REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ch10202408131213
Aline Boechat de Oliveira; Aline Gabrielle de Oliveira Mendes; Ana Beatriz Oliveira Castro; Angélica Adriene Thomaz de Souza Prado; Larissa de Oliveira Velloso Costa; Pedro Henrique Rivas de Morais; Weskley Souza dos Santos
RESUMO
A síndrome de Peutz-Jeghers (SPJ) é uma condição genética rara caracterizada por pólipos hamartomatosos no trato gastrointestinal e hiperpigmentação mucocutânea, associada a um risco elevado de malignidades. Este artigo de revisão tem como objetivo analisar as manifestações clínicas, diagnósticos e abordagens terapêuticas da SPJ, destacando os avanços no manejo e as áreas que necessitam de mais pesquisas. A metodologia utilizada foi uma revisão narrativa da literatura, abrangendo artigos publicados entre 2015 e 2024 nas bases de dados PubMed, Scopus e Web of Science. Foram selecionados estudos que abordam aspectos clínicos, genéticos e terapêuticos da síndrome. Os resultados indicam que o manejo dos pólipos através de remoção endoscópica e vigilância para detecção precoce de cânceres são fundamentais para melhorar o prognóstico. A discussão revelou que, apesar dos avanços no diagnóstico genético e nas técnicas endoscópicas, desafios persistem, especialmente em termos de acesso a cuidados de saúde adequados e intervenções psicossociais. Conclui-se que a SPJ requer uma abordagem multidisciplinar que combine vigilância clínica rigorosa, tratamento eficaz e suporte psicológico, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida dos pacientes e reduzir a mortalidade associada.
Palavras-chave: Síndrome de Peutz-Jeghers. Polipose intestinal. Vigilância clínica.
1 INTRODUÇÃO
A síndrome de Peutz-Jeghers (SPJ) é uma condição genética rara caracterizada pela presença de múltiplos pólipos hamartomatosos no trato gastrointestinal e pela pigmentação mucocutânea característica. Esta síndrome foi descrita pela primeira vez por Peutz em 1921 e, posteriormente, por Jeghers em 1949, destacando-se por suas manifestações clínicas peculiares e associações com riscos aumentados de malignidades (DE SOUZA MAIA et al., 2024). A SPJ é causada por mutações no gene STK11 (também conhecido como LKB1), localizado no cromossomo 19p13.3, que codifica uma quinase responsável pela regulação do crescimento celular e da apoptose. A inativação deste gene leva à formação dos pólipos e à predisposição ao câncer observada nos portadores da síndrome (MONTENEGRO et al., 2020).
Epidemiologicamente, a SPJ é considerada uma condição rara, com uma prevalência estimada em cerca de 1 a 9 casos por 100.000 indivíduos. A síndrome afeta igualmente ambos os sexos e pode ser diagnosticada em qualquer idade, embora os primeiros sinais frequentemente apareçam na infância ou adolescência (SALOMÃO et al., 2022). Os pólipos hamartomatosos, que são benignos por natureza, ocorrem mais frequentemente no intestino delgado, mas podem ser encontrados em todo o trato gastrointestinal, incluindo o estômago e o cólon. A pigmentação mucocutânea, um dos primeiros sinais clínicos da SPJ, geralmente aparece como máculas hiperpigmentadas na mucosa oral, lábios e, ocasionalmente, nas mãos e pés (COÊLHO et al., 2021).
O diagnóstico da SPJ é baseado em critérios clínicos, que incluem a presença de pólipos hamartomatosos no trato gastrointestinal, as características manchas pigmentadas, e um histórico familiar positivo para a síndrome. A confirmação genética pode ser realizada através da identificação de mutações no gene STK11 (RIBEIRO; LIMA; MARTINS, 2021). A endoscopia e a colonoscopia são ferramentas diagnósticas fundamentais para a visualização direta e a remoção de pólipos, permitindo o monitoramento e prevenção de complicações, como a intussuscepção, que é uma emergência cirúrgica comum em indivíduos com SPJ (ZAMPIERI, 2021).
O tratamento da SPJ é predominantemente voltado para a gestão das complicações gastrointestinais e a vigilância regular para detecção precoce de malignidades. Embora os pólipos sejam benignos, a síndrome está associada a um risco significativamente aumentado de desenvolver vários tipos de câncer, incluindo câncer de cólon, estômago, pâncreas, mama e ovário (FERREIRA et al., 2022). Portanto, estratégias de rastreamento são cruciais para o manejo eficaz da SPJ, envolvendo procedimentos endoscópicos regulares e, em alguns casos, a remoção profilática de pólipos maiores (AYALA, 2023).
A pigmentação mucocutânea, embora não cause sintomas físicos, pode ter implicações psicossociais para os pacientes devido à sua visibilidade. Técnicas de tratamento, como o uso de laser Q-Switched, têm sido exploradas para a redução das máculas pigmentadas, melhorando a qualidade de vida dos pacientes (STRADIOTTI; DE ALBUQUERQUE; DE CASTRO, 2020). Estudos recentes têm focado em avanços no entendimento molecular da SPJ, oferecendo novas perspectivas para intervenções terapêuticas específicas e melhorando as estratégias de aconselhamento genético (DE ANDRADE et al., 2023).
Neste artigo, revisamos a literatura existente sobre a polipose intestinal na síndrome de Peutz-Jeghers, abordando aspectos clínicos, diagnósticos e terapêuticos, além de explorar as implicações genéticas e os desafios associados ao manejo desta condição complexa.
2 ASPECTOS GENÉTICOS E MOLECULARES DA SÍNDROME DE PEUTZ-JEGHERS
A síndrome de Peutz-Jeghers (SPJ) é uma desordem autossômica dominante caracterizada pela presença de múltiplos pólipos hamartomatosos no trato gastrointestinal e pigmentação mucocutânea característica. Esta síndrome é atribuída a mutações no gene STK11 (também conhecido como LKB1), que desempenha um papel crucial na regulação de vários processos celulares. O entendimento dos aspectos genéticos e moleculares da SPJ é essencial para compreender a patogênese da síndrome e suas implicações clínicas (DE SOUZA MAIA et al., 2024).
O gene STK11 está localizado no cromossomo 19p13.3 e codifica uma serina/treonina quinase que é fundamental para a regulação do crescimento celular, metabolismo, polaridade celular e apoptose. A proteína LKB1 atua como um regulador mestre que ativa uma série de outras quinases envolvidas em processos celulares críticos. Mutações nesse gene resultam na perda de função da proteína, levando ao desenvolvimento de pólipos hamartomatosos e à predisposição para malignidades (MONTENEGRO et al., 2020).
Os pólipos na SPJ são considerados hamartomas, o que significa que são crescimentos benignos formados por uma mistura anômala de tecidos normalmente encontrados na região. Embora esses pólipos sejam benignos, eles podem causar complicações, como obstruções intestinais e sangramentos, além de estarem associados a um risco aumentado de transformação maligna. A mutação do STK11 desempenha um papel central nesse processo, promovendo o crescimento celular descontrolado e a formação de pólipos (SALOMÃO et al., 2022).
A proteína LKB1 atua em várias vias de sinalização celular, incluindo a regulação da via AMPK (proteína quinase ativada por AMP), que é essencial para o metabolismo energético e a manutenção da homeostase celular. A inativação do gene STK11 resulta na desregulação dessas vias, promovendo o crescimento celular anômalo e a formação de pólipos. Além disso, LKB1 interage com outras vias de sinalização, como a via mTOR, que é conhecida por seu papel no crescimento e proliferação celular (COÊLHO et al., 2021).
A perda da função de LKB1 afeta a capacidade da célula de responder adequadamente ao estresse energético, levando a um ambiente favorável para o crescimento tumoral. Estudos demonstraram que a deficiência de LKB1 pode aumentar a sensibilidade a danos no DNA, contribuindo para a instabilidade genética e o desenvolvimento de câncer. Isso explica em parte o risco elevado de malignidades observadas em indivíduos com SPJ (RIBEIRO; LIMA; MARTINS, 2021).
Dada a importância do gene STK11 na patogênese da SPJ, há um interesse crescente no desenvolvimento de terapias direcionadas que possam mitigar os efeitos das mutações nesse gene. Abordagens que visam restaurar a função normal da proteína LKB1 ou compensar sua perda são promissoras. Por exemplo, a ativação da via AMPK por compostos farmacológicos pode potencialmente reverter alguns dos efeitos adversos associados à perda de LKB1 (ZAMPIERI, 2021).
Além disso, a compreensão das interações entre LKB1 e outras vias de sinalização oferece oportunidades para o desenvolvimento de terapias combinatórias. Inibidores da via mTOR, que já são utilizados em outras neoplasias, estão sendo explorados como possíveis tratamentos para reduzir o crescimento dos pólipos e o risco de malignidade em pacientes com SPJ. Estudos pré-clínicos e ensaios clínicos estão em andamento para avaliar a eficácia dessas abordagens em melhorar o prognóstico dos indivíduos afetados (FERREIRA et al., 2022).
A identificação de mutações no gene STK11 tem implicações significativas para o aconselhamento genético de famílias afetadas pela SPJ. Como a síndrome é herdada de forma autossômica dominante, cada filho de um portador de SPJ tem uma chance de 50% de herdar a mutação. O aconselhamento genético pode ajudar as famílias a entender os riscos associados, as opções de rastreamento e as estratégias de manejo disponíveis (AYALA, 2023).
Testes genéticos para a identificação de mutações no STK11 são recomendados para indivíduos com suspeita de SPJ e seus familiares, permitindo o diagnóstico precoce e a implementação de medidas preventivas. Isso é particularmente importante dado o risco elevado de malignidades associadas à síndrome. Além disso, a informação genética pode orientar decisões sobre a vigilância endoscópica e outras intervenções preventivas (STRADIOTTI; DE ALBUQUERQUE; DE CASTRO, 2020).
3 MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E DIAGNÓSTICO DA SÍNDROME
Os pólipos hamartomatosos são a característica definidora da SPJ e podem ocorrer ao longo de todo o trato gastrointestinal, incluindo o intestino delgado, cólon, reto, estômago e, em alguns casos, o esôfago (SALOMÃO et al., 2022). O intestino delgado é a localização mais comum, com pólipos geralmente encontrados no jejuno e íleo. Embora sejam benignos por natureza, esses pólipos podem causar complicações significativas, como obstruções intestinais, intussuscepção e sangramento gastrointestinal. Episódios de dor abdominal, anemia por deficiência de ferro e episódios de obstrução podem ser os primeiros sinais clínicos que levam à investigação e diagnóstico da SPJ (COÊLHO et al., 2021).
A intussuscepção é uma complicação particularmente comum e grave em indivíduos com SPJ, ocorrendo quando um segmento do intestino se invagina dentro de outro, levando a obstrução e potencial isquemia. Esta condição pode ser recorrente e geralmente requer intervenção cirúrgica, especialmente em crianças e jovens adultos (RIBEIRO; LIMA; MARTINS, 2021).
Além dos pólipos gastrointestinais, a hiperpigmentação mucocutânea é uma característica diagnóstica importante da SPJ. Essas manchas pigmentadas são mais frequentemente observadas na mucosa oral, lábios, pele ao redor da boca, dedos das mãos e dos pés, e região perianal (FERREIRA et al., 2022). As manchas são geralmente de cor marrom-escuro ou azul-preto e podem ser confundidas com efélides (sardas). Embora não causem sintomas físicos, essas manchas podem ter implicações psicossociais significativas para os pacientes, afetando sua autoestima e qualidade de vida (ZAMPIERI, 2021).
A SPJ está associada a um risco elevado de desenvolvimento de diversos tipos de câncer, incluindo câncer de cólon, estômago, intestino delgado, pâncreas, mama, ovário, útero, testículo, e pulmão (DE SOUZA MAIA et al., 2024). Estima-se que até 90% dos indivíduos com SPJ desenvolverão alguma forma de malignidade ao longo da vida. O risco de câncer colorretal é particularmente elevado, com uma incidência acumulada de cerca de 39% aos 70 anos de idade. Da mesma forma, o risco de câncer pancreático é substancialmente elevado, com uma incidência estimada de 36% aos 70 anos (MONTENEGRO et al., 2020).
O diagnóstico da SPJ é baseado em critérios clínicos e genéticos. Os critérios clínicos incluem a presença de dois ou mais dos seguintes elementos: múltiplos pólipos hamartomatosos no trato gastrointestinal, hiperpigmentação mucocutânea característica, e histórico familiar de SPJ. A confirmação do diagnóstico pode ser obtida através da identificação de uma mutação no gene STK11 em testes genéticos (SALOMÃO et al., 2022).
A endoscopia digestiva alta e a colonoscopia são ferramentas diagnósticas fundamentais na identificação e remoção de pólipos gastrointestinais em pacientes com SPJ. Esses procedimentos permitem a visualização direta dos pólipos e a realização de biópsias para exame histológico. A cápsula endoscópica é uma técnica não invasiva que pode ser usada para visualizar o intestino delgado, uma região de difícil acesso pelos métodos endoscópicos convencionais (COÊLHO et al., 2021).
A ressonância magnética (RM) e a tomografia computadorizada (TC) são utilizadas para o diagnóstico de complicações, como intussuscepção, e para o rastreamento de malignidades. A enterografia por RM é uma técnica avançada que oferece imagens detalhadas do intestino delgado, auxiliando na identificação de pólipos e outras anomalias (RIBEIRO; LIMA; MARTINS, 2021).
Os testes genéticos para mutações no gene STK11 são recomendados para indivíduos com suspeita de SPJ e seus familiares. A identificação de uma mutação patogênica confirma o diagnóstico e permite o rastreamento de familiares em risco. O teste genético é uma ferramenta crucial para o aconselhamento genético, ajudando as famílias a entenderem os riscos e as opções de manejo disponíveis (FERREIRA et al., 2022).
O manejo da SPJ envolve vigilância regular e intervenção para prevenir complicações e detectar malignidades precocemente. Recomenda-se a realização de colonoscopias regulares a partir dos 8 a 10 anos de idade, com intervalos de tempo determinados pelo número e tamanho dos pólipos encontrados (DE SOUZA MAIA et al., 2024). Além disso, exames de imagem regulares, como RM e TC, são usados para monitorar o desenvolvimento de cânceres extraintestinais.
A remoção endoscópica de pólipos é recomendada para prevenir obstruções intestinais e reduzir o risco de intussuscepção. Em casos de pólipos de grandes dimensões ou intussuscepção recorrente, pode ser necessário realizar cirurgia para ressecção segmentar do intestino afetado (MONTENEGRO et al., 2020).
O aconselhamento genético é uma parte essencial do manejo da SPJ, dado o padrão de herança autossômico dominante da síndrome. Os pacientes e suas famílias devem ser informados sobre os riscos associados à SPJ, incluindo o risco aumentado de malignidades, e as opções de vigilância disponíveis. Testes preditivos para familiares em risco permitem a identificação precoce e a implementação de estratégias de prevenção (ZAMPIERI, 2021).
As implicações psicossociais da SPJ, particularmente em relação à hiperpigmentação mucocutânea, não devem ser subestimadas. A presença de manchas pigmentadas visíveis pode impactar a autoestima e a qualidade de vida dos pacientes, especialmente em adolescentes e jovens adultos. Intervenções, como o uso de laser para clareamento das manchas, podem ser consideradas para melhorar a qualidade de vida dos pacientes (FERREIRA et al., 2022).
4 ABORDAGEM TERAPÊUTICA E PROGNÓSTICO
Os pólipos hamartomatosos, característicos da SPJ, exigem monitoramento e remoção para prevenir complicações como obstrução intestinal, intussuscepção e sangramento gastrointestinal. A polipectomia endoscópica é a abordagem padrão para a remoção de pólipos acessíveis, especialmente no estômago, cólon e intestino delgado (DE SOUZA MAIA et al., 2024). Este procedimento não apenas alivia sintomas, mas também reduz o risco de malignização dos pólipos. A tecnologia endoscópica avançada, como a polipectomia assistida por balão e a enteroscopia de duplo balão, permite o acesso a regiões mais difíceis do intestino delgado, facilitando a remoção de pólipos (COÊLHO et al., 2021).
Em casos de intussuscepção recorrente ou pólipos de grandes dimensões, pode ser necessário realizar uma cirurgia abdominal para ressecção segmentar do intestino. Embora a cirurgia seja invasiva, ela é frequentemente justificada quando os riscos associados aos pólipos não podem ser geridos de outra forma. A decisão de operar deve ser cuidadosamente considerada, levando em conta os benefícios e os riscos potenciais da intervenção (RIBEIRO; LIMA; MARTINS, 2021).
A SPJ está associada a um risco elevado de desenvolver várias formas de câncer, incluindo câncer de cólon, estômago, intestino delgado, pâncreas, mama, ovário, útero e pulmão (FERREIRA et al., 2022). Portanto, a vigilância regular é crucial para a detecção precoce de malignidades e intervenção em estágios iniciais, quando o tratamento é mais eficaz. As diretrizes recomendam colonoscopias regulares, começando na adolescência e continuando em intervalos apropriados, com base nos achados individuais e no histórico familiar (SALOMÃO et al., 2022).
Além da colonoscopia, a vigilância para outros tipos de cânceres requer exames de imagem e exames físicos regulares. A ressonância magnética (RM) e a tomografia computadorizada (TC) são ferramentas úteis para a avaliação do câncer pancreático, e a mamografia e a ressonância magnética são recomendadas para a detecção precoce do câncer de mama. O rastreamento do câncer de ovário pode incluir ultrassonografia transvaginal e dosagem do marcador CA-125 (ZAMPIERI, 2021).
As manifestações físicas da SPJ, particularmente a hiperpigmentação mucocutânea, podem ter impactos psicossociais significativos. Pacientes, especialmente adolescentes e jovens adultos, podem enfrentar desafios emocionais e sociais devido à aparência das manchas pigmentadas. Terapias com laser, como o uso de laser Q-Switched, podem ser eficazes na redução dessas manchas, melhorando a qualidade de vida e a autoestima dos pacientes (STRADIOTTI; DE ALBUQUERQUE; DE CASTRO, 2020). Além disso, o suporte psicológico é fundamental para ajudar os pacientes a lidar com o estresse e a ansiedade associados à síndrome e às suas complicações.
O aconselhamento genético desempenha um papel essencial na gestão da SPJ, dado seu padrão de herança autossômico dominante. Este aconselhamento ajuda os pacientes e suas famílias a compreenderem os riscos associados à síndrome, as opções de vigilância e tratamento disponíveis e as implicações para os familiares que possam estar em risco de herdar a mutação no gene STK11 (DE ANDRADE et al., 2023). Testes genéticos preditivos podem ser oferecidos aos membros da família para identificar aqueles que portam a mutação, permitindo um acompanhamento clínico precoce e a implementação de medidas preventivas adequadas.
O planejamento familiar também deve ser discutido com pacientes em idade reprodutiva, considerando a possibilidade de transmitir a mutação para os descendentes. Tecnologias de reprodução assistida, como a fertilização in vitro com diagnóstico genético pré-implantacional, podem ser opções para aqueles que desejam evitar a transmissão da síndrome para a próxima geração (MONTENEGRO et al., 2020).
O prognóstico de pacientes com SPJ é influenciado por múltiplos fatores, incluindo a eficácia da vigilância e do tratamento, a adesão ao seguimento médico e a presença de complicações. Com vigilância e intervenção adequadas, muitos dos riscos associados à síndrome podem ser geridos de forma eficaz. No entanto, o risco aumentado de malignidades persiste ao longo da vida, exigindo um acompanhamento contínuo (RIBEIRO; LIMA; MARTINS, 2021).
A detecção precoce de cânceres associados à SPJ melhora significativamente o prognóstico, aumentando as chances de sucesso do tratamento e a sobrevida a longo prazo. A colaboração multidisciplinar entre gastroenterologistas, oncologistas, geneticistas e psicólogos é essencial para fornecer um cuidado abrangente que aborda todos os aspectos da síndrome (AYALA, 2023).
A abordagem terapêutica da síndrome de Peutz-Jeghers requer um manejo integrado que combine a remoção de pólipos gastrointestinais, a vigilância regular para a detecção precoce de cânceres e intervenções que abordem os impactos psicossociais da síndrome. O aconselhamento genético é uma ferramenta valiosa para informar os pacientes e suas famílias sobre os riscos associados à SPJ e as opções de prevenção disponíveis. Com um acompanhamento clínico rigoroso e estratégias de manejo eficazes, é possível melhorar o prognóstico e a qualidade de vida dos pacientes com SPJ. O contínuo avanço na compreensão dos mecanismos genéticos e moleculares da síndrome poderá, no futuro, oferecer novas oportunidades para intervenções terapêuticas mais específicas e eficazes (FERREIRA et al., 2022).
5 METODOLOGIA
Este estudo trata-se de uma revisão de literatura narrativa, cujo objetivo é sintetizar e analisar as evidências existentes sobre a polipose intestinal na síndrome de Peutz-Jeghers. A escolha pela revisão narrativa se deve ao fato de que ela permite fornecer uma visão abrangente das manifestações clínicas, abordagens diagnósticas, terapêuticas e prognósticas associadas à síndrome.
A busca bibliográfica foi realizada nas bases de dados eletrônicas PubMed, Scopus e Web of Science, abrangendo o período de 2015 a 2024. As palavras-chave utilizadas nas buscas incluíram “síndrome de Peutz-Jeghers”, “polipose intestinal”, “diagnóstico”, “tratamento”, “prognóstico”, “genética” e “câncer associado”, incluindo seus equivalentes em inglês. Os operadores booleanos foram empregados para combinar termos e otimizar os resultados das buscas.
Os critérios de inclusão para a seleção dos artigos foram: artigos publicados em inglês, espanhol ou português; estudos originais, revisões de literatura e relatos de caso relacionados à síndrome de Peutz-Jeghers; estudos que abordam aspectos clínicos, diagnósticos, terapêuticos ou prognósticos da síndrome. Os critérios de exclusão incluíram: artigos que não estavam disponíveis em texto completo; estudos publicados antes de 2015; artigos que não estavam diretamente relacionados ao tema central da revisão, como aqueles focados exclusivamente em síndromes genéticas não relacionadas ou em populações pediátricas sem enfoque na SPJ.
A seleção dos artigos foi realizada em duas etapas. Primeiro, foram analisados os títulos e resumos dos artigos identificados nas buscas para verificar sua relevância em relação aos critérios de inclusão. Em seguida, os artigos selecionados foram lidos na íntegra para confirmar sua adequação e extrair dados relevantes. Os dados extraídos incluíram informações sobre o desenho do estudo, características da amostra, intervenções realizadas, principais achados e conclusões dos autores. As informações foram organizadas em uma tabela para facilitar a comparação e a análise.
Os dados coletados foram analisados qualitativamente. Os principais temas e tendências identificados nos estudos foram agrupados em categorias, como manifestações clínicas, métodos diagnósticos, abordagens terapêuticas e prognóstico. A análise qualitativa permitiu a identificação de padrões e lacunas no conhecimento atual, além de destacar áreas para futuras pesquisas.
Considerando que este estudo se baseia exclusivamente na revisão de literatura existente, não foi necessária a aprovação de um comitê de ética em pesquisa. Todas as fontes utilizadas estão devidamente referenciadas, respeitando os direitos autorais e a integridade acadêmica.
6 DISCUSSÃO
A compreensão dos aspectos genéticos da SPJ tem avançado significativamente, mas ainda existem discordâncias sobre a melhor abordagem para o manejo das mutações no gene STK11. De Souza Maia et al. (2024) enfatizam a importância do diagnóstico genético precoce para orientar o manejo clínico e a vigilância, argumentando que a identificação de mutações no STK11 permite intervenções personalizadas que podem melhorar o prognóstico a longo prazo. Em contraste, Montenegro et al. (2020) sugerem que, embora os testes genéticos sejam úteis, eles não substituem a necessidade de um acompanhamento clínico rigoroso, dado que nem todas as mutações no STK11 resultam em um fenótipo grave.
Além disso, o papel das vias de sinalização celular, como a via AMPK e mTOR, na patogênese da SPJ continua sendo um tema de investigação ativa. Salomão et al. (2022) defendem que terapias direcionadas que modulam essas vias podem oferecer novas oportunidades terapêuticas para pacientes com SPJ, especialmente em termos de prevenção do crescimento descontrolado de pólipos. Por outro lado, Coêlho et al. (2021) argumentam que o desenvolvimento de tais terapias ainda está em estágios iniciais, e mais pesquisas são necessárias para validar sua eficácia e segurança em populações clínicas.
A diversidade de manifestações clínicas da SPJ é um ponto de discórdia entre os pesquisadores, particularmente em relação à apresentação e manejo dos pólipos gastrointestinais. Ribeiro, Lima e Martins (2021) destacam que a presença de múltiplos pólipos em locais variados ao longo do trato gastrointestinal requer uma abordagem de diagnóstico abrangente, que inclui endoscopia e exames de imagem avançados. Eles propõem que a cápsula endoscópica, embora não invasiva, é limitada na sua capacidade de intervenção terapêutica, devendo ser complementada por técnicas endoscópicas tradicionais para a remoção de pólipos.
Em contraste, Ferreira et al. (2022) questionam a eficácia da cápsula endoscópica como método diagnóstico de primeira linha, especialmente em regiões onde o acesso à tecnologia avançada é limitado. Eles argumentam que, embora a cápsula endoscópica possa ser útil na identificação de pólipos em locais de difícil acesso, a colonoscopia e a enteroscopia de duplo balão continuam sendo as ferramentas mais eficazes para a remoção de pólipos e prevenção de complicações, como a intussuscepção.
A hiperpigmentação mucocutânea, uma característica diagnóstica chave da SPJ, também gera debates quanto ao seu impacto psicológico e à necessidade de tratamento estético. Zampieri (2021) afirma que o tratamento das manchas pigmentadas com laser pode melhorar significativamente a qualidade de vida dos pacientes, especialmente em adolescentes. No entanto, Stradiotti, de Albuquerque e de Castro (2020) alertam para os riscos associados a procedimentos estéticos, como hipopigmentação e cicatrização inadequada, sugerindo que o suporte psicológico deve ser priorizado sobre intervenções estéticas invasivas.
A abordagem terapêutica para a SPJ é multifacetada, envolvendo a remoção de pólipos, vigilância regular para detecção de cânceres e manejo de complicações. De Andrade et al. (2023) defendem que a remoção endoscópica de pólipos é essencial para prevenir complicações e que avanços nas técnicas endoscópicas têm melhorado a eficácia e a segurança desses procedimentos. Eles destacam a polipectomia assistida por balão como uma inovação importante para o manejo de pólipos em regiões de difícil acesso.
Por outro lado, Ayala (2023) argumenta que, embora a polipectomia endoscópica seja eficaz, a cirurgia abdominal ainda é necessária em casos de pólipos grandes ou complicações como intussuscepção recorrente. A decisão entre intervenção endoscópica e cirúrgica deve ser baseada em uma avaliação cuidadosa dos riscos e benefícios, considerando a preferência do paciente e a experiência do cirurgião.
A vigilância para detecção de cânceres associados à SPJ é outro aspecto crítico do manejo. De Souza Maia et al. (2024) enfatizam a importância de diretrizes claras para o rastreamento de câncer, incluindo a frequência de exames e a idade de início. Eles argumentam que a adesão a essas diretrizes pode reduzir significativamente a mortalidade associada à SPJ. Em contraste, Montenegro et al. (2020) observam que as diretrizes de vigilância podem não ser aplicáveis universalmente, dado o acesso variável aos cuidados de saúde em diferentes regiões. Eles sugerem que abordagens individualizadas, baseadas em fatores de risco específicos do paciente, podem ser mais eficazes.
O prognóstico para pacientes com SPJ é influenciado por múltiplos fatores, incluindo a eficácia do manejo clínico e o risco de malignidades. Salomão et al. (2022) afirmam que, com vigilância e tratamento adequados, muitos dos riscos associados à SPJ podem ser mitigados, permitindo que os pacientes tenham uma expectativa de vida próxima à da população geral. No entanto, Coêlho et al. (2021) apontam que a incerteza sobre o risco de cânceres extraintestinais continua a ser um desafio significativo, exigindo monitoramento contínuo e suporte psicológico para os pacientes.
A qualidade de vida dos pacientes com SPJ é outro tema de debate. Ribeiro, Lima e Martins (2021) destacam que a gestão dos impactos psicossociais, como a ansiedade relacionada ao risco de câncer e o estigma social associado às manchas pigmentadas, é essencial para um cuidado holístico. Eles sugerem que intervenções psicológicas, como terapia cognitivo-comportamental, podem ajudar os pacientes a lidar com o estresse e a melhorar sua qualidade de vida.
Em contraste, Ferreira et al. (2022) questionam a eficácia das intervenções psicológicas isoladas, argumentando que um modelo de cuidado integrado que combine apoio psicológico com monitoramento médico regular é mais eficaz. Eles defendem que a educação do paciente e a comunicação aberta com a equipe médica são fundamentais para capacitar os pacientes e promover uma abordagem proativa ao manejo de sua saúde.
Os avanços no entendimento genético e molecular da SPJ têm implicações significativas para o desenvolvimento de novas terapias. Zampieri (2021) propõe que a pesquisa futura deve focar em intervenções que modulam as vias de sinalização celular afetadas, como a AMPK e mTOR, para desenvolver terapias direcionadas que possam inibir o crescimento de pólipos e prevenir malignidades. Por outro lado, Stradiotti, de Albuquerque e de Castro (2020) alertam para os desafios éticos e práticos de implementar essas terapias em larga escala, especialmente em regiões com recursos limitados.
Além disso, o aconselhamento genético e o planejamento familiar continuarão a desempenhar um papel crucial no manejo da SPJ. De Andrade et al. (2023) enfatizam a importância de integrar o aconselhamento genético na prática clínica rotineira, permitindo que os pacientes façam escolhas informadas sobre reprodução e rastreamento genético. Ayala (2023), no entanto, alerta para a necessidade de considerar as implicações éticas do uso de tecnologias de reprodução assistida e diagnóstico genético pré-implantacional, destacando a importância de diretrizes claras para proteger os direitos e a autonomia dos pacientes.
7 CONCLUSÃO
A síndrome de Peutz-Jeghers (SPJ) é uma condição genética rara, mas com implicações clínicas significativas devido à presença de pólipos hamartomatosos no trato gastrointestinal e ao risco elevado de malignidades associadas. Esta revisão abordou os aspectos clínicos, diagnósticos e terapêuticos da SPJ, destacando a importância de um manejo abrangente e multidisciplinar para melhorar o prognóstico dos pacientes.
Os avanços no entendimento dos aspectos genéticos e moleculares da SPJ, especialmente em relação ao gene STK11, têm permitido um diagnóstico mais preciso e o desenvolvimento de estratégias de vigilância personalizadas. A identificação precoce de mutações genéticas é crucial para o manejo eficaz da síndrome, permitindo intervenções que podem reduzir significativamente o risco de complicações graves.
O manejo dos pólipos gastrointestinais continua a ser um desafio central no tratamento da SPJ. A remoção endoscópica dos pólipos, embora eficaz, exige vigilância contínua para prevenir complicações como obstrução intestinal e intussuscepção. O uso de tecnologias endoscópicas avançadas, como a polipectomia assistida por balão, tem melhorado a segurança e a eficácia desses procedimentos, oferecendo melhores resultados para os pacientes.
A vigilância para a detecção precoce de cânceres associados à SPJ é essencial, dada a alta incidência de malignidades ao longo da vida dos pacientes. Diretrizes de rastreamento baseadas em fatores de risco individuais podem melhorar a eficácia da vigilância e reduzir a mortalidade associada. No entanto, o acesso a cuidados de saúde adequados e a adesão ao seguimento clínico continuam a ser desafios em diversas regiões.
Os impactos psicossociais da SPJ, particularmente em relação à hiperpigmentação mucocutânea, não devem ser subestimados. O suporte psicológico e intervenções estéticas, quando apropriadas, são componentes importantes do manejo holístico da síndrome, melhorando a qualidade de vida e o bem-estar emocional dos pacientes.
Apesar dos avanços, ainda existem lacunas significativas no conhecimento sobre a SPJ, especialmente em relação ao desenvolvimento de terapias direcionadas que modulam as vias de sinalização celular afetadas. A pesquisa futura deve focar em estratégias que possam não apenas gerenciar os sintomas, mas também modificar o curso natural da doença, prevenindo a progressão para malignidades.
Em conclusão, a síndrome de Peutz-Jeghers requer uma abordagem integrada que combine monitoramento clínico rigoroso, intervenções terapêuticas eficazes e suporte psicossocial abrangente. A colaboração contínua entre pesquisadores, clínicos e pacientes é fundamental para melhorar os resultados e a qualidade de vida dos indivíduos afetados. Com o avanço contínuo da pesquisa e o desenvolvimento de novas intervenções, há esperança de que estratégias de manejo mais eficazes possam emergir, oferecendo um futuro mais promissor para aqueles que vivem com esta condição desafiadora.
REFERÊNCIAS
AYALA, Fernanda Rocha Rojas. Síndromes de câncer colorretal hereditário (SCCH) no serviço de oncogenética do Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas. 2023. Tese (Doutorado) — Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2023.
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