterizada como pilar essencial para redução do excesso de peso e da propagação do autocuidado, percebe-se que o excesso dela somado ao culto ao corpo na era atual, contribui para a consolidação de pressões psicológicas nos estudantes e colaboram à adesão de hábitos e práticas alimentares equivocadas. Portanto, mais estudos que abordem questões nesses sentidos se mostram necessários.

Como por exemplo, pesquisas que abordem se vivências e pressões durante o curso de Medicina fazem com que os estudantes desenvolvam desordens relacionadas à alimentação. Pois a prevenção e tratamento dos comportamentos de risco para surgimento de transtornos alimentares se faz de suma importância, principalmente em estudantes do curso de saúde, visto que serão profissionais capazes de interferir na promoção da saúde e disseminação de autocuidados dos pacientes.

5. CONCLUSÃO/CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir dos resultados desse estudo quantitativo transversal, foi possível traçar a prevalência e o perfil dos estudantes de medicina que possuem comportamento de risco para o desenvolvimento de transtornos alimentares, diante disso foi analisado que um número significativos de estudantes, dentro da amostra de 312 alunos, apresentou a pontuação que os classifica como um grupo de risco para a obtenção de transtornos alimentares, entre esses, os estudantes do sexo feminino e os que possuem um IMC alterado com o escore de sobrepeso apresentaram um maior comportamento de risco para transtornos alimentares, de acordo com o o Teste de Atitudes Alimentares – EAT-26.

Os resultados demonstram a forte influência da sociedade atual sobre a busca de um corpo perfeito, mas também a obsessão pela magreza e a distorção da autoimagem, uma vez que uma grande parte dos estudantes com comportamentos de risco possuem IMC normal e de sobrepeso. Com base nos dados apresentados, conclui-se que os transtornos alimentares afetam uma porcentagem significativa da população estudantil e que esses podem acarretar em prejuízos para a saúde física e mental dos jovens.

Dessa forma, para combater essa realidade alarmante, é necessário promover uma conscientização e educação sobre os transtornos alimentares, ademais proporcionar uma maior assistência psicológica e nutricional dentro das universidades. Além disso, é essencial que as instituições de ensino se tornem ambientes mais acolhedores e que se preze pela autoaceitação, promovendo uma cultura pautada na valorização das diversidades de corpos e quebra do estereótipo de beleza, e pelo oferecimento mais proativo do apoio.

Portanto, o estudo tem como finalidade mostrar que é necessária uma abordagem multidisciplinar para o combate aos transtornos alimentares, para assim promover uma saúde mental e bem-estar dos jovens, auxiliando-os a conquistar um melhor desempenho pessoal e acadêmico e uma melhor qualidade de vida. Mas também, proporcionar discussões e debates dentro das universidades sobre os comportamentos de risco para os transtornos alimentares e a criação de atendimentos especializados para esses estudantes, como forma de reduzir as consequências e prevalências desses transtornos.

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