PERFIL EPIDEMIOLÓGICO DA INCIDÊNCIA DE SÍFILIS CONGÊNITA EM UM ESTADO DA AMAZÔNIA LEGAL: ANÁLISE ESTATÍSTICA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10119388


Sayanne Quirino Ferreira Vedana
Aline Simone Dantas Siqueira Carvalho
Carolina Gorayeb Dantas
Adenilson Oliveira Gomes
Samilly Quirino Ferreira
Yamilla Quirino Ferreira
Gerson Jhoseph Lima dos Santos


RESUMO

Objetivo: Analisar a tendência temporal da taxa de incidência de casos novos de Sífilis Congênita em Rondônia e comparar com as incidências da região Norte e do Brasil. Método: Estudo caso ecológico com uso de dados dos dados do Sistema Nacional de Agravos de Notificação – SINAN disponibilizados pelo Departamento de Informática do Sistema único de Saúde – DATASUS submetidos a análise estatística de medidas de dispersão e interpretação deles para avaliar desenvolvimento de sífilis congênita de acordo com fatores de risco selecionados. Resultados: Observou-se uma incidência decrescente no período nas áreas de notificação estudadas no período entre 2018 a 2021. Em Rondônia, não houve tratamento de parceiros adequados, tampouco adesão à realização de pré-natal materna. Pelo menos 1/3 dos casos notificados tiveram diagnóstico tardio (parto) e manteve coeficiente de mortalidade específica por sífilis constante com pico de 19,65 óbitos/ 100.000 nascidos vivos. Conclusão: Nesse estudo foram observados congruência de dados de Rondônia com os nacionais tendo aumento temporal de casos notificados de sífilis congênita, podendo ser resultado da melhor detecção. Porém ainda fora das metas preconizadas pelas autarquias internacionais de saúde, salientando a necessidade de aperfeiçoamento e incremento de novas intervenções públicas nesse agravo.

1. INTRODUÇÃO

Desde seu surgimento no cenário epidemiológico durante o século XV no território europeu, o qual vivia instabilidade civil, econômica e guerras territorialistas, a sífilis tem sido destaque devido sua morbimortalidade além do estigma promíscuo e castigo divino que permanece na contemporaneidade. Após a descoberta do agente etiológico, Treponema pallidum, em 1905, em Berlim, por Fritz Richard Schaudinn e Paul Erich Hoffman, bem como o advento da penicilina têm-se mudado o transcorrer da infecção treponêmica. (CARRARA, 1996).

Desde 1986, é um agravo de notificação compulsória na modalidade congênita, porém somente em 2010 o diagnóstico de sífilis adquirida foi somada a lista de notificação e houve incremento nos métodos de diagnóstico de cada fase/modalidade da infecção treponêmica. Por tratar-se de uma Infecção sexualmente transmissível, a Sífilis emerge no cenário de natalidade brasileira visto que a infecção fetal pela espiroqueta sifilítica causa inúmeras complicações neonatais, maĺ formações fetais o que alicerçam a morbimortalidade do manejo precoce da infecção. Cegueira, surdez, alterações ósseas e dentárias são algumas dos transtornos neonatais que a sífilis congênita traz, bem como infecção liquórica levando ao quadro grave de meningite sifilítica.

Mundialmente, a sífilis ainda afeta um número elevado de gestantes. A Organização Mundial de Saúde (OMS) presumi uma incidência de 12 milhões de novos casos de sífilis anualmente, no mundo, sendo 1 milhão em gestantes. Nos Estados Unidos, a prevalência da SC teve aumento de 27,5% entre 2013 e 2014, chegando a 11,6 casos/100.000 nascidos vivos (NV) em 2014 (ANDRADE ALMB, et al., 2018). No que tange ao Brasil, Em 2022, observou-se uma taxa de incidência de 10,3 casos/1.000 NV no Brasil. (BRASIL, 2023)

A eliminação da sífilis congênita é uma das metas propostas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) prevista dentre os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), estipulando como taxa de incidência 0,5 caso por 1.000 nascidos vivos. Porém os dados brasileiros mais recentes, expressos no Boletim Epidemiológico de Sífilis de 2023, demonstram não só o insucesso em atingir essa meta, como também as crescentes taxas de incidência e mortalidade infantil por essa doença, nos dois últimos anos, a taxa de incidência da sífilis congênita se manteve estável em torno de dez casos por 1.000 nascidos. (BRANCO TJT, et al., 2020; boletim de vigilância 2023)

É importante salientar que o tratamento contra a infecção se baseia ao esquema a base de penicilina, uma dos primeiros antimicrobianos desenvolvidos e que possuem resposta eficaz e pouca resistência antimicrobiana. Isso fez com que as autarquias de saúde do Brasil, ao padronizar os critérios de tratamento adequado em gestantes com diagnósticos de sífilis, definiram que o tratamento a base de penicilina é o padrão- ouro no manejo pré-natal e neonatal do binômio. Paralelamente, os desafios que a comunidade médica enfrenta para diminuir a incidência de sífilis no Brasil são as iniquidades sociais que vitimam grande parte da população usuária do Sistema Único de Saúde – SUS, desde a não realização de consultas mínimas no prénatal, não compreender a gravidade do tratamento inadequado da infecção e a reinfecção por parceiros não tratados (BRASIL, 2022).

Nessa perspectiva, o objetivo do presente estudo é analisar a tendência temporal da taxa de incidência de casos novos de Sífilis Congênita em Rondônia e comparar com as incidências da região Norte e do Brasil nos anos de 2018 a 2021 para que assim se possa apresentar medidas de intervenção efetivas.

2. MATERIAL E MÉTODOS

Este artigo trata-se de um estudo epidemiológico observacional descritivo ecológico de casos notificados de Sífilis Congênita em crianças menores de 1 ano de idade entre os anos 2018 a 2022, residentes no estado de Rondônia, Região Norte e Brasil. Foram utilizados dados do Sistema Nacional de Agravos de Notificação – SINAN disponibilizados pelo Departamento de Informática do Sistema único de Saúde

– DATASUS. Foram calculados incidência absolutas do Brasil, Região Norte e Rondônia, bem como os casos notificados de sífilis congênitas de acordo com as seguintes variáveis: escolaridade materna, realização de pré-natal e tratamento de parceiros. A posteriori, foram submetidos a leitura analítica e construção de hipóteses de acordo com as variáveis adotadas.

Em virtude dos aspectos mencionados, é necessário salientar que os dados a serem utilizados nesta pesquisa já foram coletados para fins de gestão de assistência e vigilância em saúde, e são públicos. Dessa forma, não foi necessária submissão ou parecer de Comitê de Ética em Pesquisa. Assim, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi dispensado de acordo com a Resolução 510/16 do Conselho Nacional de Saúde (CNS).

Ressalta –se , ainda, que a pesquisa foi delineada de acordo com os princípios éticos de respeito à autonomia, não maleficência, beneficência e justiça (deveres prima fascie). A pesquisadora se comprometeu, a todo o momento, respeitar as exigências legais específicas e cumprir as resoluções éticas brasileiras, em especial a resolução 510/16 do CNS. Ética em Pesquisa (CEP).

3. RESULTADOS

No período de 2018-2022 foram notificados, no Brasil, 114.837 novos casos de sífilis congênita destes, sendo 9.824 na Região Norte e 309 no estado de Rondônia. De acordo com medidas de dispersão de dados, observa-se uma maior homogeneidade de casos notificados por ano na Região Norte, em relação ao Brasil e a Rondônia. Nota-se que todos as regiões de notificação obtiveram queda em relação ao ano de 2018 e com ascensão no ano de 2021. Na prática, considera-se que um coeficiente de variância superior a 50% indica alto grau de dispersão e, por consequência, baixa representatividade da média. Por outro lado, quanto menor for o valor de seu coeficiente de variância, mais representativa é a média (MARTINS; DONAIRE, 2004, p. 164).

Tabela 1 – Incidência absoluta de casos notificados de sífilis congênita de acordo com área de abrangência de notificação. Brasil, Região Norte, Rondônia, 2018 a 2022.

BRASIL26.83925.38723.57827.01912.014114.837
REGIÃO NORTE2.2502.2431.8272.3261.1789.824
RONDÔNIA119806941309

Fonte: Ministério da Saúde/SVS – Sistema de Informação de Agravos de Notificação – Sinan Net

Tabela 2 – Medidas de dispersão estatística dos casos confirmados de sífilis Congênitas de acordo com a área de abrangência de notificação. Brasil, Região Norte, Rondônia 2018-2021

BRASIL22967,439402254,36277,12149827,3%
REGIÃO NORTE1964,8231810,7481,467236724,5%
RONDÔNIA(1)77,251044,2532,3148572641,8%

Fonte: Ministério da Saúde/SVS – Sistema de Informação de Agravos de Notificação – Sinan Net
1. Rondônia foi calculado de acordo com casos confirmados do período de 2018-2021

O número de nascidos vivos no Brasil no período de 2018-2022 teve uma média de 2.752.329 , na região Norte 306.473 e em Rondônia 26.251. A partir do número de nascidos vivos de cada ano e casos notificados de sífilis congênita foi obtido a taxa de incidência anual de cada área de notificação (Figura 1). Todas as regiões analisadas nesse presente estudo obtiveram queda na taxa de incidência e a diferença de dados refletem a maior proporção de casos notificados de acordo com a área de notificação, isto é, Brasil tem incidência maior que Região Norte e Rondônia por haver dados com número maior.

Figura 1 – Taxa de incidência por 1.000 nascidos vivos segundo país, região e estado por ano de diagnóstico. Brasi, 2018-2022.

Fonte: Ministério da Saúde/SVS – Sistema de Informação de Agravos de Notificação-Sinan Net

Levando em consideração tratamento de parceiros em mulheres gravidas e casos de notificados de sífilis congênita observa-se uma congruência da proporção entre essas variáveis no Brasil e Rondônia, embora o Brasil tenha uma maior relação entre ausência de tratamento do parceiro com sífilis e o desenvolvimento da sífilis congênita no RN (Figura 2).

Figura 2 – Percentual dos casos notificados cujos parceiros da grávida não receberam tratamento antitreponêmico. Brasil, Rondônia 2018-2021.

Fonte: Ministério da Saúde/SVS – Sistema de Informação de Agravos de Notificação-Sinan Net

Em RNs diagnosticados com sífilis congênita cuja mãe realizou diagnóstico de sífilis materna durante o pré-natal obtivemos uma distribuição linear no que diz respeito ao Brasil, porém em Rondônia a distribuição ao longo dos anos foi heterogênea estando em queda até 2020 e ascensão novamente em 2021 (Figura 3).

Figura 3 – Proporção de casos confirmados apesar do diagnóstico no pré-natal. Brasil, Rondônia, 2018-2021.

Fonte: Ministério da Saúde/SVS – Sistema de Informação de Agravos de Notificação-Sinan Net

A realização do pré-natal pela população de mulheres grávidas, andam em consonância com a escolaridade. Como é ilustrado nos gráficos 4 houve similaridade da proporção de casos notificados cujas mães não realizaram pré-natal e que têm baixa escolaridade, mais evidente no ano de 2020.

Figura 4 – Proporção de casos confirmados cujas mães realizaram o pré-natal e
proporção das mães com baixa escolaridade. Brasil, Rondônia, 2018-2021

Fonte: Ministério da Saúde/SVS – Sistema de Informação de Agravos de Notificação-Sinan Net

O tratamento antitreponêmico é eficaz, porém é critério preconizado pelas autarquias de saúde brasileira que o início do tratamento seja feito durante a gestação pelo menos 30 dias antes do termo para considerarmos a gestante adequadamente tratada (BRASIL, 2022). Assim o diagnóstico durante o pré-natal é um dos pilares para controle da morbimortalidade do RN exposto a sífilis. Sob a análise dessas variáveis também há semelhança entre proporções dos casos notificados de sífilis e a realização diagnóstico no pré-natal de sífilis maternas obedecendo as devidas diferenças entre casos notificados em cada região de notificação.

Figura 5 – Percentual dos casos notificados cujos parceiros da grávida não receberam tratamento antitreponêmico. Brasil Rondônia 2018-2021.

Fonte: Ministério da Saúde/SVS – Sistema de Informação de Agravos de Notificação-Sinan Net

Dados retrospectivos analisados no último boletim epidemiológico de Sífilis no Brasil elucidam que o coeficiente de mortalidade infantil específica por sífilis elevou-se em 54,4% quando comparados os anos 2012 e 2022 (de 5,1 para 7,8 óbitos /100.000 NV). Embora tem havido realização de pré-natal em considerável fração da população exposta, nota-se que o diagnóstico de sífilis congênita foi realizado tardiamente (parto/curetagem), denotando falha na cadeia terapêutica.

Figura 6 – Proporção de casos notificados de sífilis congênita por casos com diagnóstico tardio, Rondônia, 2018-2021.

Fonte: Ministério da Saúde/SVS – Sistema de Informação de Agravos de Notificação-Sinan Net

Não obstante às intervenções em saúde para diminuição dos índices de sífilis congênita, obtivemos em Rondônia uma taxa de mortalidade com pico de 12,20% em 2021 no período analisado, e um coeficiente de mortalidade com 10 óbitos por 100.000 NV a mais que em relação ao mesmo dado do Brasil.

4. DISCUSSÃO

Embora a sífilis seja uma infecção sexualmente transmissível de fácil diagnóstico, manejo e prevenção ainda figura como importante causa de óbito fetal e morbimortalidade neonatal (PEELING et al., 2017).). No que tange a mortalidade infantil, no país, as principais causas são doenças adquiridas no período perinatal (58,2% dos óbitos) e, paralelamente, a maior fração do total de óbitos ocorrem em até seis dias de vida. No Brasil em 2022, dados do SINAN expressos no boletim Epidemiológico de Sífilis – 2023 demonstram que em 2022, foram notificados no país 213.129 casos de sífilis adquirida, 83.034 casos de sífilis em gestantes, 26.468 casos de sífilis congênita e 200 óbitos por sífilis congênita (taxa de mortalidade infantil específica por sífilis congênita de 7,8 óbitos/100.000 NV) (BRASIL, 2022).

No cenário de transmissão vertical da sífilis, o status de infecção da genitora emerge como o principal alvo de intervenção, pois uma vez infectado o recém-nascido já está exposto a possíveis danos crônicos irreversíveis a sua saúde pela infecção treponêmica. É necessário ser instituído com esquema intramuscular de penicilina benzatina 30 dias antes do termo, idealmente, o tratamento materno deve ser administrado no primeiro trimestre, ou o mais cedo possível, se os cuidados pré-natais (CPN) forem iniciados mais tarde. (WHO, 2021).

Após um novo entendimento biopsicossocial e de determinantes sociais do processo-saúde e doença pela comunidade de saúde no final da década de 1990, o entendimento de saúde coletiva vem sendo orientado de que fatores sociais do indivíduo contribuem para seu adoecimento (CEBALLOS, 2015). Nessa perspectiva, a escolaridade materna influencia os índices de infecção materna pela sífilis, reinfecção durante a gestação, diagnóstico inoportuno e as demais consequências neonatais para o RN (ROCHA et al., 2021). No Brasil, a taxa de analfabetismo das mulheres de 15 anos ou mais, em 2022, foi de 5,4%, enquanto a dos homens foi de 5,9%, paralelamente apenas 29,9% da população com mais de 25 anos possui ensino educação básica obrigatória – ou seja, concluíram, no mínimo, o ensino médio.

Tal fato corrobora o percentual de 70% dos casos notificados de sífilis congênita em Rondônia em 2019 são filhos de mãe com baixa escolaridade. Cenário congruente encontrado no Acre no período de 2009 a 2018 (BRANCO et al., 2020). Embora essa proporção rondoniense tenha declinado para 46,3% em 2021, permanece sendo um possível catalizador dessa incidência. Ao passo que no Brasil, houve uma distribuição linear ao longo do período. Além disso, a falta de instrução do parceiro bem como a construção idiossincrática das políticas de saúde, que sempre foram excludentes em relação ao homem, provocando a baixa procura por atendimento o pode ser empecilho a sua adesão ao tratamento antitreponêmico, o que o torna vetor de reinfecção materna (CAPILHEIRA; SANTOS, 2006). Em Rondônia, observa-se que há considerável fração dos RN que cujos parceiros de suas genitoras não foram tratados para sífilis (Figura 4), embora seja o estado com maior percentual de tratamento no Brasil (49,9%). Esse fato deságua à jusante de um ciclo de reinfecção que pode passar despercebido se não há acompanhamento contínuo de pré-natal na atenção básica, demonstrado em um estudo analisando cinco maternidades de Fortaleza (CAMPOS etal., 2012).

O mais recente protocolo brasileiro para o manejo de sífilis na gestação (Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Atenção Integral às Pessoas com Infecções Sexualmente Transmissíveis – IST) parte do status de adequação de tratamento materno para notificação de sífilis congênita, isto é, se o tratamento não foi adequado já é critério para notificação. Considera-se tratamento adequado para sífilis durante a gestação: o tratamento completo de acordo com o estágio clínico da sífilis com benzilpenicilina benzatina, iniciado até 30 dias antes do parto. Mesmo que a mãe seja adequadamente tratada a propedêutica de investigação continua com VDRL materno e do RN simultâneos, cujo resultado positivo em duas titulações maior que a mãe configura critério de notificação, bem como alteração de exame físico associado a VDRL positivo (BRASIL, 2022).

A transmissão vertical pode ocorrer a partir da 9ª semana de gestação, sendo mais frequente entre a 16ª e 28ª semanas, reforçando assim a necessidade do diagnóstico e tratamento precoces (CARDOSO ARP, et al., 2018).

Sob essa perspectiva, a realização de pré-natal materno é indispensável para o manejo de sífilis na gestação e prevenção de sífilis congênita. É a ferramenta primordial que evidenciará no momento do termo, em registro na caderneta da gestante, se os critérios de tratamento materno adequado foram atendidos, além de avaliar a resposta terapêutica acompanhando o transcorrer da infecção na gravidez e a realização de testes sorológicos par avaliar queda de titulações do VDRL, possibilidade de reinfecção, (DOMINGUES et al, 2021). Assim é necessário o controle de remissão de doença da gestante a fim de realizar uma avaliação, controlando assim, as possíveis reinfecções especialmente quando o parceiro não adere ao tratamento (MOURA MCLC, et al., 2019).

Dessa forma, pode-se salientar a diferença entre a proporção nacional (média de 81,9% entre os anos 2018-2021) com a de Rondônia na realização positiva de PréNatal com média de 71,2% por ano entre o período analisado, chegando a 63,8% em 2020. Isso pode inferir que em Rondônia, há problemas de execução na assistência pré-natal no que diz respeito a acesso, e resolutividade visto que há grande proporção de casos confirmados a despeito da realização do pré-natal. Assim, embora a taxa de detecção esteja a caminho da meta do indicador de processo número 5 do relatório de validação para Certificação da Eliminação da Transmissão Vertical de HIV e/ou Sífilis (≥95%), a longo prazo a resolutividade da assistência deve ser aperfeiçoada, com dispensação de antibiótico penicilínico, rastreio de reinfecções e documentação de resposta terapêutica ao manejo clínico da sífilis materna (BRASIL, 2021).

A sífilis permanece causando óbitos pela infecção congênita no Brasil contemporâneo. No último ano (2022), foram notificados 200 óbitos por causa específica de sífilis congênita no país, gerando uma taxa de mortalidade específica de 7,8 óbitos/ 100.000 NV. Para fins de análise, a mesma taxa em Rondônia foi de 4 óbitos/100.000 NV, sendo que se trata de apenas uma UF, que possui barreiras de subnotificação.

Vale salientar que os dados das variáveis analisadas nesse artigo obtiveram queda em 2020, o impacto do covid-19 contribuiu para um declínio de 23,4% na taxa, em comparação com 2019. Ademais, após a pandemia, as taxas de detecção de sífilis adquirida atingiram patamares superiores ao período pré-pandêmico. Esse fato atrelado a subnotificação podem deturpar os indicadores (BRASIL, 2023).

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A sífilis congênita continua sendo um agravo com grande importância no cenário de natalidade rondoniense, sendo responsável por importante mortalidade infantil específica de uma doença evitável. Nesse estudo foram observados congruência de dados de Rondônia com os nacionais, embora em Rondônia se realizou menos prénatal nas mães dos RN que foram notificados com sífilis congênita. Além disso, a baixa escolaridade materna é evidenciada em maior fração dos casos notificados no estado estudado que nas áreas de notificação analisadas, possivelmente refletindo a baixa adesão na realização de pré-natal em Rondônia. Pelo menos um terço dos casos notificados no estado, em todos os anos analisados, tiveram diagnóstico no parto que, atrelada a baixa proporção de parceiros tratados, podem denotar a reinfecção materna como incremento na permanência de linearidade da incidência anual de sífilis congênita. Dessa maneira, o aperfeiçoamento das estratégias de saúde pública já implementadas no Brasil e em Rondônia, bem como novas intervenções terapêuticas e preventivas, como o estreitamento da participação de parceiros no prénatal, são possíveis pilares que alicerçarão o caminho para que esse agravo tenha alcance metas preconizadas pela OMS/OPAS.

As limitações desse artigo estão na insuficiência de dados disponíveis nas plataformas para conseguirmos calcular risco relativo entre as variáveis maternas e o desfecho dos RN no desenvolvimento ou não da sífilis congênita. Por exemplo, para analisar se há maior risco de desenvolvimento de sífilis congênita em mulheres com baixa escolaridade faz-se necessário tabelar o número de gestantes com baixa escolaridade com RNs com e sem sífilis congênita, bem como o número de gestantes com escolaridade média/alta com RNS com e sem sífilis. Sem esses dados, não é possível determinar estatisticamente risco relativo nem aplicar teste de chi quadrado. Dessa forma, salienta-se a necessidade de aperfeiçoamento da ficha de notificação para que esses dados epidemiológicos não sirvam apenas para calcularmos incidência e medidas de frequência.

6. REFEREÊNCIAS

BRANCO, T. J. T.; LEALE, A. S.; FREITAS, T. F.; MANZATI, B. B. Perfil epidemiológico dos casos notificados de sífilis congênita no estado do Acre nos anos de 2009-2018. Revista Eletrônica Acervo Saúde, v. 12, n. 9, p. e4347, 25 set. 2020.

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BRASIL. Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Atenção Integral às Pessoas com Infecções Sexualmente Transmissíveis – IST, Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. – Brasília : Ministério da Saúde, 2022.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Guia para Certificação da Eliminação da Transmissão Vertical de HIV e/ou Sífilis / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. 2. ed. – Brasília : Ministério da Saúde, 2021.

CAMPOS, A. L. DE A. et al.. Sífilis em parturientes: aspectos relacionados ao parceiro sexual. Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, v. 34, n. 9, p. 397–402, set. 2012.

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