PERFIL CLÍNICO-EPIDEMIOLÓGICO DOS ÓBITOS POR DOENÇA RENAL CRÔNICA NO BRASIL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10212052


Diego de Sousa Silva1
Flávia da Conceição Silva Reis2
Itallo Alves dos Reis3
Claudia de Sousa Fidelis4
Elton Robson Sodré Menezes5
Luis Felipe Monteiro de Sousa Macedo6
Franklin Reis Fonseca de Araujo7
Thayse Cristina Oliveira Marinho8
Jusciellyson da Silva Nava9
Mario Vinicius Teles Costa10


RESUMO

Introdução: A doença renal crônica (DRC) é um problema mundial de saúde pública. No Brasil, apresenta mortalidade de 19,5% e com tendência de alta nos últimos 12 anos. Objetivo: Descrever o perfil clínico-epidemiológico de pacientes que evoluíram a óbito relacionado a DRC no Brasil. Procedimentos metodológicos: Trata-se de uma revisão integrativa de literatura, na qual 102 artigos foram estabelecidos nas bases de dados MEDLINE, LILACS e BDENF. Ao final, 8 artigos foram incluídos para compor a amostra. Resultados e Discussão: O perfil dos brasileiros que mais evoluem a óbito relacionado a DRC é representado por homens brancos, de idade avançada, de baixa escolaridade, residentes nas regiões Sudeste e Nordeste, que são atendidos no sistema público e dificilmente são avaliados por médico nefrologista. Eles são fumantes e têm diabetes e hipertensão arterial como comorbidades associadas. Considerações finais: É evidente a complexidade da DRC e as diversas variáveis de agravos à saúde relacionadas. O perfil de saúde desses pacientes pode contribuir para medidas de prevenção e controle.

Palavras-chave: Epidemiologia. Insuficiência Renal Crônica. Óbito.

ABSTRACT

Introduction: Chronic kidney disease (CKD) is a global public health problem. In Brazil, mortality rates are 19.5%, with an upward trend over the last 12 years. Objective: To describe the clinical-epidemiological profile of patients who died related to CKD in Brazil. Methodological procedures: This is an integrative literature review, in which 102 articles were established in the MEDLINE, LILACS and BDENF databases. In the end, 8 articles were included to compose the sample. Results and Discussion: The profile of Brazilians who most commonly die from CKD-related deaths is represented by white men, of advanced age, with low education, living in the Southeast and Northeast regions, who receive care in the public system and are rarely evaluated by a nephrologist. They are smokers and have diabetes and high blood pressure as associated comorbidities. Final considerations: The complexity of CKD and the various variables of related health problems is evident. The health profile of these patients can contribute to prevention and control measures.

Keywords: Epidemiology. Renal Insufficiency Chronic. Death.

1.               INTRODUÇÃO

A Doença Renal Crônica (DRC) é caracterizada pela perda progressiva e irreversível da função renal secundária ao acúmulo de toxinas urêmicas, que provoca alterações do equilíbrio hidroeletrolítico e acidobásico. É uma doença multifatorial que progride a partir da hipertensão glomerular e da modificação do parênquima renal. Com a perda de néfrons sadios, há alterações na dinâmica glomerular com consequente hipertensão nos néfrons remanescentes. Mecanismos compensatórios, em resposta ao aumento da pressão intraglomerular, agem no parênquima renal modificando suas características de tal forma que os mecanismos de adaptação são, também, os responsáveis pela progressão da doença (ANDRADE; ANDRADE, 2020).

Siviero, Machado e Cherchiglia (2014) estimaram que a incidência global da Doença Renal Cônica aumenta cerca de 8% ao ano, por isso é considerada como um problema mundial de saúde pública. No Brasil, para cada paciente mantido em programa de diálise crônica, existiriam entre 20 e 25 pacientes com algum grau de disfunção renal, ou seja, entre 1,2 e 1,5 milhão de brasileiros com doença renal crônica em estadiamento variável da doença. Portanto, os dados apontam para uma doença ainda subdiagnosticada (ROMÃO JUNIOR, 2004).

A estimativa do Censo Brasileiro de Diálise Crônica mostrou que em 2018, mais de 130 mil pessoas viviam com DRC e estavam em terapia renal substitutiva, com taxa de mortalidade bruta de 19,5% e com tendência de alta nos últimos nove anos (NEVES et al., 2020).

Aguiar et al. (2020) afirma que a doença apresenta alterações heterogêneas que ocorrem na estrutura e na função renal, evoluindo de forma silenciosa até atingir estágio avançado, de modo que se detectada tardiamente provoca lesões de difícil controle e tratamento. Nesses pacientes, os fatores que propiciam a desordem metabólica são: diabetes mellitus, hipertensão arterial, hipercolesterolemia, tabagismo, alcoolismo, sobrepeso/obesidade, dieta e maior idade.

No Brasil e em vários outros países, a DRC está associada às condições sociais, econômicas e demográficas, ao comportamento de risco e a comorbidades. A região brasileira com maior índice de mortalidade por DRC é o Sudeste, enquanto Nordeste e Norte apresentam menor número de casos. No mundo, os óbitos pela DRC estão relacionados a homens, brancos, de idade avançada, com história de tabagismo, etilismo, e comorbidades como anemia, doença óssea, aumento do risco de doenças cardiovasculares e câncer (WEBSTER et al.,2017).

Rezende et al. (2021) relaciona a velocidade da perda renal com a hipertensão arterial, diabetes e doença cardiovascular. Embora seja uma doença grave, a DRC pode ser prevenida e tratada. O diagnóstico precoce e o tratamento adequado desses agravos são essenciais como ação preventiva. Ainda segundo o autor, por situar-se na fase terminal ou avançada de uma sequência de doenças que leva à morte, a DRC é usualmente preterida em relação às demais.

As doenças crônicas se relacionam com a piora da qualidade de vida, além de elevarem sobremaneira os custos financeiros do sistema de saúde. Também trazem custos indiretos para a sociedade e Estado, pois o setor produtivo é impactado pela redução da produtividade devido às limitações físicas dos doentes, ocasionando a perda de dias de trabalho (PERES et al., 2010). Considerando o exposto, este estudo tem como objetivo geral descrever o perfil clínico-epidemiológico de pacientes que evoluíram a óbito relacionado a doença renal crônica no Brasil.

2.               PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Trata-se de uma Revisão Integrativa da Literatura (RIL), de caráter descritivo, realizada através do levantamento bibliográfico, em abril de 2023. O estudo presente foi desenvolvido seguindo as seis fases de elaboração da revisão integrativa: elaboração da pergunta norteadora, busca na literatura, coleta de dados, análise crítica dos estudos incluídos, discussão dos resultados e apresentação da revisão (SOUZA; SILVA; CARVALHO, 2010).

 Para elaboração da pergunta norteadora, conforme recomenda Santos, Pimenta e Nobre (2007), foi utilizada a estratégia PICo (População, Interesse/fenômeno de interesse e Contexto). O primeiro elemento (P) consiste em “Pacientes com Doença Renal Crônica (DRC)”; o segundo elemento (I) representa os “Fatores clínicos e epidemiológicos associados”; e o terceiro elemento (Co) destina-se a pesquisar os “Óbitos pela doença no Brasil”. Assim, partindo dessa perspectiva, a questão norteadora do estudo foi: Quais são os fatores clínicos e epidemiológicos associados aos óbitos por Doença Renal Crônica no Brasil?

A busca pelos artigos foi realizada nas bases de dados Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Medical Literature Analysis and Retrieval Sistem online (Medline) e Banco de Dados em Enfermagem – Bibliografia Brasileira (BDENF), pela combinação dos Descritores em Ciências da Saúde: “perfil epidemiológico”, “perfil de saúde”, “doença renal crônica”, “óbitos”, “morte” e “Brasil”, com os operadores booleanos AND e OR.

Os critérios de inclusão definidos foram: idioma (português e inglês), disponibilidade do conteúdo (texto integral) e data de publicação (2013 a 2023). Foram excluídos os artigos não relacionados ao tema, além de trabalhos de conclusão de curso, teses, dissertações e revisões. Foi feita a leitura do título e resumo de cada artigo para verificação da temática e elegibilidade, sendo removidos os artigos que não responderam à pergunta norteadora.

Para a apresentação dos resultados, os dados dos artigos selecionadas foram distribuídos e organizados considerando ano, autor(es), país, população e/ou amostra, objetivo e principais achados, em diagrama de Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA) para revisão integrativa (PAGE et al., 2018).

3.               RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram achados durante a pesquisa 102 artigos estabelecidos nas bases de dados e, após a identificação, cinco artigos foram excluídos por duplicidade e um por não estar disponível na íntegra. Após essa etapa, 96 foram avaliados para a elegibilidade, sendo 73 excluídos após a leitura dos títulos e resumos, onde realizou-se a leitura integral de 23 estudos, e 15 excluídos por não atenderem a questão norteadora, sendo 8 artigos compondo a amostra final (Figura 1).

Figura 1: fluxograma do processo de seleção dos artigos

Fonte: Adaptado do PRISMA (2018).

Os artigos incluídos foram publicados em periódicos brasileiros e estrangeiros, sendo cinco deles escritos em língua inglesa. As informações sobre os artigos foram organizadas e sintetizadas no Quadro 1, com o intuito oferecer mais detalhes sobre os estudos selecionados.

Quadro 1: Caracterização dos estudos com os achados relativos ao perfil de óbitos associados doença renal crônica no Brasil.

Autor, ano/ título/ PeriódicoObjetivo / Materiais e métodosPerfil dos pacientes que evoluíram a óbito
BARRA et al. (2022)   Characteristics and predictors of mortality on haemodialysis in Brazil: a cohort of 5,081 incident patients.

Periódico: BMC Nephrology.
Avaliar os principais preditores de morte em uma grande população em hemodiálise em um país em desenvolvimento.   Estudo de coorte com 5.081 pacientes dialíticos, entre 2012 e 2017.  Ser mais velho, iniciar diálise no hospital, ter diabetes como causa da insuficiência renal, fosfatase alcalina alta, cateter venoso central como primeiro acesso vascular e sobrecarga hídrica foram associados a maior risco de morte.
SILVA et al., 2022   Mortalidade por doença renal crônica secundária à hipertensão no Brasil: um estudo do “Global Burden of Disease”.

Periódico: Rev. Bras. Contr. Epidem.
Descrever as variações da mortalidade por DRC secundária à hipertensão arterial no Brasil entre 1990 e 2019.   Estudo epidemiológico a partir de óbitos por DRC secundária a HAS.Ser do sexo masculino, ter mais de 70 anos, ter hipertensão arterial sistêmica e diabetes associadas, ter maiores valores de pressão arterial, menor taxa de filtração glomerular e maior nível de creatinina sérica.
FERNANDES et al. (2013)   Association of Ethnicity and Survival in Peritoneal Dialysis: A Cohort Study of Incident Patients in Brazil.

Periódico: AJKD.
Avaliar o efeito da etnia na mortalidade de pacientes dialíticos no Brasil.   Estudo de coorte observacional prospectivo com 2.159 pacientes dialíticos, entre 2004 e 2007.  1.370 pacientes eram brancos, 516 eram pardos e 273 eram negros. O modelo de risco competitivo mostrou maior mortalidade em pacientes brancos em comparação com pacientes pretos e pardos.
DOMINGOS et al. (2017)   Chronic kidney disease – determinants of progression and cardiovascular risk. PROGREDIR cohort study: design and methods.   Periódico: São Paulo Med. J.Criar uma coorte que contemplasse formas mais avançadas de DRC (estágios 3 e 4).   Estudo de coorte prospectivo com 454 pacientes de São Paulo, de 2012 a 2013.A média de idade foi de 67 anos; 63% eram homens; 60% eram fumantes ou ex-fumantes; 45% diabetes; e 32% relataram infarto do miocárdio prévio. Os escores de calcificação da artéria coronária também foram altos, com mais da metade dos casos apresentando um escore de Agatston acima de 100.  
BERSAN et al. (2013)   Letalidade e internações de pacientes em hemodialise em plano de saúde.

Periódico: Rev. Saúde Pública.
Analisar desfechos clínicos de pacientes em hemodiálise vinculados a plano de saúde.   Estudo de coorte com dialíticos em Belo Horizonte (MG), de 2004 a 2008.  Associaram-se a maior risco para óbito a idade avançada, diabetes mellitus, não realizar consulta prévia com nefrologista e internar-se no primeiro mês de hemodiálise.
SIVIERO; MACHADO; CHERCHIGLIA, 2014   Insuficiência renal crônica no Brasil segundo enfoque de causas múltiplas de morte.   Periódico: Cad. saúde colet. (Rio J.)Investigar a mortalidade por DRC no Brasil por meio das causas múltiplas de morte.   Estudo epidemiológico, na Base Nacional de Dados em Terapia Renal Substitutiva, entre 2000 e 2004.Entre os resultados destaca-se que aproximadamente 48% dos óbitos decorreram, provavelmente, de complicações do tratamento (hemodiálise) e 39%, de diabetes, além de uma condição cardiovascular na declaração de óbito.  
BASTOS; REIS; CHERCHIGLIA, 2022   Health-related quality of life associated with risk of death in Brazilian dialysis patients: an eight-year cohort.   Periódico: Quality of Life Research  Examinar associações entre qualidade de vida e risco de morte em pacientes brasileiros submetidos à terapia dialítica entre 2007 e 2015.   Estudo de coorte observacional com pacientes dialíticos.Entre os pacientes em hemodiálise, a morte foi associada com os domínios físico e componente físico resumido. Em relação aos pacientes com diálise peritoneal, a morte foi associada à dor corporal, saúde mental, emocional e funcionamento social.
DE LIMA et al. (2022)   Diastolic and systolic left ventricular dysfunction and mortality in chronic kidney disease patients on haemodialysis.   Periódico: Nephrology (Carlton)Verificar se as disfunções diastólica e sistólica do ventrículo esquerdo são preditivos de mortalidade por todas as causas e se têm efeitos comparáveis ou diferentes nos resultados.   Estudo retrospectiva dos dados ecocardiográficos de 1.285 pacientes em hemodiálise acompanhados até o óbito ou transplante.  Durante um seguimento de 30 meses, 33% dos pacientes morreram, sendo 53% por evento cardiovascular. Foi encontrada uma associação gradual e progressiva entre as categorias de disfunção diastólica do ventrículo esquerdo e o risco de morte.

Fonte:Os autores (2023).

Essa pesquisa demonstrou que maior parte dos óbitos associados a doença renal crônica são de pessoas atendidas nos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) e que dificilmente conseguem ser atendidos por um médico nefrologista. Esses indivíduos, em sua maioria, são do sexo masculino, com todas as pesquisas indicando percentuais acima de 60% entre os homens (BERSAN et al., 2013; SIVIERO; MACHADO; CHERCHIGLIA, 2014; DOMINGOS et al., 2017; BARRA et al., 2022; DE LIMA et al., 2022).

Somente o estudo de coorte observacional com pacientes dialíticos desenvolvido por Bastos, Reis e Cherchiglia (2022) apresentou maior percentual feminino, tanto na população do estudo (55%) quando nas taxas de incidência (54%) e de prevalência (56%). Os demais trabalhos não demonstraram associação significativa para a variável sexo.

Com relação a faixa etária, os estudos demonstraram que os indivíduos com idade mais avançado são maioria no índice de mortalidade por doença renal crônica, com todas as pesquisas indicando média a partir de 60 anos de idade, independente do gênero (BERSAN et al., 2013; SIVIERO; MACHADO; CHERCHIGLIA, 2014; DOMINGOS et al., 2017; BASTOS; REIS; CHERCHIGLIA, 2021; BARRA et al., 2022; SILVA et al., 2022).

O fator idade é um aspecto importante do perfil epidemiológico desses pacientes tendo em vista sua relação com a qualidade de vida. O estudo de coorte de Bastos, Reis e Cherchiglia (2021), que tinha como objetivo examinar associações entre qualidade de vida e risco de morte em pacientes brasileiros submetidos à terapia dialítica entre 2007 e 2015, sugeriu medidas de intervenção precoce e oportuna visando melhorar a qualidade de vida de pacientes em diálise, pois estas podem contribuir de forma positiva com os demais fatores associados à mortalidade de pacientes em diálise.

Nos estudos de Silva et al. (2022), o envelhecimento mostrou-se como o principal fator de risco para morte por DRC, visto que, em tal processo, eventos como a arteriosclerose com concomitante perda progressiva da função renal, evidenciada pela redução da taxa de filtração glomerular com o avançar da idade, podem comprometer ainda mais a função renal na presença de doenças como a HAS, que se apresenta como uma das doenças mais prevalentes em idosos, gerando estresse direto sobre o sistema renal.

Analisando o fator cor/raça, Fernandes et al. (2013) demonstrou que os brasileiros brancos em tratamento dialítico têm maior risco de mortalidade em comparação com pacientes pretos e pardos. O total de óbitos de pacientes brancos foi de 1.370 (63,4%), enquanto em pacientes pretos e pardos foram de 273 (12,6%) e 516 (24%), respectivamente. Os estudos de Fernandes et al. (2013), Domingos et al. (2017) e De Lima et al. (2022) também demonstraram a maior parcela de óbitos por DRC entre indivíduos brancos, todos com mais de 65%.

A pesquisa de Barra et al. (2022) foi a única que apresentou maioria dos óbitos em indivíduos não-brancos (56,6%). O autor analisou os fatores preditores de morte em 5.081 pacientes dialíticos, entre 2012 e 2017. Os demais trabalhos não demonstraram associação significativa para essa variável.

Em relação a localidade, a região brasileira com maior número de óbitos por DRC foi a Sudeste, seguida da região Nordeste (FERNANDES et al., 2013; SILVA et al., 2022). A maior parte desses pacientes foi atendida em serviço público de saúde, segundo Barra et al. (2022). A escolaridade dos pacientes que mais morrem por doença renal crônica foi até o Ensino Primário (55%), demonstrado por Fernandes et al. (2013).

A associação dos óbitos com hábitos de vida e comorbidades pré-existentes também foi apresentada nos estudos. O tabagismo esteve presente em mais de 50% dos casos (DOMINGOS et al., 2017; DE LIMA et al., 2022). A consulta médica com nefrologista, que é o especialista em doenças renais, foi avaliada nos estudos de Barra et al. (2022) e Bersan et al. (2013), sendo consideradas de forma tardia. Nesses estudos, apenas 39% e 36,9% dos pacientes conseguiram ser encaminhados de forma precoce a um serviço de nefrologia, respectivamente. Neste último estudo, 50% dos pacientes que morreram sequer foram avaliados por um médico nefrologista, evidenciando que existe lacunas a serem preenchidas no âmbito da gestão hospitalar.

Com relação às comorbidades, diabetes mellitus e hipertensão arterial sistêmica foram as condições associadas mais prevalentes entre os óbitos relacionados a doença renal crônica no Brasil (BERSAN et al., 2013; FERNANDES et al., 2013; DOMINGOS et al., 2017; BARRA et al., 2022; DE LIMA et al., 2022; SILVA et al., 2022). Outra condição importante foi a dislipidemia, fator diretamente ligado aos 32% com história prévia de infarto agudo do miocárdio nos pacientes. O grau de calcificação da coronária também foi alto em mais de 50% dos casos (DOMINGOS et al., 2017).

Siviero, Machado e Cherchiglia (2014) demonstraram, ainda, que a anemia é uma das complicações que pode aparecer em qualquer estágio da DRC, tornando-se mais prevalente e severa de acordo com a progressão da insuficiência renal. A presença da anemia acarreta uma série de consequências aos pacientes portadores de DRC.

Por sua vez, Domingos et al. (2017) avaliaram diversos dados clínicos de pacientes em tratamento dialítico, tais como história médica, frequência alimentar, antropometria, exames laboratoriais, nível de cálcio, ecocardiograma, espessura médio-intimal da artéria carótida, velocidade da onda de pulso, retinografia e variabilidade da frequência cardíaca. A população analisada tinha principalmente DRC nos estágios 3 e 4, com uma média estimada da taxa de filtração glomerular 38,4 ml/min/1,73 m2. A variação da albuminúria foi ampla, com frequências de normoalbuminúria (35%), microalbuminúria (31%) e macroalbuminúria (34%).

Também de forma isolada, De Lima et al. (2022) verificou se a disfunção diastólica do ventrículo esquerdo e a disfunção sistólica do ventrículo esquerdo eram prevalentes nas causas associadas a morte por DRC. O desfecho foi mortalidade por todas as causas. Durante 30 meses, 33% dos pacientes morreram, 53% devido a eventos cardiovasculares. Foi encontrada uma associação gradual e progressiva entre as categorias de disfunção diastólica e o risco de morte. Observou-se uma associação progressiva entre os graus de disfunção sistólica e a mortalidade.

Por fim, pacientes com alta sobrecarga hídrica, que fizeram a primeira diálise no hospital e que o primeiro tipo de acesso foi o cateter venoso central tiveram maior prevalência entre os óbitos associados a doença renal crônica (BERSAN et al., 2013; SIVIERO; MACHADO; CHERCHIGLIA, 2014; BARRA et al., 2022). Considerando, portanto, que a DRC é um importante problema de saúde pública, o enfermeiro ao prestar cuidados às pessoas portadoras desta enfermidade, tanto na atenção básica quanto no âmbito hospitalar, vê-se frente a um grande desafio – sistematizar o cuidado. Assim sendo, a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE), neste contexto, emerge como instrumento essencial que pode subsidiar e/ou guiar a assistência de enfermagem, com foco na integralidade das dimensões do ser cuidado e garantindo ao enfermeiro, autonomia e segurança, além de atendimento humanizado e individual (MASCARENHAS et al., 2011).

3.     CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foi possível constatar nessa pesquisa que o perfil dos pacientes que mais evoluem a óbito relacionado a doença renal crônica no Brasil é representado por homens brancos, de idade avançada, de baixa escolaridade, residentes nas regiões Sudeste e Nordeste, que são atendidos nos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) e que dificilmente conseguem ser atendidos por um médico nefrologista. Nesse perfil, os indivíduos são fumantes ou ex-fumantes e que apresentam, também, diabetes e hipertensão arterial como comorbidades associadas.

Os estudos mostraram que é evidente a grande complexidade da doença renal crônica e as diversas variáveis de agravos à saúde aos quais os pacientes estão expostos. As taxas de morbimortalidade são altas e não devem ser naturalizadas pela sociedade e pelas instituições de saúde. Devem ser combatidas, principalmente através de medidas de promoção à saúde.

Assim, espera-se que os resultados deste estudo possam servir de apoio para as políticas públicas de saúde, de modo a auxiliar os profissionais de saúde e gestores a adotarem estratégias eficazes, que possibilitem ao paciente maior compreensão e conhecimento em relação à própria doença, proporcionando-lhe não somente maior autonomia, mas uma boa adesão ao tratamento para evitar consequências, e tendo assim, melhora na sua qualidade de vida.

Nesse contexto, a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE) ao paciente com doença renal crônica deve ser priorizada e pensada nas diferentes variáveis, direcionando as medidas de gestão hospitalar e seus protocolos, a minimizarem efeitos negativos na qualidade de vida e, ainda, a auxiliarem na redução da mortalidade e seus preditores nesses pacientes.

4.     CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foi possível constatar nessa pesquisa que o perfil dos pacientes que mais evoluem a óbito relacionado a doença renal crônica no Brasil é representado por homens brancos, de idade avançada, de baixa escolaridade, residentes nas regiões Sudeste e Nordeste, que são atendidos nos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) e que dificilmente conseguem ser atendidos por um médico nefrologista. Nesse perfil, os indivíduos são fumantes ou ex-fumantes e que apresentam, também, diabetes e hipertensão arterial como comorbidades associadas.

Os estudos mostraram que é evidente a grande complexidade da doença renal crônica e as diversas variáveis de agravos à saúde aos quais os pacientes estão expostos. As taxas de morbimortalidade são altas e não devem ser naturalizadas pela sociedade e pelas instituições de saúde. Devem ser combatidas, principalmente através de medidas de promoção à saúde.

Assim, espera-se que os resultados deste estudo possam servir de apoio para as políticas públicas de saúde, de modo a auxiliar os profissionais de saúde e gestores a adotarem estratégias eficazes, que possibilitem ao paciente maior compreensão e conhecimento em relação à própria doença, proporcionando-lhe não somente maior autonomia, mas uma boa adesão ao tratamento para evitar consequências, e tendo assim, melhora na sua qualidade de vida.

Nesse contexto, a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE) ao paciente com doença renal crônica deve ser priorizada e pensada nas diferentes variáveis, direcionando as medidas de gestão hospitalar e seus protocolos, a minimizarem efeitos negativos na qualidade de vida e, ainda, a auxiliarem na redução da mortalidade e seus preditores nesses pacientes.

REFERÊNCIAS

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SILVA, Matheus Vinicius Barbosa et al. Mortalidade por doença renal crônica secundária à hipertensão no Brasil: um estudo do “Global Burden of Disease”. Revista de Epidemiologia e Controle de Infecção, v. 12, n. 3, p. 1-15, 2022. Disponível em: https://online.unisc.br/seer/index.php/epidemiologia/article/17522. Acesso em: 14 set. 2023.

SIVIERO, Paula Cristina Lima; MACHADO, Carla Jorge; CHERCHIGLIA, Mariangela Leal. Insuficiência renal crônica no Brasil segundo enfoque de causas múltiplas de morte. Cad Saúde Colet, v. 22, n. 1, p. 75-85, 2014. Disponível em: https://scielo.br/j/cadsc/a/WCKcBVD5LxK8wrf848FhBvw. Acesso em 13 set. 2023.

WEBSTER, Ângela C. et al. Chronic kidney disease. The lancet, v. 389, n. 10075, p. 1238-1252, 2017. Disponível em: https://thelancet.com/journals/lancet/PIIS0140-6736(16)32064-5. Acesso em:  14 set. 2023.


Diego de Sousa Silva – Universidade Federal do Maranhão (UFMA) – Médico com pós-graduação em Saúde Pública – diego.sousa@discente.ufma.br1
Flávia da Conceição Silva Reis – Universidade Federal do Maranhão (UFMA) – Médica – flavia.reis@discente.ufma.br2
Itallo Alves dos Reis – Universidade Federal do Tocantins (UFT) – Médico – italloreis@hotmail.com3
Claudia de Sousa Fidelis – Universidade Federal do Maranhão (UFMA) – claudia.fidelis@discente.ufma.br4
Elton Robson Sodré Menezes – Universidade Federal do Maranhão (UFMA) – Médico com pós-graduação em Engenharia Clínica – elton.impactoengenharia@gmail.com5
Luis Felipe Monteiro de Sousa Macedo – Universidade Federal do Maranhão (UFMA) – Médico – luismasedo@hotmail.com6
Franklin Reis Fonseca de Araujo – Universidade Federal do Maranhão (UFMA) – Médico – franklinrfaraujo@gmail.com7
Thayse Cristina Oliveira Marinho – Universidade Federal do Maranhão (UFMA) – Médica – tcoliveiramarinho@gmail.com8
Jusciellyson da Silva Nava – Universidade CEUMA, Campus Imperatriz – Médico – jusciellyson@hotmail.com9
Mario Vinicius Teles Costa – Universidade Federal do Maranhão (UFMA) – Médica -marioviniciustc9@gmail.com10