PERFIL CLÍNICO DE PACIENTES NEUROCRÍTICOS EM FASE SUBAGUDA SOB SUPORTE VENTILATÓRIO INVASIVO EM UM HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DE PERNAMBUCO

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th10248141508


Elis Fernanda Araújo Lima de Oliveira1
Fabiana Nery Ribeiro Oliveira2
Victor Ribeiro Neves3
Fabianne Maisa de Novaes Assis Dantas4
Paulo André Freire Magalhães5


RESUMO

Introdução: Pacientes neurocríticos exigem cuidados intensivos devido a déficits neurológicos que causam instabilidade clínica. A fase subaguda, entre a aguda e a crônica, é crucial, pois esses pacientes podem recuperar funções, mas ainda necessitam de cuidados intensivos, incluindo suporte ventilatório invasivo. Objetivo: Delinear características demográficas, condições clínicas e defechos em pacientes neurocríticos na fase subaguda sob VPMI. Métodos: Trata-se de um estudo analítico e observacional transversal com 20 pacientes neurocríticos de ambos os sexos, com mais de 18 anos, internados em UTI e utilizando VPMI.Resultados: A amostra foi composta predominantemente por homens (80%), com idades entre 23 e 84 anos. Os pacientes permaneceram na UTI por uma média de oito dias, iniciando VPMI desde a admissão. As principais condições que necessitaram de VPMI foram Acidente Vascular Encefálico (AVE) em 50% e Traumatismo Cranioencefálico (TCE) em 40%. Desses, 85% dos pacientes receberam alta e 15% evoluíram para óbito. Conclusão: Este estudo fornece dados relevantes sobre o perfil clínico de pacientes neurocríticos em VPMI, sublinhando a importância de um manejo individualizado e protocolos adaptados à realidade das UTIs para melhorar os desfechos clínicos.Palavras-chave: Cuidados Críticos; Respiração Artificial; Unidade de Terapia Intensiva; Sistema Respiratório; Distúrbios Neurológicos.

INTRODUÇÃO

            A definição de paciente neurocrítico abrange aqueles que apresentam déficits em um ou mais sistemas, resultantes de comprometimentos neurológicos que demandam cuidados intensivos e complexos dentro das unidades de terapia intensiva (UTIs), devido à instabilidade clínica caracterizada por tais condições (Maia et al., 2024). A fase subaguda, que se situa entre a fase aguda e a fase crônica, representa um estágio crucial no curso de condições neurológicas severas. Na fase aguda, os pacientes experimentam lesões significativas, comprometimento profundo das funções neurológicas e instabilidade clínica. Em contraste, a fase subaguda é marcada por uma evolução onde os pacientes podem apresentar alguma recuperação, mas ainda necessitam de monitoramento intensivo e intervenções terapêuticas adequadas (Oliveira; Pereira, 2020; Silva, 2021).

            Durante a fase subaguda, muitos desses pacientes começam a recuperar funções, embora ainda estejam suscetíveis a complicações. As manifestações clínicas típicas incluem variações no nível de consciência, dificuldades motoras, necessidade de suporte respiratório e nutrição enteral, entre outras. A duração dessa fase varia de dias a semanas, dependendo da gravidade da condição inicial, das intervenções médicas realizadas e das características individuais dos pacientes (Martins, 2022; Costa, 2023).

            O campo da terapia intensiva está em constante evolução, com ênfase no manejo de pacientes neurocríticos, cuja condição requer uma abordagem multidisciplinar e cuidados especializados (Silva et al., 2021). A ventilação mecânica invasiva é uma intervenção comum em tais situações, destinada a assegurar a oxigenação adequada e o suporte ventilatório em pacientes com comprometimento respiratório (Costa et al., 2022). Dado o alto nível de complexidade clínica presente nesses casos, é essencial estabelecer um perfil clínico detalhado que auxilie na elaboração de estratégias de manejo mais eficazes e individualizadas (Pereira et al., 2023).

            Dados de literatura indicam que a morbidade e a mortalidade em pacientes neurocríticos submetidos à ventilação pulmonar mecânica (VPM) estão intimamente ligadas a fatores como a etiologia neurológica, a gravidade do estado clínico inicial e a duração da ventilação (Martins et al., 2020). Portanto, entender esses fatores é fundamental para a otimização dos cuidados e a melhoria dos desfechos clínicos (Almeida; Ferreira, 2024). Contudo, há uma carência de informações específicas e robustas sobre o perfil clínico desses pacientes em contextos de terapia intensiva no Brasil, o que justifica a realização deste estudo transversal em um hospital universitário de referência em cuidados neurológicos localizado no interior de Pernambuco.

            Esta pesquisa tem como objetivo delinear o perfil clínico de pacientes neurocríticos sob ventilação mecânica invasiva, focando nas características demográficas, condições clínicas e resultados associados ao tratamento. Os achados deste estudo têm o potencial de contribuir significativamente para a formulação de protocolos de atendimento mais ajustados à realidade das UTIs, promovendo melhorias substanciais no cuidado a esse grupo vulnerável de pacientes.

MÉTODOS

DESENHO DO ESTUDO

            Este estudo analítico e observacional foi realizado de forma transversal, com o objetivo de avaliar o perfil clínico e sociodemográfico de pacientes neurocríticos na fase subguda do insulto neurológico e em uso de VPMI. A pesquisa foi conduzida na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de um Hospital Universitário localizado no interior do estado de Pernambuco.

POPULAÇÃO E AMOSTRA

            A amostra foi definida com base na conveniência e acessibilidade, pacientes de ambos os sexos, maiores de 18 anos, internados na UTI como neurocríticos em fase subaguda e submetidos à VPMI.

            A seleção dos pacientes foi realizada de acordo com os seguintes critérios de inclusão: pacientes classificados em neurocríticos em fase subgado no insulto neurológico primário em VPMI.

            Os critérios de exclusão foram: Declínio agudo do estado neurológico; Elevação da pressão intracraniana refratária; Instabilidade hemodinâmica; Hipotensão que requer vasopressores; Paralisia farmacológica; Ventilação mecânica com pressão expiratória positiva final (PEEP) maior ou igual a 8 cmH2O; Fração inspirada de oxigênio (FiO2) superior a 60%; Uso do modo de ventilação APRV (Airway Pressure Release Ventilation); Terapia de reposição renal contínua; Status de conforto em que a sedação contínua não possa ser desmamada; Índice de massa corporal (IMC) superior a 30 kg/m²; História de cirurgia torácica prévia; Falta de consentimento do provedor documentado.

COLETA DE DADOS

Os dados foram coletados de forma prospectiva durante o período de internação dos pacientes na UTI. Informações clínicas relevantes, incluindo dados sociodemográficos, características neurológicas, ventilatórias e hemodinâmicas, foram registradas em formulário padronizado e estruturado previamente pelos autores.

ANÁLISE ESTATÍSTICA

Os resultados foram apresentados por meio de análise descritiva, utilizando números absolutos e percentuais. Os dados foram organizados em tabelas e gráficos para facilitar a visualização e interpretação. Variáveis contínuas foram apresentadas como médias (DP) e/ou seus respectivos intervalos de confiança ou por meio da mediana e intervalo interquartil (1-3IQ).

CONSIDERAÇÕES ÉTICAS

O estudo é um recorte de um estudo maior que foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros – CISAM/UPE (número do parecer 3.943.794 e CAAE 29528519.1.0000.5191). Todos os participantes ou seus representantes legais assinaram um termo de consentimento informado antes da inclusão no estudo, garantindo a confidencialidade e o direito de desistir a qualquer momento da pesquisa.

RESULTADOS

            Um total de 20 pacientes neurocríticos hospitalizados foi incluído no estudo, sendo a maioria do sexo masculino (n=16), com idade dos participantes variando de 23 anos a 84 anos. Os pacientes estavam internados em média oito dias, sendo instituída a VPMI desde o 1o de admissão hospitalar. A Tabela 1 apresenta as características dos indivíduos que participaram da pesquisa.

Tabela 1. Caracterização da amostra estudada (n=20) apresentada como média (DP) ou mediana (1-3IQ)*.

 Média (DP)Intervalo de Confiança de 95%
Limite inferior – Limite superior
Idade (anos)50,2(17)42,258,1
Peso (kg)68,1(13)62,074,2
Altura (m)1,64(7.91)1,601,68
Escala de coma de Glasgow8.0(2.4)6.89.1
Dias em VPM7.9(5)5.510.2
Nível de PS (cmH20)11.0(8-13)*9.013.4
PEEP (cmH20)5.0(5-5.2)*5.05.9
FiO2 (%)21.0(21-23.5)*21.423.6

Legenda- VPM: Ventilação Pulmonar Mecânica; PS: Pressão de Suporte; PEEP: Pressão Positiva Expiratória Final; FiO2: Fração Inspirada de Oxigênio.

            A frequência de diagnóstico que justificou a necessidade de cuidados intensivos, incluindo a instituição de VPMI foi o Acidente Vascular Encefálico, AVE (50%), seguido de Traumatismo Cranioencefálico Grave, TCE (40%). Pneumonia por broncoaspiração foi prevalente em 5% de ambos os casos (TCE e AVE) (Figura 1).

Figura 1.  Frequência de diagnósticos de pacientes neurocríticos sob ventilação pulmonar mecânica invasiva.

            Dos vinte pacientes incluídos no estudo, 85% receberam alta hospitalar, enquanto os demais (15%) foram a óbito durante a internação.

DISCUSSÃO

            A complexidade do cuidado a pacientes neurocríticos na terapia intensiva, especialmente na fase subaguda, é um tema de crescente relevância no contexto da medicina moderna. Este estudo, por meio de uma análise transversal de pacientes sob ventilação mecânica invasiva (VPMI) em uma unidade de terapia intensiva de um hospital universitário no interior de Pernambuco, fornece insights significativos sobre o perfil clínico dessa população vulnerável e suas respectivas necessidades de manejo (Santos et al., 2020; Oliveira et al., 2021).

            A predominância de pacientes do sexo masculino (80%) e a faixa etária variando de 23 a 84 anos refletem a diversidade dessa população, que apresenta necessidades variadas de cuidado intensivo. Este padrão demográfico pode estar associado a fatores como as taxas de acidentes e comportamentos de saúde que afetam de maneira desproporcional o sexo masculino, especialmente em idades mais jovens e adultas (Costa; Almeida, 2022). Além disso, a média de internação de oito dias, com a instituição da VPMI desde o primeiro dia de admissão, sugere uma exposição prolongada a intervenções invasivas, o que destaca a necessidade de uma abordagem cuidadosa para minimizar complicações associadas à ventilação prolongada.

            Os diagnósticos mais comuns AVE e TCE corroboram dados previamente relatados na literatura, que evidenciam a predominância dessas condições como principais motivos para internação em UTIs neurocríticas (Martins; Fernandes, 2023). A proporção significativa de casos de pneumonia por broncoaspiração, que acomete 5% dos pacientes, enfatiza a vulnerabilidade desse grupo a complicações infecciosas, uma vez que a ventilação mecânica é um fator de risco bem documentado para desenvolvimento de pneumonia associada à ventilação (PAV) (Rodrigues et al., 2019). Portanto, a implementação de estratégias de profilaxia, como a elevação da cabeceira do leito e cuidados rigorosos de higiene oral, torna-se fundamental para a prevenção dessas complicações (Cunha et al., 2021).

            O fato de que 85% dos pacientes receberam alta hospitalar é um indicativo encorajador, refletindo um desfecho favorável para a maioria dos casos analisados. No entanto, 15% dos pacientes faleceram indica a gravidade intrínseca das condições subjacentes e a necessidade de monitoramento e intervenções contínuas para mitigar a mortalidade (SOUZA et al., 2024). A relação direta entre a etiologia neurológica, a gravidade do estado clínico no momento da admissão e os desfechos de saúde sugere que a identificação precoce de fatores de risco poderia melhor informar as intervenções terapêuticas e o suporte clínico (LIMA; PEREIRA, 2023).

            Ademais, a carência de dados robustos sobre o perfil clínico de pacientes neurocríticos no Brasil, especialmente no contexto de UTIs, é uma limitação que este estudo começa a abordar. Com a crescente demanda por cuidados neurointensivos e a diversidade das intervenções necessárias, uma melhor compreensão das características e resultados dos pacientes permitirá a formulação de protocolos mais adequados e adaptados às realidades locais (ALMEIDA et al., 2022). Isso pode, potencialmente, melhorar tanto a eficiência dos cuidados como os desfechos clínicos, favorecendo uma prática baseada em evidências e alinhada às necessidades dos pacientes.

CONCLUSÃO

A análise dos 20 pacientes neurocríticos hospitalizados revela importantes implicações para a prática clínica e para a gestão de cuidados intensivos. Compreendendo predominantemente homens e uma faixa etária ampla, o estudo destaca a prevalência do Acidente Vascular Encefálico e do Traumatismo Cranioencefálico Grave como as principais condições que conduziram à necessidade de Ventilação Mecânica Invasiva. A taxa de sucesso ao tratamento, com 85% dos pacientes recebendo alta hospitalar, sugere uma resposta positiva às intervenções realizadas, embora a mortalidade de 15% sublinhe a gravidade do perfil clínico dos indivíduos atendidos. Esses achados indicam a necessidade de estratégias aprimoradas para o manejo de complicações, como a pneumonia por broncoaspiração, observada em uma porcentagem significativa dos casos. Assim, o estudo não apenas contribui para o entendimento das características e desfechos de pacientes neurocríticos, mas também incentiva a contínua reflexão sobre práticas de cuidado intensivo e a importância de abordagens preventivas nesse contexto.

REFERÊNCIAS

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1 MSc. Programa de Pós-graduação em Reabilitação e Desempenho Fundacional (PPGRDF), Universidade de Pernambuco (UPE), Petrolina, Pernambuco Brasil; elisfernanda89@gmail.com.

2 MSc. Programa de Pós-graduação em Reabilitação e Desempenho Fundacional (PPGRDF), Universidade de Pernambuco (UPE), Petrolina, Pernambuco Brasil; fabiana.nery@upe.br.

3 PhD. Programa de Pós-graduação em Reabilitação e Desempenho Fundacional (PPGRDF), Universidade de Pernambuco (UPE), Petrolina, Pernambuco Brasil; victor.neves@upe.br.

4 PhD. Programa de Pós-graduação em Reabilitação e Desempenho Funcional (PPGRDF), Universidade de Pernambuco (UPE), Petrolina, Pernambuco Brasil; fabianne.assis@upe.br.

5 PhD. Programa de Pós-graduação em Reabilitação e Desempenho Fundacional (PPGRDF), Universidade de Pernambuco (UPE), Petrolina, Pernambuco Brasil; paulof.magalhaes@upe.br
Corresponding author: Paulo Magalhães. Universidade de Pernambuco. BR 203, Km 2, s/n, Petrolina/PE, Brazil, CEP: 56328-903. Tel +55(87) 3866-6468. E-mail: paulof.magalhaes@upe.br..