REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202508141524
Eduardo José Guerra Seabra1
Juliana Carvalho Sá2
Maerli Maria da Silva Dantas Costa3
Hadrielle Vanessa dos Santos Araújo4
Jeferson Garcia de Araújo5
RESUMO
Introdução: A abordagem do paciente odontológico envolve o plano de tratamento integrado. É uma ferramenta que objetiva a organização de uma sequência lógica, integrada e individualizada de procedimentos por ordem de prioridade, de acordo com suas necessidades clínicas. Objetivo: Analisar a aplicabilidade da confecção do plano de tratamento odontológico integrado na atenção básica de saúde bucal em municípios da 4ª Região de Saúde do Seridó do Rio Grande do Norte. Metodologia: Estudo de natureza quantitativa descritiva observacional, do tipo exploratório, realizado através de formulário encaminhado para cirurgiões dentistas atuantes na Atenção Básica de Saúde Bucal dos municípios da 4ª Região de Saúde. Resultados: A amostra da pesquisa foi representada por 35 cirurgiões-dentistas atuantes na ESF nos municípios da 4ª Região de Saúde. Os procedimentos básicos mais realizados são radiografias, juntamente com exames complementares. Em relação a prática cotidiana do plano de tratamento odontológico integrado em saúde bucal na Estratégia de Saúde Família, foi encontrado que 20% realizam sempre, 14% não realizam, 17% realizam poucas vezes e 49% relatam realizar na maioria das vezes. Conclusões: Com esse estudo foi possível concluir que o plano de tratamento odontológico não é realizado em todas as unidades de estratégia de saúde da família, porém esse cenário vem apresentando mudanças positivas com o decorrer dos anos, devido às novas filosofia de ensino na formação dos cirurgiões dentistas voltadas para o tratamento integrado, promovendo a saúde integral do paciente, transmissão de conhecimentos a sociedade em relação a prevenção e a implementação do PEP que facilita o controle dos procedimentos realizados, como também a identificação do tratamento ainda a ser realizado.
Palavras-Chave: ESF, Plano de Tratamento, Saúde Bucal.
ABSTRACT
Introduction: The approach to dental patients involves an integrated treatment plan. It is a tool aimed at organizing a logical, integrated, and individualized sequence of procedures based on priority, according to the patient’s clinical needs. Objective: To analyze the applicability of creating an integrated dental treatment plan in primary oral health care in municipalities of the 4th Health Region of Seridó, in the state of Rio Grande do Norte, Brazil. Methodology: This is a descriptive, observational, and exploratory study with a quantitative approach, conducted through a form sent to dentists working in Primary Oral Health Care in municipalities of the 4th Health Region. Results: The research sample consisted of 35 dentists working in the Family Health Strategy (FHS) in the municipalities of the 4th Health Region. The most commonly performed basic procedures are radiographs, along with complementary exams. Regarding the routine practice of the integrated dental treatment plan within the Family Health Strategy, it was found that 20% always implement it, 14% do not implement it, 17% rarely do, and 49% report implementing it most of the time. Conclusions: This study showed that the integrated dental treatment plan is not carried out in all family health strategy units. However, this scenario has shown positive changes over the years, due to new teaching philosophies in dental education focused on integrated treatment, promoting comprehensive patient care, spreading knowledge to society regarding prevention, and implementing electronic dental records (EDRs), which facilitate control of performed procedures as well as identification of treatments yet to be carried out.
Keywords: FHS, Treatment Plan, Oral Health.
Introdução
O Sistema Único de Saúde (SUS), instituído pela Constituição de 1988, garante a saúde como um direito universal e dever do Estado, assegurando acesso equitativo à promoção, prevenção e recuperação da saúde¹. A construção dos princípios do SUS evidenciou a necessidade de superar o modelo biomédico hegemônico, centrado na cura das doenças e negligente quanto à integralidade do paciente, incluindo fatores biológicos, psicológicos e sociais. Nesse contexto, surgiu a Estratégia de Saúde da Família (ESF), anteriormente chamada de Programa de Saúde da Família, como uma abordagem mais humanizada, que considera as condições de vida e o entorno dos pacientes².
Concebida para reestruturar a atenção básica, a ESF oferece serviços integrais de promoção e prevenção à saúde, funcionando como a porta de entrada para o sistema público de saúde no Brasil. Ao proporcionar uma assistência próxima às famílias e focar nos determinantes do processo saúde-doença, busca superar as limitações do modelo biomédico, priorizando a resolução de problemas e promovendo melhorias na qualidade de vida da população, apesar dos desafios enfrentados em sua implementação ² ³.
O serviço odontológico no SUS deve garantir um cuidado integral, conforme estabelecido nas “Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal” . A abordagem intersetorial permite identificar e controlar os principais agravos em saúde bucal, promovendo intervenções direcionadas ⁴.
Historicamente, a Odontologia no SUS operava de forma isolada, mas avanços na integração entre serviços trouxeram melhorias nos diagnósticos e tratamentos⁵. Essa integração é essencial para aumentar a eficácia das intervenções e assegurar um atendimento mais preciso.
O plano de tratamento odontológico deve priorizar os procedimentos conforme a necessidade clínica do paciente. Essa organização facilita a eliminação e o controle das doenças bucais, além de preservar dentes e tecidos orais. Também orienta o paciente sobre cuidados e possíveis intercorrências durante o tratamento⁶.
O Cirurgião-Dentista no SUS deve ter uma visão ampla da Odontologia, considerando o paciente de forma integral. Além de proporcionar tratamentos duradouros e eficazes, é necessário garantir a recuperação da estética, função e fonética, restabelecendo a saúde bucal e geral do indivíduo⁷.
Para aprimorar a saúde bucal da população e avaliar a aplicação do plano de tratamento odontológico, foi enviado um formulário aos Cirurgiões-Dentistas (CD) de cada município da 4ª Região de Saúde. O objetivo foi verificar se o plano de tratamento em Saúde Bucal é adotado como rotina nos atendimentos odontológicos do SUS. Assim, o trabalho visou analisar a aplicabilidade da confecção do plano de tratamento odontológico integrado na atenção básica à saúde bucal nos municípios da 4ª Região de Saúde.
Metodologia
CONSIDERAÇÕES ÉTICAS
O projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da UERN. Foram seguidas as normas e diretrizes conforme a resolução 466/2012 sobre pesquisa realizada com seres humanos e em conformidade com o Ofício Circular 2/2021 para procedimentos em pesquisas com qualquer etapa em ambiente virtual. Posteriormente a explicação dos detalhes da pesquisa feita pelos pesquisadores, os cirurgiões-dentistas que concordaram em participar da pesquisa, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), depois de sanadas possíveis dúvidas, garantindo plena compressão. Os participantes tiveram autonomia para desistir da mesma, em qualquer fase.
NATUREZA DO ESTUDO
Estudo de natureza quantitativa descritiva observacional, do tipo exploratório, realizado através de formulário encaminhado para cirurgiões dentistas atuantes na Atenção Básica de Saúde Bucal dos municípios da 4ª Região de Saúde.
POPULAÇÃO
A população foi composta por todos os cirurgiões-dentistas atuantes na Atenção Básica em Saúde Bucal dos municípios da 4ª Região de Saúde.
CRITÉRIOS DE INCLUSÃO
Cirurgiões dentistas atuantes na Atenção Básica em Saúde Bucal dos municípios da 4ª Região de Saúde.
CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO
Cirurgiões-dentistas que estavam em período de férias ou licença durante a coleta de dados da pesquisa.
Cirurgiões-dentistas que recusaram a assinatura do TCLE para participação na pesquisa.
COLETA DE DADOS
Inicialmente, houve o contato com a CIR através de ligação telefônica e/ou endereço eletrônico, para requerer uma pauta na Reunião Ordinária da CIR da 4ª Região de Saúde, solicitando ao colegiado a emissão da Carta de Anuência que autoriza e apoia a realização da pesquisa e em seguida, a obtenção do endereço eletrônico dos cirurgiões-dentistas atuantes na Atenção Básica em Saúde Bucal dos municípios correspondentes a mesma.
Antecedendo o envio dos formulários, ocorreu um contato prévio com os cirurgiões dentistas através do endereço eletrônico, para explicar a finalidade da pesquisa, sanar possíveis dúvidas e recolher a assinatura do TCLE.
Por conseguinte, a coleta de dados foi realizada através de Formulário encaminhado para o endereço eletrônico de cada cirurgião-dentista atuante na Atenção Básica em Saúde Bucal dos municípios da 4ª Região de Saúde.
FORMULÁRIO
Elaborado através do Aplicativo “Google Forms”, utilizado para gerenciar pesquisas e coletar informações. Foi composto por nove perguntas objetivas e subjetivas, que seguiram uma linha de raciocínio como na representação esquemática em forma de fluxograma (Imagem 1).
A ideia central do formulário foi o plano de tratamento clínico odontológico e a partir do mesmo foram interligadas outras questões, para identificar se a presença de aplicabilidade na rotina dos atendimentos e quais critérios poderiam facilitar ou dificultar sua realização. Especificou-se concomitantemente informações relacionadas a tempo de formação e especialidades na área odontológica dos entrevistados.
Dessa forma, alguns procedimentos básicos para realização do plano de tratamento clínico odontológico, foram listados no formulário, onde o cirurgião-dentista assinalou se realizava-se ou não, correlatando se sua conduta era influenciada pela estrutura ou filosofia do local de trabalho. Como também especificar quais os procedimentos odontológicos mais realizados nos 2 (dois) últimos meses: urgência, prevenção ou tratamento.
Imagem 1: Fluxograma demonstrativo da relação entre os questionamentos do formulário.
RISCOS E BENEFÍCIOS
A pesquisa apresentava potencial risco de constrangimento durante o preenchimento do formulário, devido a questões pessoais relacionadas à prática clínica do cirurgião-dentista. Para assegurar a confidencialidade e o respeito aos participantes, a aplicação do formulário foi conduzida exclusivamente por uma pesquisadora, e apenas ela e o pesquisador responsável tiveram acesso ao manuseio e armazenamento seguro dos documentos. Ademais, somente a pesquisadora envolvida no projeto teve acesso aos nomes dos respondentes. Destaca-se que o objetivo do estudo foi contribuir para uma análise geral da realidade investigada, sem identificar ou expor indivíduos específicos como praticantes de ações corretas ou incorretas.
O principal benefício foi aprimorar os atendimentos odontológicos na Atenção Básica, promovendo a conscientização de cada participante sobre a relevância do plano de tratamento clínico integral como ferramenta fundamental para a promoção da saúde bucal, alinhada aos princípios do SUS. O objetivo incluiu a melhoria da qualidade dos serviços prestados, com foco em atender às necessidades da população e promover a saúde de maneira abrangente. Além disso, buscou-se desenvolver um documento que orientasse gestores financeiros a otimizar a distribuição dos recursos públicos, garantindo maior eficiência no uso desses recursos.
Outro benefício foi o fato da equipe executora desta pesquisa se comprometer a dar consultoria sobre planejamento clínico odontológico às equipes de saúde bucal da 4ª Região de Saúde, através de oficinas de capacitação e consultoria técnica sobre possíveis ajustes nas condições de trabalho e de atendimento clínico, colaborando no aperfeiçoamento de habilidades e consequente aplicabilidade dos conhecimentos teóricos na prática, com estratégias que possibilitem a adequada execução desta etapa clínica na atenção em saúde bucal, que deve ser passada por cada indivíduo assistido.
ANÁLISE ESTATÍSTICA
As informações coletadas foram tabuladas no Excel e representadas em gráficos no Word para análise estatística, permitindo identificar a porcentagem de realização do Plano de Tratamento Odontológico Integrado e os procedimentos mais frequentes na Atenção Básica da 4ª Região de Saúde.
A pesquisa em si, trouxe caráter dicotômico nas informações principais. O profissional realizava ou não, o plano de tratamento para cada paciente. Portanto, os dados foram tabulados de maneira simples: percentuais e proporções. Onde as inferências foram para orientação da 4ª Região de Saúde, bem como a cada equipe de saúde bucal.
Resultados
A amostra da pesquisa foi composta por 35 cirurgiões-dentistas que atuam na Estratégia de Saúde da Família (ESF) em municípios da 4ª Região de Saúde. Quanto ao tempo de formação, 51,4% dos profissionais concluíram sua graduação há, no máximo, 5 anos; 25,7% têm entre 6 e 15 anos de formados; e apenas 22,9% possuem mais de 16 anos desde a formação.
As especialidades odontológicas mais predominantes entre os profissionais entrevistados foram ortodontia, cirurgia oral, saúde da família e prótese dentária. Além disso, também foram identificadas especialização em odontopediatria, odontologia legal, implantodontia, endodontia, dentística e harmonização orofacial.
Os procedimentos básicos realizados para auxiliar e compor o plano de tratamento odontológico estão diretamente ligados a resolutividade dos casos, como também o tratamento adequado, a necessidade de cada paciente. Através da figura 1, é possível identificar a frequência, prevalência e ausência desses procedimentos.
Figura 1. Procedimentos básicos realizados no plano de tratamento odontológico. Caicó-RN, 2024.
Os procedimentos básicos mais frequentemente realizados incluem radiografias, acompanhadas de exames complementares. Por outro lado, fotografias e moldagens não foram apontadas como práticas de rotina pelos entrevistados. Além disso, 20% dos profissionais relataram que nenhum desses procedimentos básicos é realizado. A principal justificativa para essa limitação foi atribuída à estrutura inadequada da unidade, representando 90% dos casos, enquanto 10% atribuíram à filosofia do local de trabalho.
Em relação à prática cotidiana do plano de tratamento odontológico integrado em saúde bucal na Estratégia de Saúde Família, nas quais os cirurgiões dentistas entrevistados atuam, enfoque principal da nossa pesquisa, obtivemos presença e ausência da prática, como vemos na figura 2.
Figura 2. Frequência de realização do plano de tratamento em saúde bucal na rotina dos atendimentos. Caicó-RN, 2024.
Dos profissionais que consideraram não ser rotina nos seus atendimentos o plano de tratamento odontológico em saúde bucal, 77,8% indicaram a filosofia do local de trabalho como sendo o motivo principal para a não realização e 22,2% afirmam que a estrutura da unidade dificulta essa prática.
Em relação aos procedimentos mais realizados pelos cirurgiões-dentistas nas unidades em que atuam, destacou-se a alta frequência de restaurações, com 68,6%. A raspagem periodontal foi realizada por 22,9% dos profissionais, enquanto a profilaxia correspondeu a 5,7% e a exodontia a 2,9%. Endodontia e atendimentos de urgência não foram considerados parte da rotina dos atendimentos, conforme ilustrado no figura 3.
Figura 3: Procedimentos mais realizados pelos cirurgiões dentistas entrevistados, nos últimos 2 meses. Caicó-RN, 2024.
Discussão
De modelo mutilador a modelo curativista.
O primeiro diagnóstico de saúde bucal é realizado pelo clínico geral, seu conhecimento irá impactar diretamente no plano de tratamento, como também na saúde do sistema estomatognático do paciente⁸. Por muito tempo a saúde bucal esteve totalmente dependente das políticas públicas de saúde, a população tinha escasso acesso aos atendimentos odontológicos, acarretando em procura apenas em situações extremas de urgência, que acabavam por resultar em exodontias⁹, característico do modelo mutilador.
As perdas dentárias e consequente demanda de pessoas com ausências dentárias, necessitando de restabelecimento da função, estética e fonética, pode ter influenciado os CD a buscar pós-graduações em prótese dentária na 4ª região de saúde reflexo do impacto contínuo do período de mutilação na população. As próteses não apenas restauram funções estéticas, mastigatórias e fonéticas, mas também melhoram a autoestima, as relações interpessoais e a saúde mental, reduzindo a ansiedade associada à perda dentária¹⁰.
O modelo biomédico curativista é visto como a ausência da doença. Caracteriza-se por considerar a etiologia da doença unicausal, recuperação, reabilitação, técnica e especialidades. Assim, o objetivo acaba sendo combater o agente etiológico¹¹. Atualmente o SUS, apresenta característica de alguns modelos. Os resultados do presente estudo, assemelham-se às características presentes no modelo biomédico curativista. Consegue-se, identificar que apesar da grande presença da doença cárie na população, o plano de tratamento direciona sua conduta clínica para tratamentos restauradores, preventivos e promotores de saúde.
Durante a etapa da análise dos dados, foi possível identificar que a porcentagem de 51,4% dos entrevistados estão formados a menos de 5 anos, o que reflete a conduta clínica repassada para os alunos atualmente, ligado ao olhar mais específico de cada caso em particular, aplicando o plano de tratamento integrado em saúde bucal. Outra característica que se assemelha no estudo ao que foi dito pelos autores, foi o baixo índice de exodontias realizadas nos pacientes, que esteve presente em apenas 2,9% dos entrevistados.
Com mais de 20 anos passados da aprovação das diretrizes curriculares nacionais para os cursos de Odontologia, esperava-se uma proporção maior de profissionais que realizam plano de tratamento como rotina, neste estudo.
Procedimentos realizados e doenças mais prevalentes: cárie e doença periodontal.
Diante dos resultados obtidos os procedimentos mais realizados nos últimos 2 meses foi restauração. A doença cárie é a mais prevalente no mundo, sendo biofilme dependente, não infeccioso, não transmissível e diretamente influenciada pela elevada ingestão de açúcar, como também higiene bucal deficiente⁴. A Organização Mundial da Saúde (OMS), desenvolveu o índice de CPOD (dentes cariados, perdidos e obturados) em consequência da cárie. Através desse índice é possível identificar que a frequência de dentes perdidos em decorrência da cárie vem diminuindo ao longo dos anos ¹². O procedimento de restauração é realizado em lesões não-cariosas, mas principalmente em lesões decorrentes da doença cárie. Os resultados mostraram que ainda é alta a prevalência da cárie dentária, confirmando o que apresentou nos estudos anteriores dos autores citados.
Estudos demonstraram que a presença de muitos patógenos na cavidade bucal e uma higiene bucal deficiente, são fatores colaboradores no surgimento de doenças sistêmicas¹³. São diversos os estudos que mostram a interferência direta da doença periodontal e suas consequências sistêmicas. A presença de doenças cardiovasculares, diabetes, doenças renais e câncer, que acarreta por vezes, morte prematura do paciente, tem sua ligação significativa com a presença da doença periodontal¹⁴. O procedimento de raspagem periodontal representou 23% dos procedimentos realizados nos últimos meses. Indicando a preocupação dos cirurgiões dentistas em remover o principal fator desencadeador da doença periodontal, o biofilme.
Filosofia do local de trabalho e sua relação com o tratamento odontológico integrado na atenção de saúde bucal.
A produção capitalista acabou por fragmentar a produção do cuidado, em áreas de atuação, onde por vezes os profissionais evitam se adaptar a uma nova filosofia de trabalho, por receio de se sobrecarregarem. A maior efetividade dos planos de tratamento odontológico integrado, irá se intensificar quando a integralidade e a filosofia da equidade, forem priorizadas nos atendimentos a população¹⁵. A precarização das condições de trabalho ofertadas para os CD, acabam por afastar os profissionais, por temerem a não realização profissional diante deste cenário. Muitas vagas, não só na área odontológica, acabam sendo ocupadas através de relações pessoais e políticas, comprometendo o desempenho e compromisso desses profissionais¹⁶. Os resultados do estudo mostram que mais de 50% dos cirurgiões-dentistas entrevistados, em relação ao plano de tratamento odontológico integrado, realizam o registro sobre as necessidades de tratamento que o paciente apresenta, seguindo os princípios de um tratamento reabilitador: Condicionamento do meio bucal, preparo da cavidade bucal, reabilitação dentro do que os municípios dispõe (próteses removíveis totais superior e inferior, prótese parcial removível superior, controle e manutenção de acordo com as necessidades e perfil do paciente). Porém, a filosofia do local de trabalho não favorece a realização do plano de tratamento, em decorrência da alta demanda de pacientes que acabam procurando o serviço na maioria das vezes para resolução de doenças já instaladas, dificultando a realização do plano de tratamento na prática diária. A infraestrutura, na maioria das vezes, não apresenta equipamentos essenciais para realização do plano, como por exemplo, um aparelho de raio-x usado como exame complementar no diagnóstico e planejamento dos casos clínicos.
Os Centros de Especialidades Odontológicas (CEO) ofertam cuidado ambulatorial e especializado, não disponíveis na Atenção Básica. São mantidos com recursos de parcerias entre Governo Federal, Estados e Municípios que estão credenciados⁵. No estudo, cirurgiões-dentistas relataram a dificuldade em proceder o plano de tratamento integrado, devido nem todos os procedimentos serem realizados na unidade de saúde e alguns municípios não serem credenciados a uma unidade de CEO.
O Conselho Regional de Medicina define o Prontuário Eletrônico do Paciente (PEC), como um documento que apresenta informações do histórico de consultas, tratamentos, doenças sistêmicas, agravos e toda assistência prestada no SUS. É sigiloso, legal e científico, facilitando o tratamento multidisciplinar dos pacientes¹⁷. Em detrimento da importância do prontuário odontológico, o profissional deve certificar-se que o preenchimento está sendo correto, podendo ser usados com finalidade jurídica e criminal¹⁸. De acordo com os entrevistados, o PEP otimizou bastante o trabalho do Cirurgião-Dentista na Atenção Básica, sua ferramenta Odontograma, facilitou o planejamento e a criação de estratégias para execução dos tratamentos, mesmo diante de uma elevada demanda de atendimentos.
Sucateamento das estruturas do atendimento odontológico nas unidades básicas de saúde .
Apesar das melhorias voltadas para a saúde bucal, a falta de insumos, materiais restauradores e a manutenção dos equipamentos ainda são questões preocupantes em muitas unidades de saúde no Rio Grande do Norte¹⁶.
Entre os entrevistados que relataram a não realização de radiografias, moldagens, exames complementares e fotografias, a principal razão apontada para essa ausência foi a estrutura inadequada do local de trabalho. Alguns desses procedimentos estão diretamente relacionados ao sucesso do tratamento odontológico, tanto no que diz respeito ao tempo de execução quanto à qualidade dos resultados. Ao utilizá-los de maneira adequada, é possível alcançar melhores resultados nos tratamentos.
Limitações e aspectos positivos.
O projeto em questão enfrentou limitações na adesão dos cirurgiões-dentistas. Muitos relataram a falta de tempo disponível para responder aos questionamentos, enquanto outros se comprometeram a participar, mas acabaram se esquecendo devido à alta demanda de atendimentos e à carga horária excessiva.
Foi possível identificar uma evolução no modelo de atenção em saúde bucal, com a mudança do foco no tratamento de problemas pontuais para a abordagem das causas subjacentes, priorizando a saúde integral do paciente. Além disso, o projeto incentivou os próprios profissionais a refletirem sobre suas condutas clínicas.
Conclusões
O plano de tratamento odontológico não é realizado em todas as unidades de estratégia de saúde da família.
Porém esse cenário mostra tendências de mudanças positivas com o decorrer dos anos, devido às novas filosofia de ensino na formação dos cirurgiões dentistas voltadas para o tratamento integrado, promovendo a saúde integral do paciente, transmissão de conhecimentos a sociedade em relação a prevenção e a implementação do PEP que facilita o controle dos procedimentos realizados, como também a identificação do tratamento ainda a ser realizado.
Referências
- PAIM, Jairnilson Silva e outros. O Que É o SUS?. / Jairnilson Silva Paim. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2015. 93p. (Coleção Temas em Saúde) 1. Sistema Único de Saúde. 2. Reforma dos Serviços de Saúde. 3. Sistemas de Saúde. 4. Direito à Saúde. I. Título.
- FERTONANI, H. P.; PIRES, D. E. P.; BIFF, D.; SCHERER, M.D.A.; Modelo Assistencial em Saúde: conceitos e desafios para a atenção básica brasileira. Ciência & Saúde Coletiva. Scielo Brasil. Junho de 2015. DOI: 10.1590/1413-81232015206.13272014
- BARROS, Idarleide Costa. A importância da estratégia de saúde da família: contexto histórico. Minas Gerais. 2014. Disponível em: https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/VRNS-9U4NBS
- BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. A saúde bucal no Sistema Único de Saúde [recurso eletrônico] / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. – Brasília: Ministério da Saúde, 2018. 350 p. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_bucal_sistema_unico_saude.pdf
- BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Cadernos de Atenção Básica n. 17. Brasília: Ministério da Saúde; 2006. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_bucal.pdf
- Rocha RG, Domaneschi C, Adde CA, Perez FEG, Buscariolo IA, Peixoto I de F, Simone JL, Romano MM, Borsatti MA, Soares MS, Penha SS, Jorge WA. Clínica Integrada em Odontologia. 2013.
- ARAÚJO, J. S. S. DE; HOLANDA, J. DE C. P.; LIMA, J. P. M. DE; RESENDE, C. M. B. M. DE. A importância do planejamento integrado na clínica odontológica: relato de caso. Revista Extensão & Sociedade, v. 1, n. 4, 13 mar. 2012. Disponível em: https://repositorio.ufu.br/handle/123456789/39433;Acesso?locale=pt_BR
- Marsi G, Mengue AC, Bertini F, Guimarães Cabral LA, Almeida JD. Avaliação da importância do exame clínico para os alunos do curso de graduação da Faculdade de Odontologia de São José dos Campos – UNESP. Rev ABENO [Internet]. 26º de janeiro de 2009;9(1):5-10. DOI: 10.30979/rev.abeno.v9i1.1320
- Frazão P, Narvai PC. Saúde bucal no Sistema Único de Saúde: 20 anos de lutas por uma política pública [Internet]. Saúde em Debate. 2009 ; 33( ja-abr. 2009): 64-71. Disponível em: https://repositorio.usp.br/item/002429080.
- Barreto JO, Sousa ML de A, Freire JCP, Araújo TN de, Freitas GB de, Ribeiro ED. Impactos psicossociais da estética dentária na qualidade de vida de pacientes submetidos a próteses. Arch Health Invest [Internet]. 28º de maio de 2018;7. Disponível em: https://www.archhealthinvestigation.com.br/ArcHI/article/view/3091
- CUTOLO LRA. Modelo Biomédico, reforma sanitária e a educação pediátrica. [s.l: s.n.]. Disponível em: <https://www.acm.org.br/acm/revista/pdf/artigos/392.pdf>.
- Hoffmann RHS, Cypriano S, Sousa M da LR de, Wada RS. Experiência de cárie dentária em crianças de escolas públicas e privadas de um município com água fluoretada. Cadernos de Saúde Pública. 2004 Apr;20(2):522–8. DOI: 10.1590/S0102-311X2004000200020
- Botros N, Iyer P, Ojcius DM. Is there an association between oral health and severity of COVID-19 complications? Biomedical Journal. 2020 May. DOI: 10.1016/j.bj.2020.05.016
- Marouf N, Cai W, Said KN, Daas H, Diab H, Chinta VR, et al. Association between periodontitis and severity of COVID‐19 infection: A case–control study. Journal of Clinical Periodontology. 2021 Feb 15;48(4). DOI: 10.1111/jcpe.13435
- FARIAS MR, SAMPAIO JJC. Papel do cirurgião-dentista na equipe de saúde da família. RGO, Rev. gaúch. odontol. (Online) [online]. 2011, vol.59, n.1, pp. 109-115. ISSN 1981-8637. Disponível em: http://revodonto.bvsalud.org/pdf/rgo/v59n1/a16v59n1.pdf
- Araújo YP, Dimenstein M. Estrutura e organização do trabalho do cirurgião-dentista no PSF de municípios do Rio Grande do Norte. Ciência & Saúde Coletiva. 2006 Mar;11(1):219–27. DOI: 10.1590/S1413-81232006000100031
- Brasil. Ministério da Saúde. O que é prontuário eletrônico [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; [data desconhecida]. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/composicao/saps/informatiza-aps/prontuario-eletronico
- AMORIM HPL et al .A importância do preenchimento adequado dos prontuários para evitar processos em Odontologia. Arquivos em Odontologia, [S. l.], v. 52, n. 1, 2016. DOI: 10.7308/aodontol/2016.52.1.03.
1Professor Doutor do Curso de Odontologia da UERN – Caicó/RN – Brasil
2Professora Doutora do Curso de Odontologia da UERN – Caicó/RN – Brasil.
3Cirurgiã-dentista graduada pela UERN – Caicó/RN – Brasil.
4Cirurgiã-dentista graduada pela UERN – Caicó/RN – Brasil.
5Graduando em Odontologia pela UERN – Caicó/RN – Brasil.