PLANEJAMENTO REPRODUTIVO: IMPORTÂNCIA E OPÇÕES CONTRACEPTIVAS DISPONÍVEIS EM TERRITÓRIO BRASILEIRO

REPRODUCTIVE PLANNING: IMPORTANCE AND CONTRACEPTIVE OPTIONS AVAILABLE IN BRAZILIAN TERRITORY

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7737388


Mariana Santos de Castro
Graciete Helena Nascimento dos Santos
Danielle Orlandi Gomes
Diego Trabulsi Lima


RESUMO

O planejamento reprodutivo é direito garantido na Constituição Brasileira ao cidadão e versa sobre a capacidade de poder escolher livre e conscientemente por ter ou não filhos, a quantidade e o intervalo de tempo entre eles. Sua boa execução é capaz de diminuir as taxas de gravidez indesejada, abortos provocados e morbimortalidade materna. Assim sendo, é de fundamental importância conhecer as opções contraceptivas disponíveis em território nacional, suas indicações e modo de uso, objetivo a que se propõe este trabalho.

PALAVRAS-CHAVE: Planejamento familiar. Anti concepção. Esterilização reprodutiva

ABSTRACT

Reproductive planning is a right guaranteed to citizens in the Brazilian Constitution and deals with the ability to freely and consciously choose whether or not to have children, the number and time interval between them. Its proper execution is capable of reducing the rates of unwanted pregnancies, induced abortions and maternal morbidity and mortality. Therefore, it is of fundamental importance to know the contraceptive options available in the national territory, their indications and mode of use, which is the objective of this work.

KEYWORDS: Family Development Planning. Contraception. Sterilization, Reproductive

1 INTRODUÇÃO

Segundo o Ministério da Saúde, planejamento reprodutivo é o direito à informação, à assistência especializada e acesso aos recursos que permitam optar livre e conscientemente por ter ou não filhos, o número, o espaçamento entre eles e a escolha do método anticoncepcional mais adequado a cada caso, sem coação, discriminação ou violência¹.

Além disso, é direito do cidadão, descrito no Artigo 226 Parágrafo 7 da Constituição Brasileira, pautado no princípio da paternidade responsável e da dignidade da pessoa humana que o Estado forneça recursos educacionais e científicos que suportem a livre escolha do casal em termos de planejamento familiar.

A importância de um adequado planejamento reprodutivo se reflete diretamente na diminuição da ocorrência de gestações indesejadas, podendo levar a uma redução nas taxas de abortamentos provocados e morbimortalidade materno-infantis².

Os métodos contraceptivos disponibilizados pelo Sistema Único de Saúde brasileiro (SUS) dividem-se em reversíveis (pílulas, injetáveis, dispositivos intrauterino, preservativos masculino e feminino, implante sub-dérmico) ou irreversíveis (esterilização masculina e feminina)³.

Assim sendo, este trabalho tem por objetivo fazer um compilado dos principais métodos oferecidos, de forma a padronizar seu uso e indicações, favorecendo assim uma melhor assistência ao cidadão no que tange ao direito de acesso ao planejamento familiar.

2 METODOLOGIA

Foi realizada uma revisão de literatura com base em portarias, manuais, diretrizes e outros protocolos já publicados por instituições nacionais e internacionais, como a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), o próprio Ministério da Saúde e a Organização Mundial de Saúde (OMS), publicados entre os anos de 2013 e 2022.

Desta forma, realizou-se um compêndio das principais alternativas de contraceptivos disponíveis, enfatizando-se os oferecidos pelo SUS.  Nesta publicação os métodos comportamentais foram excluídos.

Foram brevemente descritas as características e mecanismos de ação de cada método contraceptivo, critérios clínicos de elegibilidade conforme orientação da OMS⁴, contraindicações e possíveis eventos adversos. Este artigo torna-se, portanto, uma importante ferramenta para consulta e elaboração de projetos de planejamento reprodutivo para serviços de saúde.

Quadro 1: Critérios clínicos de elegibilidade para uso de métodos contraceptivos conforme a OMS

Fonte: Fonte: World Health Organziation(WHO).  Medical Eligibility Criteria for Contraceptive Use, 5ª ed, 2015. Disponível em: https://www.who.int/publications/i/item/9789241549158

3 DESENVOLVIMENTO

3.1 EXAMES DIAGNÓSTICOS INDICADOS PARA ESCOLHA DO MÉTODO

Para a maioria dos contraceptivos hormonais orais e injetáveis, nenhum exame diagnóstico subsidiário é necessário além da anamnese e exame físico. Para a inserção de dispositivos intrauterinos, é recomendado a critério clínico⁵:

Quadro 2: Exames pré inserção de dispositivos intrauterino

Fonte: Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Manual Técnico para Profissionais de Saúde : DIU com Cobre TCu 380A / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. – Brasília :
Ministério da Saúde, 2018

3.2 PRINCIPAIS MÉTODOS CONTRACEPTIVOS DISPONÍVEIS

3.2.1 Preservativos Masculinos⁶

Preservativo masculino, condom ou camisinha é constituído de uma fina membrana, em forma de saco, geralmente de borracha (látex), que é colocado sobre o pênis ereto, antes do coito e é considerado forma eficaz de se prevenir as doenças sexualmente transmissíveis. 

Qualquer um pode fazer uso do preservativo masculino ao manter relação sexual com pessoas com pênis. O uso do condom não provoca efeitos colaterais, salvo nos raros casos de alergia ao material. Seu uso requer alguns cuidados, que devem ser orientados aos pacientes, pois se não respeitados, aumentam o índice de falha do método.

O preservativo deve ser de boa qualidade, estar íntegro e ser usado antes de qualquer penetração com o pênis em ereção. Este método deve ser usado apenas uma vez e descartado após o uso. Não deve ser utilizado concomitantemente a lubrificantes à base de óleo, pois podem danificar o látex. Outros materiais não permitidos são: quaisquer óleos (de cozinha, de bebê, de coco, mineral), vaselina, loções, cremes frios, manteiga, manteiga de cacau e margarina. Em caso de necessidade de lubrificação, optar por produtos feitos de glicerina e silicone ou mesmo água ou saliva.

3.2.2 Preservativos Femininos

É uma bolsa cilíndrica transparente e suave, com dois anéis flexíveis, sendo um deles ocluso por uma membrana. Antes da relação sexual, a mulher insere o condom na vagina pela extremidade oclusa, que deve alcançar o fundo da vagina, enquanto a extremidade aberta fica para fora, para possibilitar a penetração do pênis no seu interior.  É um método que pode ser usado tanto para proteção de IST’s como para a prevenção da gravidez. É de uso único e descartável.

3.2.3 Anticoncepcionais  hormonais combinados (AHC)⁷

Compostos por uma associação de estrogênio e progestagênio, são seguros e eficazes desde que prescritos por um profisisonal de saúde ou profissional atuante em serviço de Planejamento Familiar.  Podem ser encontrados em formulações de administração via oral, injetável, transdérmica e intravaginal.

Não exigem exames subsidiários para sua prescrição, à exceção de aferição da pressão arterial e cuidadosa anamnese buscando antecedentes pessoais e familiares de trombofilias, neoplasias hormônio- dependentes, eventos tromboembólicos e enxaqueca com aura. Atenção especial para pacientes usuárias de drogas anticonvulsivantes (fenitoína, carbamazepina, barbitúricos, primidona, topiramato, oxcarbazepina, lamotrigina) e rifampicina, pois estas medicações interferem no metabolismo hepático e há chance de interação medicamentosa com redução da eficácia.

Quadro 3: Contraindicações absolutas (categoria 4) aos AHCs, de acordo com critério de elegibilidade da OMS

Fonte: World Health Organization (WHO). Medical eligibility criteria for contraceptive use [Internet]. 5. ed. Genebra: WHO; 2015. [cited 2018 Aug 19]. Disponível em: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO). Anticoncepção hormonal combinada. São Paulo: FEBRASGO; 2021. (Protocolo FEBRASGO-Ginecologia,no65/ Comissão Nacional Especializada em Anticoncepção)


* TVP: trombose venosa profunda; EP: embolia pulmonar; IAM: infarto agudo do miocárdio; AVC: acidente vascular cerebral; FA: fibrilação atrial; DM: diabetes melito; HAS: hipertensão arterial sistêmica; DCV: doença cardiovascular; ACA: anticorpo antifosfolípide; HNF: hiperplasia nodular focal;
* São considerados fatores de risco para TVP: passado de TVP, trombofilia, obesidade, hemorragia ou transfusão sanguínea pós-parto, imobilidade, pré-eclâmpsia, tabagismo e parto cesariano imediato.

Eventos adversos:

Quadro 4: Principais eventos adversos relacionados ao uso de contraceptivos combinados

Fonte: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO). Anticoncepção hormonal combinada. São Paulo: FEBRASGO; 2021. (Protocolo FEBRASGO-Ginecologia, no65/ Comissão Nacional Especializada em Anticoncepção)

*Não foi confirmada relação causal entre ganho de peso e uso de AHC, apesar do relato de várias mulheres.

Anticoncepcionais combinados de uso oral

Pílulas com combinação de estrógenos e progesterona. O estrógeno presente na maioria destes métodos é o etinilestradiol e, a partir de 2011, formulações contendo valerato de estradiol passaram a ser comercializadas. Os progestágenos são variados, estando associados aos diferentes efeitos de cada pílula. Exercem uma ação contraceptiva por meio de uma influência no eixo neuroendócrino, por um bloqueio gonadotrófico especialmente do pico de LH e, com isso, impedem que ocorra a ovulação.

Além disso, tornam o muco endocervical espesso e hostil ao espermatozoide, atuam como agente antiproliferativo no endométrio e alteram a secreção e peristalse das tubas uterinas. O componente estrogênico atua inibindo o pico do hormônio folículo estimulante (FSH), evitando a seleção e crescimento do folículo dominante. Atuam também estabilizando o endométrio e potencializando a ação do componente progestagênico.

O uso deve ser iniciado, de preferência, até o 5º dia do ciclo menstrual, a cada 24h, conforme orientações específicas de cada fabricante.

Anticoncepcionais combinados de uso injetável

Devem ser aplicados a cada 30 dias, iniciando o uso até o 5º dia do ciclo menstrual, intramuscular e de preferência nas nádegas. O mecanismo de ação é por meio do bloqueio ovulatório e sua eficácia é muito alta quando usados corretamente. As principais contraindicações são semelhantes às dos anticoncepcionais orais combinados.

Dentre os efeitos colaterais, destacam-se: irregularidade menstrual, mastalgia, cefaleia, tontura e aumento de peso. Após a suspensão do uso, o retorno à fertilidade é rápido, sendo aproximadamente 60 dias após a última injeção.

Quadro 5: Modo de uso e formulações disponíveis para contraceptivos combinados injetáveis

Anel Vaginal

Comercializado com o nome de Nuvaring ®. Se constitui por um anel flexível, com um diâmetro externo de 54mm e espessura de 4mm, que contém etonogestrel e etinilestradiol. O contraceptivo deve ser introduzido na vagina, onde permanece por três semanas, sendo removido após e tem-se uma pausa por 7 dias, quando é inserido novamente um novo anel. Proporciona um excelente controle do ciclo, estando raramente associado com sangramentos anormais.

As desvantagens que estão mais associadas à descontinuidade do uso, podem-se destacar a sensação de corpo estranho, desconforto vaginal, problemas durante o coito e expulsão do anel. As contraindicações são semelhantes às dos anticoncepcionais combinados.

Adesivo transdérmico

Trata-se de um sistema matricial com uma superfície de 20 cm², que contém 750 mg de etinilestradiol (EE) e 6 mg de norelgestromina (NGMN). A  liberação é de 20 mg EE e 150 mg de NGMN diariamente, sendo o último convertido em levonorgestrel através de metabolismo hepático.

Possui mecanismo de ação, indicações e contraindicações semelhantes a todos os anticoncepcionais combinados. Um dos benefícios relatados é que, como não possui absorção intestinal e evita o metabolismo de primeira passagem hepática, não interfere de forma significativa com outros medicamentos como anticonvulsivantes e antibióticos. Deve ser prescrito com cuidado em mulheres com doença dermatológica esfoliativa ou mulheres obesas (>= 90kg), pois pode ter sua eficácia diminuída.

O adesivo trans dérmico deve ser colado sob a pele, nos braços, nas costas ou na região abdominopélvica anterior ou posterior, rodiziando os locais de aplicação.  Cada adesivo permanece colado na pele por 7 dias, totalizando 21 dias de uso, seguidos de 7 dias de pausa. Se ocorrer descolamento por menos de 24h, colar o mesmo adesivo caso ainda mantenha a aderência ou colar um novo adesivo (não há perda de eficácia). Se descolamento por mais de 24h, iniciar um novo ciclo e utilizar método de barreira por 07 dias.

3.2.4 Anticoncepcionais com progestágeno isolado⁸

As principais indicações são as condições em que se deve evitar o uso de estrógeno, como puerpério com mães que amamentam, pacientes hipertensas, portadoras de enxaqueca, diabetes, cardiopatia, doenças vasculares, reumatológicas e com passado de tromboflebite.

No Brasil estão disponíveis formulações a serem a administradas via oral, intramuscular, sub-dérmica e intrauterina.

Agem impedindo a ovulação por meio do bloqueio na liberação cíclica das gonadotrofinas, o que impede o pico pré ovulatório do LH. Também causam atrofia e diminuição da vascularização endometrial, espessamento do muco cervical e redução da motilidade tubária.

Quadro 6: Principais contraindicações ao uso de contraceptivos com progestágeno isolado

Fonte: World Health Organization (WHO). Medical eligibility criteria for contraceptive use [Internet]. 5. ed. Genebra: WHO; 2015. [cited 2018 Aug 19]. Disponível em: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO). Anticoncepcional hormonal apenas de progestagênio e anticoncepção de emergência. São Paulo:FEBRASGO;2021. (Protocolo FEBRASGO-Ginecologia, no 66/ Comissão Nacional Especializada em Anticoncepção)

Eventos adversos

O principal evento adverso é a ocorrência de sangramentos irregulares, principalmente nos três primeiros meses de uso. Tal fato deve ser comunicado com bastante clareza à usuária, pois constitui a principal causa de abandono do método.

Outros efeitos são: cefaleia, tontura, mudança de humor, ganho de peso, mastalgia, acne, hirsutismo ou queda de cabelo.

  • Manejo dos sangramentos irregulares

– Correta orientação pré prescrição do método escolhido

– Aguardar e observar o padrão de sangramento principalmente nos 06 primeiros meses, pois 50% das usuárias terão melhora do padrão após este período

– Descartar outras causas de sangramento se padrão desfavorável > 06 meses

– Opções medicamentosas (utilizar a partir do 2º mês, resposta pobre no 1º mês)

Quadro 7: Opções medicamentosas para controle de sangramento irregular por uso de contraceptivo hormonal

Fonte: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO). Anticoncepcional hormonal apenas de progestagênio e anticoncepção de emergência. São Paulo:FEBRASGO;2021. (Protocolo FEBRASGO-Ginecologia, no 66/ Comissão Nacional Especializada em Anticoncepção

Solicitar ultrassonografia sempre que o sangramento se mantiver desfavorável por mais 06 meses, mesmo com medicações, se houver mudança brusca do padrão de sangramento ou se dismenorreia ou dispareunia.

Anticoncepção oral com progestágeno isolado

Pílulas ingeridas diariamente, de forma contínua (sem intervalo entre as cartelas). As opções disponíveis são as seguintes:

Quadro 8 : Modo de uso e formulações disponíveis para uso de progestágeno isolado via oral

Anticoncepção injetável com progestágeno isolado

Atualmente o único disponível é o acetato de medroxiprogesterona 150mg. Atua como uma substância de depósito e o hormônio presente encontra-se na forma de microcristais em suspensão, sendo absorvido lentamente. Estão mais associados a ganho ponderal, diminuição da densidade mineral óssea e demora ao retorno da fertilidade após interrupção do método (pode ser de até 01 ano). Deve ser aplicado a cada 03 meses, intramuscular, preferencialmente nas nádegas.

Implante subdérmico à base de progestágeno

No Brasil, a opção disponível é o Implanon NXT®, cujo progestágeno é o etonogestrel (ENG). Constitui-se de uma haste formada por vinicelatato de etileno medindo 40x2mm, que contém 68mg de etonogestrel, liberados lentamente desde a sua inserção e elaborado para ser utilizado por até 3 anos.

Sua inserção pode ser realizada em consultório, subdermicamente na região interna do braço não dominante das mulheres, a qualquer momento do ciclo menstrual, desde que se tenha afastado a possibilidade de gestação. Apesar de fácil, deve ser realizada por pessoal treinado, a fim de minimizar possíveis complicações como edema, hematoma, inserção profunda ou em local inadequado, infecção ou mesmo quebra do dispositivo.

Após a inserção, em aproximadamente 08h os níveis sanguíneos de ENG já alcançam nível suficiente para inibir a ovulação, sendo portanto uma boa indicação para grupos de mulheres em estado de vulnerabilidade, como adolescentes, dependentes químicas e portadoras do vírus HIV.

Ressalta-se que, conforme relatório de recomendação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (CONITEC) divulgado em 2021, o implante subdérmico foi incorporado aos métodos contraceptivos oferecidos pelo SUS, com uso condicionado à criação de programa específico voltado para mulheres em idade fértil em situação de rua; com HIV/AIDS em uso de dolutegravir; em uso de talidomida; privadas de liberdade; trabalhadoras do sexo; e em tratamento de tuberculose em uso de aminoglicosídeos no Âmbito do SUS⁹.

Não há evidência de aumento do risco de eventos tromboembólicos com o uso do ENG, sendo este portanto uma interessante opção para contracepção de pacientes com trombofilias e antecedente pessoal de tromboembolismo (após a fase aguda). Age também na diminuição das queixas de dismenorreia, incluindo aquelas pacientes com endometriose, além de favorecer a diminuição dos sintomas pré-menstruais.

Sistema intrauterino com levonorgestrel (SIU – LNG)10

Trata-se de um pequeno dispositivo em forma de T com duas possíveis apresentações contendo 52mg ou19,5mg de levonorgestrel. Atuam principalmente a nível endometrial, com efeito antiproliferativo, inibindo sua atividade mitótica e impedindo a resposta endometrial ao estradiol circulante. Também torna o muco cervical espesso e hostil ao espermatozoide, inibindo sua motilidade no colo, endométrio e tubas uterinas. Tem pouco efeito sobre o eixo hipotálamo-hipófise-ovariano, porém como leva a importante atrofia endometrial, causa amenorreia e/ou oligomenorreia.

 Através da membrana de controle, o sistema consegue liberar o LNG que, em 15 minutos , já se encontra circulante no plasma. A taxa de liberação cai ao longo do tempo de uso, que é de 05 anos (porém recentemente nos EUA a Food and Drug Administration (FDA) liberou o uso do SIU com 52mg LNG por até 08 anos).

Pode ser inserido a nível ambulatorial em mulheres independente da paridade (embora o dispositivo com 19,5mg leve vantagem em nulíparas por seu menor tamanho e insertor mais fino) e em qualquer momento do ciclo menstrual, tendo-se afastado a possibilidade de gravidez ou mesmo no puerpério imediato.

O SIU contendo 52mg de LNG também é indicado para controle de sangramento abundante e para portadoras de endometriose ou adenomise.  É contraindicado para aquelas que apresentem alterações locais como câncer de colo uterino ou endometrial, mioma submucoso, estenose do canal cervical, doença inflamatória pélvica, infeccão puerperal e também câncer de mama.

3.2.5 Anticoncepcionais de emergência9

A primeira opção é a utilização de Levonorgestrel em duas doses de 0,75mg, com intervalo de 12 em 12 horas ou 1,5mg, em dose única (a grande vantagem seria a opção de dose única e a ausência de efeitos gastrointestinais).  Outra opção é o Método Yuzpe que consiste na combinação de 0,1mg de etinilestradiol e 0,5mg de levonorgestrel tomados em duas vezes, sendo que a segunda tomada é feita 12 horas após a primeira.

Indicado em casos de coito desprotegido, deve ser reservado para as situações de emergência e sempre nos primeiros 5 dias após o ocorrido. Outras opções são o acetato de ulipristal e a insersão de dispositivo intrauterino de cobre. A única contraindicação ao método é uma gestação conhecida.

3.2.6 Dispositivo intrauterino (DIU) não hormonal10

Consiste em um objeto sólido em formato de T que é inserido através do colo uterino na cavidade uterina, com o objetivo de evitar a gestação. O principal mecanismo de ação do DIU de cobre se dá por uma reação de copo estranho à liberação de pequenas quantidades de metal. Esta liberação estimula a produção de prostagladinas e citocinas na cavidade uterina, que por sua vez forma uma espécie de espuma biológica tóxica para espermatozoides e óvulos. A inibição da ovulação não está presente nesse método e o DIU não protege contra HIV e outras ISTs.

Indicado para mulheres que procuram método reversível, independente de coito, de longo prazo. Mulheres com contraindicação ao estrogênio ou que amamentam podem ser boas candidatas ao DIU. Pode ser utlizado inclusive por mulheres nulíparas e adolescentes (atentar para maior risco de expulsão neste grupo).

Pode ser inserido em qualquer fase do ciclo menstrual e não apenas durante a menstruação, basta que se afaste a possibilidade de gestação. Pode ser inserido no pós-parto imediato (até 48h), durante a cesariana, antes da sutura uterina e também após aborto. Após o puerpério imediato, recomenda-se aguardar até 6 semanas para realizar inserção, a fim de diminuir chances de expulsão do dispositivo.

Mulheres com suspeita de sepse puerperal/ aborto infectado devem ser desencorajadas a usar o método até que haja resolução do quadro. Também é eficaz como contracepção de emergência, se inserido em até 5 dias do coito desprotegido e desde que não haja mais de cinco dias da ovulação.

Quadro 9 : Contraindicações para inserção de dispositivo intrauterino

Fonte: Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Manual Técnico para Profissionais de Saúde : DIU com Cobre TCu 380A / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. – Brasília : Ministério da Saúde, 2018

Manejo de eventos adversos

  • Perfuração uterina

– Risco entre 0,3 e 2,2/ 1.000 inserções

– Risco maior em: lactantes, parto há menos 6 semanas, uso de prostaglandina antes da inserção, inserção sob anestesia geral

– Recomenda-se retirar o dispositivo via vaginal se fio visível, caso contrário proceder com videolaparoscopia

  • Sangramentos anormais

– Comuns nos primeiros 3 – 6 meses;

– Se desejar tratamento: AINEs ou ácido tranexâmico;

– Investigar outras causas ginecológicas se sangramento persistente;

  • Doença Inflamatória pélvica

– Lembrar que antibióticos geralmente não são recomendados para profilaxia se mulheres saudáveis. Atenção para pacientes com valvulopatias cardíacas, que exigem profilaxia para procedimentos invasivos;

– Tratar DIP de forma habitual;

– Retirar o DIU apenas se não houver melhora após o tratamento ou se a mulher assim optar (mas apenas após iniciar antibioticoterapia);

  • Ocorrência de gestação tópica

– Retirar DIU se fio visível, apesar do pequeno risco de abortamento;

– Se fio não visível, avaliar possibilidade de perfuração uterina

– Mantendo-se ou retirando-se o DIU, orientar paciente a sempre buscar atendimento médico em caso de sangramento, dor abdominal, contrações, secreção vaginal ou febre.

Seguimento após inserção

O Ministério da Saúde recomenda que toda usuária retorne para uma consulta de revisão entre 30 a 45 dias da inserção do dispositivo intrauterino. Neste momento, é realizado exame clínico-ginecológico e avaliação do padrão de sangramento e da satisfação da mulher com o método5;

A critério clínico, a ultrassonografia poderá ser solicitada para confirmação do bom posicionamento do DIU após a sua inserção. Também pode ser utilizada para identificar a presença do DIU quando da ausência de fio visível na cérvix ou nos casos de fio com comprimento mais longo que aquele registrado no momento da inserção;

3.2.7 Vasectomia

  É uma cirurgia simples que tem o objetivo de interromper a passagem dos espermatozóides do testículo para o líquido ejaculado, com poucas complicações. Os critérios para o método são os mesmos da laqueadura tubária.

As principais complicações envolvidas, ainda que raras, são: hematomas e equimoses testiculares, dor e edema da bolsa escrotal e pênis, infecção de sítio cirúrgico e recanalização espontânea. 

3.2.8 Laqueadura tubária

É realizada por várias técnicas, sendo a mais comum a técnica de Pomeroy, que consiste em uma salpingectomia segmentar. As complicações do procedimento são variadas, estando a maioria associada a lesões de órgãos ou vísceras vizinhas, como bexiga e intestino. Podendo ocorrer sangramentos e infecção de ferida operatória. Uma complicação muito comum é o arrependimento, devido a isso, é fundamental que se tenha convicção de que a paciente tem perfeita consciência de que não que mais ter filhos.

Do ponto de vista legal, deve-se obedecer á lei do Planejamento Familiar, que regulamenta o artigo da Constituição que diz que o planejamento familiar é um direito de todo cidadão, não sendo permitido qualquer tipo de coerção. A lei tem número 9263 e é de 12 de janeiro de 1996, regulamentada na portaria 048, do Ministério da Saúde, alterada pela Lei nº 14.443, de 2 de setembro de 2022.

A lei determina:

– Somente é permitida a esterilização voluntária em homens ou mulheres com capacidade civil plena, maiores de 21 anos ou, pelo menos, dois filhos vivos;

– Deve ser aguardado prazo de 60 dias entre a expressão do desejo da esterilização e sua realização;

– Deve ser elaborado documento que expresse a vontade pela paciente, contendo informações sobre os riscos da cirurgia, possíveis efeitos colaterais, dificuldade de sua reversão e opções de contracepção reversível. Deixou de ser necessária assinatura do cônjuge, mesmo que haja sociedade conjugal;

– A esterilização cirúrgica em mulher durante o período de parto será garantida à solicitante se observados o prazo mínimo de 60 (sessenta) dias entre a manifestação da vontade e o parto e as devidas condições médicas.

– Não se pode fazer esterilização por outro procedimento que não seja LT ou vasectomia;

– Em pessoas incapazes, a esterilização só pode ser feita mediante autorização judicial;

– A esterilização é permitida, fora dos critérios acima, se houver risco à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto, desde que testemunhado em relatório escrito e assinado por dois médicos.

4 CRITÉRIOS DE MUDANÇA TERAPÊUTICA

Está indicada a mudança de método contraceptivo para todo(a) usuário(a) que não se adapte à opção previamente escolhida, que apresente eventos adversos graves ou mesmo se assim o desejar, desde que o método escolhido tenha caráter reversível.

5 CONCLUSÃO

O acesso ao planejamento reprodutivo é direito garantido por lei ao cidadão e não só o sucesso como a própria existência de políticas públicas voltadas para este serviço estará mais segura quanto mais este fato for conhecido e debatido por toda a população. 

REFERÊNCIAS

1- Ministério da Saúde. Portaria nº 48, de 11 de fevereiro de 1999. Ano Internacional da Mulher. Brasília (DF); 2004.7

2- Planejamento familiar/ contracepção. Fiocruz, 28 jun. 2022. Disponível em: https://www.rets.epsjv.fiocruz.br/planejamento-familiarcontracepcao#:~:text=Ao%20reduzir%20as%20taxas%20de,a%20necessidade%20de%20aborto%20inseguro.&text=O%20planejamento%20familiar%20pode%20impedir,de%20mortalidade%20infantil%20do%20mundo. Acesso em: 16 jan, 2023.

3- BRASIL. Ministério da Saúde. Cadernos de Atenção Básica – Saúde Sexual e Saúde Reprodutiva. Secretaria de Atenção à Saúde Departamento de Atenção Básica Série A. Normas e Manuais Técnicos Cadernos de Atenção Básica, n. 26. Brasília – DF. 2010.

4- World Health Organziation(WHO).  Medical Eligibility Criteria for Contraceptive Use, 5ª ed, 2015. Disponível em: https://www.who.int/publications/i/item/9789241549158

5- BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Manual Técnico para Profissionais de Saúde : DIU com Cobre TCu 380A / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. – Brasília : Ministério da Saúde, 2018.

6- Finotti, Marta. Manual de anticoncepção / Marta Finotti. — São Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), 2015. 

7- Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO). Anticoncepção hormonal combinada. São Paulo: FEBRASGO; 2021. (Protocolo FEBRASGO-Ginecologia,no65/ Comissão Nacional Especializada em Anticoncepção)

8- Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO). Anticoncepcional hormonal apenas de progestagênio e anticoncepção de emergência. São Paulo:FEBRASGO;2021. (Protocolo FEBRASGO-Ginecologia, no 66/ Comissão Nacional Especializada em Anticoncepção)

9- BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde. Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias e Inovação em Saúde. Relatório de recomendação: Implante subdérmico de etonogestrel na prevenção da gravidez não planejada por mulheres adultas em idade reprodutiva entre 18 e 49 anos. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde. Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias e Inovação em Saúde – Brasília: Ministério da Saúde, 2021.

10- Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO). Métodos anticoncepcionais reversíveis de longa duração. São Paulo: FEBRASGO; 2021. (Protocolo FEBRASGO-Ginecologia, no 64/ Comissão Nacional Especializada em Anticoncepção)

11- BRASIL. LEI Nº 9.263, DE 12 DE JANEIRO DE 1996. Dispõe do Planejamento familiar. Brasilia, DF: Diário Oficial da União, 1996.