PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DOS ÓBITOS POR INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA NA BAHIA (2014-2019)

EPIDEMIOLOGICAL PROFILE OF DEATHS DUE TO ACUTE RENAL FAILURE IN BAHIA (2014-2019)

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10723177


Viviane Muniz da Silva1;
Antônio Lucas Freitas Andrade2;
Elio Gabriel Alves de Oliveira3;
Maria Victória Almeida de Lisboa4;
Raquel dos Santos Viana5.


RESUMO

Introdução: A insuficiência renal aguda é uma condição caracterizada por uma rápida diminuição na função renal, que pode ocorrer em dias ou mesmo horas. Essa enfermidade é multifatorial e sistêmica, manifestando-se por uma queda na taxa de filtração glomerular, elevação de biomarcadores como creatinina sérica e redução na produção e eliminação de urina. Objetivo: O presente artigo consiste em um estudo ecológico, no qual tem como objetivo descrever o perfil epidemiológico das mortes relacionadas à insuficiência renal aguda no estado da Bahia no período de 2014 a 2019. Métodos: Trata-se de um estudo ecológico de natureza descritiva e retrospectiva com uma abordagem quantitativa, que teve como base a coleta de dados epidemiológicos. Os dados foram obtidos do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde. As variáveis de investigação incluíram o sexo, raça e faixa etária. O objetivo dos dados obtidos era compreender o perfil epidemiológico dos pacientes que faleceram devido à insuficiência renal aguda na Bahia entre 2014 e 2019. Resultados: A análise dos óbitos por insuficiência renal aguda na Bahia entre 2014 e 2019 revelou uma tendência de aumento constante no número de óbitos. A maioria desses óbitos ocorreram na faixa etária de 50 a 59 anos, com uma diferença notável na distribuição por sexo. A condição afetou mais homens do que mulheres em todas as faixas etárias consideradas, destacando possíveis diferenças na suscetibilidade à doença entre os sexos. A análise por raça mostrou que o grupo racial “Outras” teve o maior número de óbitos, seguido pelo grupo racial “Preta”. Curiosamente, a raça “Branca” apresentou o menor número de óbitos, com diferenças nas porcentagens entre homens e mulheres. Conclusão: A Insuficiência Renal Aguda é uma condição de saúde significativa que afeta a população da Bahia, com uma tendência de aumento nos óbitos ao longo dos anos. 

Palavras-chaves: Injúria Renal Aguda. Mortalidade. Perfil de Saúde. 

ABSTRACT

Introduction: Acute renal failure is a condition characterized by a rapid decrease in kidney function, which can occur within days or even hours. This disease is multifactorial and systemic, manifesting itself as a drop in the glomerular filtration rate, an increase in biomarkers such as serum creatinine and a reduction in urine production and elimination. Aim: This article consists of an ecological study, which aims to describe the epidemiological profile of deaths related to acute renal failure in the state of Bahia from 2014 to 2019. Methods: This is an ecological study of a descriptive and retrospective nature with a quantitative approach, which was based on the collection of epidemiological data. The data were obtained from the Information Technology Department of the Unified Health System. The investigation variables included sex, race and age group. The objective of the data obtained was to understand the epidemiological profile of patients who died due to acute renal failure in Bahia between 2014 and 2019. Results: Analysis of deaths due to acute renal failure in Bahia between 2014 and 2019 revealed a trend of constant increase in the number of deaths. The majority of these deaths occurred in the 50 to 59 age group, with a notable difference in distribution by sex. The condition affected more men than women in all age groups considered, highlighting possible differences in susceptibility to the disease between the sexes. Analysis by race showed that the “Others” racial group had the highest number of deaths, followed by the “Black” racial group. Interestingly, the “White” race had the lowest number of deaths, with differences in percentages between men and women. Conclusion: Acute Renal Failure is a significant health condition that affects the population of Bahia, with a tendency for deaths to increase over the years.

Keywords: Acute Kidney Injury. Mortality. Health Profile.

INTRODUÇÃO

A insuficiência renal aguda (IRA) é uma condição caracterizada por uma rápida diminuição na função renal, que pode ocorrer em dias ou mesmo horas. Essa enfermidade é multifatorial e sistêmica, manifestando-se por uma queda na taxa de filtração glomerular, elevação de biomarcadores como creatinina sérica e redução na produção e eliminação de urina. Os critérios diagnósticos para a IRA foram estabelecidos recentemente, o que torna o diagnóstico desafiador. Portanto, pesquisas estão em andamento para identificar marcadores que possam indicar o início da doença antes que sintomas clínicos significativos se desenvolvam, visando ao diagnóstico precoce e à melhoria do prognóstico. Alguns desses marcadores incluem a molécula de lesão renal (KIM-1), cistatina-C e lipocalina associada à gelatinase de neutrófilos (NGAL)1.

Com o passar do tempo, a IRA tem sido melhor definida e mais estudada, resultando em critérios diagnósticos cada vez mais universais. Isso permitiu uma melhor compreensão da incidência da doença, que aumentou nas últimas duas décadas, especialmente, em duas populações: pacientes hospitalizados em unidades de terapia intensiva (UTI) e aqueles que não necessitam de diálise. A incidência de IRA em pacientes hospitalizados chega a 15%, enquanto na UTI pode ultrapassar 50%2.

A IRA é uma condição com alta morbimortalidade. No Brasil, em 2019, foram registradas mais de 100.000 internações por IRA, com uma taxa de mortalidade média de 12%. Os principais fatores de risco para o desenvolvimento da doença incluem hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus, obesidade, sepse, doenças cardiovasculares, cirurgias extensas, idade avançada e o uso de medicamentos nefrotóxicos. Além disso, foi observada uma relação entre a COVID-19 e o desenvolvimento de IRA em pacientes com doença viral grave devido ao uso de ventilação mecânica3.

Estudos em animais, também, destacaram o papel protetor do estrogênio na saúde renal, enquanto a testosterona pode contribuir para a piora da condição. No entanto, o sexo feminino não está isento de desenvolver a doença. O envelhecimento, também, está associado ao declínio da função renal, devido a fatores como comorbidades que se tornam mais comuns com o passar dos anos, alterações na hemodinâmica renal e o uso mais frequente de medicamentos nefrotóxicos, além de mudanças intrínsecas nos rins, como diminuição do tamanho, atrofia tubular e queda na taxa de filtração glomerular4.

Os óbitos por IRA na Bahia entre 2014 e 2019 ocorreram, predominantemente, em indivíduos do sexo masculino, de etnia parda e com idade entre 50 e 59 anos. Essa alta morbimortalidade associada à IRA é um problema de saúde pública, com taxas de internações oito vezes maiores do que o número de óbitos5.

Pacientes com diagnóstico de IRA podem evoluir para uma piora do quadro, necessitando de terapia de substituição renal (TSR). No entanto, estudos recentes demonstraram que a decisão de iniciar a TSR não resultou em diferenças significativas na taxa de mortalidade entre aqueles que começaram o tratamento precocemente e aqueles que iniciaram mais tarde. Isso ressalta a complexidade do tratamento da IRA6.

Além dos desafios clínicos, a terapia renal envolve custos significativos, com grande consumo de recursos de saúde, especialmente, em hospitais acadêmicos e de grande porte. Pacientes que requerem diálise também têm um custo de tratamento significativamente maior, cerca de 50% a mais em média. Além disso, estudos sugerem que muitos casos de IRA poderiam ser prevenidos, e apenas metade dos pacientes com a doença recebe o tratamento adequado7.

Diante desses altos índices de morbimortalidade, custos elevados e desafios terapêuticos, torna-se essencial continuar pesquisando e compreendendo a IRA. Além disso, a análise do perfil epidemiológico dos pacientes com IRA internados pode ser uma ferramenta eficaz para identificar aqueles com maior risco de óbito, permitindo intervenções mais direcionadas para melhorar o desfecho dos pacientes8.

O presente artigo consiste em um estudo ecológico, no qual tem como objetivo descrever o perfil epidemiológico das mortes relacionadas à insuficiência renal aguda no estado da Bahia no período de 2014 a 2019.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo ecológico de natureza descritiva e retrospectiva com uma abordagem quantitativa, que teve como base a coleta de dados epidemiológicos. Os dados foram obtidos do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS). As variáveis de investigação incluíram o sexo, raça e faixa etária. O objetivo dos dados obtidos era compreender o perfil epidemiológico dos pacientes que faleceram devido à IRA na Bahia entre 2014 e 2019.

Foram incluídos na pesquisa apenas os dados da região da Bahia relativos à população que veio a óbito devido à IRA durante o período de 2014 a 2019, com idades entre 20 e 59 anos. Não houve critérios de exclusão.

Todos os dados coletados foram exportados e tabulados nos programas TabWin versão 4.15 e no Microsoft® Office Excel 2013 para realizar uma análise dos dados por meio da distribuição de frequência absoluta e relativa. Além disso, os dados obtidos do DATASUS foram formatados em tabelas e gráficos, e analisado estatisticamente utilizando o teste t Student, com o nível de significância de 0,5 e um intervalo de confiança de 95%.

Ademais, o benefício desse estudo, além de ser de rápida execução e de baixo custo, está relacionado ao fato de que, ao traçar o perfil epidemiológico mais prevalente das mortes por IRA, é possível compreender os fatores de risco para um prognóstico desfavorável da doença. Dessa forma, é possível direcionar uma atenção mais cuidadosa para essa população, com o objetivo de reduzir o número de óbitos. No entanto, em relação aos riscos, sendo um estudo ecológico, há o viés de que informações sobre comportamento, atitudes e históricos clínicos não estão disponíveis, uma vez que se trata de um estudo populacional e não individual. Isso significa que outras variáveis podem interferir no desfecho. Para mitigar esse viés, não foram incluídas no estudo populações mais idosas, devido à presença mais comum de doenças de base nessa faixa etária, bem como populações pediátricas e pacientes que faleceram devido à IRA durante os anos da pandemia de COVID-19.

Por fim, dado que este estudo usou informações de domínio público provenientes da plataforma do DATASUS, que é uma entidade do Ministério da Saúde (MS), a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa não foi necessária, em conformidade com a resolução nº 510/2016.

RESULTADOS

Os dados foram obtidos por meio da coleta no DATASUS e foram organizados nas tabelas 01, 02, 03 e 04 e nos gráficos 01 e 02. 

Tabela 01 – Óbitos por Insuficiência Renal Aguda na Bahia, segundo faixa etária, sexo e raça, no período de 2014 a 2019.

Variáveis%p-valor
Faixa Etária1.558
20 a 291147,32< 0,5
30 a 3925016,05< 0,5
40 a 4943427,85< 0,5
50 a 5976048,78< 0,5
Sexo1.439
Masculino81556,64< 0,5
Feminino62443,36< 0,5
Raça1.439
Branca15410,70< 0,5
Preta31521,89< 0,5
Outras97067,41< 0,5
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM9.

Gráfico 01 – Óbitos por Insuficiência Renal Aguda na Bahia, segundo faixa etária, sexo e raça, no período de 2014 a 2019.

Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM9.

Tabela 02 – Tendência temporal dos óbitos por Insuficiência Renal Aguda na Bahia ao longo do período de 2014 a 2019.

Ano %
201473.36515,12
201577.72616,02
201679.63716,41
201783.30117,16
201883.54617,22
201987.68418,07
Total485.259
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM9.

Gráfico 02 – Tendência temporal dos óbitos por Insuficiência Renal Aguda na Bahia ao longo do período de 2014 a 2019.

Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM9.

Tabela 03 – Distribuição por faixa etária e sexo dos óbitos por Insuficiência Renal Aguda na Bahia ao longo do período de 2014 a 2019.

Faixa EtáriaSexo
MasculinoFeminino
%%
20 a 2994913,932597,21
30 a 391.31219,2659116,46
40 a 491.74725,661.02128,44
50 a 592.80241,151.71947,88
Total6.8103.590
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM9.

Gráfico 03 – Distribuição por faixa etária e sexo dos óbitos por Insuficiência Renal Aguda na Bahia ao longo do período de 2014 a 2019.

Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM9.

Tabela 04 – Distribuição por raça e sexo dos óbitos por Insuficiência Renal Aguda na Bahia ao longo do período de 2014 a 2019.

RaçaSexo
MasculinoFeminino
%%
Branca11.05910,296.71514,74
Preta18.46417,198.03117,63
Outras77.90872,5230.80067,63
Total107.43145.546
Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM9.

Gráfico 04 – Distribuição por raça e sexo dos óbitos por Insuficiência Renal Aguda na Bahia ao longo do período de 2014 a 2019.

Fonte: MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM9.

DISCUSSÃO

Na tabela 01 e no gráfico 01, os dados mostram a distribuição dos óbitos por faixa etária, sexo e raça. Pode-se observar que a maioria dos óbitos ocorreu na faixa etária de 50 a 59 anos (48,78%) e que a insuficiência renal aguda afetou mais homens (56,64%) do que mulheres (43,36%). Quanto à raça, a maioria dos óbitos foi de pessoas classificadas como “outras” (67,41%). Ademais, também pode-se observar, que há uma diferença estatisticamente significativa entre as médias das amostras, visto que o valor de p é < 0,5 para todas as variáveis.

Na tabela 02 e no gráfico 02 os dados revelam um aumento consistente (19,5%) no número de óbitos por Insuficiência Renal Aguda na Bahia ao longo dos anos, o qual pode ser um indicativo de uma preocupação de saúde pública na região, possivelmente relacionada a fatores demográficos, estilo de vida ou acesso a cuidados médicos. Dessa forma, destaca-se a importância de políticas de saúde preventivas, triagem precoce e tratamento eficaz. Isso pode incluir programas de conscientização sobre saúde renal, promoção de hábitos de vida saudáveis e melhoria no acesso aos serviços de saúde.

A tabela 03 e o gráfico 03 mostram que a IRA afetou mais homens do que mulheres em todas as faixas etárias consideradas, sendo que a de 50 a 59 anos teve o maior número de óbitos tanto para homens (41,15%) quanto para mulheres (47,88%), e a de 40 a 49 anos também apresentou um número significativo de óbitos em ambas as categorias de sexo, sendo homens (25,66%) e mulheres (28,44%). Diante disso, o aumento no número de óbitos nas faixas etárias mais avançadas pode ser atribuído ao envelhecimento da população, uma vez que essa condição é mais comum em idades mais avançadas. A diferença entre homens e mulheres nas faixas etárias mais jovens, também, é notável, sugerindo uma possível diferença na suscetibilidade à IRA entre os sexos. 

A tabela 04 e o gráfico 04 mostram a análise por raça, nota-se que o grupo racial “Outras” teve o maior número de óbitos por IRA tanto para homens (72,52%) quanto para mulheres (67,63%), representando a maioria dos óbitos. A raça “Preta” apresentou o segundo maior número de óbitos, sendo mais comum em homens (17,19%) do que em mulheres (17,63%). Já a raça “Branca” teve o menor número de óbitos, mas, curiosamente, houve uma diferença significativa nas porcentagens entre homens (10,29%) e mulheres (14,74%), com uma porcentagem maior de óbitos entre as mulheres brancas. Dessa forma, a diferença nas porcentagens entre homens e mulheres nas categorias raciais “Pretas” e “Brancas” pode sugerir diferenças nas taxas de mortalidade por sexo em grupos raciais específicos.

CONCLUSÃO

A análise dos óbitos por Insuficiência Renal Aguda na Bahia entre 2014 e 2019 revela um perfil preocupante. A faixa etária mais afetada foi entre 50 e 59 anos, com maior incidência em homens e indivíduos classificados como “Outros” racialmente. Houve um aumento constante nos óbitos ao longo dos anos, indicando a necessidade urgente de estratégias preventivas e acesso a cuidados de saúde.

Esses resultados destacam a importância de abordagens direcionadas para grupos de maior risco, como homens nessa faixa etária e determinados grupos étnicos. É crucial implementar políticas de saúde pública focadas na prevenção, conscientização sobre hábitos saudáveis e melhorias no acesso aos serviços de saúde para mitigar a incidência e mortalidade associadas à Insuficiência Renal Aguda na Bahia.

REFERÊNCIAS

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  9. MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM [site]. DATASUS. 2020. [23 out. 2023]. http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sim/cnv/obt10ba.def.

1Centro Universitário FTC, Curso de Medicina, Salvador, Bahia, Brasil. E-mail: fta.viviane@gmail.com 
2Centro Universitário FTC, Curso de Medicina, Salvador, Bahia, Brasil. E-mail: lucasfand@gmail.com 
3Centro Universitário FTC, Curso de Medicina, Salvador, Bahia, Brasil. E-mail: gabrielcdz13@gmail.com 
4Centro Universitário FTC, Curso de Medicina, Salvador, Bahia, Brasil. E-mail: mariavitorialisboa00@gmail.com 
5Centro Universitário FTC, Curso de Medicina, Salvador, Bahia, Brasil. E-mail: raquel.viana@medicinaftc.com.br